REPETITIVOS
Compra tributada de insumos para produtos imunes também dá direito a créditos de IPI

Ministro Marco Aurélio Bellizze foi o relator
Foto: Imprensa/STJ

Sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.247), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que ‘‘o creditamento de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), estabelecido no artigo 11 da Lei 9.779/1999, decorrente da aquisição tributada de matéria prima, produto intermediário e material de embalagem utilizados na industrialização, abrange a saída de produtos isentos, sujeitos à alíquota zero e imunes’’.

No julgamento, o colegiado discutiu a abrangência do benefício fiscal instituído pelo artigo 11 da Lei 9.779/1999, a fim de definir, especificamente, se há direito ao creditamento de IPI na aquisição de insumos e matérias-primas tributados (entrada onerada), inclusive quando aplicados na industrialização de produto imune; ou se tal benefício ocorre apenas quando utilizados tais insumos e matérias-primas na industrialização de produtos isentos ou sujeitos à alíquota zero.

Com a definição da tese, podem voltar a tramitar todos os processos sobre o mesmo assunto que estavam suspensos à espera do precedente.

Benefício para produtos imunes não é interpretação extensiva de norma

Segundo o relator do repetitivo, ministro Marco Aurélio Bellizze, o dispositivo legal em debate traz os requisitos para as hipóteses de manutenção do crédito de IPI, bem como deixa claro – sobretudo ao utilizar a expressão ‘‘inclusive’’ – que o benefício não se restringe às saídas de produto isento ou sujeito à alíquota zero, mas, que ele está assegurado também nesses casos, sem excluir outras situações de saída desonerada.

“O reconhecimento do direito ao creditamento não decorre de suposta extensão do benefício contido no artigo 11 da Lei 9.779/1999 para hipótese ali não prevista, mas, ao contrário, da compreensão fundamentada de que tal situação (produto imune) está contida na norma em exame, sobretudo ao utilizar o termo ‘inclusive’’’, apontou o magistrado.

O aproveitamento do crédito de IPI, explicou o relator, exige a verificação de dois requisitos. O primeiro diz respeito à realização de operação de aquisição de matéria-prima, produto intermediário ou material de embalagem, sujeita à tributação do imposto. O segundo é a submissão do bem adquirido ao processo de industrialização, conforme disposto no Regulamento do IPI (Decreto 7.212/2010).

‘‘Verificadas, assim, a aquisição de insumos tributados e a sua utilização no processo de industrialização, o industrial faz jus ao creditamento de IPI, afigurando-se desimportante, a esse fim, o regime de tributação do imposto na saída do estabelecimento industrial, já que é assegurado tal direito inclusive nas saídas isentas e nas sujeitas à alíquota zero’’, afirmou Bellizze.

Disciplina de tributação na saída do estabelecimento industrial é irrelevante

O ministro também citou os critérios definidos na Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (Tipi) para viabilizar o direito ao crédito de IPI, especialmente no que diz respeito aos produtos sob a rubrica NT (não tributado).

Nessa categoria, prosseguiu, estão produtos excluídos do campo de incidência do IPI, já que não são resultantes de nenhum processo de industrialização; e outros que, apesar de derivados do processo de industrialização, por determinação constitucional, são imunes ao tributo.

Dessa forma, o relator observou que, se o produto – resultado do processo de industrialização de insumos tributados na entrada – é imune, o industrial tem direito ao creditamento. Porém, se o produto não deriva do processo de industrialização de insumos tributados, sua saída, ainda que desonerada, não faz jus ao creditamento de IPI.

Nas palavras do ministro, o direito ao creditamento ‘‘não se aperfeiçoa porque não houve submissão ao processo de industrialização, e não simplesmente porque o produto encontra-se sob a rubrica NT na Tipi’’, detalhou.

