QUEBRA DE FIDÚCIA
TRT-MG mantém justa causa de empregada que extraiu documentos da empresa para instruir reclamatórias de ex-empregados

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Reprodução CERS

O empregador pode rescindir o contrato de trabalho por justa causa se, comprovadamente, o empregado incorreu em ato de improbidade, sinaliza o artigo 482, alínea ‘‘a’’, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Por isso, a 10ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais) manteve a dispensa por justa causa aplicada a uma empregada que acessou o banco de dados da empresa para instruir reclamatórias trabalhistas de outros ex-funcionários. Ela foi contratada como recepcionista e, às vezes, atuava como gerente substituta do escritório.

Segundo o processo, que tramitou na 5ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora (MG), a reclamante utilizava o perfil de outra empregada, já desligada, para extrair relatórios do livro-caixa do sistema e fornecê-los a outros ex-empregados. O acesso, realizado por senha individual, foi ativado fora do horário de trabalho e das dependências da empresa.

Destruição da confiança autoriza justa causa

Desa. Ana Maria foi a relatora
Foto: Imprensa TRT-3

A relatora do recurso ordinário trabalhista (ROT) no TRT mineiro, desembargadora Ana Maria Amorim Rebouças, disse que a dispensa por justa causa não é direito do empregador, mas uma das extensões do seu poder diretivo. Assim, a ruptura motivada não está no ato de sua vontade, mas sim no permissivo legal para fazê-lo, nas hipóteses do artigo 482 da CLT. E só quando houver violação séria das principais obrigações do contrato de trabalho, destruindo de tal forma a confiança depositada no trabalhador que torne impossível a subsistência da relação de emprego.

No caso concreto, ao manter a sentença de primeiro grau, a magistrada comprovou os atos ilícitos imputados à reclamante, na medida em que a reclamada carreou aos autos prints da tela de acesso do sistema de informática, demonstrando tudo o que foi relatado na peça de defesa. E o mais importante: sem sofrer impugnações da reclamante.

‘‘Comprovada a autoria da reclamante pelo ilícito, é de ver que a reclamante quebrou a fidúcia depositada pela empregadora, impossibilitando a continuidade do vínculo empregatício’’, concluiu, no acórdão, a desembargadora-relatora.

Clique aqui para ler o acórdão do TRT-3

0010133-56.2020.5.03.0143 (ROT)

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COMPRA NO ESCURO
TJRS condena corretores que venderam chalé em mau estado de conservação a clientes doentes

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Sob pena de responder por perdas e danos, o corretor prestará ao cliente todos os esclarecimentos acerca da segurança ou do risco do negócio, das alterações de valores e de outros fatores que possam influir nos resultados da incumbência, adverte o parágrafo único do artigo 723 do Código Civil (CC).

Por desconsiderar o dispositivo, um casal de corretores acabou responsabilizado judicialmente por vender uma casa com defeitos grave, inclusive colocando entraves à vistoria, a cliente com familiares enfermos, na Comarca de Capão da Canoa (Litoral Norte gaúcho).

Como resultado da conduta antijurídica, os réus foram condenados a abater R$ 35 mil na venda do imóvel – que havia sido vendido ao preço de R$ 170 mil – e ainda a indenizar em R$ 5 mil, a título de danos morais, cada um dos três autores da ação indenizatória. A decisão é da 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), ao confirmar integralmente sentença proferida pela 2ª Vara Cível daquela comarca.

Vítimas de propaganda enganosa

O relator da apelação no colegiado, desembargador Nelson José Gonzaga, disse que a falta de diligência dos compradores não afasta o dever de informação, por parte dos corretores, a cerca da real situação de conservação do imóvel. Além disso, o anúncio de venda não trazia qualquer informação ou ressalva de que o bem necessitava de reformas para ser habitado. Em outras palavras, os compradores foram vítimas de uma propaganda enganosa.

‘‘Em outras palavras, não agiram os réus com o dever de informação necessário e imprescindível quando da negociação, mas aproveitaram-se, com o fim de concluir a venda, da vulnerabilidade e confiança dos autores, que lidavam com questões de doença na família e estavam no desespero de mudar para o litoral, a fim de obterem melhores condições de saúde aos familiares doentes’’, escreveu no acórdão.

