DANOS À COLETIVIDADE
Dono de lava-jato é condenado por morte de adolescente após “brincadeira” com compressor

O dono de um lava-jato de Campo Grande (MS) terá de pagar indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 100 mil em razão da morte de um empregado de 17 anos causada pela manipulação indevida do compressor de ar.

A decisão é da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), para quem a tragédia ocorrida com o jovem representou lesão aos interesses e aos direitos de toda a coletividade.

‘‘Brincadeira’’

O episódio ocorreu em fevereiro de 2017, durante uma suposta ‘‘brincadeira’’ do proprietário e de um ajudante, que consistiu em introduzir o bico da mangueira do compressor de ar nas nádegas do rapaz. Ele passou mal, teve vômitos, inchaço na barriga e, com muita dor, foi encaminhado ao hospital, onde morreu alguns dias depois.

Segundo a imprensa local, a causa da morte seria uma hemorragia interna no esôfago, que teria se rompido com a entrada do ar comprimido.

Abusos

No mesmo mês, o Ministério Público do Trabalho (MPT) ajuizou ação civil pública contra a empresa e seu sócio. A partir dos depoimentos e dos documentos reunidos em inquérito, o MPT concluiu que havia trabalho infantil ou de adolescente no local, agravado pela exposição a abusos físicos, psicológicos ou sexuais e por várias ilegalidades referentes ao meio ambiente e à segurança do trabalho.

Para os procuradores do trabalho, a situação gerou ‘‘repercussão negativa, insuportável e desproporcional, sobre os valores da coletividade’’. Por isso, o MPT-MS pediu a condenação de ambos por danos morais coletivos.

Reparação individual

O pedido, porém, foi indeferido pelo juízo da 1ª Vara de Trabalho de Campo Grande, que não identificou, no caso concreto, ofensa à coletividade.  A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (TRT-24, Mato Grosso do Sul), para quem o falecimento do jovem, embora resultado de atitudes inquestionavelmente reprováveis, demandaria, na esfera trabalhista, provável reparação individual, e não coletiva, pelos danos acarretados aos familiares da vítima.

Dano coletivo

Ministro Hugo Scheuermann foi o relator
Foto: Secom TST

Para o ministro Hugo Scheuermann, relator do recurso do MPT ao TST, não há como dissociar a morte do adolescente das condições de trabalho impostas pela empresa. Ele observou que o trabalho em lava-jatos é insalubre e, portanto, expressamente vedado a menores de idade tanto na Constituição Federal quando no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, Lei 8.069/1990).

O descumprimento dessas normas, a seu ver, configura dano moral coletivo. ‘‘O trabalho realizado por menor de idade em condições insalubres ultrapassa a esfera individual de interesse dos trabalhadores, evidenciando-se a lesão aos interesses e direitos de toda a coletividade, relativos à contratação de menor em conformidade com a ordem jurídica vigente’’, explicou no voto.

Segundo o relator, não se trata de caso isolado ou mera fatalidade, mas de circunstância que demonstra uma permissibilidade no local de trabalho, com potencial de agredir valores morais de toda a sociedade. ‘‘É inadmissível a ‘normalização’ no ambiente de trabalho de práticas vexatórias, cruéis e inegavelmente degradantes, que, no caso, inclusive tinham cunho nitidamente sexual, ainda que sob o pretexto de uma relação de maior intimidade’’, concluiu.

Trabalho infantil

O valor da indenização será revertido ao Fundo Municipal para a Infância e a Adolescência (FMIA) de Campo Grande, para financiar projetos de combate ao trabalho infantil, sob a fiscalização do Ministério Público do Trabalho.

Homicídio

O dono do lava-jato e o outro empregado que participou da ‘‘brincadeira’’ foram condenados a pena de 12 anos por homicídio qualificado doloso. Com informações de Ricardo Reis e Carmem Feijó, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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RR-24062-83.2018.5.24.0001

DIREITO DE PREFERÊNCIA
Consolidada a propriedade em nome do credor, não é possível a purgação da mora, diz STJ

Foto: Divulgação CBIC

Ao tomador do empréstimo que não quitou o débito até a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, é assegurado somente o exercício do direito de preferência na compra do imóvel que serviu de garantia do financiamento. A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

No caso sob análise, o colegiado superior entendeu que o fato de a consolidação da propriedade em nome do banco credor ter ocorrido depois da entrada em vigor da Lei 13.465/2017 impede a quitação do débito e a retomada do contrato de financiamento imobiliário.

Uma empresa ajuizou ação anulatória de ato jurídico, na qual alegou que o banco teria cometido várias irregularidades na expropriação do imóvel dado como garantia, por alienação fiduciária, em cédula de crédito bancário (CDB). Segundo a autora da ação, não lhe foi dada a oportunidade de reaver o bem ou discutir a dívida.

Em primeira instância, foram julgados improcedentes os pedidos de suspensão do leilão, retificação da certidão de matrícula e manutenção na posse do imóvel. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve a decisão, sob o fundamento de que, com o advento da Lei 13.465/2017, foi assegurado ao devedor tão somente o exercício do direito de preferência na compra do bem alienado.

No recurso dirigido ao STJ, a empresa defendeu a inaplicabilidade da Lei, sob o argumento de que o contrato foi firmado antes da sua entrada em vigor.

