CRITÉRIOS DE DESOCUPAÇÃO
STF suspende reintegração de posse de fazenda com 500 famílias no Maranhão

Foto: Gustavo Moreno/STF

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a ordem de reintegração de posse de uma fazenda no oeste do Maranhão em que vivem cerca de 500 famílias em situação de vulnerabilidade social. De acordo com Fachin, não ficou comprovado no processo que a medida seguiu as regras estabelecidas pelo STF para remoções.

A decisão liminar (provisória) foi dada na Reclamação (RCL) 79286 e vale até o julgamento final da ação. A Segunda Turma do Supremo vai analisar a determinação de Fachin em sessão do Plenário Virtual de 23 a 30 de maio.

Plano de reintegração

A propriedade em disputa é a Fazenda Jurema, que tem cerca de 23 mil hectares e fica às margens da Rodovia MA-125, entre os municípios de Vila Nova dos Martírios e São Pedro da Água Branca. A região é próxima das divisas com Pará e Tocantins.

A ordem para remoção foi dada pela Justiça do Maranhão, em pedido da Suzano S.A. Reunião entre autoridades locais fixou para esta terça-feira (13/4) a execução forçada da remoção de todos os ocupantes que ainda estivessem na área.

Na reclamação, a Defensoria Pública do Maranhão argumenta que o planejamento da reintegração traz medidas ‘‘precárias, inadequadas e inexecutáveis’’ para realocar as famílias, contrariando a regra de transição definida pelo STF na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828.

Cautelas

Em sua decisão, o ministro Edson Fachin ressaltou que, conforme o relato da Defensoria, há moradores que estão no local há mais de 20 anos. ‘‘Contudo, não há nos autos indicação de que tenham sido adotadas as cautelas definidas nas normas de transição impostas por este Supremo Tribunal’’, afirmou.

As regras em questão, fixadas na ADPF 828, estabelecem critérios para desocupações coletivas. Entre os pontos, há a necessidade de cumprir etapas prévias à reintegração, como tentativas de conciliação e inspeções judiciais para evitar a separação de integrantes de uma mesma família.

Além disso, caso as remoções envolvam pessoas vulneráveis, o poder público deve ouvir os representantes das comunidades afetadas, dar prazo razoável para a desocupação e garantir o encaminhamento das pessoas para abrigos públicos. Com informações de Lucas Mendes, da Assessoria de Imprensa do STF.

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RCL 79286

LEI DE LIBERDADE ECONÔMICA
OAB consegue derrubar a cobrança de alvarás para funcionamento de escritórios de advocacia em Veranópolis (RS)

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Os serviços advocatícios, por se constituírem em atividade de baixo risco, não se sujeitam aos atos públicos de liberação da atividade econômica e ao pagamento das respectivas taxas.

A decisão é da 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ao negar apelação do Município de Veranópolis, na Serra gaúcha, que exigia o pagamento de taxas para a emissão de alvará e de localização e funcionamento de escritórios de advocacia.

O colegiado confirmou integralmente os fundamentos da sentença proferida pela 1ª Vara Federal de Bento Gonçalves (RS), que, por sua vez, acolheu os argumentos lançado no mandado de segurança coletivo impetrado pela seccional gaúcha da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em face do secretário da Fazenda do Município.

Nos dois graus de jurisdição ficou claro que a legislação municipal (artigos 381 e seguintes da Lei 7100/2017) ignorou o fato de que os advogados e as sociedades de advocacia exercem atividade de baixo risco, nos termos do artigo 3º, inciso I, da Lei Federal 13.874/2019 (Lei de Liberdade Econômica) e da Resolução CGSIM 51/2019 (Código CNAE 6911701).

Para a relatora da apelação no TRF-4, desembargadora Maria de Fátima Freitas Labarrère, a cobrança de taxa pelo Município de Veranópolis não decorre do regular exercício de seu poder de polícia, mas de exigência prévia para a instalação e funcionamento dos estabelecimentos.

‘‘Como apontado pela sentença, a Lei de Liberdade Econômica garante o exercício das atividades econômicas de baixo risco sem a necessidade de atos públicos de liberação, aí compreendidos os cadastros, emissões de alvarás e licenças. Dessa forma, revela-se indevida tal imposição aos estabelecimentos afetos às atividades de baixo risco, notadamente o exercício da advocacia, bem como a cobrança da respectiva taxa. Assim, correta a concessão da segurança’’, fulminou a relatora no acórdão.