‘‘Lindo chalé rústico a três quadras do mar’’

O anúncio publicado pela Santana Corretora de Imóveis, no site da OLX, era convidativo: ‘‘Lindo chalé rústico situado a 3 quadras do mar, frente leste, composto de casa principal – 2 dormitórios com armários embutidos e sacada no andar superior, cozinha, banheiro, despensa e sala ampla para 2 ambientes no andar térreo, com armários embutidos em todas as peças; na parte de trás do terreno possui anexo com 2 amplas peças (para quarto ou sala de lazer/academia) e banheiro – ótimo pátio ajardinado com acesso de veículos à garagem, com churrasqueira e pia auxiliar. Região de moradores fixos. Estuda proposta à vista’’.

Parecia o local ideal para abrigar moradores que necessitam de boas condições para continuar o seu tratamento de saúde, longe do stress de uma metrópole como Porto Alegre. A estagiária da Corretora garantia, em e-mails e telefonemas à compradora, que o imóvel se encontrava em ótimas condições e que contava com mobília completa.

A compradora, no entanto, informou a necessidade de trazer para a nova casa os seus próprios móveis, já que a sua mãe e o esposo dela necessitavam de aparelhos caríssimos para o tratamento médico. Inclusive, foram informados que a voltagem da residência seria 127v – o que viabilizaria o uso dos equipamentos.

Entraves para a vistoria do imóvel

Segundo registra a petição inicial, os autores da ação tentaram realizar visita antecipada ao imóvel, mas foram impedidos pelos os corretores, sob o pretexto de que a vistoria era desnecessária, porque este se encontrava em ‘‘perfeitas condições’’. Enquanto isso, o delicado estado de saúde dos familiares, exigindo tempo integral para cuidados, e a pressão da Corretora concorreram para a ‘‘agilização’’ do negócio. Assim, mesmo sem conhecer o imóvel, os autores toparam fechar o negócio, desembolsando R$ 30 mil, a título de arras.

Na ocasião, ficou acordado que realizariam visita pessoal ao imóvel quando da assinatura do contrato. Contudo, haja vista o tempo de deslocamento até esta cidade e do horário de encerramento das atividades dos bancos, os corretores disseram que os autores deveriam efetuar o depósito do valor integral da venda anteriormente à vistoria. E assim foi feito.

O que não começa bem não termina bem. Após a assinatura do contrato de compra e venda e efetuado o pagamento de todos os valores devidos, os autores foram informados de que a voltagem do imóvel, na verdade, era 220v, o que inviabilizaria o aproveitamento dos equipamentos médicos. Também vieram a saber que a residência sequer contava com água encanada, possuindo apenas um poço artesiano. Em síntese, as condições do imóvel divergiam da descrição posta no anúncio veiculado na internet.

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141/1.16.0001454-0 (Capão da Canoa-RS)

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RISCOS EMPRESARIAIS
Seguradora pode reter parte do valor do seguro D&O por expressa previsão contratual

Reprodução Sindsegsp.Org

Ante expressa previsão no contrato, a seguradora pode reter parte do pagamento da indenização do seguro de responsabilidade civil D&O. Com o entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afastou a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) no caso, tendo em vista que o segurado é pessoa jurídica, com capacidade técnica suficiente para entender os termos do contrato.

Na origem, houve a contratação de uma apólice de seguro D&O, com o propósito de cobrir os riscos de eventuais prejuízos que os administradores da empresa, no exercício de suas funções, causassem a terceiros. Embora essa modalidade de seguro seja destinada, em regra, à proteção apenas dos executivos, a empresa negociou sua inclusão no contrato, mediante condições específicas, para o caso de reclamações no âmbito do mercado de capitais.

Após acordo em ação coletiva, a empresa pagou valores referentes a prejuízos causados a seus acionistas e ao mercado, mas não recebeu da seguradora o repasse do valor integral. Por isso, acionou a companhia de seguros na Justiça, requerendo a complementação da indenização securitária, no valor de R$ 6,3 milhões.

Cláusula estabelecia desconto no valor da indenização

Ministro Marco Bellizze foi o relator
Foto: Sandra Fado/STJ

Em primeira e segunda instâncias, o pedido foi julgado improcedente, ao fundamento de que, com o endosso realizado no contrato, foi admitida a participação proporcional da empresa no sinistro. No recurso especial (REsp) dirigido ao STJ, a empresa sustentou que, à luz do Direito do Consumidor, deveria receber o valor integral da indenização.

O relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, observou que houve um endosso no contrato do seguro, a fim de incluir na cobertura o risco relativo a perdas e danos originados no mercado de capitais. Conforme ressaltou, uma das cláusulas específicas negociadas estabelecia o desconto de 10% no valor da indenização securitária devida à pessoa jurídica no caso de sinistro.

O ministro ressaltou que a cláusula de participação foi redigida de forma clara, ficando nítida a anuência da contratante com a retenção de parte da indenização a que teria direito.

Ausência de vulnerabilidade impede incidência do CDC

Bellizze apontou que o artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor (CDC) trouxe a possibilidade de se considerar consumidora uma pessoa jurídica, desde que seja a destinatária final do produto. No entanto – disse o magistrado –, o STJ adota a teoria finalista mitigada, que privilegia a análise da vulnerabilidade do adquirente do produto ou do serviço em cada caso, a fim de verificar eventual superioridade do fornecedor que justifique a incidência das regras protetivas do CDC.

‘‘Considerar a segurada como hipossuficiente técnica não se mostra plausível, principalmente quando levadas em conta as atividades por ela exercidas e o seu porte econômico, possuindo assessoria e consultoria adequadas para a celebração de contratos de tamanha monta’’, comentou. O ministro também afirmou que, no caso, não se pode falar em contrato de adesão (artigo 54 do CDC), pois a negociação de cláusulas entre as partes afasta essa hipótese.

Além disso, Bellizze destacou o fato de que, embora possa haver relação de consumo no seguro empresarial quando a pessoa jurídica contrata a proteção do próprio patrimônio, o seguro D&O busca proteger a atuação dos administradores, servindo, assim, como um insumo à atividade da empresa. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.926.477

CHARGEBACK
TJSP julga abusiva cláusula de retenção de valores em contestação de compras

Reprodução/Site TJSP

A retenção de valores por instituição financeira em procedimento de contestação de compra (chargeback) é abusiva quando ficar evidenciado que houve falha na verificação de dados cadastrais do titular de cartão de crédito. Com isso, a intermediadora de pagamentos deve entregar ao estabelecimento comercial a totalidade da venda realizada.

A decisão, por unanimidade de votos, é da 30ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), em acórdão de apelação lavrado na sessão de 17 de fevereiro.

Venda parcelada pela internet

Consta nos autos que uma empresa de produtos odontológicos realizou venda parcelada pela internet no total de R$ 9.490. Após ter recebido a segunda parcela e entregue o produto, foi informada que o titular do cartão contestou a compra, procedimento conhecido como chargeback.

Ao ser informada que não receberia os valores das parcelas restantes, a autora ingressou com demanda para contestar a retenção do montante, uma vez que a falha de segurança aconteceu na instituição responsável pelo meio de pagamento.

Relação de consumo

Desa. Lúcia Pizzotti foi a relatora
Foto: Antônio Carreta/TJSP

A relatora do recurso no colegiado, desembargadora Maria Lúcia Pizzotti, afirmou em seu voto que a relação entre as empresas é de consumo, sendo a autora da ação a parte vulnerável da relação, diante de uma instituição que ‘‘detém a expertise na fabricação e manutenção do produto objeto da demanda’’.

A julgadora apontou que, no caso concreto, o titular do cartão de crédito não reconheceu a compra e pugnou pelo estorno. ‘‘De fato, a compra foi realizada em nome de uma pessoa, e o cartão de crédito estava em nome de outra”, escreveu no voto. Mesmo assim a transação foi aprovada pela administradora do cartão.

De acordo com a magistrada, ‘‘em matéria de responsabilidade civil das instituições financeiras, aplica-se a teoria do risco profissional’’, tornando a cláusula que prevê a retenção abusiva. Também participaram do julgamento os desembargadores Monte Serrat e Carlos Russo.  Com informações da Comunicação Social do TJSP.

Clique aqui para ler o acórdão

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 1011567-30.2022.8.26.0005 (São Paulo)

DÍVIDAS FISCAIS
Empresas em crise e os aspectos tributário e recuperacional da transação

Por Bruna Nunes de Quadros

Ilustração FreePik

A atividade empresarial é complexa e apresenta uma série de dificuldades para quem a exerce. Essas adversidades, quando assentadas com maior veemência, podem culminar em crises. A evasão deste cenário de desequilíbrio econômico é de interesse de ordem pública e social, visto que as sociedades empresárias são instrumentos de geração de insumos e renda e, assim, exercem um papel significativo e determinante no meio social.

