AÇÃO REVISIONAL
Prescrição anterior à coexistência de dívidas impede sua compensação

Foto-Arte: Marcello Benevides Advogado

Uma dívida não pode ser objeto de compensação caso a sua prescrição tenha se consumado antes da coexistência com outra que deveria ser compensada. A conclusão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao manter acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR).

De acordo com os autos, foi ajuizada ação revisional de conta- corrente, com pedido de repetição de indébito, contra um banco que teria cobrado juros, taxas e tarifas indevidamente, além de praticar ‘‘venda casada’’ de produto financeiro.

Iniciado o cumprimento de sentença, o banco apresentou impugnação e aventou a possibilidade de compensação de parcela do valor devido com créditos que possuiria perante a autora da ação. O juízo rejeitou a impugnação e afastou a compensação, sob o fundamento de que os créditos da instituição financeira já estariam prescritos. O tribunal local manteve a decisão.

No recurso especial (REsp) dirigido ao STJ, o banco argumentou que a prescrição não atinge o direito em si, razão pela qual não impediria a compensação.

Exigibilidade dos créditos deve existir ao mesmo tempo

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Imprensa/TSE

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, afirmou que, de acordo com o artigo 368 do Código Civil, há a hipótese de compensação de créditos caso as partes envolvidas sejam credoras e devedoras uma da outra concomitantemente.

Para tanto, a ministra lembrou que é necessário que os créditos sejam exigíveis ao mesmo tempo, caso contrário, não poderão ser compensados. ‘‘A compensação é direito formativo extintivo e, no Direito brasileiro, opera por força de lei no momento da coexistência das dívidas’’, complementou.

A relatora comentou que, para as dívidas serem compensáveis, o artigo 369 do Código Civil exige que sejam líquidas, vencidas e de coisas fungíveis, mas a doutrina considera que o legislador deveria ter feito menção a ‘‘exigíveis’’ em vez de ‘‘vencidas’’, pois não pode ser considerado exigível pela compensação um débito não exigível para pagamento.

Doutrina admite hipótese de compensação de débito prescrito

Por outro lado, ainda com apoio na doutrina, Nancy Andrighi ressalvou que a prescrição somente obstará a compensação se ela for anterior ao momento da coexistência das dívidas. ‘‘Se o prazo prescricional se completou posteriormente a esse fato, a prescrição não constitui empecilho à compensação dos débitos.’’

No caso em julgamento, a ministra observou que a prescrição do crédito da instituição financeira ocorreu em 2008, quando a sua dívida com o autor da ação revisional ainda não gozava do requisito da liquidez, pois tal ação só viria a ser ajuizada em 2011.

‘‘Conclui-se que, na oportunidade em que o crédito da parte autora se tornou líquido, a pretensão do banco recorrente já estava prescrita, não havendo que se falar em compensação’’, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.007.141

DEPRESSÃO NO TRABALHO
Natureza ocupacional deve ser examinada com base em nexo técnico reconhecido pelo INSS

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) determinou que o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9, Paraná) reexamine a alegação de uma atendente da Electrolux do Brasil S.A. de que o seu quadro depressivo decorre das condições de trabalho.

Mesmo após a questão ter sido levantada por ela no processo, o TRT paranaense não se manifestou sobre o argumento de que o reconhecimento do Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP) pela perícia médica do INSS permite presumir que a doença tem natureza acidentária, cabendo à empresa fazer prova em contrário.

Depressão

Na reclamatória trabalhista, a atendente sustentou que o supervisor praticava assédio moral, tratando-a de maneira agressiva, com ironias e questionamentos sobre sua competência. Esta teria sido, segundo ela, a causa da depressão – que a levou ao afastamento por auxílio-doença acidentário. Seu argumento era o de que a doença se equipararia a acidente de trabalho.

Sem comprovação

O juízo de primeiro grau deferiu indenização de R$ 5 mil, mas o TRT excluiu a condenação, afirmando que ela não havia comprovado o nexo de causalidade entre o trabalho e a doença.

Para o TRT, a decisão do INSS pelo afastamento na modalidade auxílio acidentário não prova a origem ocupacional da doença, e não foi feita perícia médica no processo. Com isso, concluiu que a empregada não havia comprovado o direito pretendido.

Ônus da prova

Em novo recurso (embargos de declaração), a atendente buscou manifestação do TRT sobre a questão do ônus da prova com base na lei que estabeleceu o nexo epidemiológico. O NTEP é uma ferramenta usada pela perícia médica do INSS para identificar doenças ou acidentes relacionados estatisticamente a uma atividade profissional específica, cruzando automaticamente os códigos da CID 10 e da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE). Os embargos, contudo, foram rejeitados.

Nulidade

Ministro Alberto Balazeiro foi o relator
Foto: Secom/TST

No recurso de revista (RR) aviado no TST, ela apontou a chamada negativa de prestação jurisdicional, ou omissão do julgador em relação a questionamentos de uma das partes – no caso, o ônus da prova. Segundo o seu argumento, as provas apresentadas haviam atestado o nexo de causalidade entre a doença e o trabalho, tanto que motivaram o recebimento de benefício previdenciário.

