ESTRATÉGIA FINANCEIRA
Exit financing: a opção inexplorada na recuperação judicial brasileira

Álvaro Scarpellini Campos 

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O exit financing é uma estratégia financeira amplamente utilizada em mercados desenvolvidos, como, por exemplo, os Estados Unidos e a Europa. No entanto, no Brasil, essa prática ainda é pouco explorada ou mesmo conhecida.

O termo exit financing refere-se a uma forma de financiamento fornecida a empresas em processo de recuperação judicial, após o término da proteção garantida pelo stay period. Esse financiamento muitas vezes é utilizado para que o credor efetue o pagamento dos créditos concursais de acordo com o plano aprovado, possibilitando o encerramento do processo de recuperação judicial.

exit financing também pode ser uma alternativa para o financiador de uma empresa em situação de crise cujo crédito esteja inadimplido. Nesta hipótese, o financiador concorda em conceder outro empréstimo, que poderá ser usado para pagar o crédito previamente concedido ou outros créditos que, se inadimplidos, poderiam levar a empresa à falência. Essa opção é, muitas vezes, mais rentável a longo prazo para os credores do que requerer a falência ou a venda dos ativos a terceiros, que poderia resultar em valores de arrematação inferiores aos de mercado.

Em comparação com o DIP Financing, o exit financing pode envolver um valor maior e maiores riscos para o financiador. Isso ocorre porque o exit financing pode implicar no pagamento de todas as dívidas renegociadas no plano de recuperação, mesmo que não tenha transcorrido o prazo previsto no artigo 61 da Lei 11.101/05.

Para a empresa em situação de crise, há diversos benefícios no exit financing: ela poderá economizar os custos processuais da tramitação da recuperação judicial; centralizar seus pagamentos em um ou poucos credores; e ainda diminuir os custos de carrego de seu passivo e a necessidade de negociação com credores não sofisticados. Além disso, deixa de utilizar a expressão em Recuperação Judicial ao lado de seu nome, o que ajuda a sua reputação no mercado.

Para os credores, a vantagem está em receber imediatamente o valor repactuado no plano, diminuindo o risco de inadimplementos futuros e da necessidade de liquidação dos ativos em caso de decretação de falência, o que possivelmente resultaria em prejuízos ainda maiores.

O único inoportuno de tal estratégia está na falta de incentivos legais para o financiador, uma vez que o seu crédito não será tratado como extraconcursal no caso de falência da empresa, já que a recuperação judicial terá sido encerrada. Portanto, a operação de exit financing deve contar com mecanismos contratuais de proteção contra esses riscos, como a previsão de covenants financeiros. Além disso, será fundamental a negociação com os credores excluídos da recuperação, para evitar que eles utilizem o encerramento da recuperação judicial como oportunidade para tentar expropriar os bens da empresa em crise.

Como indicado anteriormente, o exit financing é um conceito ainda pouco explorado no Brasil, mas tem o potencial de transformar o processo de recuperação judicial no país. Apesar dos desafios, a evolução do entendimento judicial e a necessidade de soluções para empresas em recuperação indicam um futuro promissor para o exit financing no Direito brasileiro. Dessa forma, é fundamental que empresários e advogados entendam e explorem esse recurso financeiro para que possa ser usado de maneira eficaz e segura.

1 Sobre o assunto: DIAS, Leonardo Adriano Ribeiro. Financiamento na Recuperação Judicial e na Falência. São Paulo: Quartier Latin, 2014.

Álvaro Scarpellini Campos, advogado especializado em sistemas de prevenção, gestão e resolução de conflitos empresariais (PUC-RS, Faculdade do Porto/Portugal e Universidade de Michigan/EUA). Integra a equipe de Cesar Peres Dulac Müller Advogados (CPDMA) 

PRECEDENTES QUALIFICADOS
Regra da irretratabilidade da CPRB não se aplica à administração, define STJ

Ministro Herman Benjamin foi o relator
Foto: Imprensa/TSE

​Em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.184), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que: a regra da irretratabilidade da opção pela Contribuição Previdenciária sobre Receita Bruta (CPRB), prevista no parágrafo 13, artigo 9º, da Lei 12.546/2011, destina-se apenas ao beneficiário do regime, e não à administração; a revogação da escolha de tributação da contribuição previdenciária pelo sistema da CPRB, trazida pela Lei 13.670/2018, não feriu direitos do contribuinte, tendo em vista que foi respeitada a anterioridade nonagesimal.

