ARRENDAMENTOS & PARCERIAS
Contratos agrários têm diferentes impactos diante das queimadas

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Por João Eduardo Diamantino

Responsável por 23,8% do PIB brasileiro, o agronegócio sofre as consequências de queimadas nunca vistas na História. A grande maioria das propriedades foi afetada pelos incêndios e faz as contas dos prejuízos. O cálculo de quanto cada produtor perdeu passa pela análise do tipo de contrato firmado, seja de arrendamento ou de parceria. Entender essa diferença é fundamental para se analisar as soluções possíveis.

As duas modalidades são reguladas pelo Decreto 59.566/1966, mais especificamente nos artigos 1º e 13. Tipicamente, os dois tipos de contrato contemplam cláusulas proibitivas e obrigatórias, que na ausência ou descumprimento de alguma delas podem torná-los nulos.

Em um contrato de arrendamento, existe o arrendador (proprietário da terra) e o arrendatário (produtor que irá utilizá-la). Este tipo nada mais é que um aluguel de imóvel rural. Ou seja, uma parte entra com a terra e a outra com a disposição de produzir. Por este uso, paga um valor pré-estabelecido – que deve ser fixo.

Já no contrato de parceria rural, como o nome sugere, existem parceiros. Isso quer dizer que haverá uma divisão um pouco mais complexa do que mero proprietário da terra e produtor. Neste caso, ambos dividem os resultados da produção – e não há um pagamento fixo. O maior benefício desta modalidade é o tributário, já que as alíquotas incidentes sobre o contrato são menores.

Esta diferença deve ser um ponto de especial atenção neste momento. Afinal, para além do tipo de contrato entabulado entre as partes, a sua efetiva execução tem repercussões fiscais.

Segundo as discussões que chegaram ao Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) nos últimos dez anos, a Receita Federal entende que uma tributação maior ou menor está proporcionalmente vinculada ao nível de riscos assumidos. Ou seja: um arrendamento, sem risco para o proprietário da terra, tem uma tributação maior em relação ao contrato de parceria, já que o risco envolvido se reflete em uma vantagem fiscal.

Na prática, partindo da premissa de que não há assunção de riscos no contrato de arrendamento, o proprietário da terra pode, em tese, exigir o cumprimento do pagamento previsto contratualmente. Mesmo que o produtor tenha tido sua lavoura queimada. Já no caso da parceria, o prejuízo é, também em tese, suportado pelas duas partes.

Importante lembrar que, seja qual for o contrato, os produtores geralmente comercializam suas produções com a expectativa da safra futura. Ou seja, vendem algo que ainda não foi produzido, com a promessa de entrega.

Nas duas situações, qualquer repactuação ou execução contratual tem que levar em conta os aspectos fiscais, já que a Receita Federal terá como base o tipo de acordo firmado entre as partes para calcular os tributos devidos. Isso é especialmente relevante em um cenário de menos subsídios e linhas de crédito.

Outra variável a ser considerada é a decretação de estado de emergência pelos municípios. Com isso, diversas operações podem ser paralisadas com a restrição do uso de máquinas.

Seja qual for o caso, nenhuma das partes deseja estar na atual situação e cada caso deve ser analisado com atenção, levando em conta as particularidades de cada contrato. Enquanto todos esperam uma reação de Brasília capaz de mitigar os danos e evitar novos incêndios, a única certeza, infelizmente, são os prejuízos.

João Eduardo Diamantino é tributarista e sócio do Diamantino Advogados Associados

BEM DE FAMÍLIA
Imóvel indivisível não pode ser penhorado para quitar dívidas fiscais, decide TRF-4

Sede do TRF-4 em Porto Alegre
Foto: Diego Beck/ACS/TRF-4

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

É impenhorável o imóvel indivisível utilizado por um dos coproprietários como bem de família, ainda que para saldar dívida daqueles em relação aos quais não ostente tal qualidade.

A decisão, por maioria, é da 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ao manter sentença da 6ª Seção Judiciária da Comarca da Região Metropolitana de Maringá (PR) – juízo de competência delegada da Justiça Federal para litígios tributários – que julgou procedentes embargos de terceiro contra penhora de um imóvel por dívidas fiscais.

Para a relatora da apelação, desembargadora Luciane Amaral Corrêa Münch, a expropriação do bem é inviável mesmo que se resguarde a quota-parte dos condôminos não devedores, porque a transformação da coisa em pecúnia esvazia a proteção erigida pela Lei 8.009/90 – Lei da Impenhorabilidade.

‘‘É irrelevante para a incidência da proteção ao bem de família que o devedor ou o terceiro sejam proprietários de outros imóveis, desde que residam somente naquele que alegam ser impenhorável’’, complementou a relatora no acórdão.