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EMPODERAMENTO CULTURAL
TRT-MG confirma indenização a trabalhador dispensado por uso de “dreads”

Reprodução Stúdio Dread SP

A Justiça do Trabalho condenou uma revendedora de carros de Belo Horizonte ao pagamento de indenização por danos morais, no total de R$ 5 mil, ao trabalhador que foi dispensado de forma discriminatória por usar de dreads e tranças no cabelo. O profissional gravou um áudio, no qual o supervisor deixa claro que o estilo dele gerava um ‘‘impasse’’ na empresa.

Na gravação, o supervisor aponta o fato de o ex-empregado usar dreads ou trança como um fator que desagradava, visualmente, a empregadora. Segundo ele, ‘‘a empresa busca transmitir uma postura mais séria, com um visual mais básico’’.

O supervisor ainda explicou, no áudio, que esse questionamento era feito em razão das normas da empresa. E informou ao trabalhador que ele mesmo não possuía dificuldade para segui-las, pois se veste normal, ao passo que o autor teria um estilo diferente.

O supervisor questionou se o autor estaria disposto a se adequar ou se isso significaria um empecilho ou um peso. O trabalhador se defendeu, informando que não abriria mão do cabelo. Por fim, o supervisor voltou a informar que a situação gerava um impasse na empresa.

No áudio, o ex-empregado ainda mencionou que havia se apresentado daquela forma na entrevista e que os dreads ou a forma dele de se vestir não foram empecilhos para a admissão. O trabalhador foi contratado para exercer a função de serviços de marketing. Porém, o contrato vigorou somente de 13/3/2023 a 10/4/2023, quando foi encerrado imotivadamente.

Sentença de procedência

Ao decidir o caso, o juízo da 43ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte garantiu ao trabalhador a indenização por danos morais, no valor de R$ 10 mil. Na sentença, o julgador concluiu, com base na prova material, que o autor foi alvo de discriminação contra a aparência, notadamente pelo uso de dreadlocks e tranças.

‘‘Ora, o uso de dreadlocks ou dreads constitui prática enraizada na cultura afrodescendente, dotada de profundos significados culturais, sociais e espirituais. Trata-se, essencialmente, de uma expressão de identidade afrodescendente e de valorização da respectiva herança cultural, de modo a expressar orgulho e apreço por essa tradição. Cuida-se, além disso, de uma manifestação de espiritualidade, de liberdade e de conexão com a ancestralidade afrodescendente, além de trazer o significado de resistência a padrões estéticos eurocêntricos. Ao fim, relaciona-se com a livre possibilidade de empoderamento e autoafirmação, permitindo que as pessoas pertencentes a essa cultura expressem sua identidade’’concluiu o juiz na sentença.

Vitória também no TRT-MG

A empregadora interpôs recurso contra a condenação. Alegou que o autor não foi vítima de conduta ou dispensa discriminatória. E reafirmou que a decisão foi tomada em função do poder diretivo do patrão, tudo em conformidade com a legislação trabalhista.

Porém, o desembargador relator da Quarta Turma do TRT-MG, Delane Marcolino Ferreira, entendeu que, de fato, o profissional foi alvo de discriminação no ambiente de trabalho em razão da aparência.

‘‘Não apenas em razão da utilização de adereços, como aduzido pela empresa, mas em decorrência do corte de cabelo por ele utilizado, associado à etnia, o que é passível de reparação civil’’, pontuou o julgador, reforçando que ele sequer tratava diretamente com os clientes.

Quanto ao valor da reparação a título de danos morais, o julgador observou que o valor deve ser arbitrado levando-se em consideração o grau de culpa do agente, as condições socioeconômicas das partes, assim como o bem jurídico lesado.

‘‘Valendo-se sempre de critérios de proporcionalidade e razoabilidade, definidos pela doutrina e jurisprudência, o valor não pode ser tão elevado que importe em enriquecimento sem causa, nem tão ínfimo, a ponto de ser incapaz de suavizar o sofrimento do lesado e de servir de intimidação para o agente’’, ressaltou o magistrado, reduzindo, diante ainda do curto período de vigência do contrato de trabalho, o valor para R$ 5 mil. Com informações da Assessoria de Imprensa do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais).

