SEM CONTROLE
Gestora de fundo de investimento não responde por dívida trabalhista de empresa investida

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) isentou a Angra Infraestrutura e a Angra Partners, respectivamente gestora e sócia controladora de um fundo de investimentos, da responsabilidade solidária pelos valores devidos a uma trabalhadora. Segundo o colegiado, o fundo de investimentos pode fazer parte do grupo econômico, mas a gestora e sua sócia se limitavam à administração dos recursos, sem exercer controle efetivo sobre a empresa investida.

A ação foi movida por uma gerente jurídica contra a Georadar Serviços e Participações S.A., de Nova Lima (MG), sua empregadora, e diversas outras empresas que, segundo ela, fariam parte do mesmo grupo econômico, entre elas o FIP O&G – Óleo e Gás Fundo de Investimento e Participações, acionista da Georadar, a Angra Infraestrutura, gestora do fundo, e a Angra Partners, sua sócia controladora.

Na contestação, o FIP O&G e a Angra Infraestrutura argumentaram que, sendo fundos de investimento em participações da Georadar, não responderiam por seus débitos trabalhistas. A Angra Partners, por sua vez, defendeu que, apesar da coincidência de nomes, era pessoa jurídica distinta da Angra Infraestrutura, com objetos sociais, atividades e direções diferentes. Também sustentou que não era acionista da Georadar. Segundo a empresa, ela é uma prestadora de serviços de advocacia, custódia, auditoria etc.

Reconhecimento de grupo econômico

O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais) condenou todas as empresas, por entender que o fundo de investimento influenciava a gestão da Georadar e deveria, portanto, responder solidariamente pelas parcelas devidas à gerente. A decisão também incluiu a Angra Partners no grupo econômico para fins de responsabilidade solidária, considerando-a controladora da gestora do fundo.

Segundo o TRT mineiro, os fundos participam do processo decisório de empresas do grupo Georadar, exercendo influência inclusive na gestão, indicando membros de conselho e participando das assembleias gerais de maneira efetiva. Concluiu, assim, que estavam integrados no processo produtivo empresarial, configurando-se grupo econômico.

Fundo de Investimento e relação de hierarquia

O ministro Hugo Scheuermann, relator do recurso de revista (RR) das empresas ao TST, esclareceu que, no âmbito do Direito do Trabalho, a configuração de grupo econômico depende da relação de controle e hierarquia e não se resume à mera influência.

No caso dos autos, o FIP O & G tinha poder de decisão sobre a Georadar, o que, para ele, justifica sua inclusão no grupo econômico e sua responsabilidade pelas obrigações trabalhistas. Para o relator, a natureza jurídica dos fundos de investimento, por si só, não é suficiente para afastar a possibilidade de sua integração a um grupo econômico.

Papel da gestora e funcionamento do fundo

No entanto, a seu ver, a Angra Infraestrutura, gestora do fundo, e sua sócia controladora, Angra Partners, não podiam ser responsabilizadas solidariamente pelas dívidas trabalhistas.

Segundo ele, a gestora se limitava a administrar os recursos do fundo, mas não tinha controle sobre a empresa investida, e a sócia controladora não estava envolvida na gestão da Georadar.

O ministro explicou que os fundos de investimento operam por meio de prestadores de serviços e terceiros contratados para gerir os recursos em seu nome e que a legislação não permite que prestadores de serviços sejam responsabilizados pelas obrigações do fundo, a não ser que haja dolo ou má-fé.

Scheuermann também enfatizou que a atuação da gestora no direcionamento dos investimentos não configura uma relação de hierarquia ou controle sobre a empresa. Ele comparou a situação à de um administrador de massa falida sendo responsabilizado por dívidas trabalhistas, sem evidências de fraude ou má-fé.

