EMBARGOS À EXECUÇÃO
Royalty não integra o valor aduaneiro na importação de borracha natural, diz TRF-4

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) entende que o pagamento de royalty não constitui ‘‘condição de venda’’ da exportação de matérias-primas, principalmente borracha natural, mas uma exigência para utilização da tecnologia transferida pela concedente para a fabricação e comercialização de pneus no território brasileiro. Dessa forma, o pagamento não deve ser acrescido ao valor aduaneiro na Declaração de Importação (DI) desta matéria-prima.

Assim, a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em reforma de sentença, julgou procedentes os embargos à execução manejados pela Pirelli Pneus Ltda em face da Fazenda Nacional (União), extinguindo, no efeito prático, dívida fiscal estimada em R$ 4,6 milhões a uma década atrás.

‘‘Condição de venda’’

A execução fiscal visava à cobrança de Imposto de Importação, Imposto sobre Produtos Industrializados, PIS-Importação e Cofins-Importação sobre os valores pagos a título de royalties e direitos de licença, no valor aduaneiro, dos insumos importados de empresas vinculadas à Pirelli no exterior e não recolhidos entre dezembro de 2011 a dezembro de 2012.

Para o colegiado, a ‘‘condição de venda’’ prevista na alínea ‘‘c’’, parágrafo 1º, artigo 8º, do Acordo de Valoração Aduaneira (AVA-GATT), é requisito sine qua non para que ocorra o acréscimo de royalties no valor de transação da mercadoria importada. Aliás, a nota explicativa deste artigo diz ser inadequado ‘‘tentar proceder a um acréscimo relativo ao royalty quando este não se basear somente nas mercadorias importadas e não puder ser facilmente quantificado’’.

Práticas de valoração aduaneira

Leandro Paulsen foi o relator da apelação
Foto: Sylvio Sirangelo

No caso dos autos, ante a inexistência de um contrato prevendo ‘‘expressa condição de venda’’ e considerando cláusula que exclui o valor da mercadoria importada da base de cálculo dos royalties devidos, a inclusão de tais parcelas no valor de transação, em procedimento administrativo-fiscal, deve observar os princípios do AVA dispostos em sua introdução geral. E estes apontam para práticas de valoração aduaneira pautadas na neutralidade, equidade e simplicidade – diretrizes incompatíveis com a fixação de valores fictícios ou arbitrários pelas administrações aduaneiras.

‘‘No caso concreto, a metodologia criada pelo fisco, com fórmulas próprias fracionadas em várias etapas, para possibilitar a inclusão dos royalties no valor de transação do insumo importado, não foi simples. Embora relate ter adotado, como ponto de partida, elementos objetivos fornecidos pelo próprio contribuinte, a complexa metodologia de cálculo, que teria legitimado o ajuste do valor aduaneiro, resultando nas diferenças tributárias e penalidades objeto da execução fiscal embargada, foi criada pela própria exequente, em aparente colisão com os princípios de valoração elencados na introdução geral do AVA’’, registrou o acórdão de apelação o desembargador-relator Leandro Paulsen.

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

5008077-96.2017.4.04.7200-SC (Florianópolis)

AJUDE A EXPANDIR NOSSO PROJETO EDITORIAL.
DOE ATRAVÉS DA CHAVE PIX E-MAIL
:
 jomar@painelderiscos.com.br

DANOS MORAIS
Empregador que informa motivo da demissão por justa causa a terceiros viola direitos de personalidade

Imprensa/TRT-SP

A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) manteve condenação, por danos morais, de uma empresa de serviços de portaria e limpeza de Guarulhos (SP) que informava a qualquer interessado sobre a justa causa aplicada a um ex-empregado. Além de ser obrigada a pagar indenização, no valor de R$ 4 mil, a companhia foi proibida de prestar informações quanto à forma de dispensa do trabalhador.

O rapaz exercia a função de controlador de acesso e alega ter sofrido desligamento arbitrário por justa causa. Após ajuizar reclamação trabalhista, as partes se conciliaram em audiência.

No entanto, o ex-empregado enfrentou dificuldades ao tentar se recolocar no mercado. Chegou a ser aprovado em vários processos seletivos, mas foi rejeitado após os contratantes buscarem referências junto ao antigo empregador, quando foram informados da dispensa por falta grave do profissional.

