TRIBUTAR É PRECISO
Produção fiscal de 2024 só serviu mais impostos ao contribuinte

Charge do Cícero (Correio Braziliense)

Por Eduardo Diamantino

Viradas de ano são momentos propícios para se olhar para o que passou. E, quem sabe, aprender com os erros, para não os repetir. O ano de 2025 começa com a sensação de que 2024 ainda não terminou. Afinal, a produção de maldades que elevam a carga tributária foi bem intensa. E seus efeitos serão sentidos por um bom tempo.

Fica uma certeza para o futuro: o governo Lula 3 veio para aumentar a carga tributária. No início do mandato, se falava em racionalização das regras, via reforma tributária e reforma administrativa. Passados esses dois anos, é indiscutível que, entre cortar gastos ou elevar a carga tributária, a preferência pela segunda opção é patente.

O discurso de perseguição aos benefícios fiscais foi uma constante. Criou-se uma narrativa de que esses benefícios são a fonte de todas as mazelas fiscais enfrentadas pelo Brasil. A narrativa vem tomando corpo em repetidas declarações. E passou a ser acompanhada por uma lista criada pela União em que quase tudo virou favor fiscal. Ela pode ser consultada no site do Ministério da Fazenda. Até mesmo o Fies, mecanismo que financia o acesso ao ensino superior, passou a integrá-la.

O que precisa ser lembrado é que a maioria de tais benefícios começou no primeiro mandato de Lula, quando representavam 1,96% do PIB até atingirem, no final do governo Dilma, algo como 4,19%. De lá para cá, cresceram pouco. Hoje, não chegam a 5%.

Mas o discurso mudou. O mantra agora é: tudo que diminui a arrecadação do Estado deve ser combatido, independentemente de sua finalidade ou razão de ser. É a adoção distorcida do princípio da igualdade. O enunciado clássico Tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais teve a sua segunda parte subtraídaQuem se submete a algum tipo de regra tributária que reduza a carga deve ser vigiado. Nesse objetivo, foi editada a MP 1.227/24 e a IN 2204/24, criando mais uma obrigação acessória para controlar referidos benefícios. Tudo de forma rápida e arbitrária.

Nessa linha, temos de destacar a edição da MP 1227, carinhosamente conhecida como MP do fim do mundo, que pretendeu acabar com a compensação cruzada, dentre outras barbaridades. Do nada e rapidamente surgiu a medida. Dessa vez, num ato de lucidez, o Congresso Nacional devolveu o texto ao Executivo.

Editou-se também a Lei 14.973/24, que reabriu a possibilidade de declaração de ativos não declarados no exterior e a atualização do valor de imóveis no Brasil. A adesão a essas oportunidades deve ter sido baixíssima, tendo em vista que não passam de forma de aumentar a arrecadação do governo, trazendo pouquíssimos benefícios aos que a elas aderiram. A reavaliação de imóveis tem o dom de arrecadar e não entregar nenhum a economia efetiva, visto que, para valer de verdade, demora vários anos.

Açodamento no Congresso e a esfera estadual

Na reforma tributária, acompanhamos o trâmite de dois projetos de lei complementar: o PLP 68, que cria o IBS, CBS e IS; e o PLP 108, que cria o Comitê Gestor de IBS e CBS, regula o processo administrativo do Imposto e trata do ITCMD.

Tivemos a conclusão do trâmite do PLP 68 junto ao Congresso, agora aguardando a sanção presidencial. Já o PLP 109 foi abandonado por uma questão de tempo. Segue firme para 2025 e é imprescindível para o novo sistema tributário funcionar em 2026.

Em todas as fases em que passaram os referidos projetos, como Câmara, comissões e Senado, ficou claro o açodamento das referidas aprovações. Muita coisa foi incluída ou excluída de forma precipitada. Pedir o texto final antes da votação passou a ser um luxo desnecessário.

