CARRO ELÉTRICO
Concessionária e fabricante têm de indenizar consumidor por erro na interpretação de garantia

Foto Divulgação

Decisão da 24ª Vara Cível de Brasília condenou a concessionária BCLV Comércio de Veículos S.A e a fabricante BMW do Brasil Ltda., solidariamente, a reparar o veículo de um cliente que apresentou problema de autonomia da bateria, na vigência do prazo de garantia, sem ônus financeiro para o consumidor.

As empresas ainda foram condenadas a indenizar, por danos morais, o proprietário do veículo em R$ 5 mil.

O autor conta que é proprietário do veículo BMW i3, ano modelo 2015, carro fabricado pela BMW e vendido pela Eurobike em 23 de dezembro de 2015. Descreve que, em 8 de dezembro de 2022, levou o veículo para revisão em concessionária autorizada e noticiou falha na autonomia do veículo com aviso em painel ‘‘propulsor de exclamação autonomia muito limitada’’. Alega que o serviço durou 11 dias, em razão dos testes com a bateria de alta tensão.

No entanto, a concessionária concluiu pela ausência de avarias e, poucos meses depois, o painel do veículo apontava a mesma informação de erro, com redução ainda maior da autonomia da bateria. O autor afirma que a garantia da bateria do veículo é de oito anos ou 160 mil quilômetros, conforme publicidade extraída da internet.

Garantia expirada

Em sua defesa, a concessionária diz que o veículo do autor já estava com a garantia expirada quando ocorreu o vício indicado no processo. Além disso, afirma que o veículo passou por diagnóstico completo em ambas as oportunidades e apresentou código de falha completamente diferente em análise por scanner em cada uma delas.

No mesmo sentido, a BMW do Brasil apresentou defesa, na qual afirma que, na primeira oportunidade em que o veículo foi levado à concessionária, não foram observadas anomalias ou vícios na bateria e que, em maio de 2023, o carro já contava com 107.489 quilômetros rodados, fora da garantia, portanto, pelo que não há que se falar em garantia.

Prevalece a publicidade apresentada na ata notarial

Na análise do processo, o juiz observou que a fabricante apresentou o termo de garantia e que consta, no referido documento, que a garantia do fabricante para as baterias de alta tensão dos veículos BMW série é de oito anos ou 100 mil quilômetros – o que ocorrer primeiro. Contudo, segundo o magistrado, tal documento não pode ser aplicado ao caso, uma vez que consta, em suas páginas iniciais, a informação de que se trata de termo de garantia de agosto de 2017, ao passo que o veículo foi adquirido no ano de 2015.

Para o magistrado, deve prevalecer, portanto, a publicidade apresentada pelo autor na ata notarial juntada ao processo, em que consta garantia de até oito anos ou 160 mil quilômetros nas baterias de alta tensão dos carros BMW i3.

Vírgula entre referente e referido

O juiz ainda destaca que na referida publicidade consta entre parênteses “(BMW i3, 94 Ah e 120 Ah)”. Apesar de o argumento da concessionária, que tal publicidade não poderia ser aplicada no caso, uma vez que é clara ao limitar a garantia de 160 mil quilômetros para os veículos com baterias de 94Ah e 120Ah, e que a bateria instalada no carro do autor seria de 60Ah, o juiz afirmou que a norma culta da língua portuguesa só permite uma interpretação: ‘‘que 94Ah e 120Ah são atributos associados ao referente de forma explicativa, por estarem separados de seu referente BMW i3 por vírgula”.

Por fim, arrematou magistrado: ‘‘Quisessem as requeridas indicar que a garantia em questão se restringe apenas aos modelos BMW i3 equipados com baterias 94Ah e 120Ah, excluindo os demais, não poderia constar a vírgula entre o referente e o referido. Nesse caso, a correta leitura da publicidade deve significar que todos os BMW i3 possuem a mesma garantia, não apenas aqueles equipados com uma ou outra bateria’’, afirmou o magistrado. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJDFT.

MANDADOS DE SEGURANÇA
Apresentação de relatórios salariais ao Ministério do Trabalho não fere a LGPD

A Justiça Federal de Santa Catarina negou a duas empresas de Pinhalzinho (SC) liminares para que não precisassem entregar ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) o Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, instituído por normas trabalhistas publicadas em 2023. As empresas alegaram que a obrigação descumpriria a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), mas o juiz Narciso Leandro Xavier Baez, da 2ª Vara Federal de Chapecó (SC), entendeu que as legislações não são incompatíveis.