Imóvel de uso familiar

A embargante Thaís Borba dos Santos alegou, em síntese, que é coproprietária de bem imóvel constrito em execução intentada pelo fisco contra Haroldo Borba dos Santos, seu irmão. Disse que a penhora recaiu sobre bem de família em que ela reside com os pais há mais de 20 anos. Alertou que não poderia se cogitar do bloqueio parcial, pois o bem é indivisível. E mais: o imóvel foi doado com cláusulas de impenhorabilidade e inalienabilidade.

Em resposta aos embargos, a União (Fazenda Nacional) pontuou a não caracterização da impenhorabilidade. Primeiro, porque o executado não reside no imóvel. Em segundo lugar, porque o devedor executado não demonstrou que só possuía este único imóvel. Em terceiro, por fim, pela ausência de impugnação contemporânea à vinculação do bem para com a execução.

‘‘Por todo o exposto, procedem os embargos pela impossibilidade não de penhora da propriedade nua com respeito ao termo usufrutuário, mas pela vedação à alienação de produto que restará indiviso com condômino parente nele residindo’’, resumiu, na sentença, o juiz de direito João Alexandre Cavalcanti Zarpellon, membro da Justiça Estadual paranaense.

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TJPR 00021520320198160109 (Maringá-PR)

 

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ABUSO DE DIREITO
TRT-SC mantém justa causa de trabalhador de fundição que aderiu à ‘‘greve selvagem’’

Para ser legítima, a paralisação de funcionários deve seguir critérios, como aviso prévio ao empregador e apoio sindical, sob pena de ser considerada ‘‘greve selvagem’’.

O entendimento é da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina), em decisão que validou a dispensa por justa causa de trabalhador que aderiu a movimento irregular contra a troca de gestão na Fundição Erus Ltda., localizada em Nova Veneza, Sul do Estado.

O ex-funcionário procurou a Justiça do Trabalho em 2023, buscando reverter a sua demissão para sem justa causa, o que asseguraria acesso a direitos como verbas rescisórias e habilitação no seguro-desemprego.

No processo, o reclamante alegou que a paralisação foi motivada pela destituição do sócio que ocupava a gestão, medida determinada pela Justiça Comum. Ainda segundo o relato, ele e os colegas se posicionaram na entrada da empresa, afirmando que só retornariam se a administração anterior fosse restabelecida.

A empresa, por sua vez, argumentou que o trabalhador praticou abandono de emprego, ao se ausentar por mais de 30 dias, prejudicando a produção e causando impacto financeiro. Além disso, afirmou que deu a chance do ex-funcionário retornar às atividades regulares, o que foi negado.

Des. Wanderley Godoy Junior
Foto: Secom/TRT-SC

Prejuízos ao empregador

No primeiro grau, o juízo da 1ª Vara do Trabalho de Criciúma não acolheu os pedidos do autor. A juíza Janice Bastos, que julgou o caso, afirmou na sentença que o trabalhador ‘‘abusou do direito de greve’’ ao recusar o retorno às atividades quando convocado pelo empregador.

A magistrada também ressaltou que ‘‘a paralisação trouxe a depreciação ou inutilização de produtos já adquiridos e a queda no faturamento da empresa’’. Isso teria gerado impactos não só para a reclamada, que teve de manter compromissos com fornecedores, impostos e salários, mas também para os próprios empregados.

Greve selvagem

Inconformado com a decisão do juízo de origem, o autor recorreu ao tribunal, insistindo que não abandonou o emprego, mas exerceu legitimamente seu direito de greve.

No entanto, na 3ª Turma do TRT-SC, o entendimento do primeiro grau foi mantido. O relator do caso, desembargador Wanderley Godoy Junior, ressaltou no acórdão que a paralisação ‘‘surpresa’’ promovida pelo trabalhador e seus colegas não seguiu os procedimentos legais, como prévio aviso à empresa e participação do sindicato.

‘‘Greve haveria se estivesse em jogo busca por direitos trabalhistas, mas o caso enquadra-se mais como uma rebelião por insatisfação contra a mudança na gestão da empresa. Trata-se do que se chama de greve selvagem’’, afirmou o magistrado.

Godoy Junior também frisou que, agravando a situação, o protesto foi direcionado contra uma ordem judicial, e não apenas uma mudança administrativa interna, caracterizando ‘‘rebelião em face de decisão estatal’’.

Com base nos elementos, o acórdão concluiu, por unanimidade, que a conduta do trabalhador foi grave o suficiente para justificar a dispensa por justa causa, conforme permite a legislação trabalhista.

O autor recorreu da decisão. Redação Painel de Riscos com informações de Carlos Nogueira, da Secretaria de Comunicação Social (Secom)/TRT-12.

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ATOrd 0000683-67.2023.5.12.0003 (Criciúma-SC)

VENDEDORA DE PERFUMES
Revista íntima sem contato físico não causa dano moral indenizável, decide TRT-SP

Dufry Shopping, no Aeroporto de Guarulhos
Foto: Reprodução/Foursquare

A 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) manteve sentença que negou indenização por danos morais a uma vendedora de perfumes da Dufry Lojas Francas Ltda., no Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP), que reclamou de abuso em revista íntima promovida pelo empregador. O colegiado reforçou o entendimento de que não se verifica a existência de situação vexatória ou humilhante se as inspeções eram gerais e ocorriam sem contato físico.