Devemos registrar também algumas declarações prometendo um aumento na tributação dos chamados super ricos. Nessa linha de argumentação, é injusto que algumas pessoas tenham mais que outras. Iniciativa empreendedora e incentivo aos investimentos passaram a ser detalhes que não devem ser considerados. A resposta a essas ideias é a cotação do dólar, que subiu abruptamente nas últimas semanas.

Para não deixar de falar da esfera estadual, merece registro a demora do Estado de São Paulo na retificação do Convênio 100, sobre insumos agropecuários, que ainda não foi completamente renovado, mantendo só uma parte dos benefícios. Um exemplo de como trazer insegurança jurídica ao setor agro.

Por outro lado, merece registro que o tão esperado aumento de alíquota do ITCMD, dado como certo por inúmeras pessoas, e a sua duplicação de alíquota de 4% para 8%, não ocorreu. O valor será o mesmo ao menos nos Estados de São Paulo e Minas Gerais. De tudo o que aconteceu, estamos aqui diante de um presente de Natal.

No âmbito do Judiciário, temos de registrar que a questão da sub-rogação do Funrural foi mais uma vez postergada. Entrou em pauta no Supremo Tribunal Federal por cinco ou seis vezes em 2024 e segue sem uma definição clara de seu destino. Não custa lembrar que é uma derivação da questão do Funrural, julgado constitucional pelo próprio STF no já longínquo ano de 2017.

Na minha visão, os pontos mencionados têm uma linha comum e preocupante. Todos são frutos de uma busca incessante por arrecadação. A carga tributária deve subir para acompanhar as despesas públicas, cada vez maiores. Para complicar a questão, foram todas elas feitas de forma rápida, gerando uma certa surpresa em todos os contribuintes. São características de governos que desconsideram o processo legislativo e argumentos em contrário. Aumentar a arrecadação é o que importa. Para os próximos dois anos nos parece que já sabemos o que acontecerá.

Eduardo Diamantino é advogado tributarista, especializado em agronegócio, sócio do Diamantino Advogados Associados

PESO DOS TRIBUTOS
PIS/Cofins em serviços na Zona Franca de Manaus: a bola está com o STJ

Foto: Divulgação/Suframa

Por Beatriz Palhas Naranjo e Guilherme Saraiva Grava

Em recente decisão, o Supremo Tribunal Federal decidiu que não tem repercussão geral a discussão a respeito da cobrança de PIS/Cofins sobre as receitas obtidas com a prestação de serviços para pessoas físicas e jurídicas na Zona Franca de Manaus (Tema 1.363).

Os ministros entenderam que o assunto envolve aspectos legais e não constitucionais, o que justifica a competência do STJ para analisá-lo. Por esse motivo, o julgamento será realizado pelo Superior Tribunal de Justiça, no Tema Repetitivo n° 1.239, em que já houve a determinação de suspensão dos recursos especiais ou agravos em recursos especiais em segunda instância e/ou no STJ fundados em idêntica questão de direito.

Regulada pelo Decreto-Lei 288/1967, a Zona Franca de Manaus foi instituída pelo Governo Federal com o objetivo de promover o desenvolvimento econômico e social do norte do Brasil, atraindo indústrias para a região.

Assim, as indústrias que se instalam na ZFM fazem jus a incentivos fiscais, incluindo incentivos sobre o PIS/Cofins.

Sobre essas contribuições, as Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 asseguram a não incidência das contribuições sobre receitas decorrentes de operações de prestação de serviços para pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior. Já o artigo 4° do Decreto-Lei n° 288/1967 equipara a venda de mercadorias para a ZFM à exportação para fins de não incidência desses tributos.

Sem incidência de PIS/Cofins para serviços na ZFM

É com base nessa equiparação que o Superior Tribunal de Justiça, em decisões anteriores a afetação do Tema Repetitivo 1.239, aplicou o entendimento de que não deve haver a incidência do PIS/Cofins sobre as receitas obtidas com a prestação de serviços para a Zona Franca de Manaus.