O juiz considerou que a divulgação dos relatórios tem como objetivo, de acordo com a lei contestada pelas empresas [14.611/2023], permitir ‘‘a comparação objetiva entre salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos de direção, gerência e chefia preenchidos por mulheres e homens, acompanhados de informações que possam fornecer dados estatísticos sobre outras possíveis desigualdades decorrentes de raça, etnia, nacionalidade e idade, observada a legislação de proteção de dados pessoais e regulamento específico’’.

Para Baez, a legislação é ‘‘mais uma ferramenta a auxiliar na igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função’’. Por outro lado, o juiz lembrou que ‘‘a própria LGPD traz em seu bojo uma série de mecanismos que possibilitam justamente resguardar a privacidade e a intimidade dos empregados da empresa impetrante’’.

As normas estabelecem que as empresas devem promover a preservação do anonimato, com ‘‘utilização de meios técnicos razoáveis e disponíveis no momento do tratamento, por meio dos quais um dado perde a possibilidade de associação, direta ou indireta, a um indivíduo’’, observou o juiz, em decisões proferidas quarta-feira (27/2).

As empresas alegaram que em ambas o contato dos funcionários é de forma corriqueira e que muitos cargos são exclusivos. Tal situação tornaria fácil a identificação da pessoa. Os relatórios devem ser publicados por pessoas jurídicas de direito privado com mais de 100 empregados.

‘‘A alegada circunstância fática acerca da existência de cargos isolados na empresa, o que ocasionaria a identificação da pessoa, não afasta a obrigatoriedade de cumprimento na norma geral e aplicável a todos’’, afirmou Baez.

Da sentença, cabe recurso de apelação ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom), da Seção Judiciária de Santa Catarina.

MS 5002085-07.2024.4.04.7202/SC
MS 5002086-89.2024.4.04.7202/SC

DESLEALDADE PROCESSUAL
Empregado que alegou falta grave porque queria sair da empresa é condenado por má-fé pelo TRT-SP

Reclamante que confessa em audiência trabalhista que pediu rescisão indireta apenas porque recebeu uma nova oferta de emprego, sem ligação com falta grave do empregador, litiga de má-fé e deve ser punido, segundo a Justiça de Trabalho paulista.

Por isso, a 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) elevou de 9% para 10% do valor corrigido da causa a multa por litigância de má-fé aplicada no primeiro grau a um ex-empregado da loja K2 Confecções (Cavallera).

Segundo o processo, o trabalhador pediu a conversão do pedido de demissão para rescisão indireta por falta de recolhimento de cinco meses de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Ficou comprovado, porém, que essa ausência, em um período de 20 meses de contrato de trabalho, não constitui falta grave o suficiente a embasar uma rescisão indireta.

Na verdade, em audiência, ele admitiu que o único motivo para pedir a rescisão indireta foi ter recebido a oferta de uma nova oportunidade de emprego.

Após sentença contrária a ele, no recurso, o profissional modificou o pedido de rescisão indireta para dispensa sem justa causa, o que foi indeferido no 2º grau.

‘‘O apelante, ao alterar a verdade dos fatos ocorridos, tripudia sobre o princípio da ampla defesa, o qual não pode ser visto como absoluto, mas contrabalanceado com os princípios da boa-fé e da lealdade processual’’, afirma a juíza-relatora do acórdão, Cynthia Gomes Rosa.

Aplicada em percentual máximo previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a multa tem por finalidade indenizar a parte contrária pelos prejuízos sofridos, além de restituir gastos com despesas processuais e honorários advocatícios. Com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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ATSum 1000934-47.2021.5.02.0058 (São Paulo)

PENTE-FINO
Supremo fixa prazo de 60 dias para conciliação em acordos de leniência na Lava-Jato

Audiência de Conciliação 
Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça realizou, na manhã de 26 de fevereiro, na Primeira Turma da Corte, audiência de conciliação no âmbito de ação que questiona os termos dos acordos de leniência celebrados na Operação Lava-Jato.

Ficou determinado que as partes, em especial os entes públicos, terão 60 dias para chegar a um consenso sobre os acordos, sempre com o acompanhamento da Procuradoria-Geral da República (PGR).

Também ficou estabelecido que nesse período ficará suspensa a aplicação de qualquer medida em razão de eventual mora, das empresas, no adimplemento das obrigações financeiras até então pactuadas.

Ministro André Mendonça
Foto: Carlos Moura/ SCO/STF

A questão é objeto da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1051, apresentada ao Supremo em março de 2023 pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Solidariedade. As legendas afirmam que os pactos foram celebrados antes do Acordo de Cooperação Técnica (ACT), que sistematiza regras para o procedimento, e que, portanto, haveria ilicitudes na realização dos acordos.

