INDENIZAÇÃO DE SINISTRO
Seguradora não tem prerrogativas processuais do consumidor em ação regressiva, decide STJ

Ministra Nancy Andrighi, Foto: Agência CNJ

​A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.282), fixou a tese segundo a qual ‘‘o pagamento de indenização por sinistro não gera para a seguradora a sub-rogação de prerrogativas processuais dos consumidores, em especial quanto à competência na ação regressiva’’.

Com a definição da tese, podem voltar a tramitar os recursos especiais e agravos em recurso especial que estavam suspensos à espera da fixação do precedente qualificado. O entendimento deverá ser observado pelos tribunais de todo o país na análise de casos semelhantes.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso repetitivo, enfatizou que a seguradora não pode se sub-rogar nas prerrogativas processuais, uma vez que tais benefícios são exclusivos da condição personalíssima do consumidor.

‘‘Muito embora a sub-rogação seja a regra nos contratos de seguro, existem limitações acerca de direitos, ações, privilégios e garantias em que se sub-roga o novo credor’’, afirmou.

Sub-rogação se restringe à transferência de direitos de natureza material

A relatora destacou que, ao longo dos anos, a jurisprudência do STJ se consolidou no sentido de que a sub-rogação se restringe à transferência de direitos de natureza material, não alcançando prerrogativas processuais vinculadas a condições personalíssimas do credor.

Nancy Andrighi apontou que, como consequência desse entendimento, o novo credor pode exercer os direitos materiais que caberiam ao credor original, tais como garantias reais, garantias fidejussórias ou pessoais, juros e poderes formativos inerentes ao crédito.

No entanto, a relatora ponderou que não é possível a sub-rogação da seguradora em normas de natureza exclusivamente processual que decorrem de um benefício conferido pela legislação especial ao indivíduo considerado vulnerável nas relações jurídicas, conforme previsto nos artigos 6º, inciso VIII, e 101, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Seguradora não está em posição de vulnerabilidade na relação de consumo

A ministra enfatizou que o artigo 101, inciso I, do CDC, que assegura ao consumidor o direito de escolher o foro de seu domicílio, não pode ser estendido à seguradora, pois esta não ocupa posição de vulnerabilidade na relação de consumo. A relatora destacou que essa regra processual tem o propósito de equilibrar as relações de consumo, garantindo ao consumidor um acesso mais fácil à Justiça.

‘‘Busca-se, mediante tal benefício legislativo, privilegiar o acesso à Justiça do indivíduo que se encontra em situação de desequilíbrio. Trata-se, portanto, de norma processual que decorre de condição pessoal (consumidor) e que deve ser examinada em cada relação jurídica, não podendo ser objeto de sub-rogação, nos termos do artigo 379 do Código Civil’’, disse.

Além disso, Nancy Andrighi afastou a possibilidade de inversão do ônus da prova em favor da seguradora, destacando que esse benefício, previsto no artigo 6º, inciso VIII, do CDC, é exclusivo do consumidor e não pode ser objeto de sub-rogação, pois decorre diretamente de sua condição na relação de consumo.

A ministra destacou que eventual inversão do ônus da prova poderá ocorrer com fundamento nas normas gerais do Código de Processo Civil (CPC) e na aplicação da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, quando cabível.

‘‘Assim, conclui-se que a sub-rogação transfere ao novo credor direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à obrigação de direito material, contra o devedor principal e os fiadores, não sendo admissível a sub-rogação nos direitos processuais decorrentes de condição personalíssima de consumidor, como o é a faculdade de promover a ação no foro de seu domicílio (artigo 101, inciso I, do CDC) e a possibilidade de inversão do ônus da prova com fundamento no artigo 6º, inciso VIII, do CDC’’, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do TSJ.

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REsp 2092308

PROPINA A POLÍTICO
Lei Anticorrupção e LIA podem ser aplicadas juntas, desde que não fundamentem sanções idênticas

Para a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é possível a utilização conjunta da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013) e da Lei de Improbidade Administrativa – LIA (Lei 8.429/1992) como fundamentos de uma ação civil pública, contanto que elas não sejam empregadas para aplicar punições de mesma natureza e pelos mesmos fatos.

Com esse entendimento, o colegiado rejeitou o recurso especial da Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor) em processo que apura – ainda na fase inicial – se a entidade pagou propina ao ex-governador Luiz Fernando Pezão.

O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) ajuizou ação civil pública por improbidade, cumulada com pedido de responsabilização baseado nas disposições da Lei Anticorrupção, e requereu a decretação da indisponibilidade de bens da Fetranspor no montante de R$ 34 milhões.

