DEMARCAÇÕES DE TERRAS
STF contemplou a ‘‘teoria do indigenato”

Por Lívia Bíscaro de Carvalho

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Além de afastar a tese do Marco Temporal para demarcação de terras indígenas, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a tese de repercussão geral com 13 itens para o Tema 1.031, o que terá efeito vinculante a orientar o julgamento de outros processos.

A decisão do STF alinha-se à ‘‘teoria do indigenato’’, que sustenta o direito originário dos povos indígenas às terras que ocupavam antes da formação do estado brasileiro. Seu oposto é a ‘‘teoria do fato indígena’’, em que a data da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988, é a referência para o reconhecimento das terras ocupadas – e serve de sustentação para o Marco Temporal.

Os debates não são novos. A tese do ‘‘fato indígena’’ surgiu em 2008 com o parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima, quando esse critério foi usado – o documento foi redigido pelo vice-procurador da República Roberto Gurgel. Em 2009, o STF decidiu que os indígenas tinham direito à terra em disputa, pois viviam nela na data da promulgação da Constituição.

Na época, o STF definiu uma série de parâmetros para a demarcação dos territórios indígenas brasileiros. Em 2017, a publicação do Parecer Normativo 1/2017, publicado pela AGU, também abriu brechas para aplicação da tese do Marco Temporal ao determinar a adoção de uma série de restrições às demarcações das terras indígenas – chamadas ‘‘salvaguardas institucionais’’ no caso Raposa Serra do Sol, tornando-as mais tarde sem efeito vinculante.

O fato é que a presença dos povos indígenas no território brasileiro existe desde antes da chegada dos portugueses ao país e mesmo as constituições anteriores à de 1988 cuidaram de assegurar a posse de áreas em que estivessem localizados com caráter permanente.

Inclusive, pela ‘‘teoria do indigenato’’ a ocupação de terras ultrapassa tão somente a habitação para incluir espaços de relevância para cultura e exploração, tal como está disposto atualmente no artigo 231 da Constituição Federal. Em contraponto, a teoria do ‘‘fato indígena’’ considera o direito à terra uma concessão do estado, decorrente da ocupação, a partir da promulgação da Constituição de 1988. Ou seja, o texto constitucional de 1988 não estabeleceu limite temporal para o início da ocupação tradicional, bem como o direito dos indígenas sobre suas terras não depende de qualquer legitimação.

Diante deste impasse, o STF afastou a tese do ‘‘fato indígena’’ por 9 votos a 2, julgando o Marco Temporal inconstitucional. No entanto, a indenização, que até então só contemplava as benfeitorias, agora foi ampliada para terra nua se demonstrada a aquisição de boa-fé, inclusive com direito de regresso da União contra o ente federativo que titulou a área.

Na prática, é louvável que se reconheça o erro do estado e, consequentemente, os direitos daqueles que estão na posse e na exploração da área por terem adquirido títulos presumivelmente legítimos. Afinal, reconhecer a terra como pública não é motivo para deixar de compensar financeiramente aquele que investiu recursos baseados em ato jurídico revestido de boa-fé. O mesmo raciocínio, inclusive, deve ser adotado para faixa de fronteira.

De todo modo, ainda há incertezas se a indenização terá apuração justa e em prazo razoável a fim de que essa suposta compensação pela perda do bem não se torne mais uma longa disputa como em alguns tipos de desapropriação.

As discussões ultrapassam os limites do Judiciário. No final de 2023, o Congresso Nacional promulgou a Lei 14.701/23, que restabeleceu o Marco Temporal com a derrubada do veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a este dispositivo. Ocorre que o Congresso não pode restabelecer algo que o Supremo julgou inconstitucional – e uma série de ações contra a nova lei aponta isso para a Corte. Como se vê, é um debate que está longe de terminar.

Lívia Bíscaro Carvalho é coordenadora da área cível no escritório Diamantino Advogados Associados

RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
A importância de analisar a posição de dependência econômica das empresas

Por Lara Fernanda de Oliveira Prado

No intricado cenário das relações contratuais empresariais brasileiras, surge uma questão que transcende a mera formalidade dos acordos: a dependência econômica.

