INSEGURANÇA JURÍDICA
Subvenções estaduais para investimentos, uma discussão que ainda vai longe

Por Guilherme Saraiva Grava

Diamantino Advogados Associados

Ao mesmo tempo em que a União projeta arrecadar R$ 35 bilhões neste ano com a tributação federal de subvenções estaduais para investimentos, os contribuintes navegam por incertezas e inseguranças em relação ao tema.

A discussão parecia ter encontrado fim com a nova Lei 14.789, promulgada no apagar das luzes de 2023 a partir da conversão da Medida Provisória 1.185/2023. Mas a verdade é que a mudança de rumos é tão brusca que a nova lei ainda gera dúvidas, inclusive pelas emendas que a MP sofreu no decorrer de sua tramitação no Congresso Nacional. A impressão é que, para solucionar um problema, criou-se outro.

Para mergulhar no assunto, é preciso entender logo de início que o regime inaugurado pelo Governo Federal inverte a lógica que existia até então – e essa é a chave fundamental da análise, examinada a partir da ótica da arrecadação.

Anteriormente, o que se tinha era um sistema que visava isentar da tributação federal os incentivos atrelados a iniciativas e projetos de desenvolvimento regional. Se um benefício fiscal (um crédito presumido de ICMS, por exemplo), estivesse atrelado a uma iniciativa desse tipo, concedia-se isenção federal de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Porém, a conexão entre uma coisa e outra precisava estar clara. Se a relação entre o benefício e um investimento não estivesse nítida (o que poderia decorrer da forma como o estado regulamentou a benesse), a União usava o benefício da dúvida em seu favor e prosseguia com a tributação normalmente.

A premissa pode parecer simples, mas diversos fatores complicavam o cenário e criavam problemas no dia a dia das empresas. Muitas dessas discussões giravam em torno dos critérios para se demonstrar o vínculo entre o benefício e o investimento, tema que foi objeto de mais de uma alteração na lei, mas que a Receita Federal insistia em interpretar à luz de pareceres da década de 1970, contrariando precedentes recentes na jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), além de enorme insegurança jurídica.

Para evitar esse cenário, a nova lei aprovada teve como objetivo simplificar a questão – pelo menos do ponto de vista da União. A partir de agora, todo e qualquer benefício fiscal concedido pelos estados estará sujeito à arrecadação federal. Subvenções estaduais, de qualquer natureza, ainda que para investimentos de interesse público, são tributadas. Ponto final.

A diferença é que, com o advento da nova lei, benesses atreladas a projetos de desenvolvimento passam a gerar créditos aos contribuintes, enquanto as demais, não. Trata-se de um cenário bem diferente e amplamente favorável à União, porque o valor do crédito fica limitado a 25% do valor aplicado na implementação e expansão do negócio.

Na prática, isso significa dizer que aquela isenção, que antes era concedida, agora virou um crédito tributário muito menor e que, como se não bastasse, só poderá ser aproveitado em um período futuro, depois de a empresa estar habilitada junto ao Governo Federal.

A situação, certamente, levará muitos contribuintes a judicializar a questão, ainda que a União tenha tentado simplificar a matéria. Mesmo com o novo sistema, as teses há muito discutidas sobre a violação ao pacto federativo ou ao conceito de receita permanecem. Resta saber como o tema será tratado pelo Poder Judiciário.

É evidente que a mudança de cenário ocasionará impactos que não serão suportados por todos os contribuintes da mesma forma. Essa nova regra de habilitação junto ao Governo Federal, por exemplo, pode atender a algumas empresas, a depender da maneira como os benefícios estaduais lhes foram concedidos e como os valores foram aplicados em iniciativas de desenvolvimento. As companhias que não conseguirem se habilitar, certamente irão se insurgir. E não lhes faltarão motivos.

Entretanto, a prática do novo regime ainda é uma incógnita, e os pontos já regulamentados pela Instrução Normativa 2.170/2023, da Receita Federal, não são suficientes para dizer como o sistema funcionará e quais exigências irão condicionar a fruição do novo crédito (ou deixar de fora benefícios nunca tributados).

Se por um lado as regras de transação e autorregularização propostas pela nova lei parecem querer colocar as polêmicas do passado em pratos limpos, o sistema de habilitação e adesão ao novo regime parecem querer interditar um debate que sempre existiu e ainda persiste: faz sentido a União tributar um benefício estadual como se fosse renda?

A verdade é que essa disputa ainda não foi superada e as discussões sobre a natureza jurídica dos benefícios, assim como do equilíbrio do pacto federativo, permanecem vivas como nunca. Até agora, a única certeza é que estamos distantes do ponto final, com risco de as dúvidas só serem resolvidas nos tribunais.