A decisão foi unânime. Com informações do técnico judiciário Bruno Vilar, compiladas pela Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

RR-10319-12.2018.5.03.0091

ADICIONAL DE INSALUBRIDADE
Apenas laudo de profissional que tenha acompanhado a perícia é capaz de afastar conclusão de perito judicial, diz TRT-RS

Fachada do TRT-RS, em Porto Alegre
Foto: Secom/TRT-4

As provas técnicas só podem ser desconstituídas por outro laudo, em sentido contrário, feito por profissional que tenha acompanhado a perícia, decidiu a 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul).

Assim, o colegiado negou recurso ordinário de uma empresa de componentes eletrônicos que se insurgiu contra sentença da Vara do Trabalho de Guaíba que determinou o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo a uma auxiliar de produção. O valor estimado da condenação, somado aos demais pedidos, é de R$ 20 mil.

Informações prestadas pelas partes e a vistoria realizada no ambiente de trabalho comprovaram a exposição a agentes químicos. A atividade de solda de fios envolvia a fusão com uso de líquidos compostos por estanho, chumbo e resinas.

Por outro lado, não houve comprovação de fornecimento de equipamentos de proteção que neutralizassem a ação dos agentes insalubres. A perícia judicial classificou a atividade como insalubre em grau máximo.

A empresa tentou desconstituir o laudo pericial por meio de prova oral e de laudos periciais de outros processos. Para isso, requereu a oitiva de uma testemunha que, segundo a defesa, comprovaria que a autora da ação desempenhava as mesmas atividades de outra colega, que não teve reconhecido o direito ao adicional.

O depoimento da testemunha da empresa não foi aceito. Tampouco os documentos foram considerados pela magistrada de primeiro grau.

Diferentes matérias foram objeto de recurso pelas partes ao TRT-RS. A empresa buscou anular a condenação ao pagamento do adicional de insalubridade, sob a alegação de cerceamento de defesa.

O relator do acórdão no TRT-RS, Clóvis Fernando Schuch Santos, enfatizou que apenas um laudo de outro perito, que acompanhasse a inspeção e chegasse à conclusão diversa, seria apto a desconstituir a perícia judicial.

‘‘Em ações que dependem de prova técnica, o perito judicial é a autoridade máxima para dirimir a controvérsia, e suas conclusões somente podem ser infirmadas [tornadas inválidas] por outro profissional igualmente gabaritado, que chegue à conclusão diversa na mesma inspeção, o que não ocorreu no presente caso. Assim, a prova oral seria inócua para a produção da contraprova pretendida pela parte ré’’, afirmou o relator.

Sobre os laudos da outra ação juntados ao processo, o magistrado manteve o mesmo entendimento: ‘‘A eventual juntada de laudo que não diga respeito ao trabalho da parte autora não tem a força desejada pela parte ré”, esclareceu o desembargador.

Os desembargadores Francisco Rossal de Araújo e Marcos Fagundes Salomão acompanharam o voto do relator. Cabe recurso da decisão. Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia/Secom/TRT-4.

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ATOrd 0020463-74.2022.5.04.0221 (Guaíba-RS)

MÁ-FÉ PROCESSUAL
VT de Florianópolis multa testemunhas em R$ 12,2 mil por mentirem em audiência

Sede do TRT-12, em Florianópolis
Foto: Secom/TRT-12

Duas testemunhas que distorceram os fatos em um processo trabalhista foram condenadas a pagar multa de R$ 12,2 mil cada. A decisão foi proferida pelo juiz Carlos Alberto Pereira de Castro, titular da 7ª Vara do Trabalho de Florianópolis, em caso envolvendo o reconhecimento do vínculo de emprego de uma mulher que atuava como auxiliar de limpeza em uma casa noturna da Capital.

Após um ano e meio de trabalho e a dispensa sem receber verbas rescisórias, a auxiliar de limpeza decidiu buscar a Justiça do Trabalho.

Ela moveu a ação contra a empresa prestadora de serviços que a teria contratado, pleiteando os reflexos salariais que seriam derivados do vínculo. Além disso, também pediu que a casa noturna onde realizava as atividades fosse responsabilizada, de forma subsidiária, pelo pagamento da dívida trabalhista.