A controvérsia, no entanto, gira em torno da interpretação da legislação sobre a não-incidência de PIS/Cofins nas operações realizadas dentro da ZFM, considerando as especificidades das atividades de prestação de serviços.

Por um lado, empresas situadas fora da ZFM que prestam serviços para empresas da zona franca têm questionado a aplicação de PIS/Cofins sobre os valores recebidos pela prestação desses serviços.

Por outro lado, a Receita Federal e o Fisco sustentam que a não incidência concedida pela ZFM se aplica apenas a produtos industrializados e que as receitas de serviços não se enquadram nas exceções previstas pela legislação, sendo, portanto, sujeitas à tributação.

Esse impasse tem sido amplamente discutido nos tribunais superiores, especialmente no STJ, que tem se debruçado sobre a natureza das receitas provenientes da prestação de serviços para a ZFM e a forma de aplicação dos benefícios fiscais.

O artigo 4° do Decreto-Lei 288/67 prevê que a exportação de mercadorias de origem nacional para consumo ou industrialização na Zona Franca de Manaus, ou reexportação para o estrangeiro, deve ser para todos os efeitos fiscais, constantes da legislação em vigor, equivalente a uma exportação brasileira para o estrangeiro.

Equivalência às exportações

Assim, a venda de mercadorias a empresas situadas na ZFM, que equivale à exportação de produto brasileiro para o estrangeiro, é isenta do PIS/Cofins uma vez que as legislações que regulamentam as contribuições preveem a não incidência em operações para o exterior.

Já estava consolidado o entendimento do STJ acerca da venda de mercadorias para ZFM. Em relação às receitas provenientes de prestação de serviços, o Tribunal vem aplicando o entendimento de que seria uma violação ao princípio da isonomia a exclusão dessas receitas do referido benefício fiscal.

Ou seja, se não incide PIS/Cofins sobre a venda de mercadorias para ZFM, também não deve incidir sobre as receitas provenientes da prestação de serviços sob pena de violação ao princípio da isonomia que estaria excluindo os prestadores de serviços dos benefícios fiscais destinados ao desenvolvimento da ZFM.

Em sentido contrário ao entendimento do STJ, como mencionado, a Receita Federal possui o entendimento de que as receitas dessas operações estão sujeitas ao pagamento do PIS/Cofins tendo em vista que a exportação de serviços para ZFM não poderiam ser equiparadas a uma exportação internacional.

Julgamento importante para empresas da ZFM

O julgamento a ser realizado pelo STJ terá implicações significativas para as empresas que prestam serviços para empresas localizadas na ZFM, uma vez que, se desfavorável, a decisão poderá resultar em um aumento da carga tributária sobre as receitas obtidas com a prestação de serviços.

Isso poderá afetar, inclusive, a competitividade das empresas prestadoras de serviços, uma vez que os custos tributários poderão ser repassados aos clientes.

Porém, a possibilidade de extensão da não incidência das contribuições para serviços diretamente relacionados à produção industrial na ZFM pode representar uma oportunidade para as empresas que oferecem esse tipo de serviço, visto que poderiam se beneficiar da redução da carga tributária.

Portanto, o que se espera é que o julgamento seja favorável aos contribuintes a fim de dirimir a divergência de entendimentos sobre o tema.

Beatriz Palhas Naranjo e Guilherme Saraiva Grava são advogados da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados

ARTIGO ESPECIAL
Ódio aos judeus requentado: o boicote à excelência judaica

Nazistas intimidando judeus em Berlim
Foto Divulgação/Gatestone Institute

Por Nils A. Haug

Tradução: Joseph Skilnik

Os chamamentos no Ocidente para boicotar israelenses são sistêmicos e indicam uma agenda agressiva generalizada ao redor do mundo para apagar a influência judaica na academia, ciência, tecnologia e cultura. A verdadeira explicação para essas iniciativas de boicote, ao que tudo indica, é o ódio aos judeus profundamente arraigado em várias sociedades ocidentais.