Guilherme Saraiva Grava é sócio da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados

TAXA DE CONVENIÊNCIA
Cobrança é legal mesmo que o ingresso seja retirado na bilheteria do evento

Foto: Divulgação T4F

Por maioria de votos, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou legal a cobrança de taxa de conveniência na venda de ingressos para espetáculos, mesmo que o consumidor retire o ingresso na bilheteria do evento. Com a decisão, reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que condenou a T4F, que opera o site Tickets for Fun, portal de venda de ingressos, a devolver a taxa em dobro quando não houvesse a contraprestação de entrega dos ingressos aos consumidores.

O recurso especial (REsp) teve origem em ação civil pública (ACP) ajuizada pelo Ministério Público estadual, que questionou a legalidade da taxa cobrada dos consumidores que retiram seus ingressos na bilheteria.

Além de afronta à jurisprudência da corte, a Quarta Turma considerou que houve julgamento extra petita por parte do tribunal fluminense, pois há diferença entre as taxas de conveniência, de retirada e de entrega, que são normalmente cobradas no mercado de intermediação e venda de ingressos para espetáculos.

São várias as taxas cobradas na venda de ingressos

Ministra iIsabel Gallotti foi o voto vencedor
Foto: Lucas Pricken/STJ

Segundo a ministra Isabel Gallotti, autora do voto que prevaleceu no julgamento, a taxa de conveniência é aquela cobrada pela simples aquisição do ingresso por meio de empresa contratada e diz respeito aos custos dessa intermediação; a taxa de retirada (também chamada de will call) é cobrada quando o consumidor compra o ingresso pela internet ou por telefone, mas, em vez de imprimi-lo em casa, faz a emissão em bilheteria específica colocada à sua disposição; e a taxa de entrega é cobrada quando a pessoa opta por receber seu ingresso em casa, pelos correios ou por outro serviço de entrega.

Gallotti lembrou que a Terceira Turma, analisando caso relativo à taxa de conveniência cobrada na aquisição de ingresso pela internet, com base no que foi decidido pelo tribunal no julgamento dos Temas 938 e 958, entendeu que não há impedimento a que os custos de intermediação da venda de ingressos sejam transferidos ao consumidor, ‘‘desde que haja informação prévia acerca do preço total da aquisição, com destaque do valor’’.

No caso em análise, a ministra verificou que o Ministério Público não alegou que os custos da taxa de conveniência estariam sendo omitidos dos consumidores. Ao contrário, esclareceu Gallotti, há indicação expressa no sentido de que a empresa oferecia os ingressos ‘‘sob o pagamento de valor adicional’’ e que estaria agregando tal valor ao dos ingressos, ainda que estes fossem adquiridos nas bilheterias.

Para a ministra, se o valor adicional é informado de maneira explícita no momento da compra do ingresso, não há como considerar que houve prática abusiva por parte da empresa.

Taxas de entrega e de retirada estão vinculadas a serviço independente

Em relação às taxas de entrega e de retirada, Gallotti lembrou que, ao contrário da taxa de conveniência, elas não configuram um simples custo de intermediação de venda, mas estão vinculadas a um serviço independente, dirigido ao consumidor que não quer ou não pode imprimir seu ingresso virtual em casa.

De acordo com a ministra, se a entrega em domicílio gera um custo para a empresa responsável pela venda dos bilhetes, a retirada de bilhetes em posto físico também acarreta custos, porque há necessidade de um local e de atendentes, além do próprio custo da impressão.

‘‘Se há serviço disponibilizado ao consumidor, que pode optar, a seu critério, se vai imprimir seu ingresso em casa, se vai solicitar que ele seja entregue pelos correios, ou se vai preferir retirá-lo em bilheteria, e se o valor cobrado pelo serviço é acessível e claro, não há que se falar em abusividade’’, concluiu a ministra. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia aqui o acórdão

REsp 1632928

PROTEÇÃO AO COMPRADOR
Nova lei garante transparência e segurança em transações imobiliárias

Por Matheus Cannizza e Geovanna Nicolete

Reprodução: site da Aripar

A averbação de constrições judiciais em matrículas de imóveis é um procedimento fundamental para assegurar a transparência e segurança nas transações imobiliárias.

A ausência dessa averbação pode acarretar sérios prejuízos aos compradores de boa-fé, uma vez que podem desconhecer a existência de ônus sobre o imóvel, como penhoras, hipotecas judiciárias ou outras medidas constritivas decorrentes de processos judiciais.