A reflexão sobre esse tema ganhou destaque à luz de um processo judicial recente, com o julgamento do Recurso Especial 1.989.291-SP, que gerou debates sobre a paridade contratual e o exercício abusivo de posição dominante. Este conflito evidenciou a complexidade das relações comerciais entre uma empresa multinacional e um representante brasileiro.

O cerne da polêmica está na validade de uma cláusula de limitação de responsabilidade, que foi objeto de análise da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A decisão do STJ, ao validar a cláusula de limitação de responsabilidade em favor da multinacional, destaca a presunção de paridade nas relações contratuais comerciais. Contudo, é imperativo questionar se esta presunção é consistente com a realidade das relações de poder subjacentes a tais contratos.

Avaliação da dependência econômica

Nesta relação, o distribuidor brasileiro viu-se numa posição de dependência econômica da multinacional, o que comprometeu significativamente a sua capacidade de negociação. A multinacional, detentora de maior poder econômico e de mercado, aproveitando a sua supremacia contratual, impôs cláusulas desfavoráveis ​​cujo único objetivo era aumentar abusivamente os seus lucros em detrimento do distribuidor.

Surge então a necessidade de repensar a liberdade contratual ilimitada nos contratos comerciais, de abordar situações em que uma das partes se encontra em clara desvantagem, de considerar a presença de assimetrias de poder e vulnerabilidades que as prejudicam excessivamente.

A dependência econômica contratual não é uma mera abstração jurídica, é uma realidade vivida por diversas empresas que se encontram numa posição de inferioridade e sem poder de negociação, face aos gigantes corporativos. O exercício abusivo de uma posição dominante pode mesmo conduzir a concorrência desleal e dificuldades financeiras.

Dessa forma, a admissão irrestrita de cláusulas limitantes de responsabilidade incentiva a sua maior elaboração nos contratos societários. Acontece que o reforço desta cultura contratual é problemático, pois impede que a parte vulnerável seja compensada pela verdadeira magnitude do dano que lhe foi causado.

Neste contexto, é importante considerar a teoria do terceiro contrato, introduzida pela doutrina italiana, que reconhece a existência de uma categoria contratual intermediária entre o contrato clássico e o contrato de consumo. Esta teoria aplica-se especialmente às relações entre empresas, nas quais uma das partes se encontra numa posição fraca em relação à outra.

Sob esse ângulo, haveria uma intervenção judicial criteriosa, com delicado equilíbrio entre a proteção dos contratantes mais vulneráveis ​​e a preservação do princípio da autonomia contratual. Diante disso, destaca-se a importância de identificar no caso específico a real dependência econômica de uma das partes e verificar se houve abuso derivado desta situação.

Assim, o reconhecimento do terceiro contrato como uma categoria contratual distinta abre caminho para uma abordagem mais equilibrada das relações comerciais. Isto porque os extremos estabelecidos no domínio do direito contratual não abrangem todas as variedades contratuais que, pelas suas características específicas, não se enquadram neste binário. É preciso buscar uma regulamentação que leve em conta as particularidades das relações.

Enquanto os países europeus buscam soluções para enfrentar a dependência econômica contratual, aproximando-a do abuso de posição dominante no contexto da legislação antitruste ou da aplicação de princípios do direito do consumidor, o Brasil carece de estrutura para enfrentar esse problema.

Vale destacar que a presunção de paridade estabelecida pelo Código Civil Brasileiro é relativa (art. 421-A.), podendo ser descartada em função de elementos específicos que justificam o desequilíbrio entre as partes. No entanto, a interpretação desta presunção e a regulação da liberdade contratual deixam margem para divergências entre os tribunais. Enquanto alguns seguem uma abordagem mais cautelosa, utilizando princípios do Código de Defesa do Consumidor e do Código de Processo Civil, outros adotam uma postura mais liberal, priorizando a autonomia da vontade das partes sem restrições, conforme decidiu o STJ no REsp 1.989.291.

Esta reflexão torna-se relevante para empresas que buscam segurança jurídica em suas transações comerciais. Portanto, é fundamental promover um diálogo mais amplo e detalhado sobre a dependência econômica nas relações contratuais, considerando as suas implicações no ambiente empresarial. Só assim será possível criar soluções jurídicas mais equitativas e adaptadas às complexidades destas interações comerciais.