Em novembro de 2024, um tanto furtivamente, Ayelet Shaked, ex-ministra da Justiça de Israel, por mais estranho que possa parecer, teve a permissão negada de entrar na Austrália para participar de uma conferência para debater sobre os atuais acontecimentos no Oriente Médio. A conferência foi organizada pelo Conselho para Assuntos Judaicos e Israelenses da Austrália (AIJAC), programada para ser um evento da comunidade judaica.

Colin Rubenstein, diretor executivo da AIJAC, rechaçou a negativa de visto, realizada sem nenhuma justificativa divulgada na época, pelo ministro australiano de assuntos internos, Tony Burke. Na opinião de Rubenstein, a decisão de recusar um visto a Shaked, com base no argumento de que ela iria difamar os australianos e incitar a discórdia na comunidade, é um ato vergonhoso de hostilidade em relação a uma democracia aliada.

Recusar a entrada em um país ocidental de um ex-ministro israelense é simplesmente mais um incidente de um movimento global de exclusão de personalidades judaico/israelenses das plataformas digitais. Em janeiro de 2022, cerca de 20 eventos culturais foram cancelados em protesto contra o patrocínio da embaixada de Israel na Austrália de uma apresentação da Sydney Dance Company, programada para ser apresentada no festival cultural de Sydney. O cancelamento se deu com base em um trabalho da Batsheva Dance Company, de Tel Aviv, e do coreógrafo israelense Ohad Naharin, mas a difamação ocorreu devido às conexões israelenses/judaicas.

Um relatório de dezembro de 2023, do Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Civil de Israel, alertou que ‘‘estão ocorrendo boicotes não oficiais no mundo acadêmico do Ocidente’’. As consequências para Israel podem ser sérias, segundo o relatório, já que essas ‘‘práticas discriminatórias podem prejudicar a economia, que depende da vitalidade científica de país de startups’’.

O relatório ainda acrescenta:

‘‘Desde 7 de outubro, começou uma espécie de boicote às escondidas aos pesquisadores israelenses, jamais visto antes. Esse boicote se reflete no cancelamento de convites para conferências conjuntas, na rejeição de artigos para publicação, na rejeição de bolsas a pesquisadores israelenses e muito mais’’.

O relatório menciona ações realizadas anteriormente, no caso em março de 2022, pela Associação de Estudos do Oriente Médio (MESA), com sede nos Estados Unidos, nas quais um boicote acadêmico contra instituições israelenses, instigado pelo movimento BDS, foi aprovado por uma grande maioria dos membros da MESA, mas condenado pela Agência de Engajamento Acadêmico, grupo encarregado de defender os direitos dos cidadãos.

Em resposta à proibição, a Associação para o Estudo do Oriente Médio e da África (ASMEA), rival da MESA, fundada pelos falecidos professores Bernard Lewis e Fouad Ajami, ‘‘apontou para o padrão de dois pesos e duas medidas na resolução da MESA e o dano que causará à liberdade acadêmica’’, segundo o JNS.

O presidente da ASMEA, professor Norman Stillman, escreveu em um comunicado:

‘‘Ao aprovar esta resolução para colocar na lista negra e boicotar instituições israelenses de ensino superior, os membros da MESA abandonaram qualquer pretexto de ser uma associação acadêmica em favor de uma organização com uma singular causa política: deslegitimar Israel. O abandono pela MESA dos princípios básicos de integridade acadêmica e liberdade, ou seja, a livre expressão de ideias, está profundamente enraizado em velhos preconceitos e parcialidades’’.