Agora, este procedimento conta com uma novidade trazida pela Lei 14.825/2024, que tem como objetivo garantir a eficácia dos negócios jurídicos relativos a imóveis sem averbação na matrícula, mediante decisão judicial, de qualquer tipo de constrição judicial.

A nova lei consiste na inclusão de um inciso V no artigo 54 da Lei 13.097/2015, que trata das hipóteses de proteção dos adquirentes de imóveis. Este novo inciso prevê a averbação, mediante decisão judicial, de qualquer tipo de constrição judicial incidente sobre o imóvel ou sobre o patrimônio do titular do imóvel, incluindo aquelas provenientes de ações de improbidade administrativa ou oriundas de hipotecas judiciárias.

Tal medida representa um avanço na proteção dos direitos dos compradores. Afinal, a averbação judicial de constrições garante que eventuais ônus sobre o imóvel sejam devidamente registrados, possibilitando que outros interessados tenham pleno conhecimento da situação jurídica do bem.

Além disso, concentrar essas ações na matrícula do imóvel tem como objetivo reduzir a burocracia, eliminando a necessidade de terceiros realizarem várias diligências para verificar se há alguma situação que possa levar à anulação do contrato de compra e venda.

É importante ressaltar que a eficácia da Lei está condicionada à efetiva implementação e fiscalização por parte dos órgãos competentes, especialmente dos cartórios de registro de imóveis.

De todo modo, a Lei 14.825/2024 representa um importante avanço na legislação brasileira. A medida contribui de forma positiva para incrementar a transparência e segurança jurídica nas transações imobiliárias, protegendo os direitos dos adquirentes e promovendo a integridade no âmbito da administração pública.

Matheus Cannizza é coordenador da área cível estratégico e Geovanna Nicolete é estagiária do escritório Diamantino Advogados Associados

CRIMES AMBIENTAIS
A responsabilidade penal das pessoas jurídicas segundo a jurisprudência do STJ

Queimadas
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

A possibilidade de uma pessoa jurídica ser responsabilizada por conduta definida como crime, assim como ocorre com as pessoas físicas, tem base na própria Constituição Federal. Em seu artigo 173, parágrafo 5º, a Carta Magna estabelece que a legislação infraconstitucional deve definir a responsabilidade da pessoa jurídica pelos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular, sem prejuízo da responsabilização dos dirigentes. Já o artigo 225, parágrafo 3º, prevê que as condutas lesivas ao meio ambiente também estão sujeitas a sanções.​​​​​​​​​

Desmatamento ilegal: a Lei 9.605/1998 prevê a responsabilização penal das pessoas jurídicas pelos danos ao meio ambiente.​ Esses dispositivos constitucionais, contudo, ainda não foram completamente regulamentados, o que deixa margem para questionamentos sobre a extensão e os efeitos de eventual condenação criminal da pessoa jurídica.

A situação é mais clara apenas em relação aos delitos ambientais, porque a Lei 9.605/1998, ao dispor sobre as sanções penais derivadas de condutas lesivas ao meio ambiente, traz especificamente a previsão de responsabilização das pessoas jurídicas.

Ainda assim, o tema é controverso na doutrina e na jurisprudência, especialmente em relação às formas de execução da decisão condenatória, cabendo ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) trazer uma resposta a cada caso.

Superação da teoria da dupla imputação

Descarte irregular de agrotóxicos
Foto: Arquivo/Embrapa

Após o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), do RE 548.181, o STJ modificou a sua jurisprudência e deixou de adotar a teoria da dupla imputação para a responsabilização das pessoas jurídicas por crimes ambientais.

Antes, o STJ entendia que essa responsabilidade dependia da imputação concomitante da pessoa física que agia em nome da pessoa jurídica (ou em seu benefício). Isso porque, conforme explicou o ministro Reynaldo Soares da Fonseca no julgamento do RMS 39.173, ‘‘somente à pessoa física poderia ser atribuído o elemento volitivo do tipo penal (culpa ou dolo)’’.

Com a decisão da Suprema Corte, detalhou o ministro, o STJ seguiu o entendimento de que é possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais independentemente da responsabilização da pessoa física que a represente.

No recurso relatado pelo ministro, a Quinta Turma do STJ manteve ação penal contra a Petrobras por provocar danos ambientais durante a implantação do trecho marítimo do gasoduto do Projeto Manati na Baía de Todos os Santos, na Praia de Cairú, em Salinas da Margarida (BA), no ano de 2005. A empresa pedia o trancamento da ação contra ela em razão de a pessoa física ligada ao crime ter sido absolvida.

