DIVISÃO PRO RATA
Bloqueio de bens em ações de improbidade deve ser proporcional à responsabilidade

Por Matheus Bene Canizza e Geovanna Cruz Nicolete

Diamantino Advogados Associados

O Superior Tribunal de Justiça decidirá, sob o rito dos recursos repetitivos, assunto bastante tormentoso relacionado às ações de improbidade administrativa: a constrição patrimonial dos réus em sede liminar. A discussão se dará no Tema 1.213, em que se analisa os REsps 1.955.957, 1.955.116, além de mais dois processos que tramitam sob sigilo.

Mais especificamente, o STJ avaliará se há necessidade ou não de divisão pro rata entre os agentes responsáveis pelo dano para a ordem de constrição. A tese é a seguinte: ‘‘a responsabilidade de agentes ímprobos é solidária e permite a constrição patrimonial em sua totalidade, sem necessidade de divisão pro rata, ao menos até a instrução final da ação de improbidade, quando ocorrerá a delimitação da quota de cada agente pelo ressarcimento’’.

O assunto é tormentoso porque diz respeito à medida constritiva francamente invasiva e, na maioria das vezes, tomada com base unicamente na narrativa fornecida pela parte legitimada que propôs ação civil pública por ato de improbidade administrativa.

Além disso, em regra, as ações de improbidade administrativa envolvem um número significativo de réus, que, solidariamente, se sujeitam ao ato de constrição patrimonial inicialmente autorizado com o objetivo de evitar que o agente indicado como ímprobo, eventualmente, se desfaça de seus bens, dificultando ou impossibilitando o ressarcimento de valores ao erário.

Não se questiona aqui a validade das medidas cautelares que buscam garantir que haja patrimônio suficiente para reparar os danos causados ao erário público, discutidos no âmbito da ação de improbidade. O que se coloca em discussão é a falta de proporção e razoabilidade, que muitas vezes acaba criando situações de injustiça, no sentido mais amplo da palavra.

Isso porque, não é nem um pouco incomum pessoas que não possuem absolutamente nada a ver com o ato ímprobo serem colocadas como rés em ações de improbidade. E, como tal, se sujeitam e são destinatárias, igualmente entre si, aos efeitos das ordens de indisponibilidade. Um dos principais desafios e controvérsias que envolvem as decisões de indisponibilidade incluem, portanto, a necessária proporcionalidade da medida, pois, ao menos em tese, a medida de constrição deveria ser, sempre, proporcional à gravidade da conduta de cada réu e ao montante do dano a ser reparado.

É desta necessidade de se apurar, ainda inicialmente, a proporção de responsabilidade de cada um que compõe o polo passivo da ação de improbidade que emerge a discussão sobre a possibilidade de haver ou não a constrição patrimonial equitativa entre os réus. Ou seja, o STJ irá decidir se as decisões liminares de constrição patrimonial devem, ou não, observar a gravidade da conduta e ao dano causado de cada agente ou terceiro.

Essa dificuldade se dá muitas vezes porque em um momento inicial, no qual não há uma fixação individual da responsabilidade dos réus, a decretação da indisponibilidade é considerada solidária e, portanto, acaba recaindo igualmente sobre o patrimônio de todos, até o limite do dano.

O mundo ideal seria que o Ministério Público já indicasse, inicialmente, qual seria, em tese, a proporção de responsabilidade de cada um daqueles que ele arrolou como réu em determinada ação civil pública por ato de improbidade, de forma a evitar que determinado réu, que possua menor responsabilidade pelo ato ímprobo, seja atingido de igual forma pela mesma ordem constrição que atingir outro réu com maior responsabilidade.

Acredita-se que, quando do julgamento do Tema 1.213, o STJ confirmará a jurisprudência atual no sentido de que, havendo solidariedade entre os corréus na ação de improbidade administrativa, o bloqueio do valor total determinado pelo juiz poderá recair sobre o patrimônio de qualquer um deles, vedado o bloqueio do débito total em relação a cada um dos coobrigados, tendo em vista a proibição do excesso na cautela.

Até a chegada da fase em que haverá a delimitação da quota de cada agente tido como ímprobo aconteça (o que pode demorar anos a fio), todos aqueles que forem demandados em ações coletivas por ato de improbidade terão, igualmente, seu patrimônio na mira das ações de indisponibilidade, sem divisão pro rata ou equitativa.

Está nas mãos do STJ, portanto, apontar para uma solução capaz de fazer Justiça.

Mattheus Bene Canniza é advogado do Diamantino Advogados Associados

Geovanna Cruz Nicolete é estagiária do Diamantino Advogados Associados 

FUROR ARRECADATÓRIO
STF invalida taxa de fiscalização sobre atividade mineradora em Mato Grosso

Ministro Barroso foi o relator
Foto: Banco de Imagens do STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou inconstitucional a criação de taxa de fiscalização sobre atividade mineradora em Mato Grosso. A maioria do Tribunal acompanhou o relator, ministro Luís Roberto Barroso, que apontou desproporcionalidade entre o valor da taxa e o custo da atividade à qual ela se refere.