Com base nisso, a Lei nº 11.101/05 prevê o instituto da recuperação judicial, que tem como propósito viabilizar a superação da crise econômico-financeira e a preservação da empresa. A recuperação judicial não se limita à mera aceitação de créditos. O instituto pretende, principalmente, conservar a fonte produtora e resguardar a geração de empregos e renda. Atualmente, é a alternativa mais efetiva para a reversibilidade do cenário de crise, uma vez que a empresa, com a tutela do Poder Judiciário, apresenta uma série de medidas preventivas e organizadas em um plano de recuperação, que visa ao reequilíbrio econômico-financeiro do negócio.

As empresas que atravessam crises e se socorrem do instituto da recuperação judicial, via de regra, além dos débitos com outros credores, estão tendo dificuldades em adimplir débitos de natureza tributária. Todavia, como o crédito tributário não está sujeito aos efeitos da recuperação judicial, se instalou um cenário de insegurança e tensão, pois, ao mesmo tempo em que as dívidas de natureza tributária, por não se sujeitarem aos efeitos da recuperação judicial, a efetividade do processo depende em grande medida da concentração da competência para decidir sobre atos que possam impactar de modo significativo o patrimônio (e a capacidade de cumprimento do plano) da devedora no juízo onde se processa a recuperação.

Em 2022, a Lei de Recuperação Judicial passou por algumas mudanças e, entre elas, a criação de câmbio mais eficiente para o adimplemento de créditos tributários. A Lei nº 10.522/02 passou a prever, por exemplo, o aumento do número de parcelas para quitação do ordinário e negócio jurídico processual específico para empresas em recuperação judicial, além de outras medidas, dentre as quais, sem dúvidas, a transação tributária foi a que recebeu mais destaque.

A transação tributária para empresas em recuperação judicial é regulada pela Lei nº 10.522/02 e pela Portaria PGFN nº 2.382/2021, que prevê, para empresas em recuperação judicial, a possibilidade de liquidação de impostos federais em 120 prestações financeiras, além de fundos no valor da multa e juros. Foi prevista, ainda, a hipótese de utilização do benefício fiscal e da base negativa de CSLL ou outros créditos próprios, sem limite de 30% do valor devido, hipótese em que o saldo devedor, após compensações, poderá ser parcelado em até 84 parcelas horizontais.

Na transação, devem ser incluídos todos os débitos, ressalvados aqueles que forem objeto de discussão judicial, os quais poderão ser excluídos mediante apresentação de garantia (que não podem estar incluídos no plano de recuperação judicial), ou com a apresentação de decisão judicial que determine a suspensão da respectiva exigibilidade. Se o contribuinte tiver interesse em incluir esses débitos no parcelamento, deverá comprovar que desistiu das defesas garantidas, tanto na esfera administrativa quanto judicial.

A transação individual se inicia com a apresentação, pelo contribuinte, de uma proposta à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), da qual obrigatório constar o detalhamento do endividamento tributário, a projeção do fluxo de caixa, assim como as premissas de garantia das dívidas.

Aqui, é importante destacar como causas de exclusão da transação tributária, notadamente a falta de pagamento de 06 parcelas consecutivas ou 09 alternadas, a comprovação da realização de atos de esvaziamento patrimonial e decretação de falência. Sobre esse ponto é de se ressaltar que a rescisão da transação, além da possibilidade de ser causa para a retomada da cobrança dos débitos com os respectivos consectários (penhora de bens etc.), permite à Fazenda Nacional requerer a convolação da recuperação judicial em falência (mesmo que o crédito tributário não se submeta aos efeitos de processos de recuperação ou falência).

Das amostras, evidencia-se que a transação individual dispõe de mais vantagens em comparação à transação por adesão, pois possibilita (ao menos em tese) ajustar o fluxo de amortização conforme a capacidade efetiva de pagamento da devedora. A devedora pode, por exemplo, propor um fluxo progressivo de amortização, iniciando-se com parcelas mais baixas que incrementam gradativamente, de modo que a satisfação do passivo fiscal se dê em consonância com o cumprimento do plano de recuperação judicial.

A maior flexibilização no tratamento do endividamento tributário pretendida com a instituição da transação individual torna a Fazenda Pública menos alheia ao processo de recuperação, pressupondo o compartilhamento de premissas econômico-financeiras entre o plano de recuperação judicial e as medidas de garantia da dívida tributária..

Bruna Nunes de Quadros, advogada especializada em Direito Tributário da Cesar Peres Dulac Müller Advogados (CPDMA)