Contato telefônico

O trabalhador pediu, então, que sua esposa ligasse para a empresa onde atuou, simulando interesse na contratação dele para um novo emprego. Ao questionar sobre a rescisão contratual em duas ocasiões, ela também foi informada da justa causa.

A ligação telefônica foi gravada, e o material, anexado aos autos. Para o funcionário, são evidentes os impactos causados em sua vida profissional e social, atingindo sua imagem e honra – direitos de personalidade assegurados no artigo, inciso X, da Constituição.

Em defesa, a companhia nega a alegação de dispensa arbitrária do trabalhador, afirmando ter cumprido a aplicação gradativa de penas disciplinares até chegar à justa causa. Afirma que não divulga publicamente informações sobre seus ex-empregados e acusa o rapaz de usar provas ilícitas, com quebra de sigilo telefônico.

Informações desabonadoras a qualquer pessoa

Desembargadora Ivani Contini Bramante
Foto: Márcia Yamamoto/ALESP

No acórdão, de relatoria da desembargadora Ivani Contini Bramante, os magistrados afirmam que o caso não configura interceptação telefônica, pois não houve ato de terceiro que tenha violado a comunicação das partes.

‘‘Evidenciado nos autos que a reclamada divulga, a qualquer pessoa que entre em contato telefônico, que o reclamante foi dispensado por justa causa, o que pode gerar inegável dificuldade para retorno ao mercado de trabalho, bem como gera clara ofensa à honra do trabalhador’’, constata a desembargadora-relatora.

Com base na Constituição Federal (CF), no Código de Processo Civil (CPC) e na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a decisão esclarece: ‘‘O ordenamento jurídico brasileiro, portanto, seja no âmbito constitucional, seja nas normas infraconstitucionais, protege o sigilo de dados e os direitos da personalidade, o que não impede, entretanto, a utilização de informações obtidas por meios eletrônicos para efeito de provas de fatos, observados, obviamente, os limites constitucionais e legais estabelecidos’’.

A Turma manteve a condenação do empregador em R$ 4 mil por danos morais, além de fixar multa de R$ 500,00 para cada informação desabonadora prestada sobre o profissional pelo ex-empregador.

Clique aqui para ler a sentença

Clique aqui para ler o acórdão

1000092-94.2020.5.02.0319 (Guarulhos-SP)

CAÇA AO CLIENTE
Marca alheia em link patrocinado do Google é concorrência desleal, diz STJ

Imprensa STJ

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu concorrência desleal na conduta de uma empresa anunciante na internet que utilizou a marca registrada de concorrente como palavra-chave no sistema de links patrocinados do Google. O objetivo da manobra era conseguir resultados privilegiados nas buscas e direcionar clientes para os seus serviços.

Ao analisar a questão inédita na corte, o colegiado manteve o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que condenou a anunciante a pagar danos morais de R$ 10 mil.

‘‘Além da flagrante utilização indevida de nome empresarial e marca alheia, a utilização de links patrocinados, na forma como engendrada pela ora recorrente, é conduta reprimida pelo artigo 195, incisos III e V, da Lei de Propriedade Industrial, e pelo artigo 10 bis da Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial’’, afirmou o relator do recurso especial  (REsp), ministro Luís Felipe Salomão.

No sistema de links patrocinados, a empresa que paga pelo serviço tem o endereço de seu site exibido com destaque nos resultados das pesquisas sempre que o internauta busca por determinadas palavras-chaves.

Para anunciante, desvio de clientela seria normal na livre concorrência 

Na origem do processo, a ação foi proposta por uma empresa de turismo cujo principal produto é a promoção de viagens à Disney. Segundo a empresa, ela era detentora de todos os direitos relativos à sua marca, porém, quando um usuário pesquisava no Google usando o seu nome como palavra-chave, o buscador mostrava como primeiro resultado a página de outra empresa – prestadora do mesmo tipo de serviço.

Em primeira instância, o juízo reconheceu o uso indevido da marca da autora para prática de concorrência desleal e fixou a indenização por danos morais em R$ 15 mil, valor reduzido para R$ 10 mil pelo TJ-SP.

No RESp, a empresa ré alegou que a captação de clientela é inerente a qualquer atividade econômica, especialmente no âmbito do e-commerce. Para a empresa, considerar reprimível qualquer desvio de clientela implicaria a eliminação da própria livre concorrência.