Lara Fernanda de Oliveira Prado é sócia da área cível e trabalhista no escritório Diamantino Advogados Associados

Painel de Riscos divulgou o desfecho do julgamento do STJ

JUDICIALIZAÇÃO
Negativas de planos fazem mal à saúde de pacientes e empresas

Por Maria Letícia Mesquita

Diamantino Advogados Associados

Quando se trata de planos e seguro saúde, uma das frequentes insatisfações de seus beneficiários são as negativas de serviço. O cerne da dúvida permeia sobre o limite das negativas por parte de tais empresas. Afinal, as recusas são abusivas?

Em recente decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) condenou um convênio privado a garantir a uma beneficiária cobertura domiciliar para tratamento medicamentoso de bipolaridade. A decisão se pautou principalmente na Lei 14.454/2022, que introduziu o parágrafo 13 no artigo 10 da Lei 9.656/98, ao afirmar, categoricamente, que ‘‘cabe ao médico escolhido pelo beneficiário estabelecer qual o método e os materiais mais adequados para o tratamento da condição’’.

No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem fixado, desde 2022, que o rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) tem caráter exemplificativo. Apesar de os magistrados terem que analisar a particularidade de cada caso, a postura demostra cada vez mais a inclinação do Judiciário a adotar entendimentos pró-consumidor na matéria.

Por fim, demonstrando que os planos e seguradoras de saúde não conseguirão se eximir de suas obrigações, o STJ determinou (REsp 1.945.959) que uma empresa fosse compelida a ressarcir o Estado de Santa Catarina por atendimento não emergencial determinado judicialmente, via SUS, de paciente segurado. Tal medida se baseia no seguinte raciocínio: rejeitar o pedido do ente público na ação regressiva proposta culminaria no ‘‘patrocínio Estatal da atividade privada’’, conforme apontado pelo ministro Gilmar Mendes no RE 597.064/RJ.

Como se as excessivas negativas administrativas já não fossem o suficiente, o problema ganha novos contornos a partir de uma nova e ousada alternativa dos empresários do ramo: o não cumprimento de decisões judiciais. Em apenas um plano, um dos maiores do mercado, estima-se que apenas nos últimos seis meses de 2023 a operadora tenha descumprido aproximadamente uma centena de decisões judiciais em caráter de urgência – média de uma desobediência a cada dois dias.

Sobre a argumentação de que está apenas exercendo seu direito à ampla defesa, a seguradora agora é alvo de inquérito instaurado pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) para apurar a suposta conduta irregular e abusiva praticada pelo grupo.

Em um país em que o acesso à saúde privada através de empresas do ramo já é realidade para mais de 22% da população, segundo dados da ANS, e a adesão a esse tipo de contrato é exponencial, ficam os questionamentos: é possível harmonizar os interesses dos clientes com a sustentabilidade financeira do negócio? Onde residirá a livre iniciativa empresarial dos ofertantes quando se há vasta judicialização da demanda em desfavor de suas negativas?

A resposta passa por uma conduta defendida por magistrados: as seguradoras poderão escolher para quais tipos de enfermidade oferecerão cobertura, mas não poderão limitar as modalidades de tratamento e intervenções médicas. Garantir uma prestação de serviço de qualidade se mostra muito palpável quando se observa que o necessário é apenas respeitar os critérios médicos e científicos estabelecidos por aqueles que já acompanham os segurados.

A consequente diminuição de judicialização de demandas se mostra benéfica tanto para consumidores quanto para as empresas, uma vez que os processos judiciais englobam não apenas o tratamento ou medicamento requerido, mas também verbas indenizatórias e custas processuais.

A quem insiste em descumprir decisões que revertem negativas abusivas negativas, cabe à ANS, junto com o Judiciário, investigar e coibir a prática com seriedade e da maneira mais ágil possível. É iminente a necessidade de garantir a que o princípio da dignidade da pessoa humana em seu acesso à saúde coexista em harmonia e bom funcionamento com o aspecto financeiro almejado pelas empresas do ramo.