Presunção

Para o relator, ministro Alberto Balazeiro, o reconhecimento do nexo técnico epidemiológico pela perícia médica do INSS gera presunção relativa de que a doença tem relação com o trabalho desempenhado. Por isso, seria imprescindível a manifestação do TRT especificamente sobre esse aspecto, o que não ocorreu.

O ministro José Roberto Freire Pimenta concordou que a omissão influenciou o resultado do julgamento, uma vez que a presunção relativa inverte o ônus da prova, que passa a ser da empresa.

Conclusão

Nesse contexto, a Terceira Turma do TST proveu o recurso de revista da empregada para declarar a nulidade da decisão do TRT e determinar o retorno dos autos para apreciação dos embargos de declaração sobre a matéria.

A decisão do colegiado foi unânime. Com informações de Bruno Vilar, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

Clique aqui para ler o acórdão

RR-1203-45.2018.5.09.0016

TEORIA DA IMPREVISÃO
STJ mantém revisão de contrato entre banco e empresa impedida de operar na pandemia

Com base nas teorias da imprevisão e da onerosidade excessiva, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão que determinou a revisão do contrato entre o Banco Safra e uma agência de viagens de ônibus, que teve suas atividades paralisadas em virtude da pandemia de Covid-19. Na avaliação da Terceira Turma, a readequação do contrato é necessária para preservar o seu equilíbrio econômico-financeiro diante da queda abrupta e temporária de faturamento naquele período.

Apesar de confirmar a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a turma afastou a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao caso, por entender que este não regula os contratos de mútuo para fomento da atividade empresarial.

A empresa, em decorrência dos decretos que suspenderam o transporte intermunicipal, ajuizou ação contra o banco, pedindo a prorrogação do vencimento das cédulas de crédito bancário (CCBs) emitidas durante a pandemia. As instâncias ordinárias determinaram a prorrogação das parcelas vencidas. O TJSP, ao manter a sentença, invocou o CDC para justificar a modificação de cláusulas contratuais.

CDC não se aplica a empréstimos para fomento de atividade empresarial

A relatora do recurso do banco no STJ, ministra Nancy Andrighi, afastou a aplicação do CDC. ‘‘Nos termos da jurisprudência do STJ, é inaplicável o diploma consumerista [CDC] na contratação de negócios jurídicos e empréstimos para fomento da atividade empresarial, uma vez que a contratante não é considerada destinatária final do serviço’’, observou.

Ministra Nancy Andrighi                                                       Foto: Agência CNJ

Nancy Andrighi afirmou que, embora a definição de consumidor englobe não apenas os destinatários finais de produto e serviço, mas também aqueles que comprovem vulnerabilidade técnica, jurídica, fática ou informacional, a aplicação do CDC só é cabível nessa segunda hipótese quando ficar efetivamente demonstrada a vulnerabilidade frente ao fornecedor.

Efeitos decorrentes da pandemia podem motivar revisão contratual

Apesar da inaplicabilidade do CDC, a relatora destacou que as instâncias ordinárias demonstraram a possibilidade de revisão contratual com base nas teorias da imprevisão e da onerosidade excessiva, previstas nos artigos 317 e 478 do Código Civil.

Segundo a ministra, a paralisação das operações de transporte gerou perda abrupta de renda para a empresa, ‘‘tornando a prestação ajustada no contrato, ainda que temporariamente, excessivamente prejudicial à sua saúde financeira e econômica’’, com risco até mesmo de levá-la à falência.

Nancy Andrighi lembrou que, para a jurisprudência do STJ, a pandemia configura evento imprevisível e extraordinário, suficiente para, em tese, a partir das teorias citadas, permitir a revisão contratual.

‘‘Nessa linha de raciocínio, permitiu-se a revisão proporcional de aluguel em razão das consequências particulares da pandemia da Covid-19 em relação a empresa de coworking, cujo faturamento foi drasticamente reduzido no período’’, exemplificou.

Empresa teve atividades interrompidas por determinação do poder público

A relatora comentou ainda que as rotas operadas pela empresa de transporte intermunicipal foram suspensas e que suas atividades foram impedidas por determinação do poder público.

‘‘A manutenção de cobrança de prestações mutuárias, nos moldes do originariamente pactuado para fomentar atividade que foi paralisada no período pandêmico, mostra-se excessivamente onerosa, devendo-se revisar o contrato para preservar o seu equilíbrio’’, concluiu a relatora ao negar provimento ao recurso especial. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.070.354

VALORIZAÇÃO DO CONTEXTO
Supremo cassa decisão da Justiça do Trabalho que liberou passaporte de devedores

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou decisão que havia determinado a devolução de passaportes de empresários condenados a pagar dívida trabalhista de quase R$ 30 mil. O ministro atendeu o pedido da trabalhadora beneficiária do crédito na Reclamação (RCL) 61122.

