FORMALISMO EXAGERADO
TRF-1 reconhece o direito de produtor rural receber premiação de incentivo do Governo Federal

A 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), por unanimidade, negou a apelação da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) contra a sentença que reconheceu o direito de um agricultor ao recebimento do Prêmio Equalizador Pago ao Produtor Rural (Pepro), declarou nula a multa contratual, além de determinar a exclusão do nome do autor de restrições de crédito.

Consta nos autos que o requerente alegou ter vendido parte do produto (soja) em negociação internacional, mas só obteve a documentação necessária após o prazo exigido no edital, o que resultou no não pagamento do prêmio e na aplicação de multa. A Conab argumentou que o autor não cumpriu o edital, pois não apresentou documentos originais no prazo e não vendeu toda a soja arrematada.

O relator do caso no TRF-1, juiz federal convocado Pablo Baldivieso, considerou que as oscilações de mercado justificaram a não venda total do produto e que a exigência de documentos originais foi um formalismo excessivo. Além disso, constatou-se que a operação de venda foi devidamente comprovada por notas fiscais e documentos de transporte.

Apesar de apresentar documentos que comprovaram a negociação e o transporte dos grãos, o produtor foi penalizado pela Conab devido à ausência de originais no prazo estipulado.

Para o magistrado, a exigência configurou um formalismo exagerado. ‘‘Se demonstrada a efetiva operação por meios idôneos, ainda que diferentes dos previstos no edital, esses documentos devem ser aceitos. A parte autora faz jus ao recebimento do prêmio, pois não poderia cumprir uma obrigação impossível de ser realizada no prazo estabelecido’’, destacou o relator.

Além disso, a Conab questionou a venda de apenas parte do produto e alegou inconsistências entre os agentes envolvidos nas operações de câmbio. No entanto, o magistrado enfatizou que as condições de mercado e as particularidades logísticas justificavam as ações do produtor.

‘‘A sentença corretamente aplicou o princípio da razoabilidade ao reconhecer que o produtor agiu para evitar prejuízos e não infringiu as regras do edital de forma deliberada. Negar o pagamento seria permitir o enriquecimento ilícito da empresa pública’’, concluiu o relator. Com informações da Assessoria de Comunicação Social do TRF-1.

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Processo 0014567-91.2007.4.01.3600 

CONTRATOS BANCÁRIOS
Financeira condenada a devolver dinheiro a consumidor não pode compensar obrigação com parcelas não vencidas

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou decisão de segundo grau que havia permitido o uso de parcelas vincendas de um empréstimo para compensar o valor que a financeira terá de restituir a uma consumidora por força de condenação judicial. Para o colegiado, eventual contrapartida só pode ocorrer em relação a dívidas já vencidas.

Segundo os autos, a consumidora ajuizou ação de revisão contratual contra a Facta Financeira S. A. Crédito, Financiamento e Investimento, alegando que o contrato de empréstimo conteria cláusulas abusivas. Na contestação, a empresa solicitou que, se condenada, pudesse compensar eventual devolução de dinheiro com o valor de parcelas do contrato que ainda iriam vencer, de modo a quitar o saldo devedor.

O juízo recalculou as taxas a serem aplicadas no contrato, de acordo com as aplicadas pelo mercado à época, e concedeu a compensação com as parcelas vincendas. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) manteve a decisão.

No recurso especial (REsp) dirigido ao STJ, a consumidora sustentou que não seria possível a compensação das parcelas do contrato nesse caso, pois ainda não estavam vencidas.

Legislação prevê as hipóteses de compensação

A relatora do REsp, ministra Nancy Andrighi, destacou que, de acordo com os artigos 368 e 369 do Código Civil, quando duas pessoas são ao mesmo tempo credoras e devedoras uma da outra, as obrigações se extinguem até onde se compensarem. Conforme ressaltou, essa regra somente pode ser aplicada nos casos de dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis.

A ministra apontou que, segundo a jurisprudência do STJ, para ser admitida a compensação de dívidas, deve haver reciprocidade dos créditos e homogeneidade entre as prestações.

Valor cobrado indevidamente deve ser devolvido ao consumidor

Para Nancy Andrighi, apesar de simples, a demanda merece atenção, pois impacta diretamente os contratos celebrados pelos consumidores brasileiros.

A relatora lembrou que, nos casos de créditos contestados, a parte ré pode requerer a sua compensação, como forma de evitar o pagamento do valor cobrado ou de reduzi-lo. Entretanto, ela apontou que o banco pretendia compensar as parcelas ainda não vencidas com o valor que deveria devolver à consumidora por ter cobrado taxas abusivas.

‘‘A manutenção da sentença nos termos narrados poderia esvaziar a devolução dos valores cobrados indevidamente, sobretudo diante de contratos bancários de trato sucessivo’’, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2137874

DANO MORAL COLETIVO
Condomínio não pode exigir certidão de antecedentes criminais para acesso de prestadores de serviços, decide TRT-RS

A proteção à propriedade privada não pode servir de argumento para justificar a exigência de certidão de antecedentes criminais a trabalhadores que prestam serviço em residências localizadas em condomínio. Afinal, esta prática afronta o direito de acesso ao trabalho e ainda fere direitos de personalidade do trabalhadores (intimidade, honra, imagem).

