TRATAMENTO HUMILHANTE
Empregador que submeteu empregado a ócio forçado é condenado a pagar dano moral

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Empregador que força o empregado ao ócio, sem lhe delegar nenhuma tarefa, viola direitos de personalidade, como honra e dignidade, assegurados no inciso X do artigo 5º da Constituição. Assim, a parte ofensora deve indenizar em danos morais a parte ofendida, a teor do que preconiza, além do próprio dispositivo constitucional, os artigos 186 e 927 do Código Civil.

Por isso, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) reformou sentença para condenar uma indústria de bebidas a pagar R$ 15 mil de reparação moral a seu ex-empregado, obrigado a ficar um ano parado, sem receber nenhuma tarefa. Com isso, ele virou alvo de chacota dos colegas.

“O Pensador”, de Auguste Rodin.
Foto: Site Arteeblog

Problemas na coluna

À época, o trabalhador estava com problemas na coluna e não podia executar tarefas que exigisse tanto esforço, como o transporte diário de dinheiro. Ao invés de permanecer parado no pátio da empresa, sem fazer nada, ele deveria ter sido transferido para um setor que não exigisse tal esforço físico.

A 8ª Vara do Trabalho de Porto Alegre julgou improcedente este pedido, no bojo de outros que acabaram deferidos, por não vislumbrar sentido na narrativa posta na petição inicial. ‘‘Veja-se que o reclamante sustenta que não foi ‘transferido para um setor que não exigisse o desenvolvimento de esforço físico’; só que a conduta alegada – a qual sequer restou robustamente demonstrada em audiência – foi justamente a que não lhe exigia esforço físico algum, não configurando ato ilícito’’, deduziu a juíza do trabalho Marina dos Santos Ribeiro.

Alvo de chacotas

A 8ª Turma do Tribunal deu procedência ao recurso do reclamante, reformando a sentença neste aspecto. Segundo a desembargadora-relatora Brígida Joaquina Charão Barcelos, a prova testemunhal confirmou que o autor foi alvo de chacotas e deboches. A testemunha afirmou, inclusive que, por não ser gaúcho, o trabalhador era ridicularizado.

Na fundamentação posta no acórdão, a magistrada explicou que o assédio moral se caracteriza por condutas reiteradas do assediador que, via de regra, não se relacionam com a prestação do trabalho em si, mas ultrapassam os limites razoáveis da cobrança de metas e respeito esperado no ambiente laboral. Estas condutas atingem o empregado em sua dignidade como pessoa humana e trabalhador.

‘‘Hipótese em que a empresa impõe ao trabalhador o ‘ócio forçado’, o de aguardar no estabelecimento sem lhe ordenar qualquer atividade, permitindo que parte dos demais colegas o tratem de forma humilhante em razão do ócio, implica violação da honra e da imagem do trabalhador, configurando duplo assédio (vertical e horizontal), cuja responsabilização prescinde da prova de efetivo dano suportado pela vítima, bastando que se prove tão somente a prática do ilícito do qual ele emergiu (dano in re ipsa)’’, registrou a ementa do acórdão.

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Ação 0020727-56.2019.5.04.0008

Jomar Martins é editor da revista eletrônica PAINEL DE RISCOS

 

 

EXECUÇÃO FISCAL
TRF-4 autoriza penhora de bem já penhorado em outros processos

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O fato de um imóvel já estar penhorado em outras execuções fiscais não lhe retira, por si só, a possibilidade de penhora. Neste caso, cabe ao executado comprovar a necessidade de afastar a constrição. O fundamento é da 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ao prover recurso da União (Fazenda Nacional), que teve pedido de penhora, perante o 2º Cartório de Registro de Imóveis de Foz do Iguaçu (PR), indeferido no primeiro grau.  A execução fiscal foi ajuizada em abril de 2018, contra a Editora Gazeta do Iguaçu, para a cobrança de dívida no valor de R$ 232,4 mil.

Segundo os autos, desde 2008, o imóvel vem sendo objeto de penhoras, as quais totalizam 12 averbações (nove referentes a execuções fiscais ajuizadas pela União, duas decorrentes de ações trabalhistas e uma de ação cível). Os débitos da União, conforme constante da matrícula, alcançam mais de R$ 11 milhões. A última avaliação do bem importou em R$ 26, 5 mil.