Segundo o relator, ministro Herman Benjamin, a contribuição previdenciária das empresas – estabelecida pelo artigo 22, inciso I, da Lei 8.212/1991 – incidia originalmente sobre a folha de salários. Essa previsão, explicou, foi modificada pela Medida Provisória 540/11, convertida na Lei 12.546/2011, que substituiu a base de cálculo do recolhimento pela receita bruta (CPRB), ao passo que, com a edição da Lei 13.161/2015, tais regimes passaram a coexistir, sendo facultado àqueles que contribuem a escolha do regime de tributação sobre a folha de salários ou sobre a receita bruta.

‘‘Verifica-se que a CPRB é contribuição substitutiva, facultativa, em benefício do contribuinte, instituída como medida de política fiscal para incentivar a atividade econômica, cuja renúncia fiscal é expressiva, da ordem de R$ 83 bilhões de reais no período de 2012 a julho de 2017. Contudo, não há direito adquirido à desoneração fiscal, a qual se constitui, no presente caso, como uma liberalidade’’, disse.

Regra da irretratabilidade da CPRB respeitou anterioridade nonagesimal

Para o ministro, o mesmo raciocínio deve ser aplicado à desoneração por lei ordinária. Herman Benjamin esclareceu que a desoneração prevista na Lei 12.546/2011 não era condicional nem por prazo certo, sendo que a sua revogação poderia ser feita a qualquer tempo, respeitando-se a anterioridade nonagesimal – o que ocorreu, já que a Lei 13.670/2018 foi publicada em 30 de maio de 2018 e seus efeitos apenas começaram a ser produzidos em setembro de 2018.

Na sua avaliação, não prospera a alegação de que a irretratabilidade da opção pelo regime da CPRB também se aplicaria à administração. ‘‘Isso porque seria aceitar que o legislador ordinário pudesse estabelecer limites à competência legislativa futura do próprio legislador ordinário, o que não encontra respaldo no ordenamento jurídico, seja na Constituição Federal, seja nas leis ordinárias’’, afirmou.

O relator ressaltou que a alteração promovida pela Lei 13.670/2018 não caracteriza violação à segurança jurídica, mas sim a exclusão de uma das opções de regime de tributação que a lei disponibilizava aos que contribuem.

‘‘A regra da irretratabilidade da opção pela CPRB disposta no parágrafo 13 do artigo 9º da Lei 12.546/2011 destina-se apenas ao beneficiário do regime, não à administração, tampouco fere direitos do contribuinte, pois foi respeitada a anterioridade nonagesimal’’, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.901.638

PRIMAZIA DA REALIDADE
Promotora de vendas que atua como operadora de telemarketing tem jornada reduzida

A 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1, Rio de Janeiro) confirmou a sentença que reconheceu, a uma trabalhadora que havia sido contratada como promotora de vendas da DFL, a função de operadora de telemarketing e o direito à jornada reduzida.

O colegiado acompanhou, por unanimidade, o voto da desembargadora Rosana Salim Villela Travesedo, entendendo que ficou comprovado que a empregada atuava como operadora de telemarketing, exercendo tarefas análogas às de telefonista. Assim, a trabalhadora fez jus à jornada de trabalho prevista no artigo 227 da CLT (6 horas diárias ou 36 horas semanais) e ao pagamento das horas extras que excederam o limite da jornada reduzida.

Contratação como promotora de vendas

A reclamante alegou que foi contratada como promotora de vendas, mas, durante a vigência do seu contrato de trabalho, exerceu atividades de operadora de telemarketing. Narrou que oferecia, via telefone, diversos produtos e serviços. Assim, a profissional postulou o reconhecimento da função de operadora de telemarketing, com a devida retificação em sua carteira de trabalho e o pagamento das horas extras devidas.

A empregadora, em sua defesa, argumentou que a autora sempre atuou como promotora de vendas, função para a qual foi contratada. Acrescentou que o telefone era apenas um dos instrumentos para fazer contato com os clientes, sendo este utilizado por menos de 10 minutos diários.

Atividade principal

Na 6ª Vara do Trabalho de Niterói, a juíza titular Claudia Regina Reina Pinheiro acolheu o pedido da obreira, fundamentando-se, em especial, na prova testemunhal produzida nos autos e no princípio da primazia da realidade. A magistrada reconheceu que a atividade principal da reclamante era exercida por telefone, com gasto de cerca de 400 minutos por dia em ligações.