Maria Letícia Mesquita é sócia da área cível no escritório Diamantino Advogados Associados.

REGULAMENTAÇÃO
IPVA na reforma tributária: o diabo mora nos detalhes

Por Vitor Fantaguci Benvenuti

Com a recente aprovação da Reforma Tributária (Emenda Constitucional 132/2023), o sistema tributário nacional já passou e ainda passará por mudanças significativas. Em relação ao Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), o ponto que mais chamou a atenção da mídia, certamente, foi a nova tributação de jatinhos e iates.

Contudo, apesar do apelo que envolve o tema, há questões que merecem ser acompanhadas de perto, especialmente em razão da necessidade de regulamentação específica de cada unidade federativa. Afinal, diz o ditado, ‘‘o diabo mora nos detalhes’’.

Em primeiro lugar, de fato, a reforma tributária passou a prever a competência dos Estados para a tributação de veículos aquáticos e aéreos.

Em mais de uma oportunidade, o STF decidiu que o texto anterior da Constituição não permitia que a cobrança de IPVA sobre embarcações e aeronaves. Então, a ideia da reforma foi superar esse impedimento, prevendo expressamente tal incidência.

Porém, a depender da regulamentação específica de cada Estado, pode haver discussão a respeito da constitucionalidade de leis estaduais que já previam a cobrança de IPVA sobre embarcações e aeronaves, antes mesmo da reforma – portanto, de forma indevida.

Isso porque o STF entende que a constitucionalidade das leis deve ser verificada com base no texto constitucional vigente à época da sua edição, ou seja, não se admite o fenômeno da constitucionalidade superveniente.

Se a lei foi editada com base no texto anterior da Constituição e, naquele momento, a tributação não era possível, a norma será inconstitucional. A Reforma Tributária, por si só, não irá validar essa lei que nasceu inconstitucional. Neste caso, deverá ser editada uma nova lei estadual, agora sob a vigência do texto da reforma, que passou a permitir a tributação.

Outro ponto que exige atenção é a previsão de que o IPVA poderá ter alíquotas diferenciadas em função do ‘‘impacto ambiental’’, possibilitando, em tese, a majoração das alíquotas de carros movidos a combustão, ou redução de alíquotas para carros elétricos.

Porém, é importante observar que os carros elétricos são uma realidade apenas para a população de maior poder aquisitivo, inclusive em razão do custo elevado desses veículos.

Na prática, a população de baixa renda, que muitas vezes depende dos seus carros movidos a combustão para gerar a renda da sua subsistência, não tem sequer condições financeiras de comprar um carro elétrico. Temos, então, uma inversão de propósitos: uma reforma que busca justiça fiscal, mas autoriza um IPVA mais oneroso para a população de menor renda.

Não bastasse isso, a reforma tributária também previu a possibilidade de alíquotas diferenciadas em função ‘‘do valor’’, com o objetivo de autorizar a tributação maior de veículos mais caros.

Falta saber qual será a altura desta régua. Tendo em vista que até mesmo os carros populares tiveram um enorme aumento de preço recente, resta torcer pelo bom senso das Assembleias Legislativas Estaduais na fixação do valor dos veículos que autorizará, eventualmente, a incidência de alíquotas maiores.

Com tantas indefinições, o cenário que se descortinou exige muita cautela. Afinal, tudo indica que a almejada justiça tributária, perseguida há mais de 30 anos e prometida como espinha-dorsal do texto aprovado no Congresso Nacional, será resumida no aumento da carga tributária para toda a população.

Vitor Fantaguci Benvenuti é advogado da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados (DAA)

PL 2.724/22
A regulação dos planos de stock options

Por Renan Castro e Murilo Muniz Silva

Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei (PL) nº 2.724/2022, que disciplina o regime dos Planos de Outorga de Opção de Compra de Participação Societária – Marco Legal do Stock Options.

O PL busca estabelecer diretrizes sobre os planos de stock options e reduzir a insegurança jurídica sobre eles. São abordados temas sobre a não vinculação dos planos de stock options aos contratos de trabalho dos empregados, reforçando a natureza mercantil e a característica não remuneratória de tais planos, e questões sobre o tratamento tributário dado às stock options, em relação ao momento da tributação do ganho de capital (Imposto de Renda), definido pelo PL como sendo o da venda das ações/quotas da empresa.