Sistema de patrocínio é lícito, mas deve respeitar propriedade intelectual

Ministro Luís Felipe Salomão
Foto: Roberto Jayme/Ascom/TSE

O ministro Luís Felipe Salomão lembrou que o artigo 195 da Lei de Propriedade Industrial (LPI) prevê como crime de concorrência desleal, entre outras condutas, o emprego de meio fraudulento para desviar, em proveito próprio ou alheio, os clientes de outra empresa.

No âmbito do sistema de links patrocinados – um dos ferramentais mais importantes do e-commerce –, o ministro comentou que, embora seja lícita a contratação do serviço de priorização de resultados de pesquisa, a inexistência de parâmetros ou proibições de palavras-chaves nas ações publicitárias pode resultar em conflitos relacionados à propriedade intelectual.

No caso dos autos, Salomão considerou que a utilização de marca de outra empresa como palavra-chave para direcionar o consumidor do produto ou serviço concorrente é, como entendeu o TJSP, capaz de causar confusão quanto à atividade exercida por ambas as empresas.

‘‘O estímulo à livre iniciativa, dentro ou fora da rede mundial de computadores, deve conhecer limites, sendo inconcebível reconhecer lícita conduta que cause confusão ou associação proposital à marca de terceiro atuante no mesmo nicho de mercado’’, concluiu o ministro ao manter a indenização fixada pelo TJ-SP.

REsp 1937989-SP

ACÚMULO DE DÍVIDAS
Philip Morris não indenizará distribuidor de cigarros por rompimento de contrato, decide TJ-SP

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: CNN

Não há necessidade de perícia contábil para aferir os prejuízos suportados por uma empresa que perdeu o contrato de distribuição, por investimentos feitos em fundo de comércio ou lucros cessantes, se a rescisão contratual que deu ensejo à ação indenizatória ocorreu sem abuso de direito, de forma motivada e com previsão na própria minuta contratual entabulada entre as partes.

Por isso, a 21ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) negou apelação de uma distribuidora de cigarros que teve o contrato rompido pela Philip Morris após quase meio século de parceria comercial. A empresa parceira queria ser indenizada pelo ‘‘abrupto rompimento’’, mas a multinacional provou nos autos que a rescisão era justificável, o que a dispensaria de dar o aviso prévio para a denúncia do ajuste.

O relator da apelação, desembargador Paulo Alcides Amaral Salles, lembrou que no ajuste contratual realizado em 1999 consta a ‘‘expressa possibilidade’’ de desfazimento do negócio se o contratado atrasar o pagamento de quaisquer compras realizadas junto à contratante. Os sucessivos aditamentos não alteraram esta exigência.

Para Salles, o inadimplemento contratual da parte apelante é incontestável, dado os diversos atrasos no pagamento das mercadorias adquiridas. ‘‘Embora a recorrente [Distribuidora Reis] afirme que o último instrumento de confissão de dívida, assinado em 07/08/2015, ainda estava no prazo para pagamento, os outros débitos já estavam há muito vencidos e foram esses que ensejaram a ruptura do contrato’’, escreveu no acórdão.

Contrato atípico

Ao concluir o voto, o desembargador-relator esclareceu que a distribuição por intermediação é um contrato atípico. Por isso, os direitos e deveres das partes são os expressamente previstos no ajuste. No presente contrato, pontuou, não há estipulação específica sobre a indenização pela clientela em caso de extinção da relação por justa causa.

‘‘Ademais, os gastos com a constituição do fundo de comércio e captação de clientela são inerentes à relação de distribuição e devem ser compreendidos como parte do risco do negócio, não podendo ser imputado ao distribuído’’, encerrou, confirmando o teor da sentença.

Rescisão unilateral

Após ter aberto e consolidado mais de 6.500 pontos de venda nos Estados de Goiás, Tocantins e Distrito Federal, a Distribuidora de Cigarros Reis, sediada em Brasília, foi à Justiça pleitear indenização da Philip Morris, que pediu resilição abrupta do contrato de distribuição por intermediação em 2015, pondo fim a 46 anos de relacionamento comercial. Nesta modalidade, o empresário (distribuidor) assume, perante o outro (distribuído), a obrigação de criar, consolidar ou ampliar o mercado dos produtos deste último, comprando-os para revender. O ajuste foi firmado por prazo indeterminado e sem exclusividade.