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ATOrd 0010693-73.2023.5.03.0181 (Belo Horizonte)

TESE VINCULANTE
Repetitivo fixa base de cálculo para honorários de sucumbência na desistência de desapropriação

​Sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.298), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a fixação de honorários advocatícios devidos pelo autor, em caso de desistência de ação de desapropriação por utilidade pública ou de constituição de servidão administrativa, deve seguir os percentuais definidos no artigo 27, parágrafo 1º, do Decreto-Lei 3.365/1941 (entre 0,5 e 5%), tendo como base de cálculo o valor atualizado da causa.

De acordo com o colegiado, esses percentuais não são aplicáveis somente se o valor da causa for muito baixo, hipótese em que os honorários serão arbitrados por apreciação equitativa, nos termos do artigo 85, parágrafo 8º, do Código de Processo Civil (CPC).

Com a fixação da tese jurídica, podem voltar a tramitar os recursos especiais e agravos em recurso especial que discutem a mesma questão e que estavam suspensos à espera desse julgamento. O entendimento definido pela Primeira Seção deverá ser observado pelos tribunais de todo o país na análise de casos semelhantes.

Base de cálculo segue regra supletiva do artigo 85, parágrafo 2º, do CPC

O ministro Paulo Sérgio Domingues, relator do repetitivo, destacou que o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a ADI 2.332, já debateu a constitucionalidade da regra sobre honorários inserida no Decreto-Lei 3.365/1941. Na ocasião, foi reconhecida a validade da base de cálculo e dos percentuais da verba sucumbencial definidos especificamente para ações expropriatórias.

Na hipótese de desistência da ação de desapropriação ou de constituição de servidão administrativa, entretanto, o ministro explicou que não há como aplicar a base de cálculo prevista no decreto-lei. Segundo ele, isso se dá porque a sentença não definirá indenização alguma, uma vez que não ocorrerá perda da propriedade imobiliária ou imposição de ônus ou restrição para a fruição do bem imóvel pelo seu proprietário.

‘‘À falta de condenação ou de proveito econômico efetivo, já foi dito que não há suporte jurídico para o estabelecimento da base de cálculo dos honorários nos moldes do artigo 27, parágrafo 1º, do Decreto-Lei 3.365/1941, de modo que essa base será fixada de acordo com norma jurídica supletiva prevista no artigo 85, parágrafo 2º, do CPC, tomando-se em conta, então, o valor atribuído à causa’’, afirmou o ministro.

Percentual dos honorários independe de existência de condenação

Quanto aos percentuais dos honorários, o relator avaliou que os valores previstos no Decreto-Lei 3.365/1941 representam norma especial que não depende da existência ou inexistência de condenação do expropriante. Segundo ele, a desistência da ação não faz desaparecer o suporte jurídico de aplicação do decreto-lei – que, como lei especial, prevalece sobre a norma geral.

Paulo Sérgio Domingues acrescentou que o entendimento deve ser flexibilizado quando o valor da causa for irrisório. Nesse caso, prosseguiu o ministro, devem ser afastados os parâmetros especiais de percentuais e base de cálculo de honorários para que seja aplicado o arbitramento por apreciação equitativa, a fim de impedir que a verba sucumbencial seja fixada em patamar incompatível com a dignidade do trabalho advocatício.

Instâncias ordinárias não aplicaram as disposições do decreto-lei

Um dos recursos representativos da controvérsia (REsp 2.129.162) foi interposto em ação movida pela Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) para a constituição de servidão administrativa sobre um imóvel particular, com o objetivo de construir uma linha de distribuição de energia elétrica. Quase um ano depois, após a concessionária desistir da ação, o juízo de primeiro grau arbitrou os honorários em 10% do valor da causa, com base nos artigos 85 e 90 do CPC. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve o parâmetro adotado, deixando de aplicar a regra do artigo 27, parágrafo 1º, do Decreto-Lei 3.365/1941.

