TRUQUE TRIBUTÁRIO
Convênio prolonga novela da transferência compulsória de créditos de ICMS

Por Gustavo Vaz Faviero e João Vitor Prado Bilharinho  

Diamantino Advogados Associados

Atribuída ao ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, a frase ‘‘no Brasil, até o passado é incerto’’ é pródiga para explicar diferentes aspectos do País. No Direito Tributário, especialmente, ela se aplica com uma frequência maior do que o desejável em um sistema funcional. É o caso da cobrança do ICMS nas transferências entre filiais de um mesmo contribuinte. Apesar do STF ter entendido que esse tipo de operação não seria tributado, os estados deram um jeito de garantir a arrecadação e descumprir a decisão da mais alta Corte do País.

No caso, o truque dos estados está na obrigação para que o contribuinte transfira seus créditos tributários. Considerando que o intuito da não cumulatividade do ICMS é justamente proteger o contribuinte, é ilógico atribuir um caráter compulsório à transferência de créditos em operações interestaduais de estabelecimentos da mesma pessoa jurídica. Assim, os estados criaram a figura exótica da ‘‘opção compulsória’’, por meio do Convênio 178/2023, do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), violando a Lei Kandir, que, em seu artigo 12, parágrafo 4º, assegura ao contribuinte a transferência do crédito – mas não o obriga a fazê-lo.

Relembrando: o Supremo decidiu que não há circulação jurídica do bem na transferência de mercadorias para estabelecimentos da mesma pessoa jurídica, uma vez que a titularidade sobre a mercadoria não é alterada, razão pela qual não haveria incidência do ICMS sobre essas operações.

Por não ser cumulativo, o valor devido decorre do resultado de um encontro de contas entre os créditos que o contribuinte possui e os débitos decorrentes das saídas tributadas. Em casos de saídas não tributadas, haveria a necessidade do estorno proporcional dos créditos decorrentes desta operação.

Diante das dúvidas que surgiram quanto ao tratamento que seria dado aos créditos, o STF decidiu três pontos importantes em embargos de declaração.

Primeiro: o estabelecimento remetente não deve estornar os créditos decorrentes das operações de transferência. Segundo: os estados deveriam disciplinar a forma de transferência dos créditos de ICMS acumulados no estabelecimento remetente até o final de 2023. Caso isso não ocorresse, os contribuintes ficariam autorizados a proceder com essa operação mesmo sem regulamentação específica.

Terceiro: com base no voto do ministro Barroso, ficou entendido que a transferência de créditos é um direito do contribuinte, mas não uma obrigação. Assim, poderia escolher a forma de destino do seu crédito.

Para atender a determinação do Supremo, os estados aprovaram o Convênio ICMS 178/2023, visando disciplinar a transferência dos créditos por meio de quatro regras básicas.

A primeira, que a apropriação do crédito pelo estabelecimento destinatário seria procedida de uma espécie de tributação prévia do crédito, em que o remetente registraria no livro de saída um débito equivalente ao imposto a ser transferido. Sob a ótica da decisão do ADC 49 há um tratamento curioso na operação, uma vez que se passou a tributar o crédito como forma de controle dos saldos a serem transferidos.

A segunda regra é que a sistemática do convênio não importa no cancelamento ou modificação dos benefícios fiscais concedidos pela unidade federada de origem.

No caso de operações interestaduais, a terceira regra prevê que o crédito a ser transferido é calculado da mesma forma que a operação era anteriormente tributada. Isso porque, o imposto a ser transferido corresponderá ao resultado da aplicação de percentuais das alíquotas interestaduais sobre o valor da entrada mais recente da mercadoria ou o custo da mercadoria produzida.

A quarta determinação é justamente a que atribui uma obrigatoriedade quanto à transferência do crédito ao não permitir que o contribuinte opte por transferir o crédito ou não. Ou seja, o entendimento fixado pelo STF no julgamento da ADC 49 garantiu ao contribuinte o direito subjetivo, com natureza facultativa, de transferir o montante que julgar necessário para suas operações, sem a necessidade da tributação do ICMS. Tanto é assim que nas operações de transferências dentro do mesmo estado não há a obrigatoriedade da transferência do crédito.

Assim, o convênio que deveria finalizar uma discussão e dar efetividade à decisão do STF, abriu um novo flanco de disputa entre o contribuinte e o Fisco que o Judiciário terá novamente que analisar.

Gustavo Vaz Faviero é coordenador da área tributária e João Vitor Prado Bilharinho é advogado da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados

RECURSOS REPETITIVOS
Incide contribuição previdenciária patronal sobre adicional de insalubridade, decide STJ

Ministro Herman Benjamin foi o relator
Foto: Imprensa/TSE

No julgamento do Tema 1.252, sob o rito dos repetitivos, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou a tese segundo a qual ‘‘incide a contribuição previdenciária patronal sobre o adicional de insalubridade, em razão da sua natureza remuneratória’’.

O relator, ministro Herman Benjamin, mencionou que a contribuição previdenciária devida pela empresa está prevista no artigo 195, inciso I, letra ‘‘a’’, da Constituição Federal, que também estabelece que ‘‘os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e consequente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei’’ (artigo 201, parágrafo 11).

Já a Lei 8.212/1991, em seu artigo 22, inciso I, estabelece que a contribuição previdenciária a cargo da empresa é de 20% sobre o total das remunerações pagas durante o mês aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que prestem serviços, destinadas a retribuir seu trabalho.

O ministro lembrou que o STJ consolidou jurisprudência no sentido de que não sofrem a incidência de contribuição previdenciária ‘‘as importâncias pagas a título de indenização, que não correspondam a serviços prestados nem a tempo à disposição do empregador’’.

‘‘Por outro lado, se a verba trabalhista possuir natureza remuneratória, destinando-se a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, ela deve integrar a base de cálculo da contribuição’’, acrescentou.

Adicional de insalubridade possui natureza remuneratória

Herman Benjamin observou que o artigo 189 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) define os requisitos para que uma atividade seja considerada insalubre, sendo orientação pacífica das duas turmas de direito público do STJ que o respectivo adicional tem natureza remuneratória, sujeitando-se à incidência da contribuição previdenciária patronal.

O ministro também ressaltou que o adicional de insalubridade não consta no rol das verbas que não integram o conceito de salário de contribuição (parágrafo 9° do artigo 28 da Lei 8.212/1991) – devidas ao empregado e trabalhador avulso –, uma vez que não é importância recebida de forma eventual, mas sim habitual.

‘‘Em se tratando de verba de natureza salarial, é legítima a incidência de contribuição previdenciária sobre o adicional de insalubridade’’, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.050.498

REsp 2050498

REsp 2050837

REsp 2052982