A empresa prestadora de serviços, por sua vez, negou a existência de vínculo, alegando que a auxiliar de limpeza atuava como freelancer; ou seja, trabalhava de forma eventual, apenas quando era convocada, o que desqualificaria o vínculo empregatício.

O processo seguiu até o momento em que foram chamadas as testemunhas de ambas as partes, buscando esclarecer qual versão condizia mais com a realidade dos fatos. Foi quando o juiz notou inconsistências.

Horários contraditórios

Durante a audiência, a testemunha da parte autora disse que o trabalho era realizado até às 6h da manhã. Contudo, evidências mostraram que a casa noturna fechava por volta das 4h.

De acordo com o magistrado, a discrepância configurou tentativa da testemunha de distorcer o cálculo das horas. Isso porque, segundo ele, ‘‘não seria crível que a autora ficasse até 5h/6h da manhã, quando sua atribuição principal era a manutenção da limpeza dos banheiros’’.

Já a outra testemunha, da parte ré, forneceu relatos contraditórios sobre a frequência de dias que a autora comparecia ao trabalho. Além disso, afirmou que o estabelecimento abria às 22h, quando, na verdade, a própria página do local na internet indicava às 20h.

Chance de retratação

Diante das inconsistências capazes de influenciar o cálculo de horas e, consequentemente, o desfecho do caso, o juiz deu a chance para que as testemunhas se retratassem sobre o que haviam declarado. No entanto, nenhuma delas o fez.

Como consequência, ambas foram multadas pelo magistrado em R$ 12,2 mil. A medida foi fundamentada no artigo 793-D da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), segundo o qual a testemunha que alterar a verdade dos fatos ou omiti-la intencionalmente deverá pagar de 1% a 10% do valor da causa em questão.

Litigância de má-fé

Além das testemunhas, a auxiliar de limpeza e a empresa prestadora de serviços, respectivamente parte autora e ré, também foram condenadas a pagar o mesmo valor. A penalização se deu devido à apresentação de pedidos e defesas baseados em afirmações falsas, caracterizando ‘‘litigância de má-fé’’.

Pereira de Castro concluiu a sentença enfatizando que o uso de falso testemunho causa danos não apenas às partes envolvidas, mas também a toda coletividade. Portanto, os valores das multas deveriam ser revertidos para um benefício social, no caso, a maternidade pública Carmela Dutra, em Florianópolis.

As partes não recorreram da decisão. Com informações de Carlos Nogueira, da Secretaria de Comunicação Social (Secom)/TRT-12.

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ATOrd 0000141-49.2020.5.12.0037 (Florianópolis)

FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO
Créditos decorrentes de LCI são classificados como quirografários no processo de falência

Ministro Antonio Ferreira foi o relator
Foto: Sérgio Amaral/Imprensa STJ

​Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os créditos decorrentes de letra de crédito imobiliário (LCI) são classificados como quirografários no processo de falência e não têm a natureza de direito real, ainda que sejam lastreados em crédito imobiliário garantido por hipoteca ou alienação fiduciária.

Com esse entendimento, o colegiado negou provimento ao recurso de uma credora que pretendia incluir os créditos devidos a ela pela massa falida de um banco na classe dos créditos com direito real, os quais têm preferência sobre os quirografários. Ela possuía mais de R$ 1 milhão investidos em LCI do banco.

O juízo de primeiro grau e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) já haviam negado o pedido, ao fundamento de que o título de crédito em si não pode ser equiparado a direito real apenas porque apresenta lastro em créditos dessa natureza.

Instituição financeira possui crédito gravado com direito real de garantia

O relator do caso no STJ, ministro Antonio Carlos Ferreira, explicou que a emissão de LCI se destina ao financiamento do mercado imobiliário. Assim, informou, as instituições financeiras autorizadas podem emitir o título para antecipar os valores usados na concessão de financiamentos aos adquirentes de imóveis ou aos empreendedores.

‘‘Os tomadores da letra de crédito imobiliário, em verdade, ao adquirirem os títulos, emprestam dinheiro às instituições financeiras para a aplicação no âmbito específico do mercado imobiliário, pressupondo que, anteriormente à emissão dos títulos, tenha havido relações creditícias garantidas por direito real – hipoteca ou alienação fiduciária de bem imóvel’’, disse.