Sustentando que a Lei Anticorrupção foi editada com o objetivo de preencher lacunas existentes na LIA, o que inviabilizaria a aplicação conjunta e a punição por ambas, a Fetranspor recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ). A corte, entretanto, entendeu que os dois mecanismos de combate à corrupção são complementares e podem ser utilizados simultaneamente.

Ao STJ, a entidade sindical alegou que a aplicação conjunta dos normativos violaria o princípio do non bis in idem, previsto no Pacto de San José da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos), pois resultaria em dupla persecução e punição pelos mesmos fatos.

Utilização conjunta das leis está de acordo com a convenção

O ministro Gurgel de Faria, relator do recurso da Fetranspor, afirmou que os direitos previstos no Pacto de San José da Costa Rica, embora integrem o ordenamento jurídico brasileiro com status supralegal, não se aplicam às pessoas jurídicas.

Mesmo que não fosse assim, acrescentou, os argumentos da recorrente não se sustentariam, pois a convenção de direitos humanos proíbe a repetição de processos ou de punições de mesma natureza pelos mesmos fatos, mas não impede o uso conjunto de diferentes legislações, com propósitos e sanções distintas, para fundamentar uma ação judicial.

Dessa forma, segundo o ministro, uma mesma conduta pode ser analisada sob a ótica da improbidade administrativa e da responsabilidade da pessoa jurídica por atos lesivos à administração pública, desde que as leis que tratam dessas matérias não sejam empregadas para impor sanções idênticas com base no mesmo fundamento e pelas mesmas condutas.

‘‘Caso, ao final da demanda, sejam aplicadas as penalidades previstas na Lei Anticorrupção, aí, sim, é que deverá ficar prejudicada a imposição de sanções idênticas estabelecidas na Lei de Improbidade relativas ao mesmo ilícito’’, destacou Gurgel de Faria.

Possível sobreposição de penalidades deve ser verificada na sentença

O relator disse ainda que a questão da possível sobreposição de penalidades deve ser avaliada no momento da sentença, na qual serão analisados o mérito da demanda e a natureza de eventuais infrações, e não na fase preliminar da ação.

Por fim, o ministro ressaltou que o artigo 3º, parágrafo 2º, da Lei 8.429/1992 deixa claro que as sanções da LIA não se aplicam à pessoa jurídica caso o ato de improbidade também seja punido como ato lesivo à administração pública, nos termos da Lei Anticorrupção.

‘‘A compatibilidade entre as legislações está garantida desde que, ao final do processo, sejam observados os limites impostos pela legislação para evitar que a mesma parte amargue sanções de mesma natureza pelo mesmo ato ilícito’’, concluiu Gurgel de Faria. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2107398

COLCHÕES TERAPÊUTICOS
Ex-distribuidor vai pagar dano moral por utilizar marca registrada de concorrente em seus produtos

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

A empresa que detém marca registrada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) pode impedir a oferta de produtos/serviços idênticos, semelhantes ou afins, tendo em vista a possibilidade de induzir o consumidor em erro ou de associação com marca distinta. Ou seja, tem o direito de agir – como prevê o inciso XIX do artigo 124 da Lei 9.279/96 – para evitar o desvio ilegal de clientela, elemento caracterizador da concorrência desleal.

Assim, a maioria dos integrantes da 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negou provimento à apelação da Kenko Premium Comércio de Colchões e Produtos Térmicos, condenada judicialmente por utilizar a expressão ‘‘Photon’’ em seus produtos.

A marca foi registrada originalmente pela Photon Training Produtos Terapêuticos Ltda. e serve para identificar diversos produtos terapêuticos, especialmente colchões/assentos/travesseiros eletromagnéticos destinados a tratamento de coluna, diminuição de tensão e melhoria da circulação sanguínea.

A maioria do colegiado prestigiou a solução posta na sentença proferida pela 4ª Vara Cível de Sorocaba (SP) que, ao julgar o mérito da ação indenizatória proposta pela Photon, condenou a Kenko a retirar a expressão de seus produtos, sob pena de multa diária de R$ 500; e, ainda, a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil.

O desembargador Sérgio Shimura, voto condutor neste julgamento, observou que ambas as empresas trabalharam juntas de 2008 a 2014, distribuindo os produtos da marca ‘‘Photon’’, quando, após, ‘‘cada uma seguiu o seu caminho’’.

‘‘Ao que consta, após a extinção do contrato de distribuição, o Sr. DANIEL JUNQUEIRA KROMBAUER, filho do Sr. JUNQUEIRA (sócio administrador da então distribuidora dos colchões com a marca ‘PHOTON’), fundou a empresa KENKO PREMIUM para continuar vendendo produtos terapêuticos, invocando em seus anúncios a marca ‘PHOTON’, em evidente prática de concorrência desleal em detrimento da autora’’, elucidou.