Na petição, a Distribuidora Reis denunciou que a Philip Morris desrespeitou o prazo de 90 dias, livremente acordado, para implementar a resilição, obrigando-a a encerrar as suas atividades em seis dias. Esse prazo exíguo gerou graves prejuízos, impactando no manejo da frota de veículos distribuidores, questões trabalhistas, dentre outras.

Assim, por infringir a ordem econômica, entende que a ré deve indenizá-la por todo este fundo de comércio e pelos lucros cessantes, tendo em vista as disposições do artigo 36, parágrafo 3º, incisos III e IV, da Lei 12.529/2011.

A Philip Morris se defende

Citada pela 2ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem, do Foro Central Cível da Comarca de São Paulo, a ré alegou que a cláusula apontada como fundamento não estava em vigência. Além disso, a autora violou a boa-fé objetiva ao reclamar sobre o prazo de 90 dias para resilição depois de três anos da rescisão contratual.

A multinacional também sustentou a existência de justa causa para a resilição contratual, o que a exime de qualquer obrigação de indenizar, conforme autoriza o artigo 715 do Código Civil (CC): ‘‘O agente ou distribuidor tem direito à indenização se o proponente, sem justa causa, cessar o atendimento das propostas ou reduzi-lo tanto que se torna antieconômica a continuação do contrato’’.

Sentença improcedente

O juízo da 2ª Vara julgou a ação indenizatória improcedente, por entender que no contrato entabulado em 1989 – usado como paradigma pela parte autora – havia cláusula dispondo sobre a possibilidade de rescisão motivada a qualquer tempo, em interpretação contrario sensu. No efeito prático, o contrato poderia ser rescindido sem justa causa por qualquer das partes, a qualquer tempo, mediante aviso prévio por escrito de 90 dias.

‘‘É evidente, portanto, que, havendo justa causa, não haveria a necessidade de aviso prévio de 90 dias, seja no contrato de 1989, seja nos posteriores; neste caso, havendo apenas a disposição expressa dos casos de justa causa para esclarecer a sistemática da resolução contratual sem a necessidade de denúncia ou de aviso prévio’’, esclareceu o juiz Luís Felipe Ferrari Debendi.

Conforme o julgador, a questão do descumprimento do aviso prévio pela parte ré ou de eventual conduta abusiva depende da verificação da existência ou não de justa causa para a rescisão contratual.

Sucessão de inadimplementos

Nesse sentido, em que pese a argumentação da Distribuidora Reis, alertou, os autos trazem ‘‘robusta comprovação’’ de que a extinção do contrato ocorreu por uma sucessão de inadimplementos, que se arrastou por mais de um ano, com instrumentos de confissão de dívida e diversos aditivos com prorrogações.

‘‘Inclusive tal fato já era de pleno conhecimento da autora, conforme se verifica nos e-mails de tratativas das confissões de dívida, nos quais restou bem claro que o motivo da rescisão contratual foi o inadimplemento da autora, que, por sua vez, poderia ser efetuado a qualquer tempo’’, complementou.

O juiz concluiu que a rescisão não foi abusiva nem abrupta, como vinha repisando a parte ré, pois ocorreu após um ano, com 11 confissões de dívida e repactuação de prazos e formas de pagamento, ao fim do qual restou a autora como devedora de montante milionário. ‘‘Inexistindo ato ilícito ou abuso de direito, não há como responsabilizar a ré por quaisquer prejuízos experimentados pela autora’’, decretou na sentença de improcedência.

Clique aqui para ler o acórdão

1085239-19.2018.8.26.0100  (São Paulo)

AJUDE A EXPANDIR NOSSO PROJETO EDITORIAL.
DOE ATRAVÉS DA CHAVE PIX E-MAIL
:
 jomar@painelderiscos.com.br

CONFLITO DE COMPETÊNCIA
Ação arbitral autorizada por assembleia prevalece sobre ação antiga de acionista minoritário

Imprensa STJ

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a prevalência de ação arbitral patrocinada por uma companhia, aprovada em assembleia geral extraordinária e proposta sob a titularidade da própria sociedade empresária, sobre procedimentos arbitrais anteriores, de iniciativa de acionistas minoritários.

