DINHEIRO NA MÃO
Pagamentos em ações trabalhistas no RS somaram R$ 2 bilhões no primeiro semestre

Secom/TRT-4

Foto: Divulgação Secom/TRT-4

A Justiça do Trabalho do Rio Grande do Sul garantiu, no primeiro semestre de 2022, o pagamento de R$ 2 bilhões a trabalhadores que tiveram direitos reconhecidos em ações judiciais. A quantia é 82% superior à do mesmo período do ano passado, quando foi pago R$ 1,1 bilhão.

As decisões também reverteram, no mesmo período, R$ 279 milhões aos cofres públicos, sendo R$ 203 milhões em contribuições previdenciárias, R$ 53 milhões em imposto de renda e R$ 23 milhões em pagamento de custas judiciais.

Demanda

Entre janeiro e junho, a Justiça do Trabalho gaúcha recebeu, no primeiro grau, 58.020 processos, aumento de 3,7% em relação ao mesmo período de 2021 (55.924). Os pedidos mais frequentes nas novas ações foram: adicional de insalubridade, horas extras, verbas rescisórias e indenizações por dano moral. No segundo grau, houve o ingresso de 31.483 casos novos, 30,8% a mais que no primeiro semestre do ano passado (24.054).

Produtividade

O primeiro grau da Justiça do Trabalho gaúcha solucionou, entre janeiro e junho, 52.558 processos na fase de conhecimento, que vai do ajuizamento da ação até a sentença. O volume é 16,5% maior em relação ao mesmo período de 2021 (45.083).

Na fase de execução, que busca o pagamento de direitos trabalhistas reconhecidos em juízo e que não foram pagos espontaneamente pelo devedor, houve o encerramento de 35.090 processos, 45,5% a mais que no primeiro semestre do ano passado (24.104)

A produtividade do segundo grau se manteve no mesmo patamar: 29.086 processos julgados nos seis primeiros meses de 2021. No mesmo período do ano passado, foram 29.836.

Equilíbrio nas decisões

Do total de processos solucionados no primeiro grau entre janeiro e junho, 43% foram resolvidos por meio de acordo entre as partes, 36% tiveram procedência parcial (autor ganhou um ou mais pedidos, mas outros não), 13% foram julgados improcedentes (nenhum pedido do autor foi atendido), 7% foram totalmente procedentes (todos os pedidos atendidos) e 1% tiveram outros encaminhamentos (arquivamento ou extinção do processo, desistência do autor e outros).

Estoque

Em 30 de junho de 2022, a Justiça do Trabalho gaúcha tinha 270.768 processos em tramitação no primeiro grau. No Tribunal, 26.203 processos aguardavam julgamento.

Avaliação

O presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4), desembargador Francisco Rossal de Araújo, elogiou o aumento da produtividade, especialmente na etapa final dos processos, que concretiza o pagamento dos direitos. ‘‘Estamos com uma política forte de conciliação e de efetividade na fase de execução. O aumento do valor dos pagamentos certamente é reflexo desse esforço de magistrados e servidores’’, comentou.

Segundo o magistrado, R$ 2 bilhões em seis meses é um valor significativo, equivalente ao orçamento anual de um município de grande porte, como Canoas (região metropolitana). ‘‘São valores de acordos e decisões judiciais que vão para as mãos de quem tinha direito. Além da justiça feita, os trabalhadores utilizam esse dinheiro e movimentam a economia, o que é importante principalmente em um contexto de crise’’, avaliou.

Outro ponto destacado pelo presidente é o equilíbrio das decisões, começando pelo alto índice de acordos – 43%. ‘‘Os percentuais de conciliação e procedência dos pedidos mostram a ponderação da Justiça do Trabalho e reforçam o importante papel da instituição na sociedade’’, afirmou.