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1000364-65.2018.8.26.0602 (Sorocaba-SP)

 

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SERVIÇO DEFEITUOSO
Agência de turismo responde por falha de informação que fez turistas perderem viagem de navio

Reprodução Caribbean News

Mesmo que seu papel na cadeia de fornecimento se limite à venda de passagens, as agências de turismo não estão isentas do dever de informar adequadamente os consumidores sobre como utilizar os serviços que elas ofertam.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a condenação solidária da agência online Decolar.com e da Pullmantur Cruzeiros do Brasil no caso de uma família que perdeu a viagem porque não foi informada da necessidade de se apresentar para o embarque duas horas antes da partida do navio.

De acordo com o processo, a família comprou passagens para um cruzeiro marítimo pelo site da Decolar. No dia da viagem, eles se dirigiram ao porto, porém foram impedidos de ingressar no navio por terem chegado após o encerramento do embarque.

A família ajuizou ação indenizatória por danos morais e materiais contra a agência de turismo e a empresa do cruzeiro, relatando que foi informada somente sobre o horário de partida do navio, e não que o embarque ocorreria com duas horas de antecedência. No julgamento da apelação, o tribunal estadual condenou solidariamente as duas empresas rés.

No recurso dirigido ao STJ, a Decolar sustentou que a solidariedade prevista nos artigos 18 e 19 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) não se aplicaria a ela, por ser apenas vendedora das passagens.

Faltou informação adequada sobre como utilizar o serviço adquirido

A relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que o artigo 6º, inciso III, do CDC, estabelece como obrigação do fornecedor e direito básico do consumidor a informação adequada e clara sobre os produtos e serviços.

Conforme ressaltou, essa regra integra o próprio conteúdo do contrato, tratando-se de um dever intrínseco ao negócio, que se impõe a todos os fornecedores. Ela mencionou ainda o artigo 14 do CDC, que trata da responsabilidade do fornecedor por defeitos do serviço e por informações inadequadas.

Especificamente no caso das agências de turismo, a ministra comentou que sua responsabilidade pode variar. Como exemplo, mencionou que o STJ já isentou a agência em um caso de extravio de bagagem, por considerar que ela foi apenas a vendedora da passagem aérea e, portanto, o nexo de causalidade com o dano só foi verificado em relação à conduta da transportadora (REsp 1.994.563).

Por outro lado, no REsp 1.799.365, a corte reconheceu a responsabilidade solidária da agência de turismo e da companhia aérea pela falha no dever de informar a uma consumidora que ela precisaria comprovar a compra da passagem de volta no momento de embarcar para o exterior.

Houve relação direta entre a falha de informação e o dano sofrido pela família

No caso em julgamento, Nancy Andrighi afirmou que o dever de informar era inerente à agência e que houve relação direta de causa e efeito entre o dano sofrido pelos consumidores e o defeito no serviço, causado pela falta de informação.

‘‘É o fato de que o dano causado pela ausência de informação poderia ter sido controlado ou evitado se a agência de turismo tivesse cumprido com o dever de informar as condições de uso do serviço vendido aos consumidores que torna indene de dúvidas a sua responsabilidade quanto ao dano sofrido pelo consumidor’’, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2166023

ADI
Lei estadual não pode obrigar planos de saúde a autorizar testes de covid-19, decide STF

Banco de Imagens STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, por unanimidade, a inconstitucionalidade da Lei 12.024/2021, do Estado da Paraíba, que obrigava as operadoras de planos de saúde a autorizar de forma imediata exames de RT-PCR para detecção da covid-19. A Corte entendeu que a competência para legislar sobre a matéria é privativa da União.

A decisão foi tomada na sessão plenária virtual encerrada em 21/2, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6969, proposta pela União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde (Unidas).

A Lei estadual determina a autorização imediata dos exames solicitados no âmbito do estado e estabelecia a competência para fiscalização e aplicação de multas à Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba (Procon/PB)

Competência privativa da União

Para o relator da ADI, ministro Cristiano Zanin, a lei estadual violou a competência privativa da União para legislar sobre direito civil e política de seguros.

Ele explicou que a competência suplementar dos estados para tratar sobre saúde e consumidor não permite a ingerência em contratos privados de saúde firmados entre as operadoras de planos de saúde e os usuários.

Nesses casos, as regras são estipuladas por lei federal e pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

Zanin ressaltou que, em relação ao teste RT-PCR para covid-19, uma resolução da ANS já determina a realização imediata em casos suspeitos e estabelece critérios e regras uniformes em todo o país.

O relator também observou que, embora a pandemia da covid-19 tenha demandado a atuação conjunta dos entes federativos, qualquer medida legislativa adotada deveria respeitar a distribuição de competências prevista na Constituição. Com informações de Cairo Tondato, da Assessoria de Imprensa do STF.

ADI 6969