Atualmente, não há regulamentação específica sobre os planos de stock options, utilizando-se como base legal a Lei das Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/76), que, no artigo 168, parágrafo 3º, estabelece a possibilidade de outorga de opção de compra de ações aos administradores ou empregados, ou a pessoas naturais que prestem serviços às companhias ou a sociedade sob seu controle.

Mas afinal, o que é stock options? Trata-se de um mecanismo pelo qual uma empresa outorga ao empregado (direto ou indireto) a possibilidade de aquisição de uma quantidade determinada de ações ou quotas da empresa em data futura por preço determinado na celebração do contrato, mediante o cumprimento de condições estabelecidas no plano (vesting). Esse mecanismo permite que empresas menores, as famosas startups, sejam atrativas para os profissionais mais qualificados do mercado frente às grandes companhias que não utilizam esse mecanismo.

Se aprovado com a redação atual, o PL (artigo 9º) estipulará condições mínimas a serem observadas pelas empresas em seus planos de stock options, que são: (I) a quantidade de opções ou ações que o beneficiário terá direito de adquirir ou subscrever com o exercício das opções; (II) o prazo no qual o beneficiário poderá exercer a sua opção da participação societária; (III) o preço por opção e/ou pelo seu exercício para efetiva aquisição da participação societária; (IV) a previsão de eventual período de indisponibilidade para venda de ação ou quota, a partir do exercício de uma opção outorgada (lock up); e (V) a possibilidade de a empresa recomprar dos beneficiários as opções ou ações adquiridas pelo empregado.

Embora os requisitos estabelecidos no PL não sejam novidade para as empresas que utilizam o mecanismo de stock options, pois são previsões encontradas na maioria dos planos, é de suma importância que a legislação veicule tais condições, a fim de garantir maior segurança jurídica às empresas na elaboração e oferta do plano de ações aos seus colaboradores.

E no que se refere a tributação, o PL trará significativo impacto, pois, além de (I) estabelecer que os planos de stock options têm natureza mercantil, desde que, evidentemente, observados os requisitos legais; (II) ainda esclarece que o Imposto de Renda incidente sobre o potencial ganho de capital na venda das ações (diferença positiva entre o preço de alienação das ações e o custo de aquisição) deve ser pago por ocasião da alienação das participações societárias.

As definições trazidas no PL são relevantes, pois, atualmente, ainda há forte discussão também no âmbito do Poder Judiciário sobre a natureza jurídica dos contratos de stock options, se mercantil ou remuneratória. Tanto que, recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) admitiu alguns recursos especiais como representativos de controvérsia para julgamento em sede de recursos repetitivos, onde será definida justamente a natureza jurídica dos contratos de opção de compra de ações outorgados aos empregados/administradores.

Vale comentar, inclusive, que, recentemente, no acórdão nº 2402-010.654, a Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recurso Fiscais (Carf) alterou seu posicionamento reconhecendo a natureza mercantil do plano de stock options analisado, cancelando a exigência fiscal. Em suas razões de decidir, o relator sustentou a presença de três requisitos: voluntariedade na adesão; onerosidade na outorga das ações; e risco quanto à variação de preço das ações, típicos de um contrato mercantil.

Isso tudo reforça a urgência de o Poder Legislativo definir a regulamentação sobre os planos de stock options, de modo a afastar definitivamente as delongadas discussões acerca da natureza jurídica dos planos em questão, e, além disso, garantir maior segurança jurídica às empresas por ocasião da elaboração e oferta dos planos de stock options aos seus colaboradores.

Portanto, é extremamente benéfica a aprovação desse PL, pois os planos de stock options são uma excelente ferramenta à disposição das empresas, independentemente do porte e segmento econômico em que atuam, como forma de atrair os melhores profissionais do mercado, além de reter os talentos, visto que permite maior engajamento desses profissionais ante a expectativa de retorno financeiro com a valorização das ações/quotas da empresa.

Renan Castro e Murilo Muniz Silva são, respectivamente, coordenador da área tributária e sócio da área societária no escritório Diamantino Advogados Associados.