Conforme o desembargador, os números poderiam ser ainda melhores, não fosse o déficit de 450 servidores, em um quadro de 3.540 postos. “Os dados mostram o desempenho da Justiça do Trabalho gaúcha e o comprometimento de seus juízes e servidores com a celeridade e a eficiência.  Estamos satisfeitos em desempenhar nosso trabalho e colaborar para a Justiça Social”, concluiu. (Gabriel Borges Fortes/Secom/TRT-4)

 

LOCAÇÕES COMERCIAIS
A ação de despejo durante o período de processamento da recuperação judicial

 Por Thiago Castro da Silva

Empresas que ajuízam ação de recuperação judicial e têm o desenvolvimento de suas atividades em imóveis locados poderão, caso haja inadimplemento, enfrentar ações de despejo, mesmo que o crédito esteja arrolado no quadro de credores. Acerca desse tema, existem algumas questões importantíssimas sendo tratadas nos tribunais quanto à suspensão da demanda e sobre a retomada do bem durante o período de processamento da recuperação judicial.

Antes de mais nada, é importante destacar que a ação de despejo poderá ocorrer por diferentes fundamentos, de acordo com a Lei do Inquilinato (Lei 8.245/191). O mais comum, em se tratando de empresas em recuperação judicial, é o pedido de despejo por falta de pagamento (art. 9.°, II). A ação também poderá ser fundamentada pelo mero descumprimento contratual (art. 9.°, I) ou tratar-se de ação por denúncia vazia, quando decorrido o prazo estabelecido no contrato (art. 46, §2°).

Para a Lei 11.101/2005, que regula a recuperação judicial das empresas, a causa de pedir na ação de despejo é fundamental para a definição da manutenção da posse da recuperanda no imóvel locado, isso porque os atos de constrição ficam suspensos enquanto a recuperação estiver sendo processada. Para tanto, a primeira análise é se o pedido de despejo se baseia no inadimplemento de crédito que está sujeito à recuperação.

Não há dúvidas que os créditos constituídos antes do ingresso da recuperação judicial se sujeitam ao plano de reestruturação. Porém, quando é pleiteada em juízo a retomada do imóvel locado, inicia-se uma discussão entre o direito de propriedade e a preservação da empresa recuperanda. O primeiro, buscando um viés constitucional, defendendo a propriedade como um direito absoluto; o segundo, defendendo o interesse social gerado pela manutenção da atividade econômica.

A corrente que defende a impossibilidade de despejo baseada no inadimplemento de crédito sujeito à recjuperação utiliza-se do argumento insculpido no art. 6.º da Lei 11.101/2005, que trata das suspensões dos atos de constrição. Entendem que, uma vez suspensa a exigibilidade do crédito, os efeitos do inadimplemento não podem atingir o locatário e, sendo o despejo um desses efeitos diretos, deverá ficar suspenso até a aprovação ou rejeição do plano.

Além disso, essa tese ganha força quando comparada aos demais credores ditos proprietários destacados no art. 49, § 3.° da mesma lei. Esses comumente chamados ‘‘credores proprietários’’, que são, por exemplo, garantidos por alienação fiduciária de bens, não estão sujeitos aos efeitos da recuperação, porém, estão impedidos de retirar bens de capital que são essenciais à atividade da recuperanda. Nessa linha, se o credor, que também é proprietário do bem e não está sujeito à recuperação judicial, não pode retomar o bem, não há razão para abrir exceção ao locador cujo crédito está sujeito à recuperação.

A via que defende a não suspensão da ação de despejo baseia-se no direito à propriedade, que está insculpido na Constituição Federal – art. 5º, XXII (‘‘é garantido o direito de propriedade’’) – cumulada com a legislação própria, a Lei nº 8.245/91 (Lei do Inquilinato). O argumento aí é que esse bem, cuja posse foi entregue por cessão temporária e onerosa de uso, não faz parte dos bens de propriedade da empresa. Logo, não estaria abrangido pelo art. 6º, § 7º-B, da Lei 11.101/05, que refere ser admitida a competência do juízo da recuperação judicial para determinar a suspensão dos atos de constrição que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial. Por essa razão, não se tratando de bem pertencente ao ativo da empresa em recuperação, não seria o juízo universal competente para decidir sobre a destinação de tal bem.