Lei trouxe novo entendimento às turmas de direito privado

Ministra Nancy Andrighi
Foto: Lucas Pricken/STJ

A relatora, ministra Nancy Andrighi, lembrou que as turmas de direito privado do STJ realmente tinham o entendimento de que seria lícito ao devedor quitar o débito no prazo de 15 dias após a intimação prevista no artigo 26, parágrafo 1º, da Lei 9.514/1997, ou a qualquer momento até a assinatura do auto de arrematação, segundo o artigo 34 do Decreto-Lei 70/1966.

No entanto, a ministra destacou que a Lei 13.465/2017 incluiu o parágrafo 2º-B no artigo 27 da Lei 9.514/1997, o qual assegura ao devedor o direito de preferência para adquirir o imóvel objeto de garantia fiduciária. Conforme ressaltou, a Terceira Turma, ao julgar o REsp 1.649.595, concluiu que, com a entrada em vigor da nova Lei, não mais se admite a quitação do débito após a consolidação da propriedade em favor do credor fiduciário.

Aplicação da lei aos casos anteriores à sua vigência

A ministra acrescentou que a Lei 13.465/2017 pode ser aplicada aos contratos anteriores à sua edição, pois serão consideradas as datas da consolidação da propriedade e da quitação do débito, e não a data da contratação do empréstimo.

Nancy Andrighi explicou que, no julgamento do REsp 1.649.595, foram estabelecidas duas teses: se já consolidada a propriedade e quitado o débito antes da Lei 13.465/2017, impõem-se o desfazimento do ato de consolidação e a retomada do contrato de financiamento imobiliário; se, após a vigência da lei, a propriedade foi consolidada, mas não foi quitado o débito, fica assegurada ao devedor tão somente a preferência na aquisição do imóvel.

‘‘Na hipótese dos autos, em que a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário ocorreu após a entrada em vigor da Lei 13.465/2017, não há que falar em possibilidade de o devedor purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação, ficando assegurado apenas o exercício do direito de preferência para adquirir o imóvel objeto da propriedade fiduciária’’, concluiu no acórdão. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.007.941

AJUSTE DE PAGAMENTO
Caseiro de chácara é reconhecido como trabalhador doméstico na Justiça do Trabalho gaúcha

Comprovada a prestação de serviços em favor da parte apontada como empregadora, é desta o ônus de provar que a relação de trabalho se desenvolveu com natureza diversa do vínculo de emprego, nos termos do artigo 818 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e do artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC).

Sem esta prova, a 11ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) reconheceu o vínculo de emprego de um caseiro como empregado doméstico. A sucessão do dono da propriedade foi condenada a pagar salários atrasados, férias vencidas, aviso-prévio e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), entre outras parcelas próprias da rescisão trabalhista.

A decisão, unânime no colegiado de segundo grau, manteve a sentença do juiz Gilberto Destro, titular da Vara do Trabalho de Triunfo (em processo que tramita no Posto da Justiça do Trabalho de Taquari, cidade vizinha).

Alegação das partes

Conforme as informações da reclamatória trabalhista, o caseiro trabalhava em uma chácara, onde dormia para evitar roubos. Ele também alegou realizar roçagem, capina e cuidado de animais, além de executar serviços domésticos na propriedade.

O empregador negou que havia prestação de serviço. Em síntese, argumentou que autorizou a entrada do trabalhador na chácara porque ele era um conhecido que gostava de passar tempo lá.

Sentença procedente

Ao analisar os depoimentos das partes e das testemunhas, o juiz do trabalho Gilberto Destro reconheceu a existência do vínculo de emprego. Conforme mencionado na sentença, a legislação prevê que o empregado doméstico é aquele que presta serviços por mais de dois dias por semana, de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal, e que a finalidade do serviço não é de lucro para o empregador.

O magistrado destacou que, para ser caracterizado o trabalho doméstico, não é essencial que a prestação de serviços ocorra na residência do empregador. Basta que a atividade seja voltada ao âmbito doméstico, beneficiando o núcleo familiar.

Desa. Silvana Tedesco foi a relatora
Foto: Secom TRT-4

‘‘O autor permanecia na chácara do réu em mais de dois dias por semana  prestando serviço de zelo, cuidado. No  atendimento dessa finalidade, encontra-se a relação subordinada do autor ao réu. A prestação de serviços envolvia  pessoalidade do trabalhador. Apesar de haver salário não pago, houve ajuste de pagamento’’, fundamentou o juiz ao deferir o pedido de vínculo.

Confirmação do vínculo no segundo grau

O empregador faleceu no curso do processo e passou a ser representado por sua esposa, que interpôs recurso ordinário trabalhista (ROT) contra a sentença. No segundo grau, a decisão foi mantida pela 11ª Turma.

A desembargadora Maria Silvana Rotta Tedesco, relatora do acórdão, destacou que o próprio depoimento da representante do empregador evidencia que houve prestação de serviços na propriedade.  A relatora foi acompanhada no julgamento pelas desembargadoras Flávia Lorena Pacheco e Vania Mattos.

A representante do empregador apresentou recurso de revista (RR) contra a decisão. O recurso aguarda a análise de admissibilidade do TRT-4 para possível envio ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). Redação Painel de Riscos com informações de Rafael Ely (Secom/TRT-4).

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ATOrd 0020570-89.2018.5.04.0761 (Taquari-RS)