CARRO PARADO
Prazo de 30 dias para reparo de produto defeituoso não afeta direito ao ressarcimento integral dos danos materiais

​A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o prazo de 30 dias previsto no artigo 18, parágrafo 1º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), não limita a obrigação do fornecedor de indenizar o consumidor – o qual deve ser ressarcido integralmente por todo o período em que sofreu danos materiais.

Na ação de danos materiais e morais ajuizada contra a Ford Motor Company Brasil Ltda. a concessionária Motomagazine Automotores Ltda. (Tropical), de Sinop (MT), o autor afirmou que comprou um carro com cinco anos de garantia e que, em menos de 12 meses, ele apresentou problemas mecânicos e ficou 54 dias parado nas dependências da segunda concessionária, devido à falta de peças para reposição.

O caso chegou ao STJ após o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) decidir que, além da indenização por dano moral, o consumidor tinha o direito de ser indenizado pelos danos materiais apenas em relação ao período que excedeu os primeiros 30 dias em que o carro permaneceu à espera de reparo. A corte local se baseou no parágrafo 1º do artigo 18 do CDC.

CDC não afasta responsabilidade integral do fornecedor

O relator na Quarta Turma, ministro Antonio Carlos Ferreira, disse que o CDC não exclui a responsabilidade do fornecedor durante o período de 30 dias mencionado no dispositivo, mas apenas dá esse prazo para que ele solucione o defeito antes que o consumidor possa escolher a alternativa legal que melhor lhe atenda: substituição do produto, restituição do valor ou abatimento do preço.

O ministro destacou que o prazo legal ‘‘não representa uma franquia ou tolerância para que o fornecedor cause prejuízos ao consumidor nesse período sem responsabilidade alguma’’.

De acordo com o relator, uma interpretação sistemática do CDC, especialmente em relação ao artigo 6º, inciso VI – que trata do princípio da reparação integral –, impõe que o consumidor seja ressarcido por todos os prejuízos materiais decorrentes do vício do produto, sem limitação temporal.

‘‘Se o consumidor sofreu prejuízos em razão do vício do produto, fato reconhecido por decisão judicial, deve ser integralmente ressarcido, independentemente de estar dentro ou fora do prazo’’, completou.

Consumidor não pode assumir risco em lugar da empresa

Antonio Carlos Ferreira comentou que uma interpretação diversa transferiria os riscos da atividade empresarial para o comprador, contrariando a lógica do sistema de proteção ao consumidor. Conforme apontou, o CDC busca evitar que a parte mais fraca arque com os prejuízos decorrente de defeitos dos produtos.

O ministro ressaltou, por fim, que este entendimento não deve ser interpretado como uma obrigação genérica dos fornecedores de disponibilizarem produto substituto durante o período de reparo na garantia.

‘‘O que se estabelece é que, uma vez judicialmente reconhecida a existência do vício do produto, a indenização deverá abranger todos os prejuízos comprovadamente sofridos pelo consumidor, inclusive aqueles ocorridos durante o prazo do artigo 18, parágrafo 1º, do CDC.’’ Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 1935157

OMISSÃO INCONSTITUCIONAL
STF dá prazo de 180 dias para Congresso criar crime de retenção dolosa de salários

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, que há omissão do Congresso Nacional ao não criar lei que defina como crime a retenção dolosa dos salários (quando o patrão deixa intencionalmente de pagar o salário do empregado ou parte dele). A Corte deu prazo de 180 dias para que seja elaborada uma norma tipificando o delito.

A decisão foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 82, na sessão virtual do Plenário encerrada em 23/5. A Procuradoria-Geral da República (PGR), autora da ação, argumentou que há demora inconstitucional do Poder Legislativo em editar lei que criminalize a conduta.

A Constituição Federal estabelece a proteção do salário como direito de todos os trabalhadores urbanos e rurais, ‘‘constituindo crime sua retenção dolosa’’. Ocorre que não foi editada norma penal para tipificar esse delito desde a promulgação da Carta Magna, em 1988.

O relator da ação, ministro Dias Toffoli, destacou que, passados quase 40 anos, o Legislativo ainda não elaborou norma sobre o crime, apesar de determinação expressa da Constituição. Ele considerou haver ‘‘inércia prolongada com repercussão social significativa’’. Também afirmou que o salário faz parte do patrimônio mínimo existencial dos trabalhadores e que deve ter ampla proteção jurídica.

Conforme o relator, a jurisprudência do STF reconhece que não há violação à separação dos Poderes nos casos em que a Corte determina um prazo para o Congresso editar norma que vise resolver uma omissão constitucional. Com informações de Lucas Mendes, da Assessoria de Imprensa do STF.