A vara de origem entendeu que o devedor seria ‘‘excessivamente onerado’’, em função dos diversos registros de penhora na matrícula, provenientes de outras execuções fiscais. Para o juízo local, o produto de eventual arrematação seria totalmente abarcado pelos créditos preferenciais existentes. Logo, a constrição se revelaria ineficaz para a garantia da presente execução.

O relator do recurso na corte, juiz federal convocado Alexandre Rossato da Silva Ávila, reformou a decisão, por entender possível a pluralidade de penhoras sobre o mesmo bem.

‘‘Ainda que o imóvel esteja penhorado em outras execuções fiscais, a avaliação referida, em princípio, mostra-se suficiente para garantir a totalidade dos débitos. Logo, na medida em que o devedor não ofertou outros bens passíveis de penhora, sendo do executado o ônus de comprovar a necessidade de afastar a constrição, não vejo óbice à penhora’’, escreveu no acórdão.

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Agravo de instrumento 5018445-94.2021.4.04.0000/PR

Jomar Martins é editor da revista eletrônica PAINEL DE RISCOS

INCENTIVO FISCAL ESVAZIADO
IRPJ e CSLL não incidem sobre valor decorrente de pagamento adiado de ICMS, diz STJ

Imprensa STJ

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é ilegal a cobrança do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) em relação aos ganhos obtidos por empresa beneficiada com pagamento adiado do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), concedido como incentivo fiscal. Com o fundamento, o colegiado superior deu provimento a recurso especial (RESp) interposto por uma fabricante de refrigerantes.

Por unanimidade, o colegiado entendeu que o fisco, ao considerar esses ganhos como lucro, possibilita que a União retire, indiretamente, o incentivo fiscal concedido pelos estados, o que levaria ao esvaziamento ou à redução do benefício.

No caso dos autos, a empresa impetrou mandado de segurança (MS) para não ter que pagar os tributos federais (IRPJ e CSLL) sobre a quantia obtida com a sua participação no Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense (Prodec).

O incentivo concedido pelo fisco de Santa Catarina consistiu no pagamento adiado de parte do ICMS relativo ao acréscimo resultante do estabelecimento da empresa naquele estado. Após 36 meses, a produtora de bebidas deveria pagar o imposto adiado, com juros simples, mas sem correção monetária. De acordo a Secretaria da Receita Federal, esse valor equivaleria a lucro, base de cálculo de incidência do IRPJ e da CSLL.

Crédito presumido de ICMS não é lucro

Para o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), o pagamento diferido do ICMS não é uma subvenção para investimento, o que impede a não cobrança dos dois tributos. No STJ, em combate ao acórdão do Tribunal Regional, a empresa sustentou que subvenção para investimento é toda vantagem fiscal concedida pelo poder público.

A relatora do Resp, ministra Regina Helena Costa, lembrou que o STJ, ao julgar o EREsp 1.517.492, definiu que o crédito presumido de ICMS não pode ser incluído na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, independentemente de os créditos se enquadrarem em uma categoria específica de subvenção. Para a magistrada, a mesma tese se aplica ao pagamento diferido do ICMS, hipótese do caso julgado.

No precedente, explicou a ministra, entre outros fundamentos, a corte considerou que o crédito presumido de ICMS, uma vez que não é incorporado ao patrimônio do contribuinte, não constitui lucro – o que afasta a incidência dos tributos em questão.

‘‘A base de cálculo do tributo haverá sempre de guardar pertinência com aquilo que pretende medir, não podendo conter aspectos absolutamente impertinentes à própria materialidade contida na hipótese de incidência’’, observou no voto.

Repartição das competências tributárias

Regina Helena Costa destacou que, em decorrência do modelo federativo, a Constituição Federal distribuiu as competências tributárias. Assim, cabe aos estados instituir o ICMS e, por consequência, outorgar isenções, benefícios e incentivos fiscais para atender a interesses estratégicos da unidade federativa.

No entender da ministra relatora, além de desobedecer ao princípio federativo, a tributação pela União de valores relativos a incentivo fiscal concedido por estado estimula a competição indireta entre os entes da Federação.