A decisão majoritária se deu na sessão virtual finalizada em 18 de dezembro, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7400. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) questionava a Lei estadual 11.991/2022, alegando, entre outros pontos, que a fiscalização da atividade e da arrecadação do setor é da Agência Nacional de Mineração (ANM).

Finalidade de arrecadação

Ao decidir, o presidente do STF observou que a desproporcionalidade da Taxa de Fiscalização de Recursos Minerários (TRFM) demonstra que sua criação está mais voltada à finalidade arrecadatória.

Segundo Barroso, chama atenção a multiplicidade de taxas amparadas no poder de polícia ambiental do Estado, que já havia criado a Taxa de Fiscalização Ambiental (TFA). Apesar de terem diferentes órgãos fiscalizadores, as duas taxas têm objetivos parcialmente coincidentes.

Lucratividade

Barroso afastou a alegação do Estado de que o valor cobrado pela taxa é percentual ínfimo das receitas ou dos lucros das empresas de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos minerários. A seu ver, a lucratividade de uma empresa deve ser considerada para medir outros tributos, como o imposto sobre a renda, mas não repercute no valor da taxa.

Tese de julgamento

O colegiado aprovou a seguinte tese de julgamento: ‘‘O Estado-membro é competente para a instituição de taxa pelo exercício regular do poder de polícia sobre as atividades de pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento de recursos minerários, realizada no Estado. 2. É inconstitucional a instituição de taxa de polícia que exceda flagrante e desproporcionalmente os custos da atividade estatal de fiscalização’’. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

ADI 7400

RISCOS DE BITRIBUTAÇÃO
Cidadania e residência fiscal: qual a diferença?

Por João Eduardo Zica Diamantino e Beatriz Palhas Naranjo

Reprodução internet

Não há dúvidas de que o Brasil está passando por um cenário de polarização política. Por esse motivo, muitos brasileiros começaram a imaginar e até mesmo planejar sair do país para morar no exterior.

Antes de qualquer coisa, para aqueles que já se imaginam vivendo no exterior, é preciso entender a diferença entre cidadania e residência fiscal. Embora comumente tratados como iguais, esses conceitos são completamente diferentes.

A cidadania nada mais é do que a possibilidade de exercer direitos perante uma nação. Ou seja, com a cidadania, você passa a ter direitos civis, incluindo passaporte, podendo exercer o direito de voto nas eleições e, por não ser algo uno, muitas pessoas possuem dupla ou até tripla cidadania.

Já a residência fiscal consiste na ligação do sujeito passivo (residente) com um país para fins tributários. Quer dizer que, durante o período que o sujeito passivo possuir a residência fiscal, aquele país poderá tributar toda sua renda, seja aquela auferida no próprio país como aquela auferida no exterior.

Resolvida essa questão, é importante mencionar que cada país é livre para determinar as regras de residência fiscal. Portanto, é preciso ter cuidado para não se sujeitar a mais de uma residência fiscal; afinal, pagar tributos uma vez já é ruim, que dirá duas ou mais.

Para se obter a residência fiscal, é necessário cumprir as regras estabelecidas pelos países, mas, de uma forma geral, a maioria das nações adota o critério temporal como regra: 183 dias de permanência na maior parte dos países, contínuos ou não, são suficientes para se tornar um residente fiscal. Em outros países, como a Inglaterra, bastam 46 dias de permanência.

Por serem conceitos completamente diferentes — cidadania e residência fiscal —, a pessoa que planeja se mudar para o exterior precisa ter em mente que o fato de possuir um passaporte de outra nação não significa que ela poderá deixar de pagar impostos no Brasil ou que passará a pagar impostos perante a nação estrangeira.

Neste cenário, passam a surgir questionamentos quanto à forma de tributação da renda do sujeito passivo, como, por exemplo: ‘‘se resido no exterior, mas ainda possuo residência fiscal no Brasil, devo pagar o imposto duas vezes?’’. Pois bem, existem alguns meios de evitar a bitributação.

O Brasil possui acordo de não bitributação com algumas nações, como, por exemplo, Argentina, Canadá, Emirados Árabes e Portugal. Para gozar desse benefício, é necessário cumprir uma série de requisitos que foram estabelecidos pela Receita Federal.

Um deles é a chamada Declaração de Saída Definitiva do País, que deve ser entregue quando a pessoa sai do Brasil de forma definitiva ou passa à condição de não residente; ou seja, quando deixa o país em caráter temporário.