Reconhecimento da prescrição para pessoa jurídica só pode ser pedido por ela mesma

Reynaldo Soares da Fonseca também relatou embargos de declaração em um recurso no qual o sócio de uma pousada pediu o reconhecimento da prescrição da pena imposta ao estabelecimento por crime ambiental.

No EAREsp 1.439.565, o sócio alegou que houve omissão na decisão do ministro que indeferiu liminarmente os embargos de divergência em que sustentou essa tese.

Na avaliação do ministro, contudo, não havia como analisar o pedido, pois a pessoa física não poderia arguir tal matéria em nome da pessoa jurídica – o que foi feito pelo sócio tanto nos embargos de divergência quando nos embargos de declaração em análise.

‘‘Se a pessoa jurídica pretende arguir a extinção da punibilidade da pena a si imposta, deve fazê-lo em nome próprio’’, disse.

Prescrição de crimes ambientais é regulada pelo Código Penal

A prescrição antes do trânsito em julgado nos crimes ambientais, ainda que praticados por pessoa jurídica, e cuja pena não seja exclusivamente a de multa, deve ser regulada pelos prazos previstos no artigo 109 do Código Penal (CP). O preceito estabelece que ‘‘aplicam-se às penas restritivas de direito os mesmos prazos previstos para as privativas de liberdade’’.

Esse entendimento foi aplicado pela Sexta Turma no julgamento do AREsp 1.621.911, ao concluir que não houve a prescrição da pretensão punitiva do crime de poluição atmosférica praticado por uma empresa. A denunciada sustentou no STJ que deveria ser aplicada ao seu caso a regra contida no artigo 114, inciso I, do CP, que estabelece em dois anos o prazo prescricional da pena de multa.

Desmatamento irregular
Foto: Arquivo/Agência Brasil

O relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, explicou que a Lei 9.605/1998 definiu os delitos ambientais e as respectivas penas, mas não previu disposições específicas sobre a prescrição, razão pela qual são aplicáveis as regras contidas no CP aos crimes ambientais.

Segundo o ministro, o prazo prescricional de dois anos – sustentado pela empresa – aplica-se em apenas duas situações: quando a pena de multa for a única cominada abstratamente pela lei ou quando for a única aplicada concretamente pelo órgão julgador, o que não era o caso em julgamento.

O ministro disse que a Lei de Crimes Ambientais comina exclusivamente a pena privativa de liberdade ao delito de poluição. No caso, por se tratar de pessoa jurídica – esclareceu –, a aplicação da pena seria em uma das modalidades previstas no artigo 21 dessa lei.

O relator observou que a definição sobre qual das penalidades aplicar ao caso caberia ao juízo de origem, o qual deveria eleger, em eventual condenação e no exercício de sua discricionariedade motivada, a sanção adequada à repressão do delito.

‘‘Não se trata, portanto, da hipótese do artigo 114, I, do CP, haja vista que a multa não é a única cominada, abstratamente, ao crime do artigo 54, parágrafo 2º, da Lei 9.605/1998 e não é possível afirmar, neste momento processual, que ela será aplicada isoladamente, caso seja julgada procedente a acusação’’, expressou no voto.

Impossibilidade de celebrar acordo de delação premiada com pessoa jurídica

Vazamento de petróleo
Foto: Governo de Sergipe

Recentemente, no julgamento do RHC 154.979, a Sexta Turma do STJ declarou a ineficácia de uma colaboração premiada celebrada entre o Ministério Público de São Paulo (MPSP) e a empresa Camargo Côrrea, por entender que não há previsão legal para esse tipo de acordo.

‘‘A interpretação das leis penais e processuais penais merece relevante atenção, por tratarem, em maior ou menor extensão, do direito de liberdade do cidadão. Daí que essas normas, salvo se para beneficiar o investigado/acusado, ou em casos de normas efetivamente sem conteúdo penal, devem ser interpretadas de maneira a obedecer ao máximo o princípio da legalidade, sem extensões ou restrições em seu conteúdo’’, disse o relator do recurso, o desembargador convocado Olindo Menezes.

Ao apresentar um panorama da legislação a respeito do instituto da delação premiada, o relator destacou que o artigo 4º, parágrafo 6º, da Lei 12.850/2013, estabelece que a formalização do acordo ocorrerá entre ‘‘delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público’’.

Segundo explicou, não é possível o enquadramento de pessoa jurídica como investigada ou acusada no crime de organização criminosa – não sendo possível, dessa forma, qualificá-la como ente capaz de celebrar o acordo de colaboração premiada. O relator observou ainda que o mesmo artigo 4º tem entre seus requisitos o fator vontade para a celebração do acordo, o que não é possível de obter de pessoa jurídica.