‘‘Não está em xeque a competência da União para tributar a renda ou o lucro, mas, sim, a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa’’, afirmou.

Interferência na política fiscal

A magistrada acrescentou que, no caso analisado, o exercício da competência tributária federal interferiu na política fiscal adotada por Santa Catarina, pois o prazo estendido para o pagamento de ICMS com redução de encargos, instituído por lei local específica, atendeu aos princípios constitucionais.

Por fim, ao reformar o acórdão do TRF-4, a ministra registrou que a tributação federal abala a credibilidade no programa de incentivo do ente federado, pois ‘‘é inegável que o ressurgimento do encargo, sob outro figurino, resultará no repasse dos custos adicionais às mercadorias’’.

Clique aqui para ler o acórdão no REsp 1.222.547.

SEM SUCUMBÊNCIA
TJ-RS nega fixação de honorários em incidente processual rejeitado

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O parágrafo 1º do artigo 85 do Código de Processo Civil (CPC) diz, ipsis litteris: ‘‘São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente’’. Assim, fora destas hipóteses, não cabe a fixação de honorários pelo Judiciário.

Invocando a literalidade deste dispositivo, ante a ausência de previsão legal, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) manteve despacho que indeferiu pedido para fixação de honorários advocatícios após rejeição de incidente processual suscitado por Condomínio Chaves de Almeida, localizado no Centro Histórico de Porto Alegre, no curso de uma cobrança litigiosa movida contra membros da família Paese.

Desconsideração da personalidade jurídica

 Segundo o acórdão, os procuradores do Condomínio protocolaram incidente de desconsideração da personalidade jurídica na 17ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, com o objetivo de conseguir autorização judicial para penhorar um automóvel BMW de uma empresa pertencente aos Paese – a Webertur Viagens e Turismo Ltda. Eles buscaram o patrimônio dos sócios porque não estavam conseguindo cobrar a dívida da pessoa jurídica. O valor do débito: R$ 258,7 mil.

O juiz Sandro Silva Sanchotene indeferiu o pedido, por entender que a parte ‘‘suscitante’’ (o Condomínio) não comprovou o preenchimento dos requisitos contidos no artigo 50 do Código Civil (CC), que trata do abuso de personalidade jurídica. Para o julgador, não ficou demonstrado o aludido desvio de finalidade, consistente na ocultação patrimonial; a utilização da personalidade jurídica para fins ilegais, ou além do objeto para o qual constituída; tampouco a alegada confusão patrimonial, caracterizada pelo repasse de bens às pessoas físicas dos sócios, ou a outras pessoas jurídicas.

‘’E, como se sabe, a inexistência de patrimônio, por si só, não basta para a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica e o redirecionamento do cumprimento de sentença aos sócios’’, justificou o julgador no despacho que rejeitou o incidente, proferido em junho de 2021.

Agravo de instrumento

Em face do teor do despacho, o advogado da família Paese entrou com recurso de agravo de instrumento no TJ-RS. Não contestou o mérito da decisão judicial, pois esta favoreceu os seus clientes, mas a falta de condenação em verba sucumbencial ao patrono da parte contrária, que saiu perdedora.

Sustentou que a parte adversa demandou contra os ora agravantes, fazendo com que estes fossem processados, constituíssem advogado e, por sua vez, que o procurador signatário trabalhasse no processo por anos, apresentando defesas, provas e afins. Argumentou que, pelo princípio da causalidade, são devidos honorários sucumbenciais em incidente de desconsideração julgado improcedente.

O desembargador-relator Glênio José Wasserstein Hekman julgou improcedente o recurso, citando o artigo 85 do CPC. O julgador acenou também com a força de um precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), num agravo interno em recurso especial (RESp) relatado pela ministra Nancy Andrighi.

Registra o excerto da ementa do acórdão 1707782/SP: ‘‘(…) Não é cabível a condenação de honorários advocatícios em incidente processual, ressalvados os casos excepcionais. Tratando-se de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, o descabimento da condenação nos ônus sucumbenciais decorre da ausência de previsão legal excepcional, sendo irrelevante se apurar quem deu causa ou foi sucumbente no julgamento final do incidente’’.