Na saída em caráter permanente, a Declaração deverá ser entregue a partir da data da saída ou até o último dia do mês de fevereiro do ano-calendário subsequente. Já na saída em caráter temporário, a Declaração deverá ser entregue a partir da data da caracterização da condição de não residente até o último dia do mês de fevereiro do ano-calendário subsequente.

Portanto, a Declaração de Saída Definitiva do País é a Declaração de Imposto de Renda que deve ser entregue à Receita Federal por quem está deixando o país em caráter definitivo – aquele que não pretende voltar a residir no Brasil ou que se enquadre na condição de não residente.

Vale mencionar que a pessoa física que ficar 12 meses consecutivos fora do Brasil passará a ser considerada como não residente fiscal. Neste caso, somente será necessário entregar a Declaração de Saída Definitiva do País após transcorridos 12 meses, na data da caracterização da condição de não residente.

Como é possível perceber, além de existirem diferentes regras para que uma pessoa venha ou não a ser considerada residente fiscal no Brasil, é preciso ter conhecimento dos requisitos que deverão ser preenchidos para só então gozar dos acordos de não bitributação firmado entre os países.

São tantas regras que aqueles que planejam sair do país tomam um banho de água fria.

João Eduardo Zica Diamantino e Beatriz Palhas Naranjo são sócios no escritório Diamantino Advogados Associados.

REPERCUSSÃO GERAL
STF vai julgar recurso sobre a adaptação obrigatória de carrinhos de compras para transporte de crianças com deficiência

Reprodução: Rede Papel Solidário

O Supremo Tribunal Federal (STF) vai decidir se lei estadual pode impor a supermercados e estabelecimentos similares a obrigatoriedade de adaptação de carrinhos de compras para transporte de crianças com deficiência ou mobilidade reduzida.

A matéria chegou ao Tribunal no Recurso Extraordinário (RE) 1198269, que teve a repercussão geral conhecida (Tema 1286).

A Associação Paulista de Supermercados (APAS) questiona decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que manteve a validade da Lei Estadual 16.674/2018, que obriga hipermercados e supermercados a adaptação de 5% dos carrinhos de compras às crianças com deficiência ou mobilidade reduzida.

No STF, a entidade argumenta que a lei viola o princípio da isonomia, pois não se estende a todo comércio varejista, e o princípio da livre iniciativa, por impor obrigação a um setor econômico específico sem contrapartida.

Competência

Em sua manifestação, o relator, ministro Gilmar Mendes, observou que a matéria do recurso possui inegável relevância do ponto de vista jurídico, econômico e social, na medida em que busca delimitar a prerrogativa de legislar sobre o assunto.

Além disso, pontuou, a questão pressupõe o devido equacionamento de princípios constitucionais, além da aplicação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

RE 1198269

CELETISTAS
Piso da enfermagem deve ocorrer de forma regionalizada por negociação coletiva, diz STF

Foto: Pedro Ventura/Agência Brasil

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a implementação do piso salarial da enfermagem, em relação aos profissionais celetistas em geral, deve ocorrer de forma regionalizada, mediante negociação coletiva nas diferentes bases territoriais e nas respectivas datas-bases.

O entendimento é que deve prevalecer o negociado sobre o legislado, tendo em vista a preocupação com eventuais demissões e o caráter essencial do serviço de saúde.

A decisão se deu, na sessão virtual finalizada em 18 de dezembro, no julgamento de recurso (embargos de declaração) apresentado na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7222.

Desestímulo à negociação

No julgamento, prevaleceu a divergência aberta pelo ministro Dias Toffoli. Por maioria, o STF entendeu que o prazo de 60 dias, originalmente previsto no julgamento da ADI, para a realização de negociações coletivas, acabou se tornando, na prática, um desestímulo à própria negociação. Isso porque as partes (empregados e empregadores) partiam da certeza de que a Lei 14.434/2022, que instituiu o piso, seria necessariamente aplicada após o fim do prazo.

Dissídio coletivo

De acordo com o ministro Gilmar Mendes, que seguiu a divergência do ministro Toffoli, quando não for possível ‘‘se chegar a um acordo, deve ser reconhecida às partes interessadas a prerrogativa de instaurar dissídio coletivo para dirimir o conflito, na forma da lei’’, competindo à Justiça do Trabalho resolver o conflito.

Remuneração global

O STF também definiu que o piso salarial se refere à remuneração global, e não ao vencimento-base, correspondendo ao valor mínimo a ser pago em função da jornada de trabalho completa. A remuneração pode ser reduzida proporcionalmente, no caso de carga horária inferior a 8 horas por dia ou 44 horas semanais.

Nesses pontos, ficaram vencidos os ministros Luís Roberto Barroso (relator da ação), Edson Fachin e André Mendonça e a ministra Cármen Lúcia, que acolhiam os embargos de declaração em menor extensão. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

ADI 7222