Embora todas as tentativas de deslegitimar a excelência judaica no cenário mundial devam ser condenadas de imediato, o marco da hipocrisia dos atores antissemitas e antissionistas ocidentais foi destacado pelos eventos em torno da publicação em 1988 do livro Os Versos Satânicos, de Salman Rushdie. Num momento de imensa pressão de muçulmanos ofendidos para proibir o livro, as nações ocidentais não estavam inclinadas a bani-lo. Eles acertadamente afirmaram que a liberdade acadêmica fazia parte de sua tradição constitucional.

A então primeira-ministra do Reino Unido, Margaret Thatcher, justificou a publicação do polêmico trabalho pelo Ocidente. ‘‘A liberdade de expressão’’, salientou ela, ‘‘era um princípio de grande importância’’ e o assunto envolvia ‘‘soberania nacional e direito internacional’’, nenhuma das quais proibia a impressão do texto.

Comparada à postura de princípio dos líderes ocidentais de defender a liberdade acadêmica e a liberdade de expressão na época do controverso livro de Rushdie, em se tratando de aplicar os tais direitos a escritores, acadêmicos, empreendedores, intelectuais, especialistas, cientistas e afins judeus/israelenses, sem mais nem menos, de uma hora para a outra, os princípios constitucionais tão badalados estão sendo ignorados, até por instituições acadêmicas de prestígio como a Universidade da Pensilvânia.

Em setembro de 2023, e em nome da liberdade acadêmica, a Universidade da Pensilvânia sediou um ‘‘Festival de Escritores de Literatura Palestina’’ em seu campus na Filadélfia, apresentando ‘‘alguns dos mais execráveis antissemitas do planeta’’. Os palestrantes escolhidos sequer eram reconhecidos como ‘‘escritores, acadêmicos ou especialistas literários’’. O festival foi considerado por um crítico como um ‘‘festival de ódio antissemita pró-BDS’’, que defendia a destruição do estado judeu. Sem causar espécie, não foi aceita a participação de judeus/israelenses.

No mesmo estilo, o ‘‘Festival de Literatura da Palestina’’ (Palfest), autodenominado de ‘‘iniciativa cultural’’, ocorrido em outubro de 2024, ‘‘anunciou que mais de mil escritores assinaram um boicote literário a Israel’’, segundo um relatório do Wall Street Journal.

Em uma carta aberta, esses escritores disseram que eles não permitirão que seus livros sejam traduzidos para o hebraico, conceder entrevistas a revistas e jornais israelenses, participar de conferências ou fazer palestras em Israel ou trabalhar com editoras e agentes literários israelenses. A Palfest, orgulhosamente, descreve sua própria atitude como ‘‘o maior boicote cultural contra instituições israelenses da História’’.

Entre os signatários da carta de boicote se encontram vencedores do Prêmio Pulitzer, ganhadores do Prêmio Nobel, MacArthur Fellows e assim por diante. Na sequência, mais 5 mil escritores assinaram o boicote.

Esses não são incidentes isolados. São sistêmicos e indicam uma agenda agressiva generalizada ao redor do mundo para apagar a influência judaica na academia, ciência, tecnologia e cultura. A estratégia dos inimigos de Israel e dos judeus é uma reminiscência dos objetivos do Partido Comunista Chinês, digamos, sobre Taiwan: isolar completamente Taiwan dos assuntos mundiais, em todas as áreas, política, financeira, econômica e cultural. Neste caso, teria dado certo não fosse pelo apoio a Taiwan pelos EUA e outros aliados. Os Estados Unidos e o Ocidente também deveriam apoiar Israel nesse caso.

A arrogância por trás da intenção de cancelar, desmantelar, privar e negar a profunda sabedoria, brilho e excelência de homens e mulheres excepcionais que contribuíram tanto para o ethos, a cultura e a grandeza da civilização ocidental é difícil de compreender. Dos ganhadores do Prêmio Nobel, 22% são judeus (de 0,2% da população mundial), entre eles Albert Einstein, Niels Bohr (cuja mãe era judia, ficando, portanto, na corda bamba durante a era nazista), Eli Wiesel e Milton Friedman. A esses notáveis também seria negada uma plataforma caso aparecessem no cenário mundial de hoje.