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ADO 82

ESTEREÓTIPO DE GÊNERO
Vendedora em Curitiba receberá indenização de R$ 15 mil por postura machista de gerente

É poder diretivo do empregador contratar e despedir sem necessitar justificativa, porém transcende aos seus direitos e poderes humilhar, aterrorizar, coagir e perseguir empregados. São condutas que ferem direitos de personalidade elencados no inciso X do artigo 5º da Constituição – a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas.

Por isso, a 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9, Paraná) reformou sentença da 14ª Vara do Trabalho de Curitiba para condenar em danos morais a Cristália Produtos Químicos e Farmacêuticos Ltda., cujo gerente tentava induzir uma propagandista-vendedora a se vestir de forma mais sexy para ‘‘favorecer as atividades comerciais’’. Valor da reparação: R$ 15 mil.

Segundo o processo, o gerente da autora da ação tinha postura sexista e machista. Ele insinuava com frequência a maneira com que ela deveria se vestir e se apresentar nos momentos em que visitava médicos para vender os produtos. Inclusive insinuava a utilização de saia mais curta.

Para o relator do acórdão, desembargador Arion Mazurkevic, o gerente sugeriu à trabalhadora a performance de um padrão específico de feminilidade em prejuízo da dignidade da trabalhadora.

A seu ver, a repercussão negativa das situações relatadas no processo ‘‘é inquestionável, pois se via privada de tratamento respeitoso em razão de estereotipificação e discriminação de gênero’’, sublinhou. O magistrado citou em sua decisão o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

‘‘Estereótipos traduzem visões ou pré-compreensões generalizadas sobre atributos ou características que membros de um determinado grupo têm, ou sobre os papéis que desempenham ou devem desempenhar’’, (…) sendo ‘‘de extrema importância que magistradas e magistrados estejam atentos à presença de estereótipos e adotem uma postura ativa em sua desconstrução’’, afirma o protocolo.

Da decisão, cabe recurso de revista ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). Redação Painel de Riscos com informações de Gilberto Bonk Junior/Ascom/TRT-PR.

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ATOrd 0001082-47.2023.5.09.0014 (Curitiba)

INSEGURANÇA JURÍDICA
O duplo pagamento de honorários em processos extintos de regularização fiscal

Vitor Benvenuti, do Diamantino Advogados Associados (DAA)/Divulgação

Por Vitor Fantaguci Benvenuti

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou para julgamento, sob o rito dos repetitivos, uma importante questão envolvendo processos fiscais. Com o Tema 1.317, a Corte decidirá se o contribuinte pode ser condenado ao pagamento de honorários advocatícios em Embargos à Execução Fiscal quando o processo é extinto por renúncia ou desistência, com o objetivo de incluir os débitos em programa de regularização fiscal que já abrange os honorários da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).

A decisão final deverá ser obrigatoriamente aplicada por todos os juízes e tribunais do país. Para entender a controvérsia e seu enorme impacto financeiro sobre as empresas brasileiras, é preciso uma breve contextualização.

É comum que, durante a tramitação dos Embargos à Execução Fiscal, apresentados pelo contribuinte para contestar a cobrança de determinado tributo, seja editada uma lei que permita a regularização fiscal com benefícios (como redução de multas e juros, além de pagamento parcelado). Geralmente, um dos requisitos para adesão ao programa é a desistência de ações judiciais e a renúncia ao direito discutido nelas.

Uma vez tomada essa providência pelo contribuinte, o juiz deverá homologar a desistência ou renúncia e extinguir o processo com resolução de mérito (artigo 487, III, “c”, do Código de Processo Civil).

De acordo com o artigo 90 do Código de Processo Civil, a extinção do processo por desistência ou renúncia implica a condenação da parte desistente ao pagamento dos ônus de sucumbência. No entanto, os próprios programas de regularização fiscal costumam prever que o pagamento com os benefícios já abrange os honorários da Procuradoria.

Surge, então, a controvérsia: o contribuinte deve ser condenado ao pagamento de honorários nos Embargos à Execução Fiscal mesmo quando esses já foram quitados no âmbito do programa?

Em relação ao tema, vale lembrar que já existe precedente vinculante do STJ, que analisou a questão no âmbito federal. No julgamento do REsp 1.143.320/RS, sob o rito dos repetitivos (Tema 400), foi fixada a seguinte tese: ‘‘A condenação, em honorários advocatícios, do contribuinte que formula pedido de desistência dos embargos à execução fiscal de créditos tributários da Fazenda Nacional, para fins de adesão a programa de parcelamento fiscal, configura inadmissível bis in idem, tendo em vista o encargo estipulado no Decreto-Lei 1.025/69’’.