Segundo o ministro, são duas relações distintas: uma entre as instituições financeiras concessoras do crédito e os respectivos beneficiários – empreendedores e compradores de imóveis – e a outra, entre a instituição financeira e os tomadores das LCIs. O relator destacou que enquanto, na primeira, a instituição financeira é credora em uma relação garantida com direito real, na segunda, ela é devedora dos valores que lhe foram aportados pelos investidores.

Na análise do ministro, a dinâmica dessas relações demonstra que os beneficiários das LCIs não são portadores de crédito gravado com direito real de garantia, mas sim as instituições financeiras, quando concedem financiamentos aos empreendedores e adquirentes.

‘‘Essas relações jurídicas obrigacionais garantidas por hipoteca ou alienação fiduciária de coisa imóvel, cujo credor é a instituição financeira, constituirão o lastro legalmente necessário para a emissão dos títulos’’, afirmou.

Para Antonio Carlos Ferreira, não é possível a extensão da disciplina protetiva dos créditos garantidos por direito real às LCIs, as quais apenas possuem como lastro relações jurídicas garantidas por hipoteca ou alienação fiduciária em garantia.

Direitos reais de garantia devem ser previstos em lei

O relator ressaltou que o direito real de garantia vincula determinado bem do devedor à satisfação da obrigação de maneira direta, tendo por função jurídica assegurar seu pagamento pelo devedor ‘‘e, por tal razão, em certa medida, desloca o credor do âmbito de insolvência do devedor’’.

Contudo, na situação em análise, o ministro verificou que quem possui esse direito privilegiado e preferencial é a instituição financeira, que pode deflagrar o processo de realização das garantias caso não sejam pagas as obrigações assumidas pelos empreendedores ou adquirentes imobiliários.

De acordo com o relator, a legislação enumera de forma taxativa os direitos reais de garantia, em virtude da vinculação de determinado bem à satisfação de uma relação obrigacional, inexistindo previsão expressa de que o lastro em relações jurídicas garantidas constitua também um direito real. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

REsp 1773522

OMISSÃO LEGISLATIVA
Congresso Nacional tem dois anos para regulamentar a participação de trabalhadores na gestão de empresas

Banco de Imagens /STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou, por unanimidade, que o Congresso Nacional regulamente o direito de trabalhadores urbanos e rurais à participação na gestão das empresas, no prazo de 24 meses a partir da publicação da ata do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 85.

Na decisão, tomada na sessão virtual encerrada em 14/2, a Corte reconheceu que há uma omissão do Legislativo no tema.

De acordo com a Constituição (artigo 7°, inciso XI), são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais a participação nos lucros ou resultados, desvinculada da remuneração, e, ‘‘excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei’’.

Autora da ação, a Procuradoria-Geral da República (PGR) argumentou que, mais de 35 anos depois da promulgação da Constituição, ainda não foi aprovada uma lei que regulamente esse direito.

Tempo razoável extrapolado

Para o relator, ministro Gilmar Mendes, o Congresso extrapolou o tempo razoável para editar uma norma nesse sentido, diferentemente da participação nos lucros e resultados, que já foi regulamentada. Essa situação, para Mendes, inviabiliza a plena efetividade do artigo 7º, inciso XI, da Constituição, e caracteriza omissão inconstitucional.

O relator reconheceu que o assunto é complexo e que há leis que já preveem a participação de empregados nos conselhos de administração das empresas públicas e sociedades de economia mista e a participação de representantes dos trabalhadores nos conselhos de sociedades anônimas.

Contudo, a seu ver, ainda há um vasto universo de empresas para as quais não existem regras sobre o assunto. ‘‘Não há mais como remediar a solução desse problema, cabendo, dessa forma, ao legislador o devido equacionamento da matéria’’, concluiu. Com informações de Lucas Mendes, da Assessoria de Imprensa do STF.

ADO 85