DIREITO DE TERCEIROS
Escola de samba não pode ser proibida de desfilar para pagar dívida

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Proibir escola de samba de desfilar na avenida enquanto não quitar um débito judicial é medida desarrazoada e atípica, pois, além de prejudicar terceiros, participantes do desfile, não contribui para o êxito do processo de execução da dívida.

Desembargador Pedro Luiz Pozza foi o relator
Foto: Imprensa TJ-RS

Por isso, a 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) reformou despacho que condicionou o desfile da escola de samba Imperatriz Dona Leopoldina, no Carnaval 2022 de Porto Alegre, à comprovação de pagamento da dívida com uma prestadora de serviços.

Cumprimento de sentença

Segundo registrou o despacho da 1ª Vara Cível do Foro Regional de Alto Petrópolis, na Comarca da Capital, de 2017 para cá, quando teve início o cumprimento de sentença, a devedora teve inúmeras oportunidades de pagar a dívida – que estava na casa dos R$ 11 mil em janeiro de 2019. Assim, não se constituindo em quantia vultosa, o juízo resolveu aplicar a medida coercitiva, por entender razoável.

‘‘A atividade da devedora são as festas burlescas e não é possível que queira se manter em sua atividade sem o pagamento de seus débitos. Aliás, a origem da dívida é decorrente da prestação de serviços pela credora, relativamente às atividades da executada, o que reforça mais a razoabilidade da medida’’, justificou o juiz Paulo de Tarso Carpena Lopes.

Coerção desarrazoada

Em contestação ao despacho, a escola de samba entrou com agravo de instrumento no TJ-RS, listando uma série de prejuízos que a manutenção da medida acarretaria. Os integrantes da 12ª Câmara Cível, à unanimidade, acolheram o recurso, derrubando a medida.

O relator do agravo, desembargador Pedro Luiz Pozza, afirmou que o juiz pode determinar as medidas de toda espécie que entender necessárias à satisfação do direito da parte que promove a execução da dívida. Entretanto, advertiu, estas medidas têm um limite. Assim, no caso concreto, não se mostra razoável a proibição do desfile – até porque, o evento já havia decorrido dois meses.

‘‘Em sendo assim, impõe-se prover o presente agravo, confirmando a antecipação de tutela deferida’’, decretou o desembargador-relator.

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PATRIMÔNIO CULTURAL
TRF-4 mantém suspensa construção de loja da Havan no Centro Histórico de Blumenau

Desembargador Rogerio Favreto
Foto: Sylvio Sirangelo

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) manteve a suspensão das autorizações federal e estadual e do processo administrativo municipal para a construção de uma unidade da rede de lojas Havan na área do Centro Histórico de Blumenau (SC). A decisão foi proferida pelo desembargador Rogerio Favreto em despacho na última quarta-feira (28/9).

A ação civil pública (ACP) foi ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) contra a empresa Havan S.A., o município de Blumenau, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e a Fundação Catarinense de Cultura (FCC).

Segundo o MPF, o processo tem o objetivo de ‘‘resguardar o patrimônio cultural e histórico constituído por bens tombados, cuja ambiência está ameaçada pela aprovação pelo Iphan e pela FCC e também pela iminente emissão de alvará de construção pelo município de Blumenau de projeto de construção de loja da empresa Havan com perfil arquitetônico incompatível com o entorno da área’’.

Em agosto, o juízo da 1ª Vara Federal de Blumenau concedeu liminar determinando a ‘‘imediata suspensão da validade e da eficácia das autorizações conferidas nas esferas estadual (pela FCC) e federal (pelo Iphan), bem como para sobrestar o trâmite administrativo na esfera municipal (na Secretaria de Planejamento Urbano), assim como de eventuais outros procedimentos em curso ou que venham a ser instaurados, relativamente à construção de unidade da Havan no Centro Histórico de Blumenau’’.

A empresa recorreu ao TRF-4 por meio de agravo de instrumento. Ela requisitou a reforma da decisão, alegando que obteve autorização em todas as esferas competentes do poder público para a construção da loja.

O relator do caso na 3ª Turma do TRF-4, desembargador Rogerio Favreto, negou o pedido de efeito suspensivo, mantendo válida a liminar. Em sua manifestação, ele destacou que ‘‘na hipótese, o Ministério Público Federal demonstra os indícios de diversas irregularidades que importaram nas autorizações concedidas pelo poder público que podem implicar em nulidade dos respectivos atos administrativos’’.

Para Favreto, ‘‘é recomendável a cautela a fim de evitar-se dano ao patrimônio histórico cuja preservação já se impôs pelo tombamento’’.

O magistrado também acrescentou que ‘‘a permanência das autorizações ora impugnadas, enquanto tramita a demanda, poderia implicar prejuízo não só ao patrimônio tombado e ao seu entorno, mas à própria empresa, considerando-se eventual sentença de procedência que obstasse a existência do imóvel comercial no Centro Histórico de Blumenau de significativo porte, tal qual o projeto apresentado, sem as necessárias adequações que porventura viessem a ser reconhecidas judicialmente’’.