Dívida

A empresa de material elétrico, localizada no Distrito Federal, fechou as portas em 2017 sem rescindir o contrato de trabalho com a então funcionária. Após a condenação ao pagamento das verbas indenizatórias, os donos não quitaram a dívida e, por isso, em 2020, seus passaportes foram apreendidos por decisão da primeira instância da Justiça trabalhista.

Entretanto, em sede de recurso, os documentos foram liberados em abril de 2023 pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10).

Medidas coercitivas

Ministro Alexandre de Moraes
Foto: Banco de Imagens/STF

Na Reclamação, a trabalhadora alegou que a liberação contrariava a decisão do STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5941 que validou dispositivo do Código de Processo Civil (artigo 139, inciso IV), que autoriza o juiz a determinar medidas coercitivas necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, como a apreensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e de passaporte.

A reclamante argumentou, ainda, que o próprio governo do Distrito Federal, em ação de execução fiscal, havia requerido o reconhecimento de fraude, informando vendas de imóveis que ultrapassam R$ 3 milhões.

Medida adequada

Em sua decisão, o ministro Alexandre de Moraes explicou que o novo Código de Processo Civil ampliou as hipóteses para a adoção de medidas coercitivas para solucionar a demora no cumprimento das decisões judiciais.

‘‘É o contexto fático que vai nortear o julgador na escolha na medida mais adequada e apta a incentivar o cumprimento da obrigação pelo devedor’’, ressaltou.

No caso, o ministro verificou que a conclusão do TRT-10 partiu da premissa genérica de ofensa ao direito de locomoção, sem considerar o contexto do processo, em que foi reconhecida fraude à execução em razão da venda de bens após as condenações na Justiça do Trabalho. Assim, concluiu que o ato contrariou as diretrizes fixadas no julgamento da ADI 5941.

Ao cassar a determinação do TRT-10, o relator determinou que outra decisão seja tomada com base no julgamento do STF. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Leia aqui a íntegra da decisão

RCL 61122

EXECUÇÃO PREFERENCIAL
Sem alienação, credor pode pedir adjudicação do bem penhorado a qualquer tempo

Reprodução Portal.Loft.Com.Br

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão unânime, definiu que o direito de requerer a adjudicação de um bem penhorado, previsto no artigo 876 do Código de Processo Civil (CPC), não se sujeita à preclusão enquanto ele não tiver sido alienado. Assim, nas execuções judiciais, a adjudicação não tem prazo para ser realizada, contanto que ainda não tenha havido outra forma de expropriação do bem, como o leilão.

O entendimento foi adotado no curso da execução de garantias hipotecárias proposta por uma fabricante de bebidas contra duas outras pessoas jurídicas. Quando já iniciados os trâmites para o leilão judicial, a exequente – que não manifestara esse interesse antes – requereu a adjudicação de dois imóveis das devedoras, pedido que foi acolhido pelo juízo de primeira instância em decisão mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

Em recurso especial (REsp) ao STJ, as partes executadas sustentaram que o direito à adjudicação estaria precluso, pois já havia sido iniciada a fase do leilão. Argumentaram, também, que as locatárias dos imóveis, sociedades em recuperação judicial, não foram intimadas para poder exercer o seu direito de preferência.

Prioridade à adjudicação justifica ausência de limite temporal

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Pedro França/Agência Senado

De acordo com a relatora do REsp, ministra Nancy Andrighi, a adjudicação é uma técnica de execução preferencial, que viabiliza de forma mais rápida o direito do exequente. Por isso, não está sujeita a um prazo preclusivo, podendo ser requerida a qualquer momento até a alienação do bem.

Para a ministra, mesmo que o artigo 878 do CPC diga que a oportunidade para pedir a adjudicação será ‘‘reaberta’’ se as tentativas de alienação forem frustradas, ‘‘isso não significa que essa alternativa colocada à disposição do credor se fecha se não exercida imediatamente após realizada a avaliação do bem penhorado’’.

No entendimento da relatora, esse é a interpretação mais condizente com a prioridade que a lei dá à adjudicação e com a ideia de que a execução se processa no interesse do credor.

Direito exercido tardiamente pode implicar pagamento de despesas

Nancy Andrighi apontou, porém, que a manifestação tardia do interesse pela adjudicação, quando já tiverem sido iniciados os atos preparatórios para a alienação, pode fazer com que o adjudicante tenha de suportar eventuais despesas realizadas até esse momento – como decidido pela Quarta Turma (REsp 1.505.399) em julgamento sobre o mesmo tema.

Quanto à situação das locatárias do imóvel adjudicado, a ministra comentou que a preferência para aquisição prevista na Lei do Inquilinato não se estende aos casos de perda da propriedade ou de venda judicial, e que o fato de estarem em recuperação tampouco impede a adjudicação, não havendo necessidade de sua intimação. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.041.861