‘‘Para efeito de creditamento, a disciplina de tributação na saída do estabelecimento industrial é absolutamente irrelevante, com idêntico resultado para produto isento, sujeito à alíquota zero ou imune (independentemente da distinção da natureza jurídica de cada qual), exigindo-se, unicamente, que o insumo adquirido (e tributado) seja submetido ao processo de industrialização’’, concluiu Marco Aurélio Bellizze. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 1976618

RECRUTAMENTO DISCRIMINATÓRIO
Rede de farmácias vai pagar dano moral por orientar gestora a não contratar obesos, tatuados e homossexuais

A veiculação de orientação discriminatória por superior hierárquico em grupo de WhatsApp corporativo, determinando critérios estéticos e de identidade pessoal na seleção de candidatos, configura ato ilícito que viola o princípio da igualdade e da não discriminação, conforme os artigos 3º, inciso IV, e 5º, caput, da Constituição Federal, além de dispositivos da CLT e da Lei nº 9.029/1995.

A ementa do acórdão lavrado pela 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) sintetiza à perfeição o fundamento empregado pela Corte para confirmar sentença do Posto da Justiça do Trabalho de Tramandaí que condenou a rede de farmácias São João a pagar R$ 10 mil de danos morais a uma de suas 40 gestoras. Motivo: ela foi orientada, pela coordenadora regional, a contratar, preferencialmente, ‘‘pessoas bonitas’’, evitando candidatos acima do peso, tatuados, com piercings e homossexuais.

Em outubro de 2021, os áudios enviados pela coordenadora regional tiveram grande repercussão nas redes sociais. O fato foi, inclusive, objeto de inquérito civil do Ministério Público do Trabalho (MPT-RS). Nas gravações, a coordenadora orientava os gestores a terem cuidado com a aparência e orientação sexual dos candidatos selecionados.

O áudio tornado público continha trechos como: ‘‘Se contratarmos alguém, que seja, com todo respeito, alguém ‘veado’ e tudo mais, deve ser uma pessoa alinhada, que não tenha trejeitos exagerados’’ e ‘‘Não esqueçam: feio e bonito, a gente paga o mesmo preço, por isso, conto com vocês! Vamos preferir os bonitos. Afinal, não somos bobos’’.

Em defesa, a empresa afirmou que a orientação foi um caso isolado, não representando os valores da instituição. Atestou, ainda, que logo após o episódio, foi instaurada uma sindicância que resultou na dispensa da coordenadora. Apresentou cartilhas sobre respeito e diversidade, criadas após o episódio, e uma nota pública divulgada à época.

A partir dos depoimentos das testemunhas e demais provas anexadas no processo, a juíza do trabalho Marinês Denkievicz Tedesco Fraga concluiu que a coordenadora excedeu o poder diretivo, expondo a autora da ação reclamatória à determinações de práticas ilegais.

‘‘É certo que as orientações repassadas ao grupo de gestores, do qual fazia parte a reclamante, configuram exigências discriminatórias, vedadas por lei, passíveis, inclusive, de rescisão indireta, conforme preceito do artigo 483, inciso I, da CLT, o que, todavia, não se discute nos autos’’, ressaltou a magistrada de origem.

A juíza ainda destacou a necessidade da preservação da saúde física e mental dos trabalhadores, trazendo o exemplo da CIPA, que, em 2022, passou a ser denominada Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio.

Desa. Ana Luiza Heineck Kruse foi a relatora
Foto: Secom/TRT-4

A gestora recorreu ao TRT-RS para aumentar o valor da indenização. A empresa, por sua vez, para afastar a condenação e, não havendo a reforma, para alterar critérios relacionados à correção monetária e juros. Apenas o segundo pedido foi acolhido pelos desembargadores.

Para a relatora do acórdão, desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse, a orientação discriminatória infringiu os artigos 3º, inciso IV (que prevê a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e outras formas de discriminação), e 5º, caput (igualdade de todos), da Constituição, além de não ter sido observado o dever do empregador de garantir um ambiente de trabalho seguro (artigo 157 da CLT).

A magistrada apontou, ainda, a violação da Lei 9.029/199, que proíbe práticas discriminatórias nos processos seletivos e na manutenção do trabalho, salientando que o empregador responde objetivamente pelos atos dos seus prepostos, nos termos do artigo 932, inciso III, do Código Civil.