Além do fato de só as pessoas físicas poderem ser penalmente responsabilizadas por esse tipo de crime, pois a responsabilização de pessoas jurídicas é limitada a poucos ilícitos penais, ‘‘a conclusão a que se chega é de que a lei se refere realmente apenas ao imputado pessoa física’’, afirmou Menezes.

Responsabilização penal de empresa não é transferida com incorporação

No julgamento do REsp 1.977.172, a Terceira Seção do STJ decidiu que a responsabilização penal de empresa incorporada não pode ser transferida à sociedade incorporadora. O colegiado fixou o entendimento de que o princípio da intranscendência da pena, previsto no artigo 5º, inciso XLV, da Constituição Federal, pode ser aplicado às pessoas jurídicas.

De acordo com o processo, o Ministério Público do Paraná (MPPR) ofereceu denúncia contra uma sociedade empresária agrícola, pelo suposto descarte de resíduos sólidos em desconformidade com as exigências da legislação estadual. Essa sociedade foi incorporada por outra empresa, que pediu a extinção da punibilidade diante do encerramento da personalidade jurídica da ré originária da ação penal. O Tribunal de Justiça do Paraná acolheu o pedido.

O relator do recurso no STJ, ministro Ribeiro Dantas, explicou que a incorporação é uma operação societária típica, por meio da qual apenas a sociedade empresária incorporadora continuará a existir, na qualidade de sucessora de todas as relações patrimoniais da incorporada, cuja personalidade jurídica é extinta.

Para o relator, a extinção legal da pessoa jurídica ré – sem nenhum indício de fraude – leva à aplicação analógica do artigo 107, inciso I, do CP, com o consequente término da punibilidade.

O ministro destacou, ainda, que o princípio da intranscendência da pena é aplicável às pessoas jurídicas, o que reforça a tese de que a empresa incorporadora não deve ser responsabilizada penalmente pelos crimes da incorporada. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

RMS 39173

EAREsp 1439565

AREsp 1621911

RHC 154979

REsp 1977172

CONDUTA OMISSIVA
Faxineira ganha dano moral por se expor a cenas de nudez e a escritos obscenos em banheiros

Permitir que uma trabalhadora seja exposta a cenas de nudez e a escritos de cunho sexual, no ambiente de trabalho, viola direitos de personalidade elencados no inciso X do artigo 5º da Constituição (intimidade, vida privada, honra e a imagem das pessoas), dando margem à reparação moral.

Por isso, a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais) manteve íntegra a sentença que condenou a Cia. Atual de Transportes (Via Atual) a pagar R$ 10 mil a uma faxineira, a título de danos morais.

Sem placa de interdição

Segundo o depoimento de uma testemunha, não havia placa de interdição durante o trabalho de limpeza dos banheiros, o que obrigava a reclamante a sair correndo quando os motoristas precisavam trocar de roupa. Como os banheiros eram muito sujos, ela tinha que parar a limpeza dos ônibus e voltar aos banheiros, mais de uma vez por dia.

Na parede de um dos banheiros, segundo esta testemunha, estava escrito ‘‘que iriam colocar na bunda da trabalhadora, ejacular nela e ter relacionamento com mais dois caras com ela’’. Nesse dia, ela chorou e foi se queixar à chefia. O encarregado disse que não podia fazer nada, pois desconhecia o autor das obscenidades.

Comportamentos reprováveis

No entanto, o juiz Luiz Cláudio dos Santos Viana, da 42ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, assegurou que a empregadora conhecia a situação constrangedora da reclamante e, ainda assim, agiu com negligência ao permitir que os comportamentos reprováveis continuassem.

Desembargadora Maristela Malheiros foi a relatora
Foto: Imprensa/TRT-3

‘‘O dano moral sofrido pela reclamante é evidente e, inclusive, independe de prova, bastando que se apliquem ao caso dos autos as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece (artigo 375 do CPC), sendo induvidosa a necessidade de reparação’’, cravou na sentença.

Negligência patronal

No segundo grau, a relatora do recurso ordinário, desembargadora Maristela Iris da Silva Malheiros, destacou que o ambiente de trabalho deve ser considerado um local sagrado, onde deve imperar e o respeito mútuo, para tornar a jornada de cada um menos árdua possível.

‘‘O que se espera de todos, de um modo geral é, no mínimo, o tratamento respeitoso com os demais. Ademais, como bem esclarecido pelo juízo a quo, a reclamada conhecia a situação constrangedora da reclamante e, ainda assim, agiu com negligência ao permitir que os comportamentos reprováveis continuassem”, registrou no acórdão. Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-3. 

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ATSum 0010851-32.2023.5.03.0019 (Belo Horizonte)