A lógica desse julgamento foi que, especificamente no âmbito federal: (i) a Certidão de Dívida Ativa (CDA) já inclui ‘‘encargos legais/honorários’’ no percentual de 20% sobre o valor dos débitos; e (ii) existe previsão legal de que tais encargos/honorários substituem a condenação do contribuinte ao pagamento de verba honorária nos embargos (artigo 3º do Decreto-Lei 1.645/1978 e Súmula 168 do extinto Tribunal Federal de Recursos).

A jurisprudência dos Tribunais de Justiça é oscilante, embora existam decisões aplicando o mesmo entendimento do Tema 400/STJ às execuções fiscais de Estados e Municípios, nos casos em que a própria lei instituidora do programa de regularização fiscal deixa claro que os honorários estão incluídos.

Contudo, as procuradorias vêm sustentando que os honorários abrangidos pelos programas de regularização se referem apenas à execução fiscal, e não aos embargos. Isso porque, ao contrário das CDAs federais, que já incluem honorários, as CDAs estaduais e municipais, via de regra, referem-se apenas aos débitos principais. Os honorários da execução são fixados pelo juiz no despacho de citação do executado.

Por isso, as procuradorias argumentam ser possível cumular os honorários da execução (quitados via programa) com os dos embargos (fixados na sentença de homologação da desistência), desde que respeitado o teto previsto no CPC – conforme tese firmada no Tema 587 do STJ.

O problema é que, na maioria das vezes, as legislações estaduais e municipais não especificam claramente quais honorários estão abrangidos pelo programa de regularização fiscal (apenas os da execução ou também os dos embargos), induzindo o contribuinte ao erro.

Essa indefinição gera grave insegurança jurídica. É inadmissível que o contribuinte, agindo de boa-fé e com base na interpretação razoável da norma, seja surpreendido com nova cobrança de honorários não prevista expressamente na legislação do benefício fiscal.

Diante desse cenário, é essencial que o STJ forneça uma solução clara e célere para a controvérsia, garantindo segurança jurídica. Caso contrário, haverá desestímulo à adesão aos programas de regularização, prejudicando tanto os contribuintes quanto a arrecadação dos próprios entes federativos.

Vitor Fantaguci Benvenuti é advogado da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados

DIREITOS AUTORAIS
Spotify indenizará em danos morais compositor que não teve o nome citado nas obras musicais

Reprodução/Routenot.Com/Blog

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O autor de uma música tem o direito de ter o seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado nessa condição nas utilizações de sua obra, como indica o artigo 24, inciso II, da Lei 9.610/98 (Lei dos Direitos Autorais). Em caso de omissão, como aponta o artigo 108, haverá responsabilização civil.

Foi o que aconteceu com a Spotify Brasil Serviços de Música, que foi condenada a pagar R$ 10 mil, a título de danos morais, por não indicar o nome do compositor João Deoclides Martins em 15 canções oferecidas em sua plataforma de streaming.

O juízo da 34ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo entendeu que a não citação do compositor na plataforma violou dispositivos da Lei 9.610/98 (artigos 7º, inciso V; 22; 24, incisos I e II; 27; e 28), e da Constituição Federal (artigo 5º, incisos XXVII e XXVIII, alínea ‘‘b’’).

Segundo a juíza Ana Helena Cardoso Coutinho Cronemberger, a Spotify explora comercialmente a plataforma, mediante a utilização de obras de terceiros. Assim, tem a obrigação de se assegurar de que os direitos dos autores das obras estão sendo integralmente respeitados.

‘‘Os acordos que realiza com os terceiros geram efeitos única e exclusivamente entre ela e tais terceiros, sendo que, se [for] o caso, deve buscar junto a eles o respectivo ressarcimento. Entretanto, os danos que vier a causar na exploração da plataforma, com a qual busca e alcança lucro, tem o dever de indenizar’’, escreveu na sentença. Noutras palavras: a empresa deve exigir que terceiros lancem os fonogramas acompanhados de informações exatas a respeito da autoria das obras.

A 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou integralmente os termos da sentença, inclusive, mantendo o quantum reparatório de R$ 10 mil. O relator das apelações, juiz convocado Ronnie Herbert Barros Soares, também rebateu o argumento de ausência de responsabilidade, em função do Marco Civil da Internet.

‘‘Ademais, não há falar em ausência de responsabilidade com base na Lei nº 12.965/2014 (Marco Civil da Internet), uma vez que a atividade desenvolvida pela demandada não se confunde com a atuação de provedores de internet, no sentido da mera disponibilização de conteúdo gerado por terceiros’’, fulminou o relator.

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1151792-72.2023.8.26.0100 (São Paulo)

 

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