O ministro André Mendonça ressaltou, durante a audiência, a importância dos acordos de leniência como instrumento de combate à corrupção, frisando que a conciliação proposta não servirá para que seja feito um ‘‘revisionismo histórico’’.

Segundo ele, o objetivo é assegurar que as empresas negociem com os entes públicos com base nos princípios da boa-fé, da mútua colaboração, da confidencialidade, da razoabilidade e da proporcionalidade.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, concordou com a importância de abertura de diálogo, assim como o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), ministro Bruno Dantas, que destacou a relevância da instituição para fiscalizar o andamento dos acordos. O ministro Vinícius de Carvalho, da Controladoria-Geral da União (CGU), ressaltou que o ministério está aberto para ouvir os pedidos de renegociação das empresas. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

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ADPF 1051

LOCAÇÃO IMOBILIÁRIA
Cláusula de renúncia às benfeitorias não se estende às acessões

Foto: Marcelo Casal Jr/Agência Brasil

​Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a cláusula de contrato de locação imobiliária que prevê renúncia à indenização por benfeitorias e adaptações não pode ser estendida à hipótese de acessão (aquisição do direito de propriedade sobre os acréscimos feitos no imóvel).

A partir desse entendimento, o colegiado restabeleceu a sentença que reconheceu o direito de um empresário a ser ressarcido depois de construir uma academia em propriedade alugada, mas não conseguir viabilizar o negócio por falta de regularização, que dependia da locadora. O valor do ressarcimento: R$ 1,1 milhão.

‘‘A obra realizada pelo locatário configurou uma acessão – e não uma mera benfeitoria, até porque o valor por ele investido no imóvel alcançou um montante elevado, que supera o senso comum para uma simples adaptação do bem para suas atividades’’, avaliou o relator do caso na Terceira Turma, ministro Marco Aurélio Bellizze.

Ação apontou enriquecimento sem causa da proprietária

Ministro Marco Aurélio Bellizze foi o relator
Foto: Sergio Amaral/STJ

Sem poder iniciar as atividades da academia, o empresário parou de pagar os aluguéis até que a situação do imóvel fosse regularizada, mas se viu obrigado a deixar o local devido à ação de despejo movida pela proprietária. Posteriormente, o imóvel foi alugado para outra pessoa, que fez uso de toda a estrutura construída.

Por essa razão, o antigo locatário ajuizou ação, alegando enriquecimento sem causa da dona do imóvel e pedindo indenização por danos materiais.

O juízo de primeiro grau acolheu o pedido, mas a decisão foi reformada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). A corte entendeu que a cláusula de renúncia ao direito de indenização estabelecida no contrato de locação abrangeria não só as benfeitorias, mas todas as alterações feitas no imóvel. Nessa situação, estaria incluída a construção (acessão) feita para adequar o local à atividade que o locatário pretendia desenvolver.

Benfeitoria e acessão não podem ser tratadas da mesma forma

O ministro Bellizze apontou que a existência de uma nova construção no imóvel ficou claramente demonstrada no processo, havendo divergência entre as instâncias ordinárias quanto ao alcance da cláusula de renúncia a indenizações.

Segundo o relator, é preciso diferenciar os conceitos de benfeitoria e acessão, institutos que não podem ser tratados da mesma forma: a primeira é uma melhoria de natureza acessória realizada em coisa já existente, enquanto a acessão é a aquisição da propriedade de acréscimos, nas formas previstas no artigo 1.248 do Código Civil (CC).

‘‘Por isso, mostra-se inviável estender a previsão contratual de renúncia à indenização por benfeitoria também à acessão, notadamente porque o artigo 114 do CC determina que os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente’’, observou Bellizze.

Código Civil prevê indenização para locatário que age de boa-fé

O magistrado ressaltou ainda que o locatário não pôde explorar a academia por falta de alvará de funcionamento, o qual não foi obtido devido ao desinteresse da proprietária do imóvel. ‘‘Ou seja, o locatário foi impedido de iniciar suas atividades em decorrência de ato da locadora’’, disse, lembrando que, segundo o artigo 1.255 do Código Civil, quem edifica em terreno alheio perde a construção para o proprietário, mas tem direito à indenização se agiu de boa-fé.

‘‘O locatário procedeu de boa-fé, inclusive mediante autorização da locadora, para a realização das obras, podendo-se cogitar a má-fé da proprietária, consoante presunção do artigo 1.256, parágrafo único, do CC, já que a construção se deu com o seu conhecimento e sem impugnação de sua parte’’, concluiu o relator ao dar provimento ao recurso especial. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.931.087

REsp 1931087