Desembargadora Rosana Travesedo foi a relatora
Foto: Secom TRT-RJ

Nesse contexto, a juíza concluiu que a função exercida pela trabalhadora era de operadora de telemarketing, determinando a retificação da carteira de trabalho e o pagamento de horas extraordinárias prestadas a partir da 6ª hora diária e acima da 36ª semanal.

Recurso ordinário ao TRT-RJ

Inconformada, a empregadora recorreu da decisão ao TRT-RJ. Na 5ª Turma, o caso foi analisado pela desembargadora relatora Rosana Salim Villela Travesedo, que negou provimento ao recurso da empresa. Inicialmente, a magistrada observou que as anotações da carteira profissional da trabalhadora não têm presunção absoluta de serem verdadeiras e podem ser confrontadas pela realidade laborativa.

A relatora pontuou que a trabalhadora comprovou o alegado desvio de função, uma vez que a realização de atividades de atendimento e agendamento de clientes por meio do telefone foi confirmada pela prova oral produzida.

‘‘Nessa contextura e levando-se em consideração a dicção do artigo 227 da CLT, faz jus a autora à retificação da CTPS quanto à função e, em consequência, à jornada de trabalho de seis horas ou 36 semanais, sendo extraordinárias aquelas que excedam tais limites, de maneira não cumulativa, tal como restou definido na origem’’, concluiu a relatora.

Por fim, a magistrada corroborou sua decisão citando jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que envolve situações semelhantes ao caso em questão. Redação Painel de Riscos com informações da Secom/TRT-1.

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0100548-87.2021.5.01.0246 (Niterói-RJ)

RETROCESSO AMBIENTAL
STF invalida regras que flexibilizaram controle de qualidade de agrotóxicos

Foto: Agência Fiocruz

O Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou trechos de um decreto de 2021 que regulamentou a lei que trata de produção, pesquisa e registro de agrotóxicos no Brasil. Entre as regras consideradas inconstitucionais estão as que flexibilizaram o controle de qualidade de pesticidas e o aproveitamento de alimentos descartados.

A decisão, por maioria, foi tomada no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 910, ajuizada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), na sessão virtual encerrada em 30/6. Foram declarados inconstitucionais dispositivos do Decreto 4.074/2002, que regulamenta a Lei dos Agrotóxicos (Lei 7.802/1989), na redação dada pelo Decreto 10.833/2021.

Limites máximos

Um dos dispositivos invalidados atribuía unicamente ao Ministério da Saúde a fixação do limite máximo de resíduos de agrotóxicos e o intervalo de segurança de aplicação do produto. Antes, essa competência também era dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e do Meio Ambiente. Para a relatora, ministra Cármen Lúcia, a revogação da atribuição compartilhada caracteriza ‘‘nítido retrocesso socioambiental’’.

Controle de qualidade

Ministra Cármen Lúcia foi a relatora
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Também foram declaradas inconstitucionais as normas que determinavam aos titulares de registro de agrotóxicos a obrigação de somente ‘‘guardar’’ os laudos sobre impurezas relevantes do ponto de vista toxicológico e ambiental nesses produtos, cabendo ao Poder Público monitorar e fiscalizar a sua qualidade. No decreto de 2002, o controle de qualidade cabia ao Mapa e aos Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente. Segundo a relatora, a alteração enfraqueceu o poder de polícia estatal.

Aproveitamento de alimentos

Outro dispositivo declarado inconstitucional vinculou a destruição ou a inutilização de vegetais e alimentos em que sejam identificados resíduos de agrotóxicos acima dos níveis permitidos ao ‘‘risco dietético inaceitável’’. Com a decisão, volta a valer a redação de 2002 do decreto, que determina a inutilização de alimentos com resíduos de agrotóxicos ‘‘acima dos níveis permitidos’’.

Segundo a ministra Cármen Lúcia, a alteração permitia o aproveitamento de alimentos que seriam descartados por descumprimento das normas sanitárias aplicáveis, colocando em risco a população.

Múltiplos ingredientes

A decisão determinou, ainda, que o produto com múltiplos ingredientes ativos só será considerado equivalente para registro se todos já tiverem sido registrados. Também deve ser dada total publicidade aos pedidos e às concessões de registro de agrotóxicos, sem exigência de cadastro para consulta.