A reclamante contou que era submetida diariamente à revista em uma sala apertada e que o procedimento era feito, na maioria das vezes, por homens. Disse que era obrigada a retirar os sapatos e que recebia o detector de metais para ela mesma passar sobre o corpo.

Ela argumentou que a situação era constrangedora. Por isso, pleiteava indenização por danos morais. A empresa confirmou os fatos narrados pela profissional.

Segundo a relatora do acórdão, desembargadora Jane Granzoto Torres da Silva, o pedido para retirar o calçado não caracteriza exposição de partes íntimas do corpo da mulher. Com relação às revistas serem feitas por pessoa do outro sexo, afirmou que ‘‘não gera, dentro de padrões de razoabilidade, vexames ou constrangimentos’’.

A julgadora ressaltou, ainda, que a própria empregada reconheceu que não havia contato físico no procedimento nem a necessidade de exposição de partes vestidas do corpo.

A magistrada citou também jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) relativa ao tema e concluiu que a revista à trabalhadora situa-se ‘‘nos limites do legítimo direito do empregador de zelar por seu patrimônio e defender-se de eventuais desfalques ou subtrações de produtos’’. Com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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ATOrd 1000301-67.2023.5.02.0316 (Guarulhos-SP)

INADIMPLÊNCIA DO EXECUTADO
É possível incluir novos réus no processo de execução, desde que mantidos o pedido e a causa de pedir, diz STJ

Pórtico do Cond. Terras de Jupiá, em Três Lagoas (MS)/Divulgação

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que é possível modificar o polo passivo de uma demanda judicial mesmo após o saneamento do processo e sem a autorização do réu, desde que não haja alteração do pedido ou da causa de pedir.

Com esse entendimento, o colegiado aceitou o pedido da Associação dos Proprietários e Moradores do Loteamento Terras do Jupiá, localizada em Três Lagoas (MS), para incluir os vendedores de um lote do condomínio no polo passivo de uma execução de dívida.

Na origem do caso, a Associação foi à Justiça para cobrar do comprador do lote o valor de taxas em atraso. Desde o início do processo, as empresas vendedoras atuaram como terceiras interessadas. Quatro anos se passaram, e a Associação decidiu incluir no polo passivo as duas empresas vendedoras, em virtude de uma suposta confissão de que seriam as responsáveis pelos débitos em discussão. Isso se deu porque as empresas alegaram ser as verdadeiras proprietárias do lote, pois o executado tinha ficado inadimplente.

O juízo de primeiro grau admitiu a alteração do polo passivo da execução, mas o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) entendeu que a medida seria incabível, pois já havia passado muito tempo desde a estabilização do processo. A corte local indicou ainda que a Associação deveria ajuizar uma nova ação de execução contra as empresas.

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Imprensa /TSE

CPC não obriga a manutenção das partes processuais após a citação

Relatora do caso no STJ, a ministra Nancy Andrighi destacou que, embora tenha se passado um tempo considerável entre o saneamento do processo e a alteração do polo passivo, não há vedação legal a essa mudança.

Segundo a ministra, isso ocorre porque o atual Código de Processo Civil (CPC), acompanhando a evolução jurisprudencial, não menciona mais a obrigação de serem mantidas as partes do processo após a citação. Nesse sentido, a modificação do polo passivo, quando mantidos o pedido e a causa de pedir, não viola o artigo 329 do Código.

‘‘Pelo contrário, além de homenagear os princípios da economia processual e da primazia do julgamento de mérito, essa possiblidade cumpre com o dever de utilizar a técnica processual não como um fim em si mesmo, mas como um instrumento para a célere composição do litígio’’, refletiu a relatora.

Ajuizamento de uma nova ação traria apenas prejuízo às partes

Nancy Andrighi observou que a inclusão das duas empresas como executadas não alterou o pedido nem a causa de pedir da execução, pois a pretensão de cobrança das taxas associativas não pagas continuou a mesma. Além disso, as empresas vendedoras já atuavam no processo desde o início, ainda que na condição de terceiras interessadas.

Dessa forma, a ministra ressaltou que o ajuizamento de uma nova ação apenas para mudar o polo passivo só iria adiar o julgamento de mérito, trazendo mais prejuízos às partes. Além disso, ela lembrou que as causas em que o pedido ou a causa de pedir são iguais devem ser julgadas conjuntamente, pois são conexas.

‘‘Portanto, não há razão para impedir o aditamento que altera apenas a composição subjetiva da lide. Há de ser oportunizada à parte autora a alteração do polo passivo mesmo após o saneamento do processo, desde que não haja alteração do pedido ou da causa de pedir’’, concluiu a relatora ao dar provimento ao recurso especial (REsp). Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2128955