‘‘Deve ser reformado o acórdão recorrido, já que a solução do caso concreto que dele emana está em desconformidade com a jurisprudência sedimentada no âmbito deste STJ, bem como com a tese jurídica ora estabelecida’’, concluiu o ministro ao determinar o retorno do processo ao tribunal de origem para que os honorários sejam novamente arbitrados. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2129162

NOME SOCIAL
Contact center é condenado por transfobia contra empregada transexual na Bahia

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou a Datamétrica Teleatendimento, de Salvador (BA), que faz gestão de relacionamento com clientes, a indenizar em R$10 mil uma empregada transexual por conduta discriminatória. Situações como não ser reconhecida pelo nome social e restrição ao uso do banheiro feminino levaram o colegiado à conclusão de transfobia pela empresa.

Ela disse que procurou a direção da empresa para relatar a situação

A empregada disse, na ação trabalhista, que foi admitida em maio de 2021 como operadora de telemarketing e que nunca teve seu nome social respeitado pela empresa, mesmo todos sabendo que ela era uma mulher transexual. Sofrendo com os preconceitos, ela disse que chegou a procurar a direção para relatar as condutas discriminatórias, sendo até bem recebida, mas, poucos dias depois, acabou demitida.

Em agosto de 2023, a primeira instância da Justiça do Trabalho de Salvador condenou a Datamétrica a indenizar a trabalhadora em R$ 10 mil por conduta de transfobia no ambiente laboral e dispensa discriminatória. Em sequência, a sentença foi confirmada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (TRT-5, Bahia).

Diante da decisão, a empresa tentou a análise do caso pelo TST.

Para a empresa, a operadora não comprovou as alegações de transfobia

No recurso, a Datamétrica declarou que sempre procedeu de maneira correta ao propiciar um ambiente de trabalho saudável e inclusivo para todos. Acrescentou que, apesar de a empregada ter apresentado, na contratação, documentos pessoais com nome de batismo e ter sua certidão de nascimento expedida após o fim do contrato, sempre esteve aberta a lhe dar o tratamento requerido; ou seja, o nome social.

A empregadora alegou questões de segurança em relação ao uso do nome social

Ainda no recurso, a Datamétrica observou que a empregada prestava serviços em uma instituição bancária, com rígidas regras de segurança e informação. Por isso, o nome social apenas poderia ser incluído em tais documentos caso ela realizasse a mudança do seu nome em registro. A empregadora lembrou que o nome social da empregada fazia parte dos canais internos da empresa e no crachá utilizado por ela.

Quanto ao uso do banheiro, a Datamétrica informou que estes eram utilizados conforme a identidade de gênero, sem qualquer restrição. A empresa também rechaçou a alegação de demissão discriminatória, lembrou que nada foi provado e que sempre prezou pela diversidade.

Para a 2ª Turma, houve violação grave dos direitos da empregada

Ao analisar o caso, a 2ª Turma do TST considerou correta a condenação da empresa ao pagamento de indenização por danos morais. Segunda a relatora do processo, ministra Maria Helena Mallmann, os fatos narrados evidenciaram violação grave aos direitos da empregada, gerando angústia e constrangimento incompatíveis com o dever de respeito à dignidade humana.

Segundo a decisão, empresas públicas e privadas devem reconhecer o nome social

De acordo com a ministra, assim como órgãos públicos, empresas privadas devem respeitar o nome social dos funcionários e dos clientes. ‘‘O nome social é a forma pela qual a pessoa trans se identifica e quer ser reconhecida socialmente nas diferentes instituições’’, observou Mallmann.

A ministra observou que o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da ADO 26 e do MI 4.733, reconheceu a transfobia como espécie de racismo, vedando práticas discriminatórias contra pessoas transgênero. ‘‘A recusa em utilizar o nome social configura afronta à dignidade humana e gera danos morais’’, frisou a relatora.

A ministra defendeu o uso do banheiro de acordo com a identidade de gênero

Por fim, quanto à restrição ao uso do banheiro feminino, a ministra ressaltou que o direito ao uso do banheiro condizente com a identidade de gênero resulta da proteção à igualdade e à dignidade, sendo a restrição a esse direito uma forma de discriminação direta. ‘‘Promover a diversidade de gênero é um passo essencial para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva’’, concluiu a relatora.

Ainda cabe recurso da decisão. Com informações de Ricardo Reis, coordenador de Editoria e Imprensa da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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ATOrd 0000416-46.2022.5.05.0029 (Salvador)