A verdadeira explicação, ao que tudo indica, é o ódio aos judeus profundamente arraigado em várias sociedades ocidentais. Isso ficou escondido por anos a fio numa fachada de tolerância e sutilezas sociais, mas agora, nas palavras de Steven Spielberg, o antissemitismo ‘‘não está mais à espreita, e sim na crista da onda, orgulhoso de si’’, tal como na Alemanha na década de 1930.

Ari Ingel, diretor executivo da Comunidade Criativa para a Paz, disse em resposta à carta de boicote de outubro:

‘‘Esses chamamentos ao boicote, agora liderados pelos próprios membros da comunidade literária, são uma reminiscência do boicote de 1933 aos autores judeus, quando os antissemitas queimaram mais de 25.000 livros. As obras de autores judeus como Albert Einstein e Sigmund Freud, juntamente com obras dos americanos Ernest Hemingway e Helen Keller, também foram queimadas. É para onde as coisas estão indo mais uma vez’’.

As palavras do Conde Stanislas de Claremont-Tonnerre, na época da Revolução Francesa, tentam analisar a animosidade em relação ao povo judeu: ‘‘aos judeus deve ser negado tudo como nação, mas concedido tudo individualmente… A existência de uma nação dentro de uma nação é inaceitável para o nosso país’’.

Stanislas, portanto, condenou a sua existência como nação, soberbamente refutada em 1948.

O jornalista Daniel Greenfield observa que, na visão dos ativistas ocidentais, ‘‘o antissemitismo sempre teve como premissa redefinir a existência judaica como antinatural e artificial. Os judeus já eram condenados como colonizadores desde a época do Faraó… Os judeus, sendo semitas, não pertencem à Europa. Os judeus, sendo europeus, não pertencem a Israel. Os judeus, sendo sionistas, não pertencem às instituições progressistas como Harvard ou Columbia. E os judeus, sendo ocupadores, não pertencem a Londres’’.

Ele continua, ‘‘não se trata de Israel’’, e sim ‘‘tem tudo a ver com os judeus’’. Sem rodeios, o ostracismo cultural e acadêmico é simplesmente o ódio aos judeus.

Ao mesmo tempo, essas atitudes também refletem a agonia dessa malevolente concepção, que favorece o grupo sobre o indivíduo, conhecido como política de identidade. Ela causou vastas cisões danosas na arena pública e agora se manifesta em um gritante preconceito irracional e raivoso sob o disfarce de uma reivindicação tendenciosa de justiça social contra uma nação, uma religião, um grupo étnico de estudiosos, intelectuais, cientistas e gênios criativos amantes da paz que valorizam a liberdade, a moralidade, a inovação e a excelência.

A nação judaica tem um chamamento divino para ‘‘trazer luz’’ ao mundo com sabedoria, verdade e justiça equânime perante a lei. Esses valores começaram com os códigos mosaicos, que introduziram rubricas definitivas de virtude. ‘‘O povo judeu trouxe a moralidade ao mundo há milhares de anos’’, comentou Safra Catz, CEO da Oracle, ‘‘e algumas pessoas ainda estão malucas por causa disso’’.

Neste momento de turbulência internacional, o mundo precisa da expertise e sabedoria das melhores mentes e grandes estadistas, incluindo as dos judeus. Se essa excelência geracional milenar for negada ao Ocidente neste momento sombrio de pós-verdade, pós-moralidade e barbárie em expansão, especialmente no Ocidente, será em detrimento da civilização e da sociedade ocidentais.