Por fim, o Plenário do STF decidiu que os critérios referentes a procedimentos, estudos e evidências suficientes para a classificação de agrotóxicos como cancerígenos, causadores de distúrbios hormonais, danosos ao aparelho reprodutor ou mais perigosos à espécie humana devem ser os aceitos por instituições técnico-científicas nacionais ou internacionais reconhecidas.

Ficaram vencidos neste julgamento os ministros Nunes Marques e André Mendonça. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

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ADPF 910

PONTO BRITÂNICO
RGE é condenada a pagar R$ 300 mil por danos morais coletivos

Reprodução internet

A concessionária de energia elétrica Rio Grande Energia (RGE) deve pagar R$ 300 mil por danos morais coletivos, nos autos de uma ação civil pública, por não manter registros corretos das jornadas dos empregados. A empregadora também foi obrigada a corrigir esta situação, sob pena de multa no valor de R$ 50 a cada registro irregular.

As determinações foram estabelecidas em primeira instância pela juíza Márcia Carvalho Barrili, titular da 4ª Vara do Trabalho de Gravataí, e mantidas pela 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul).

Tanto o valor da indenização como o montante relativo às eventuais multas devem ser destinados à Secretaria de Saúde de Gravataí, na Região Metropolitana de Porto Alegre

Ação civil pública

Ao ajuizar a ação civil pública em 2018, o Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT-RS) disse que observou diversas irregularidades nos registros de pontos dos empregados. A título de exemplo, citou cerca de quatro mil documentos que demonstraram a utilização do chamado ‘‘ponto britânico’’; ou seja, registros invariáveis de horários, ou com variações mínimas, que não refletiram fielmente a duração das jornadas.

Segundo o MPT, essas irregularidades foram verificadas tanto nos pontos manuais como nos registros eletrônicos. Diante disso, o órgão pleiteou o pagamento da indenização por danos à coletividade e, em caráter liminar, que a empregadora fosse obrigada a manter registros fidedignos dos horários de trabalho dos seus empregados, sob pena de multa.

Farta documentação

Ao analisar os pedidos, a juíza de Gravataí, inicialmente, deferiu o pedido de liminar e determinou, de imediato, que a empresa regularizasse a situação. Ao confirmar essa ordem posteriormente, em sentença, a magistrada mencionou a farta documentação apresentada pelo MPT comprovando as irregularidades.

‘‘Pelo menos até setembro/2017, os registros de horário dos empregados eram manuais e visivelmente realizados em uma única assentada’’, observou na sentença. ‘‘Aliás, uma boa parte com a mesma caneta e mesmo padrão de letra’’, apontou ainda.

Des. Fernando Moura Cassal foi o relator
Foto: Secom TRT-4

A julgadora ressaltou que a imensa maioria dos documentos apresentava horários uniformes de entradas e saídas, com ínfimos minutos de variação em alguns casos, e com raros registros de horas extras. Além disso, a magistrada disse que a prova testemunhal confirmou a prática e destacou ações trabalhistas ajuizadas contra a empregadora sobre a mesma conduta.

‘‘Restou inequívoca a prática da demandada de não observar as regras legais acerca da marcação de horário de seus empregados’’, concluiu.

Recurso ao TRT-4

Descontente com o teor da sentença, a empresa apresentou recurso ordinário trabalhista (ROT) ao TRT-4, mas os desembargadores mantiveram o entendimento de origem. Como observou o relator do caso na 6ª Turma, desembargador Fernando Luiz de Moura Cassal, ao não propiciar o controle correto das jornadas, a empresa causou danos ao conjunto de empregados e à comunidade local de trabalhadores.

No entanto, o relator optou por limitar em R$ 10 mil reais a soma das multas diárias diante da constatação de registros irregulares, bem como em R$ 100 mil o valor da indenização por danos morais coletivos, no que foi vencido pelos votos divergentes das desembargadoras Beatriz Renck e Simone Maria Nunes, também integrantes da turma julgadora, que consideraram adequados os valores respectivos de R$ 100 mil e de R$ 300 mil.

A empresa apresentou recurso de revista (RR) contra a decisão ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). Com informações de Juliano Machado (Secom/TRT-4)

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ACPCiv 0020060-08.2018.5.04.0234 (Gravataí-RS)