Nesse fundamento, a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) proibiu que o Condomínio Horizontal de Lotes Rivieira, em Xangrilá, no litoral norte gaúcho, exigisse antecedentes criminais de trabalhadores que prestam serviços nas residências.

Os magistrados foram unânimes ao confirmar a sentença do juiz Luís Fernando da Costa Bressan, do Posto da Justiça do Trabalho de Capão da Canoa, que acolheu a ação civil pública (ACP) manejada pelo Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPTRS)

Para os integrantes do colegiado, trata-se de prática discriminatória que deve ser severamente coibida, sob pena de perpetuar preconceito contra trabalhadores de baixa renda e de pouco acesso a estudo. E não só: a conduta afronta direitos humanos e trabalhistas basilares, causando insegurança jurídica e configurando ofensa ao patrimônio moral coletivo

Mantida a conduta discriminatória, há previsão de multa de R$ 20 mil por trabalhador atingido. Ainda foi fixado o pagamento de R$ 20 mil a título de danos morais coletivos, a serem revertidos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

A partir de denúncia que gerou um inquérito civil do MPT, foi constatado que os condôminos aprovaram em assembleia que os prestadores de serviços deveriam apresentar certidões criminais emitidas pelas Justiças Estaduais e Federais para poderem acessar as casas.

Enquanto o MPT e o condomínio tentavam formalizar um termo de ajustamento de conduta (TAC), o condomínio ratificou a postura e ainda apresentou nova ata de assembleia com restrições mais severas impostas aos trabalhadores.

Frustrada a negociação, o MPT ajuizou a ação

O condomínio alegou que a proibição representava ‘‘risco ao direito de livre disposição, fruição, uso e gozo da propriedade privada’’. Sustentou que o julgamento procedente da ACP constituiria a legitimação da intervenção estatal na propriedade privada em forma diversa à legalmente prevista (desapropriação).

Em sentença, foi confirmada a tutela de urgência, com a determinação para que o condomínio, imediatamente, deixasse de utilizar banco de dados com informações sobre antecedentes criminais e se abstivesse de prestar, buscar ou exigir as informações como condição para o acesso ao local, sob pena de multa de R$ 20 mil, por trabalhador prejudicado, a cada descumprimento.

Para o juiz Luís Fernando, a decisão tomada em assembleia geral viola os princípios da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho. Ele ressaltou que ‘‘o condomínio, na condição de pessoa jurídica de direito privado, não pode se imiscuir em poder que não lhe é afeto, haja vista que inflige aos trabalhadores persecução criminal que cabe tão somente ao Estado’’.

‘‘Ao decidir acerca das regras a serem cumpridas dentro de sua área não pode atentar contra a Constituição e legislação vigente. No caso, além de impedir o livre exercício ao trabalho, está a infligir aos trabalhadores que se enquadram dentre as hipóteses elencadas na assembleia geral acima descritas, condenação preliminar e perpétua, o que não se pode admitir’’, afirmou o magistrado.

O condomínio recorreu ao TRT-RS, mas a sentença foi mantida. ‘‘Não apenas a individualidade de cada empregado é atingida, mas toda a coletividade, que vê a perpetuação de descumprimentos de direitos humanos e trabalhistas basilares em desvirtuamento do que estabelece a legislação, causando insegurança jurídica e configurando ofensa ao patrimônio moral coletivo, o que justifica a indenização pleiteada’’, disse a relatora do acórdão, desembargadora Ana Luíza Heineck Kruse.

A magistrada ainda chamou a atenção para a tentativa do condomínio de burlar a proibição determinada em sentença. Mesmo após o encerramento da instrução, houve um novo pedido para que o condomínio pudesse examinar certidões que seriam exigidas pelos próprios condôminos.

Também participaram do julgamento os desembargadores João Paulo Lucena e André Reverbel Fernandes.

Cabe recurso de revista (RR) ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia/Secom/TRT-4.

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ACPCiv 0021493-43.2023.5.04.0211 (Capão da Canoa-RS)

AÇÃO CIVIL PÚBLICA
TRT-SP restabelece cotas para pessoas com deficiência em empresa de vigilância

A 17ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo), em reforma de sentença, determinou que a Gocil Serviços de e Segurança é obrigada a seguir o artigo 93 da Lei 8.213/91, que prevê cotas progressivas de vagas para reabilitados e pessoas com deficiência de acordo com o número total de empregados.

Contrariando a norma, o primeiro grau da Justiça do Trabalho havia reduzido de 5% para 3% o quantitativo de postos reservados a deficientes, mas a Turma entendeu que não pode o Judiciário mudar a lei sem justificar eventual inconstitucionalidade.

Em resposta à ação civil pública (ACP), a ré alegou que a atividade exercida impõe dificuldades para a contratação ou permanência de vigilantes e seguranças com deficiência. Disse que demonstrou que empreendeu esforços para o cumprimento da regra e pleiteou a exclusão da cota e da multa aplicada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).