A ação segue tramitando em primeira instância e ainda terá o mérito julgado pela Justiça Federal catarinense. (Com informações da Assessoria de Comunicação Social do TRF-4)

Clique aqui para ler a decisão

5012821-46.2022.4.04.7205 (Blumenau-SC)

 

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA
Parcelamento da dívida só é possível com acordo entre credor e devedor

Imprensa STJ

O executado não tem direito subjetivo a parcelamento do débito na fase de cumprimento de sentença, decidiu, por unanimidade, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo o colegiado, tal parcelamento não pode ser concedido nem mesmo pelo juiz, ainda que em caráter excepcional – sendo admitida, todavia, a possibilidade de acordo entre credor e devedor na execução.

Com a decisão, a turma negou provimento ao recurso especial (REsp) de uma empresa que, invocando o princípio da menor onerosidade, buscava o parcelamento de débito no cumprimento de sentença.

O juízo de primeiro grau indeferiu o pedido de parcelamento e determinou a incidência de multa e honorários sobre a parte que foi paga parceladamente. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) negou provimento ao recurso da empresa, por entender que o artigo 916, parágrafo 7º, do Código de Processo Civil (CPC/2015), veda expressamente a aplicação do parcelamento na fase executiva.

Ao STJ, a recorrente alegou que a vedação do CPC/2015 poderia ser mitigada, principalmente na hipótese de processo de recuperação judicial, ao qual ela está submetida.

Vedação do novo CPC não impede transação entre credor e devedor

Marco Aurélio Bellizze foi o relator
Foto: Imprensa STJ

O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, destacou não ser mais aplicável a jurisprudência do STJ que admitia, no cumprimento de sentença, o parcelamento do valor da execução pelo devedor, pois esse entendimento foi formado à luz do CPC de 1973.

O magistrado apontou que, com a entrada em vigor do novo CPC, o parcelamento do débito na execução de título judicial foi expressamente vedado, com a ressalva de que credor e devedor podem transacionar em sentido diverso da lei, em virtude da natureza de direito patrimonial disponível.

Menor onerosidade pressupõe outros meios executivos igualmente eficazes

Bellizze argumentou que o princípio da menor onerosidade ao devedor constitui exceção à regra, segundo a qual o processo executivo visa, principalmente, a satisfação do crédito, devendo ser promovido no interesse do credor. O relator enfatizou que a aplicação do princípio, destinado a evitar conduta abusiva por parte do credor, pressupõe a possibilidade de processamento da execução por vários meios igualmente eficazes (artigo 805 do CPC).

O relator apontou que, no caso dos autos, a admissão do parcelamento traria como consequências a não incidência da multa e dos honorários decorrentes do não pagamento voluntário e a imposição, ao credor, de maior demora para receber o seu crédito, depois de já ter suportado todo o tempo da tramitação do processo na fase de conhecimento.

Ao negar provimento ao recurso especial, Bellizze concluiu que ficou evidente ‘‘a inexistência de meios igualmente eficazes’’, o que impossibilita a incidência do princípio da menor onerosidade.

Leia o acórdão no REsp 1.891.577-MG

HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA
Decreto centenário viabiliza redirecionamento da execução contra sócios de massa falida

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O artigo 10 do Decreto 3.708/1919, que regula a constituição de sociedades por quotas, de responsabilidade limitada, diz, literalmente: ‘‘Os socios gerentes ou que derem o nome á firma não respondem pessoalmente pelas obrigações contrahidas em nome da sociedade, mas respondem para com esta e para com terceiros solidaria e illimitadamente pelo excesso de mandato e pelos actos praticados com violação do contracto ou da lei’’.

Sacado do ‘‘fundo do baú’’, sem perder a atualidade, o dispositivo foi fundamental para a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) reformar sentença que negou o redirecionamento da cobrança de honorários de sucumbência a um dos sócios da Massa Falida de Vigilância Borges Ltda. Afinal, seu uso permitiu alcançar os sócios da empresa falida.

‘‘Embora inaplicáveis as disposições do Código Tributário Nacional ao cumprimento de sentença relativo a honorários advocatícios, visto dizerem respeito somente às execuções fiscais de dívidas tributárias ou não-tributárias, certo que não está afastada a possibilidade de redirecionamento em virtude do disposto no art. 10 do Decreto n.° 3.708/1919, o qual prevê a responsabilização pessoal dos sócios de sociedades por quotas de responsabilidade limitada quando presentes as condutas ali previstas’’, estampou o acórdão.

A cobrança, em execução de sentença, foi proposta pela União (Fazenda Nacional), sucessora do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O valor: R$ 1,5 mil.

Vara negou o redirecionamento da execução

A 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Bento Gonçalves (RS) extinguiu o processo, sem julgamento de mérito, por entender que houve ‘‘perda de objeto’’. É que o sindico informou que os valores arrecadados na massa falida já haviam sido distribuídos entre os credores trabalhistas. Além disso, o inquérito judicial para apuração de crimes falimentares dos sócios havia sido arquivado, em face da extinção da punibilidade pela prescrição. Essa condição, por si só, segundo o juízo, já impediria o redirecionamento da execução contra a pessoa do sócio. Em síntese, diante da certeza de inexistência de valores, não haveria a possibilidade do prosseguimento da execução contra o corresponsável legal da empresa.

