INSEGURANÇA JURÍDICA
Decisão do Superior Tribunal de Justiça sobre ‘‘tese do século’’ pode prejudicar contribuintes?

Por Douglas Guilherme Filho

Diamantino Advogados Associados

A máxima que diz que no Brasil até o passado é incerto já entrou para sabedoria popular. A frase, atribuída ao ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, tem feito especial sentido para quem atua no campo tributário.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que cabe ação rescisória da União contra decisões favoráveis ao contribuinte que contrariem o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) no caso denominado ‘‘tese do século’’. Tomada em sede de recurso repetitivo (Tema 1.245), a decisão deve ser seguida por todo o Judiciário.

O problema é que o STF levou quatro anos para chegar a um entendimento final. A ‘‘tese do século’’, como ficou conhecida a discussão sobre incluir o ICMS na base de cálculo do PIS/Cofins (Tema 69), impediu a União de cobrar essas contribuições com a base de cálculo majorada de forma incorreta por conta da cobrança indevida do imposto estadual.

O julgamento em questão ocorreu em 15 de março de 2017 e, a partir daquela data, a União não poderia mais exigir o recolhimento do PIS/Cofins de maneira majorada.

Por se tratar de decisão proferida em sede de Repercussão Geral, o entendimento ali firmado deveria ter efeitos ex-tunc (retroativos), autorizando, ainda, a restituição do valor indevidamente recolhido antes do julgamento.

No entanto, após Embargos de Declaração da União, o STF modulou os efeitos de forma ex-nunc: ou seja, a decisão só teria eficácia a partir do julgamento de mérito, ressalvados os casos em que os contribuintes já tivessem ingressado com ações judiciais.

A solução parecia simples. Os contribuintes que tivessem ajuizado ações antes da data fixada pelo STF poderiam reaver os valores recolhidos nos cinco anos anteriores. Caso contrário, só poderiam pleitear a restituição a partir de 15 de março de 2017. Acontece que os Embargos de Declaração só foram julgados em 13 de maio de 2021. Mais de quatro anos após o julgamento de mérito.

Nesse período, diversos contribuintes ajuizaram ações objetivando afastar a exigência do recolhimento do PIS/Cofins majorado, bem como reaver os valores recolhidos indevidamente.

É justamente daí que vem a insegurança jurídica em relação à decisão do STJ. Isso porque, durante os quatro anos entre os dois julgamentos do STF, diversos contribuintes obtiveram decisões judiciais transitadas em julgado reconhecendo o direito à restituição, inclusive antes de 15 de março de 2017.

Ao permitir que a União ajuíze ações contra decisões transitadas em julgado, a Corte Superior faz regra morta das garantias constitucionais, especialmente as que tratam do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada.

Em outras palavras, o STJ deu um cheque em branco para a União questionar todas as ações que tenham transitado em julgado durante o período que o STF levou para julgar os Embargos de Declaração.

Em termos financeiros, a decisão do STF reduz substancialmente o direito de os contribuintes recuperarem tributos indevidamente recolhidos, tornando incerto até mesmo o passado daqueles que confiaram no Poder Judiciário.

Douglas Guilherme Filho é coordenador da área tributária no escritório Diamantino Advogados

RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
Cuidadora não consegue responsabilizar filho de idosa por débitos trabalhistas

Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil/Secom

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que o filho de uma idosa não tem responsabilidade pelo contrato de emprego firmado por sua irmã com uma cuidadora para acompanhar a mãe, que estava acamada.

De acordo com o colegiado, não houve fraude ou sucessão entre empregadores para justificar a responsabilização do homem, que não estava registrado como empregador nem dirigia os serviços da profissional.

Cuidadora disse que foi contratada pelos dois filhos da idosa

A trabalhadora ajuizou reclamatória trabalhista contra os dois filhos da idosa para pedir o pagamento de verbas rescisórias e adicional noturno, entre outros direitos, alegando ter sido contratada por ambos.

O juízo da 14ª Vara do Trabalho de Vitória (ES) deferiu parte das parcelas pedidas, mas excluiu o filho da idosa do processo.

Segundo ficou provado, ele não morava na mesma casa nem era responsável direto pelos cuidados com a mãe, que ficavam a cargo de sua irmã, que com ela residia e contratava e pagava as cuidadoras.

Ao julgar recurso, o Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (TRT-17, Espírito Santo) aplicou a responsabilidade solidária ao filho da idosa. Apesar de confirmar as provas, o TRT entendeu que, em se tratando de empregada doméstica, são responsáveis pela condenação todas as pessoas que se beneficiam dos serviços prestados; ou seja, o núcleo familiar.

‘‘O filho, embora não residisse no local da prestação de serviços, dele se beneficiava, mesmo que de forma indireta, uma vez que eram voltados à sua genitora, já idosa, por quem teria o dever legal de zelar’’, registrou a decisão.