‘‘A responsabilidade da reclamada também se fundamenta na sua omissão em evitar situações dessa natureza. Embora tenha adotado medidas punitivas após a divulgação do áudio, não há nos autos evidências de que tenham sido implementadas políticas eficazes de prevenção anteriormente ao ocorrido. Não se verifica, ainda, nenhuma resposta ou orientação específica para os gestores que foram destinatários e também vítimas da mensagem, porquanto o teor discriminatório atinge igualmente quaisquer dos gestores que tiverem identidade com os grupos discriminados pela coordenadora’’, concluiu a desembargadora.

Também participaram do julgamento os desembargadores João Paulo Lucena e André Reverbel Fernandes. Não houve recurso da decisão.

Danos morais coletivos

A empresa Comércio de Medicamentos Brair Ltda., razão social das Farmácias São João, uma das maiores redes do setor farmacêutico no Estado, firmou, em 2022, um acordo judicial com o Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS) em Passo Fundo para frear a escalada de casos de assédio moral e de dispensa discriminatória. Como coroamento do acordo, a empresa aceitou pagar R$ 1 milhão a título de danos morais coletivos, face à enxurrada de denúncias de assédio.

O acordo foi firmado no âmbito de uma ação civil pública (ACP), ajuizada pelo MPT gaúcho, que tramitava na 3ª Vara do Trabalho de Passo Fundo, sendo homologado pelo juiz do trabalho Marcelo Caon Pereira.

O procedimento no âmbito do MPT-RS foi aberto após denúncias realizadas tanto por ex-funcionários como pelo Sindicato dos Empregados no Comércio de Passo Fundo. Ao longo das investigações realizadas para apurar as denúncias, a instituição ouviu formalmente 34 empregados e ex-empregados da rede em Passo Fundo.

Na esfera judicial, o MPT-RS alegou a existência de inúmeras situações de assédio moral no ambiente de trabalho da empresa, como humilhações, xingamentos e deboches com empregados, existência de tratamento preconceituoso em razão de cor de pele e classe social, piadas de cunho sexual, dispensa discriminatória de trabalhadores que retornavam de auxílio-doença, entre outras violações de direitos.

Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-4, e da Assessoria de Comunicação Social (Ascom) do MPT-RS.

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ATOrd 0020389-30.2023.5.04.027 (Tramandaí-RS)

DESISTÊNCIA DO CLIENTE
TJSP reconhece serviços jurídicos antes do ajuizamento do pedido de recuperação judicial

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

A empresa que desiste do ajuizamento do pedido de recuperação judicial não está desobrigada de pagar integralmente o trabalho jurídico feito pelos advogados, mesmo ante à inexistência de contrato de honorários advocatícios entre as partes.

Assim, a Justiça Comum do Estado de São Paulo se guiou pelo conteúdo de um laudo pericial para julgar procedente uma ação de cobrança de honorários advocatícios intentada pela Sebe Sociedade de Advogados em face da Massa Falida Distribuidora de Produtos Alimentícios Camolesi Ltda. e seus dois sócios.

A autora da ação cobrava o que não havia sido pago do trabalho de preparação para o ajuizamento da recuperação judicial da pessoa jurídica, incluindo consultas sobre questões de direitos trabalhistas e patrimoniais dos sócios, inclusive análise de contratos celebrados com instituições financeiras e venda de imóveis em nome das pessoas físicas dos sócios.

Todos os réus da ação foram condenados, solidariamente, a pagar R$ 50 mil, com juros e correção monetária, desde a data de sua destituição – 18 de julho de 2018.

‘‘Após análises e explanações a respeito dos valores praticados em situações semelhantes, concluiu-se que o valor pedido na inicial é condizente com os trabalhos realizados. Por tudo isso, examinando as ponderações do d. Perito, em cotejo com os elementos dos autos, tenho que o valor apurado pericialmente é justo para a remuneração dos serviços efetivamente prestados pelo autor aos requeridos (inclusive pessoas físicas)’’, decretou na sentença a juíza Daniele Mie Murata, da 4ª Vara Cível de Piracicaba.

No segundo grau da justiça paulista, o entendimento não destoou. Para a 27ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), o laudo técnico pericial se revelou satisfatório à finalidade para a qual se destinava, pois veio devidamente fundamentado. O perito respondeu todos os quesitos formulados pelas partes, deixando claro o valor do saldo devedor dos réus, conforme o artigo 473, incisos I, II, III e IV, e parágrafos 1º, 2º e 3º do Código de Processo Civil (CPC).