‘‘Ademais, a responsabilização de sócio-gerente deve ocorrer mediante a instauração de Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, previsto no artigo 133 do CPC, a fim de que reste comprovada a dissolução irregular da empresa com o intuito de fraudar credores ou desviar bens, ou a prática de atos de abuso de gestão ou de violação à lei ou contrato/estatuto’’, arrematou o juiz federal substituto Eduardo Kahler Ribeiro na sentença.

2ª Turma deu provimento à apelação da União

Desembargadora Maria de Fátima foi a relatora
Foto: Sylvio Sirangelo/TRF-4

Os desembargadores da 2ª Turma do TRF-4, no entanto, observaram que os sócios da falida foram denunciados pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MP-RS) como incursos nas sanções do artigo 186, inciso VI, do Decreto-Lei 7.661/45, combinado com o artigo 29 do Código Penal (CP), dada a manutenção de livros contábeis obrigatórios com escrituração atrasada, lacunosa e confusa. Inclusive com a apresentação de dois livros idênticos para o mesmo período.

‘‘Portanto, inegável a presença de fortes indícios da prática delitiva, motivo pelo qual cabe reconhecer o preenchimento de uma das hipóteses previstas no art. 10 do Decreto n.° 3.708/19 (existência de atos praticados com violação da lei), ainda que posteriormente extinta a punibilidade em decorrência da prescrição (evento 2/pet31, p. 5), haja vista a independência das esferas’’, cravou no acórdão a desembargadora Maria de Fátima Freitas Labarrère, acolhendo a apelação da União.

Com a decisão do colegiado, à unanimidade, o processo retornou à vara de origem para o regular prosseguimento da execução, redirecionando-a, agora, contra os sócios da Massa Falida de Vigilância Borges Ltda.

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5001621-66.2018.4.04.7113 (Bento Gonçalves-RS)

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BATE-BOCA
Banco deverá indenizar recepcionista que sofreu injúria racial de cliente

Secom TST

A Caixa Econômica Federal (CEF) deverá pagar indenização de R$ 20 mil à recepcionista de uma agência bancária de Florianópolis (SC) que foi vítima de injúria racial cometida por uma cliente. A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) rejeitou o recurso da empresa, que buscava alterar a condenação, ao levar em conta que as condições de trabalho propiciaram a situação. A decisão foi unânime.

Injúria racial 

A recepcionista, contratada por uma prestadora de serviços, auxiliava no autoatendimento, prestava informações e distribuía senhas ao público. Ela relatou na reclamação trabalhista que a agência em que trabalhava atendia um grande público, na maioria formado por beneficiários de programas sociais, e que passava por diversas situações estressantes, inclusive de discriminação racial.

Os problemas, segundo ela, foram informados ao seu supervisor, mas nenhuma providência chegou a ser tomada. Em 18 de março de 2018, uma cliente se exaltou e passou a ofendê-la com palavras de baixo calão e injúrias raciais. A situação levou a recepcionista a se afastar, em razão do abalo emocional. Uma semana após retornar ao trabalho, ela foi dispensada.

Danos morais

A empregada, então, ingressou com a reclamação trabalhista para reivindicar o pagamento de indenização por danos morais. Em sua defesa, a Caixa argumentou que não poderia ser responsabilizada, já que a injúria racial foi cometida por terceiro, sobre o qual não tinha nenhum controle.

Condições de trabalho

O juízo da 5ª Vara do Trabalho de Florianópolis considerou que as condições de trabalho da agência favoreceram o ato de injúria racial. Para a Justiça, ficou comprovado que o número de empregados da agência era insuficiente para responder à demanda do público, o que gerava insatisfação nos clientes. Além disso, discussões e até ofensas de clientes eram habituais no estabelecimento.

Ainda de acordo com a sentença, o empregador, embora não tenha total controle sobre as condutas dos clientes, tem o dever de tomar medidas para que situações desse tipo sejam evitadas, como providenciar número adequado de funcionários e fazer campanhas de conscientização para estimular o respeito entre clientes e atendentes.

Imagem

Ministro Augusto César foi o relator
Foto: Secom TST

A Caixa recorreu, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina) manteve a decisão. Segundo o TRT, o patrimônio jurídico da pessoa não é formado apenas pelos bens materiais e economicamente mensuráveis, mas também pela imagem que ela projeta no grupo social. Se esse patrimônio é atingido por ato de terceiro, o responsável pelo dano tem a obrigação de repará-lo ou, ao menos, de minimizar seus efeitos.

Ambiente propício

Para o relator do agravo de instrumento da Caixa, ministro Augusto César, ficaram evidentes a caracterização de culpa, dano e nexo causal que fundamentaram a condenação. Segundo ele, está registrado na decisão do TRT que o banco proporcionou um ambiente de trabalho propício ao ocorrido, uma vez que a agência precisava de mais funcionários em decorrência do perfil dos clientes, que exigiam maior dedicação e mais tempo para auxílio, suporte e assistência.

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AIRR-462-61.2018.5.12.0035