Parentesco não torna o filho responsável

O ministro Breno Medeiros, relator do recurso de revista do filho, explicou que o contrato de trabalho não tem como requisito formal a pessoalidade do empregador, e, por isso, sua substituição no curso da relação não modifica o vínculo de trabalho. Contudo, no caso, não se trata de fraude nem sucessão entre empregadores.

Para o ministro, não cabe aplicar a chamada responsabilidade solidária com base apenas na constatação dos deveres gerais de cuidado que as regras de Direito Civil impõem aos descendentes. Segundo Breno Medeiros, a simples relação de parentesco não torna o filho responsável pela relação de trabalho. Com informações de Guilherme Santos, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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RR – 354-86.2020.5.17.0014

AÇÃO CIVIL PÚBLICA
TRT-15 condena Petrobras a pagar dano moral coletivo por prática de atos antissindicais

Sede do TRT-15, em Campinas (SP)

A 9ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região  (TRT-15, Campinas-SP)  julgou improcedente recurso interposto pela Petrobras, condenada a pagar R$ 30 mil por dano moral coletivo em virtude da prática de atos antissindicais, apurados em ação civil pública movida pelo Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Destilação e Refino de Petróleo de São José dos Campos e Região.

Pela ACP, a empresa foi acusada de praticar, por meio de um de seus gerentes ‘‘atos antissindicais não apenas em face da entidade, mas também diretamente às pessoas físicas de seus dirigentes’’. Um advogado da empresa também foi acusado de criar um grupo de WhatsApp com mais de 200 pessoas, que recebiam essas mensagens.

Segundo afirmou o Sindicato, em 15/3/2015, um gerente da empresa ‘‘elaborou um boletim intitulado ‘Brocha’, que seria um trocadilho maldoso com o nome do boletim editado semanalmente pelo Sindicato autor chamado ‘Tocha’, remetendo artigos por e-mail em nome da empresa para diversos empregados, com o intuito de difamar e ridicularizar a entidade e seus dirigentes sindicais’’.

A empresa não negou a ocorrência dos fatos imputados ao gerente, porém argumentou que a conduta, ainda que reprovável no âmbito cível, não é punível no âmbito da relação de trabalho, uma vez que se trata de ato praticado fora do ambiente laboral e sem o conhecimento, participação ou autorização do empregador.

A empresa também pediu que fosse aplicada a prescrição trienal quanto aos danos morais coletivos, destacando que os fatos narrados quanto ao ‘‘folhetim’’ remontam ao ano de 2015, sendo que a presente ação foi proposta apenas em abril de 2019.

A relatora do acórdão, a juíza convocada Camila Ceroni Scarabelli, afirmou que, ‘‘de fato, como decidido na Origem, o prazo a ser considerado para a prescrição das pretensões formuladas na ACP é o de cinco anos, previsto na Lei nº 4.717/65, nos termos, aliás, do entendimento consolidado no TST’’. Ressaltou que ‘‘não é possível se acolher a tese de que a atitude do emitente, seu funcionário, se deu inteiramente desvinculada do trabalho, mas verdadeiramente em razão dele, para prejudicar a entidade sindical e seus dirigentes, os desmoralizando’’.

O acórdão destacou que ‘‘aquela atitude, absolutamente temerária, com grande potencial de prejudicar a atividade da entidade de classe, cumulou-se com a comprovação de criação de grupo de WhatsApp, pelo advogado da empresa, intentando prejudicar o dirigente do sindicato-autor, como apurou-se na audiência’’. Foi apurado nos autos que ‘‘o grupo de WhatsApp tinha mais de duzentas pessoas, de diversos setores, do que se infere ter havido amplitude na comunicação nas frases ali exteriorizadas’’, salientou o acórdão.

A empresa se defendeu, mais uma vez, afirmando ter tomado conhecimento dos dizeres do panfleto denominado ‘Brocha’ por intermédio de outros empregados da equipe da refinaria, encaminhados para cerca de 20 a 25 pessoas, para os seus e-mails particulares, e que, verificando que tal folhetim/panfleto ‘Brocha’ provinha do seu gerente, deslocou-o para outra área, administrativa, com menor salário, e sem muito contato com o sindicato.

O colegiado concluiu, assim, que nesse contexto, ‘‘é evidente que a empresa deve ser responsabilizada, com fulcro no art. 186 do CC, art. 927 do CC e art. 932, III do CC, pelos atos praticados por funcionários seus, em razão do trabalho, não podendo dissociar a conduta daquelas pessoas de seu labor’’, e que ‘‘o ato de retirada do cargo não isenta a empregadora da sua responsabilidade civil pelos atos daquele que elege como seus empregados e prepostos’’. Soma-se a isso o fato de que os funcionários colocados em cargo de gerência ‘‘são de inteira confiança da empresa, muitas vezes agindo em seu nome e cujas ações influenciam uma vasta quantidade de empregados’’ e, por isso, ‘ ‘‘não há como escusar a empresa dos atos em questão’’. Com informações da Comunicação Social do TRT-15.

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ACPCiv 0010368-26.2019.5.15.0013 (S. José dos Campos-SP)