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Agravo de instrumento 70085431674

Jomar Martins é editor da revista eletrônica PAINEL DE RISCOS

 

 

CONTROLE DE HORAS EXTRAS
Empregador pode requisitar dados de localização do celular do empregado para fazer prova

Secom TRT-SC

A Justiça do Trabalho de Santa Catarina considerou válido o pedido para que o  registro de localização do aparelho celular da empregada de um banco fosse utilizado como evidência numa ação judicial. Por maioria de votos, a Seção Especializada 2 do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região – Santa Catarina (TRT-12) entendeu que o pedido não representa violação à intimidade da trabalhadora e pode ser atendido antes da realização de outros meios de prova.

O processo tramita desde 2020 na 2ª Vara do Trabalho de Joinville e trata, dentre outros pedidos, do pagamento de horas extras. Em novembro do ano passado, durante uma audiência, o banco solicitou ao juízo que os dados de geolocalização do telefone móvel da bancária fossem requisitados à operadora de telefonia, servindo como prova de que o registro das folhas de ponto da empresa estaria correto.

A juíza do trabalho Tatiane Sampaio autorizou parcialmente o pedido à operadora e determinou que a pesquisa fosse feita por amostragem, indicando a localização do celular apenas em dias úteis e em 20% do período contratual. “A prova digital é mais pertinente e eficaz do que a prova testemunhal”, fundamentou a juíza, afirmando que os parâmetros da pesquisa evitariam a violação à privacidade da trabalhadora.

Sigilo

No julgamento do mandado de segurança (MS) impetrado contra esta decisão pela trabalhadora no TRT-SC, três dos 10 desembargadores que compõem a Seção Especializada 2 entenderam que a pesquisa somente poderia ser autorizada pela Justiça no caso de não haver outros meios de prova, como documentos e depoimentos de testemunhas.

A desembargadora Lígia Maria Teixeira Gouveia considerou a autorização “precoce”, ressaltando que as partes e testemunhas envolvidas no processo ainda não foram ouvidas. A magistrada defendeu que a produção desse tipo de prova exige a demonstração, pela empresa, de que os fatos não poderiam ser revelados de outra forma.

“Não se trata de meio de prova que se possa considerar ordinário, justamente porque atinge a esfera da vida privada das pessoas”, defendeu a magistrada. “O tratamento de dados pessoais sensíveis deve ser precedido de cautelas maiores, uma vez que eventual publicização pode trazer consequências mais gravosas aos direitos e liberdades de seus titulares”, argumentou a desembargadora.

Direito das partes

A maioria do colegiado, contudo, seguiu o voto do desembargador-relator Gracio Petrone, que já havia negado a liminar requerida pela autora, mantendo a decisão de primeiro grau. O magistrado ponderou que a legislação não estabelece hierarquia entre os tipos de prova e afirmou que o pedido de prova digital reforça a busca efetiva da verdade real, favorecendo a rápida duração do processo.

“Se o novo meio probatório, digital, fornece dados mais consistentes e confiáveis do que a prova testemunhal, não há por que sua produção ser relegada a um segundo momento processual, devendo, de outro modo, preceder à prova oral”, argumentou o relator, afirmando que vê o pedido como “exercício de direito” das partes.

“A pesquisa apenas aponta a localização do dispositivo telefônico, não incluindo conversas ou imagens de qualquer uma das partes ou de terceiros”, destacou.

Ainda segundo Petrone, a medida não representa ofensa à garantia constitucional de inviolabilidade das comunicações ou à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018), favorecendo a segurança da prestação jurisdicional.

“Conferido aos dados coletados o adequado sigilo, reservada sua análise às partes envolvidas, com vista à confirmação dos fatos afirmados pela própria autora, não se tratará de prova obtida por meio ilícito, nem tampouco se estará desprezando os direitos à privacidade”, concluiu o relator.

Terminado o prazo para recurso, o processo voltará a tramitar na 2ª Vara do Trabalho Joinville para julgamento de mérito. (Secom TRT-SC/Fábio Borges) 

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Processo 0000955-41.2021.5.12.0000