Segundo o colegiado, os réus não comprovaram as suas alegações, nos termos dos artigos 405 a 429, ambos do CPC. Antes, limitaram-se a alegar que o valor do débito está incorreto, sem apresentar qualquer prova.

‘‘Por outro lado, o autor comprovou que realizou a prestação de serviço de forma convincente, conforme pactuados entre as partes, todavia, não teve a contraprestação referentes aos serviços advocatícios, os quais totalizam o valor R$ 50.000,00’’, cravou no acórdão o relator das apelações, desembargador Luís Roberto Reuter Torro.

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AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Calçados Ramarim é condenada a criar programa de vigilância epidemiológica para empregados

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) reformou decisão de segunda instância e acolheu recurso do Ministério Público do Trabalho (MPT) para condenar a Calçados Ramarim Ltda., de Nova Hartz (RS), a implantar programa de vigilância epidemiológica para detecção precoce de casos de doenças relacionadas ao trabalho.

A empresa, mesmo autuada, manteve as irregularidades

Na ação civil pública (com pedido de tutela inibitória), o MPT pediu a condenação da Ramarim, porque a empresa, mesmo sendo multada após autuação, manteve irregularidades quanto às normas de segurança do trabalho em uma de suas filiais, sobretudo quanto aos riscos ergonômicos nas atividades dos empregados.

A tutela inibitória, como medida judicial, visa impedir que práticas consideradas ilícitas continuem ocorrendo. É uma medida de prevenção. No caso, o pedido do MPT foi para que a empresa se adequasse às condições de segurança e saúde, implantando um programa de vigilância epidemiológica.

A Ramarim disse que procurou se adequar às normas de saúde. Também questionou a ação ajuizada, pois, segundo a indústria, após a autuação, foram contratados profissionais da área de Ergonomia, Medicina e Segurança do Trabalho, tudo no intuito de viabilizar seu programa de ergonomia do trabalho, que envolveu, ainda, as modificações em máquinas e equipamentos.

Para a empresa, as multas referentes às questões de ergonomia decorrem de interpretação subjetiva

Segundo a empresa, apesar da criação do Cronograma de Implantação e de Gestão de Ergonomia do Trabalho, o MPT não ficou satisfeito e realizou nova inspeção em uma filial da indústria. A Ramarim questionou a autuação, alegando que as penalidades aplicadas na área de ergonomia do trabalho decorrem de interpretação subjetiva quanto ao cumprimento ou não das obrigações do empregador.

O primeiro grau indeferiu o pedido de tutela inibitória do MPT

Ao julgar o caso, o juízo da 1ª Vara do Trabalho de Sapiranga (RS) concluiu que o pedido do MPT não tinha fundamento em norma. Também negou o pedido de tutela inibitória. Segundo a sentença, o que se busca é a promoção e a melhoria da condição social dos trabalhadores, o que não poderia ser executado via ordem judicial.

Para o juízo de 1º grau, não cabe ao Poder Judiciário acolher o pedido

Ainda de acordo com a sentença, acolher o pedido importaria na criação de medidas não previstas em lei, trazendo custos não previstos, indistintamente, a todos os empregadores, fazendo com que o Judiciário exerça função atípica. ‘‘Se a sociedade entender que é indispensável a instituição de tal programa, o foro adequado para transformá-lo em obrigatório não é o Poder Judiciário’’, diz a sentença.

TRT-RS: A empresa buscou regularizar a situação

O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) manteve a sentença e indeferiu a tutela inibitória. A decisão aponta que, embora constatado o descumprimento da legislação trabalhista, as provas revelam que a empresa buscou corrigir as irregularidades, adequando-se às normas de higiene e segurança no trabalho. Diante da decisão, o MPT recorreu ao TST.

Para a relatora, o caso revela a necessidade da tutela inibitória

A relatora do recurso na Segunda Turma, ministra Maria Helena Mallmann, observou que, como a empresa descumpriu as normas ligadas ao meio ambiente de trabalho, haveria a possibilidade de repetir a ilegalidade. ‘‘Uma vez praticado o ilícito pela fábrica, pode-se inferir que haja continuação ou repetição’’. Nesse sentido, segundo ela, válida é a tutela inibitória para a efetividade da proteção do direito material.