Nils A. Haug é advogado, escritor, especialista em teoria política e ética e articulista do Gatestone Institute – centro de estudos e conselho de política internacional dedicados a educar o público sobre temáticas que os meios de comunicação de massa deixam de promover

SEM PRESUNÇÃO DE DANO
Prova de prejuízo ao erário em ação de improbidade reforça legitimidade da Justiça

Diamantino Advogados Associados

Por Matheus Cannizza e Geovanna Nicolete

Quando se trata de ações de improbidade administrativa, a boa técnica jurídica deve ser capaz de separar o clamor popular que usualmente cerca esses processos e aplicar a legislação conforme as características do caso concreto. Foi o que fez o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao decidir que os danos ao erário também devem ser comprovados em casos anteriores à Lei 14.230/2021, que reformou a Lei de Improbidade Administrativa (LIA).

Sob a relatoria do ministro Gurgel de Faria (REsp 1.929.658/TO), a 1ª Turma do STJ inaugurou um relevante movimento de virada jurisprudencial. O ministro esclareceu que, até então, vigorava na Corte a presunção de dano causado por atos considerados lesivos ao erário. Essa presunção, no entanto, não encontrava amparo direto no texto legal, mas derivava da consolidação das decisões anteriores do próprio STJ.

Em seu voto, o ministro Paulo Sérgio Domingues destacou a necessidade de superação do entendimento consolidado, observando que, até o advento da nova lei, era admitida ‘‘a possibilidade de condenação com base no artigo 10 da LIA quando os fatos representassem potencial perda patrimonial’’. O ministro relator acrescentou que a revisão do entendimento jurisprudencial abrange todo o rol do artigo 10 da LIA, de modo que ‘‘o dano presumido, para qualquer figura típica do artigo 10 da LIA […], não pode mais dar suporte à condenação pela prática de ato ímprobo’’.

A posição da 1ª Turma, portanto, representa um marco importantíssimo na mudança de jurisprudência, com impacto sobre todos os casos que ainda não transitaram em julgado. Esse entendimento traz maior racionalidade a processos contra pessoas que, muitas vezes, são demandadas com base em ilações ou acusações genéricas, sem a necessária individualização dos atos tidos como ímprobos ou a demonstração clara dos supostos danos causados.

A exigência de comprovação de dano efetivo reforça a necessidade de um esforço investigativo mais rigoroso por parte do Ministério Público e de outros órgãos de controle, que deverão demonstrar de maneira inequívoca o prejuízo sofrido pelo erário. Essa abordagem evita condenações automáticas baseadas em conjecturas ou suposições, assegurando maior respeito ao devido processo legal e ao princípio da ampla defesa.

No âmbito da administração pública, a decisão sublinha a importância do cumprimento estrito dos princípios da legalidade e da eficiência. A contratação sem licitação, como no caso analisado pelo STJ, embora permitida em situações excepcionais, deve ser fundamentada em critérios objetivos e devidamente justificada, sob pena de nulidade e responsabilização dos gestores.

A recente decisão, portanto, representa um avanço significativo na aplicação da Lei de Improbidade Administrativa, ao exigir a comprovação de dano efetivo ao erário, inclusive em casos anteriores à reforma de 2021. Essa mudança promove maior segurança jurídica, impedindo condenações baseadas apenas em presunções, e fortalece o respeito ao devido processo legal.

Ao enfatizar a necessidade de provas concretas, o STJ contribui para uma atuação mais criteriosa por parte dos órgãos de controle e reforça a importância de uma gestão pública responsável e transparente. A jurisprudência, assim, avança no sentido de equilibrar o combate à corrupção com a proteção dos direitos individuais, fortalecendo a legitimidade de todo o sistema de Justiça.

Matheus Cannizza e Geovanna Nicolete integram a área de contencioso cível estratégico do escritório Diamantino Advogados Associados

GESTÃO PROFISSIONAL
Governança em empresas familiares: estruturas e instrumentos essenciais

Advogada Liège Fernandes Vargas, do escritório CPDMA

A governança corporativa em empresas familiares tem ganhado cada vez mais relevância no cenário empresarial brasileiro, no qual cerca de 90% das empresas possuem controle familiar. A ausência de um planejamento adequado para a sucessão do negócio e a dificuldade de manter a harmonia nas relações familiares, em muitos casos, culminam no fracasso da empresa após a terceira geração. Nesse contexto, a criação de mecanismos eficazes de governança e a implementação de estruturas formais são fundamentais para a continuidade e sustentabilidade dessas organizações.