O desembargador-relator Homero Batista Mateus da Silva lembrou em seu voto que a proteção às pessoas com deficiência, assim como a dos aprendizes, é constitucional e reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), sendo vedada até mesmo negociação coletiva que enfraqueça a medida.

Por isso, entendeu ser ‘‘desaconselhável’’ a opção do juízo de origem em afastar o critério da lei. ‘‘Mostra-se mais adequado o sopesamento da conduta da ré como critério para o estabelecimento de forma de cumprimento e regularização’’, argumentou.

Com a decisão, a empresa deverá seguir aumentando progressivamente o cumprimento da cota de acordo com os prazos estabelecidos, começando com 3% (em 60 dias), depois 4% (em 120 dias), e por fim 5% (em 180 dias). Os prazos começam a contar após a intimação.

Feita a análise de documentos que comprovaram a contratação de novos empregados, a Turma também diminuiu o valor da indenização por danos morais coletivos de R$ 1,6 milhão para R$ 500 mil.

O processo pende de julgamento de embargos de declaração. Com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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ACPCiv 1000087-20.2021.5.02.0034 (São Paulo)

ABUSO DE POSIÇÃO
É ilegal cobrar tarifa para entrega de cargas em terminais retroportuários, diz STJ

Divulgação Cade

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria, que a cobrança da tarifa Terminal Handling Charge 2 (THC2) pelos operadores portuários, em relação aos terminais retroportuários, configura abuso de posição dominante, na modalidade de compressão de preços (price squeeze). Para o colegiado, a prática viola a Lei 12.529/2011, que regula a defesa da concorrência no Brasil.

O entendimento foi fixado durante o julgamento de ação ajuizada pela empresa retroportuária Marimex, que questionava a cobrança da THC2 – também chamada de Serviço de Segregação e Entrega (SSE) – pela operadora portuária Embraport. A tarifa era exigida para separação, transporte e entrega de cargas do porto nos terminais retroportuários.

Segundo a Marimex, a THC2 já estaria incluída na tarifa box rate (THC), cobrada para o desembarque da carga do navio. A empresa alegou que a cobrança adicional representaria pagamento em duplicidade.

Embora, em primeira instância, o pedido tenha sido julgado improcedente, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) determinou o afastamento da cobrança, por entender que a exigência da THC2 violava regras concorrenciais.

No recuso ao STJ, a Embraport sustentou a legalidade da cobrança da THC2, com base na Lei 10.233/2001 e na Resolução 2.389/2012 da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), que regula o setor. A empresa argumentou que a agência teria competência regulatória para definir tarifas, promover revisões e reajustes tarifários e reprimir ações que atentem contra a livre concorrência ou infrações de ordem econômica.

Ministra Regina Helena Costa foi a relatora
Foto: Imprensa/STJ

Acesso às instalações portuárias garante ambiente competitivo

Para a relatora, ministra Regina Helena Costa, a competência regulatória conferida à Antaq pela Lei 10.233/2001 incorporou a concepção de que a garantia de acesso às instalações portuárias por todos os atores do mercado constitui elemento indispensável ao incentivo do cenário competitivo, especialmente para impedir a concentração de serviços em reduzido número de prestadores.

Ela apontou que os operadores portuários detêm posição dominante no mercado de infraestrutura portuária, podendo atuar tanto nas atividades de movimentação de cargas nos portos quanto no seu posterior armazenamento, em concorrência com os retroportos. Essa integração vertical pode gerar ganhos de eficiência, mas também viabilizar práticas que prejudiquem a concorrência.

Cobrança de serviço essencial não pode criar vantagens injustas

Conforme explicou a ministra, aplica-se ao caso a teoria das infraestruturas essenciais, segundo a qual o detentor da infraestrutura deve garantir acesso às instalações indispensáveis ao exercício de atividades econômicas pelos demais atores do mercado, especialmente quando a oferta de um produto ou serviço não se viabiliza sem acesso ou fornecimento essencial.

De acordo com essa teoria, é possível exigir tarifas para o acesso à infraestrutura essencial, mas a cobrança não pode criar vantagens econômicas injustas para um competidor em detrimento de outros, sob pena de violar os princípios da livre concorrência previstos no artigo 36 da Lei 12.529/2011.

No entendimento da relatora, permitir que os terminais portuários exijam a THC2 de seus competidores diretos no mercado de armazenagem de bens oriundos do exterior como tarifa de acesso a insumo essencial ao exercício de suas atividades possibilita a compressão dos preços praticados pelos retroportos.

Ao negar provimento ao recurso, Regina Helena Costa concluiu que a cobrança configuraria as práticas vedadas pela legislação antitruste de dificultar a constituição ou o desenvolvimento de concorrente; de impedir o acesso de competidor às fontes de insumos ou matérias primas; e, ainda, discriminar adquirentes ou fornecedores de serviços mediante a fixação diferenciada de condições de prestação de serviço. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 1899040