Prossegue a ministra, afirmando que, até mesmo quando constatada a posterior regularização da situação que ensejou o pedido de tutela inibitória, o que não é a hipótese dos autos, justifica-se o provimento a fim de prevenir o eventual descumprimento de decisão judicial reparatória e a repetição da prática de ofensa a direito material e, possivelmente, de um dano. Com informações de Ricardo Reis, coordenador de Editoria e Imprensa da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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TST-RRAg – 20477-69.2017.5.04.0371

AMPLIAÇÃO INTERPRETIVA
Isenção de IPI de carro para pessoa com deficiência não depende de restrição na CNH

A Lei 8.989/1995 não exige o registro de restrições na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) para que a pessoa com deficiência tenha direito à isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na compra de carro. Assim, a interpretação da norma deve priorizar sua finalidade social de promover a inclusão desse grupo de pessoas.

A decisão é da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento com entendimento unânime.

Um homem com visão monocular impetrou mandado de segurança para obter o benefício fiscal na compra de um veículo novo, alegando que a exigência de CNH com restrições específicas não tem respaldo legal. Também impugnou o entendimento da Receita Federal de que pessoas com visão monocular não teriam direito à isenção, já que a Lei 14.126/2021 reconhece essa condição como deficiência para todos os efeitos legais.

A pretensão, no entanto, foi rejeitada em primeiro grau, decisão mantida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).

Ao recorrer ao STJ, a parte autora da ação sustentou que a exigência imposta pelo TRF-4 amplia indevidamente os requisitos legais e viola o princípio da legalidade estrita aplicável às hipóteses de isenção tributária.

Não pode haver exigências não previstas expressamente em lei

O relator do recurso, ministro Afrânio Vilela, lembrou que o artigo 1º, inciso IV, da Lei 8.989/1995, garante a isenção do IPI na compra de veículos por pessoas com deficiência – física, visual, auditiva ou mental, severa ou profunda –, bem como por pessoas com transtorno do espectro autista. Segundo o ministro, a norma é clara ao delimitar de forma objetiva quem tem direito ao benefício, sem exigir que a CNH contenha restrições ou que o veículo adquirido seja adaptado.

Afrânio Vilela ressaltou que a atuação da administração tributária deve se pautar pelo princípio da legalidade, o que impede a imposição de exigências não previstas expressamente em lei. Por isso, afirmou que a análise do direito à isenção deve se restringir aos critérios estabelecidos na própria Lei 8.989/1995, sendo indevida qualquer ampliação interpretativa, como condicionar o benefício à existência de restrições na CNH ou à adaptação do veículo.

No caso em análise, o ministro observou que o TRF-4 negou a isenção com base no fato de o contribuinte possuir CNH sem restrições, interpretando isso como indicativo de ausência de deficiência severa ou profunda. No entanto, o relator rejeitou esse entendimento, por considerar que cria uma exigência não prevista na legislação e desvirtua o propósito da norma, que exige apenas a comprovação da deficiência para a concessão do benefício fiscal.

Lei retirou exigências de acuidade visual mínima ou campo visual reduzido

O ministro também apontou que o TRF-4 negou o pedido com fundamento no princípio da especialidade, ao interpretar que a Lei 14.126/2021 – embora reconheça a visão monocular como deficiência ‘‘para todos os efeitos legais’’ – não teria alterado de forma expressa os critérios estabelecidos na Lei 8.989/1995 para a concessão da isenção de IPI.

No entanto, Afrânio Vilela afastou esse entendimento, afirmando que a revogação expressa do parágrafo 2º do artigo 1º pela Lei 14.287/2021 retirou do ordenamento jurídico as exigências de acuidade visual mínima ou de campo visual reduzido, não havendo mais fundamento legal para restringir o direito à isenção com base nesses critérios.

‘‘Com a comprovação da visão monocular do recorrente, entendo estar devidamente demonstrada a condição de pessoa com deficiência visual, necessária para a concessão do benefício’’, concluiu ao dar provimento ao recurso. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2185814