As empresas familiares enfrentam o desafio de conciliar a gestão profissional do negócio com os valores e tradições familiares. A governança familiar, estruturada através da criação de conselhos, objetiva oferecer essa conciliação. O Conselho de Família, por exemplo, é um órgão (não societário) que possibilita a comunicação entre os membros familiares e auxilia na resolução de conflitos, na preservação dos valores da família e no planejamento da sucessão. Já o Conselho de Administração, órgão deliberativo previsto na Lei das Sociedades Anônimas, proporciona uma visão estratégica e imparcial sobre a gestão do negócio, sendo composto, muitas vezes, por membros externos que trazem uma abordagem mais técnica e profissional​.

Além dessas estruturas, a utilização de instrumentos jurídicos específicos é indispensável para assegurar a governança familiar. Nesse sentido, o Acordo de Sócios – também chamado de Acordo de Quotistas ou Acionistas, dependendo da natureza jurídica da sociedade – regula aspectos societários como a compra e venda de ações e o direito de voto, garantindo previsibilidade nas decisões empresariais futuras. Já o Protocolo Familiar, também conhecido como Estatuto Familiar, estabelece normas de convivência e responsabilidades entre os membros da família, envolvidos direta ou indiretamente no negócio, criando uma estrutura que minimiza conflitos internos e favorece a continuidade dos valores a serem passados ao longo das gerações.

Para implementação dessas estruturas de governança, podem ser utilizadas empresas no formato de holdings (as chamadas holdings familiares). Conceitualmente, a holding pode ser definida como uma pessoa jurídica que centraliza o controle organizacional e/ou patrimonial do grupo familiar, seja através de (i) uma holding pura, focada exclusivamente na gestão de participações em outras sociedades; (ii) uma holding mista, que agrega também outras atividades empresariais; ou, ainda, (iii) uma holding patrimonial, que tão somente administra o patrimônio familiar. Essas estruturas facilitam o planejamento sucessório e a administração do patrimônio, contribuindo para a perpetuação e preservação do negócio, podendo ainda acarretar a redução da carga tributária.

Analisando os desafios enfrentados por empresas familiares, um dos principais pontos de desgaste na relação familiar é a falta de interesse das gerações futuras em participar da gestão do negócio. Pesquisas recentes apontam que mais de 50% dos herdeiros não desejam se envolver diretamente na administração da empresa – pesquisa da consultoria KPMG mostra este quadro. Nesse cenário, é crucial que as famílias empresárias criem mecanismos de governança que permitam a continuidade do negócio, mesmo que a gestão direta passe a ser realizada por profissionais externos.

Ao mesmo tempo, é importante que os entes familiares que estão no controle e na gestão do negócio criem estruturas que fomentem as gerações mais novas a participarem e a entenderem as premissas familiares, oportunizando que estes tragam pontos de vista e mudanças do mundo contemporâneo que podem impactar diretamente na perpetuidade do negócio, principalmente aquelas de cunho tecnológico.

Dessa forma, ao combinar todos esses elementos, a governança corporativa familiar pode ser efetivamente implementada em diversas estruturas.

Ressalta-se, por fim, que as empresas familiares demonstram, muitas vezes, a dificuldade de separar o contexto empresarial da relação familiar, misturando os problemas de ambas as relações. Por tais razões, é recomendável que a implementação seja realizada também com auxílio de um consultor ou advogado; ou seja, um agente externo à relação familiar.

Clique aqui para ler o estudo da KPMG

Liège Fernandes Vargas é coordenadora da Área de Direito Societário do escritório Cesar Peres Dulac Müller Advogados (CPDMA)