Existe, porém, um outro problema de ordem processual que está relacionado à definição do juízo competente para suspender a ação de despejo. No Superior Tribunal de Justiça prevalece o entendimento de que ‘‘A ação de despejo movida pelo proprietário locador em face de sociedade empresária em recuperação judicial não se submete à competência do Juízo recuperacional’’ (CC 148.803/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/04/2017, DJe 02/05/2017).

Essa posição vai ao encontro de outros julgados da Segunda Seção, tais como o CC 123.116/SP, DJe 03/11/2014, e AgRg no CC 145.517/RS, DJe 29/06/2016, que entendem que ‘‘Em ação de despejo movida pelo proprietário locador, a retomada da posse direta do imóvel locado à sociedade empresária em recuperação judicial, com base nas previsões da lei específica (a Lei do Inquilinato n. 8.245/91), não se submete à competência do Juízo universal da recuperação’’ (CC 123.116/SP).

Encontra-se, contudo, na jurisprudência, posição divergente – mesmo que ainda minoritária. A  2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo já julgou no sentido de que ‘‘embora o Juízo da recuperação não tenha competência para presidir a ação de despejo, cabe a ele definir o destino dos bens essenciais à consecução da atividade empresarial das devedoras, como guardião do princípio da preservação da empresa insculpido no art. 47 da lei de regência’’ e que a ‘‘retomada do imóvel essencial fere o disposto na parte final do § 3º do art. 49 da LRF’’, devendo ser mitigado o direito de propriedade (AI nº 2250318-08.2019.8.26.0000, Relator Araldo Telles, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, j. 15/04/2020).

Ainda que a Lei 14.112/2020 (Nova Lei de Recuperação Judicial) tenha positivado as medidas de cooperação jurisdicional entre os juízes, encontra-se uma certa resistência dos juízos cíveis que processam os despejos em suspender a retomada dos imóveis, mesmo após os julgadores prestarem informações acerca da recuperação judicial e dos efeitos da sujeição do crédito.

Dentre tantas outras situações, ainda pode-se destacar as cláusulas resolutivas expressas por insolvência (cláusula ipso facto), onde a exceção do interesse das partes (pacta sunt servenda) poderá ser observada diante da importância do bem à recuperanda e seus credores, ouvindo-se o juízo da recuperação. O mesmo pode ser utilizado nos casos de cláusula compromissória, onde a escolha pelo juízo arbitral poderá gerar um impasse ante a liminar de despejo e a sujeição do crédito à recuperação. Nesse caso, o mérito submetido ao juízo arbitral não pode ser objeto de deliberação no Poder Judiciário, porém, até que se instalem as deliberações dos árbitros, há, ao nosso ver, mesmo em cognição sumária, a possibilidade de tutela dos direitos da locatária/recuperanda para permanência no imóvel.

Em contrapartida, o inadimplemento posterior ao ajuizamento da recuperação poderá ensejar o despejo da devedora, porque não é possível transmitir ao proprietário o ‘‘financiamento’’ do soerguimento da recuperanda. É dever da recuperanda adimplir com suas obrigações correntes como forma de demonstrar sua viabilidade econômica.

É preciso buscar alternativas para que as redes de varejo, as mais afetadas com o tema, possam ter as mesmas possibilidades de reorganização econômico-financeira que os demais segmentos da economia. Para que isso aconteça, é preciso que a cooperação jurisdicional seja eficaz, garantido ao proprietário o recebimento dos aluguéis vencidos (dentro do plano de recuperação judicial) e a vencer (como débito corrente no curso do processo). À devedora, é necessário que se garanta a manutenção das suas atividades ,para que possa ter o mínimo de previsibilidade na sua projeção de caixa e, assim, honrar com o seu plano de reestruturação.

Thiago Castro da Silva, advogado especializado em reestruturação de empresa da Cesar Peres Dulac Müller Advogados (CPDMA)