Ao analisar o conflito de competência, o colegiado entendeu que a companhia seguiu as regras legais de realização da assembleia e de ajuizamento do procedimento arbitral, de forma que os acionistas minoritários não tinham legitimidade extraordinária para promover as ações.

Os três procedimentos, ajuizados em tribunais arbitrais vinculados à mesma câmara de arbitragem, discutiam a responsabilização dos acionistas controladores por supostas condutas ilícitas na gestão da sociedade. Os dois mais antigos foram movidos por acionistas com menos de 0,01% das ações, em legitimação extraordinária, e, inicialmente, incluíram no polo passivo a própria sociedade empresária. Depois, a sociedade prosseguiu como mera interveniente nesses procedimentos.

No conflito de competência, a companhia alegou que não pôde promover imediatamente o procedimento arbitral com o mesmo objeto porque a assembleia geral extraordinária designada para deliberar sobre a medida foi suspensa judicialmente. Dessa forma, só após o levantamento da suspensão é que a sociedade conseguiu realizar a assembleia e, na sequência, em legitimação ordinária, entrar com a ação arbitral – quando as duas ações dos sócios minoritários já estavam em andamento.

STJ tem competência para decidir conflito entre dois juízos arbitrais

Ministro Marco Aurélio Bellizze
Foto: Sergio Amaral/STJ.

O relator na Segunda Seção do STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, explicou que, no caso dos autos, a câmara de arbitragem não disciplinou solução para o impasse criado quando dois tribunais arbitrais proferem decisões inconciliáveis em procedimentos parcialmente idênticos. Nas ações movidas pelos acionistas individuais, o tribunal arbitral proferiu decisão negando a sua extinção; já na ação mais recente, a corte arbitral reconheceu a sua prevalência sobre os feitos mais antigos.

Nesse contexto, o ministro lembrou que, de acordo com o artigo 105, inciso I, alínea ‘‘d’’, da Constituição, compete ao STJ processar e julgar, originariamente, os conflitos de competência entre quaisquer tribunais.

‘‘A jurisprudência da Segunda Seção, tomando como premissa a compreensão de que a atividade desenvolvida no âmbito da arbitragem possui natureza jurisdicional, reconhece a competência desta corte de Justiça para dirimir conflito de competência em que figura, seja como suscitante, seja como suscitado, o tribunal arbitral’’, esclareceu o magistrado.

Segundo ele, apesar de não compor organicamente o Poder Judiciário, o tribunal arbitral deve ser compreendido na expressão ‘‘quaisquer tribunais’’ prevista no artigo 105 da Constituição, o que significa que cabe ao STJ decidir o conflito de competência entre dois tribunais arbitrais. O relator também destacou que a câmara à qual os tribunais arbitrais estão vinculados não tem poder jurisdicional para dirimir o conflito, por possuir apenas atribuições administrativas.

Minoritários só teriam legitimidade extraordinária em caso de inércia da companhia

Com base na Lei 6.404/1976, Bellizze apontou que, em regra, a ação de reparação de danos causados ao patrimônio social por atos dos administradores ou controladores deve ser proposta pela companhia diretamente lesada – titular natural do direito. Apenas em caso de inércia da sociedade é que a lei confere, de forma subsidiária, a legitimidade extraordinária para o acionista promover a ação.

O relator destacou que o ajuizamento da ação de responsabilização pela companhia exige a realização de assembleia geral para deliberar sobre o assunto. E que a inércia capaz de justificar a legitimação extraordinária dos acionistas apenas ficaria caracterizada se, passados três meses da aprovação pela assembleia, o titular do direito lesado não tivesse tomado a medida judicial ou arbitral cabível.

Para o ministro, contudo, a companhia não se mostrou inerte na tomada das providências legais para a propositura da ação, o que torna os acionistas minoritários ilegítimos para ajuizar seus procedimentos.

‘‘Não se pode conceber que a companhia, titular do direito lesado, fique tolhida de prosseguir com ação social de responsabilidade dos administradores e dos controladores, promovida tempestivamente e em conformidade com autorização assemblear, simplesmente porque determinados acionistas minoritários, em antecipação a tal deliberação e, por isso, sem legitimidade para tanto, precipitaram-se em promover a ação social de responsabilidade de controladores’’, concluiu Bellizze.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.