PREJUÍZO À AMPLA DEFESA
TRF-4 suspende execução fiscal antes do trânsito em julgado de reconhecimento de nulidade

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Luciane Münch foi o voto vencedor
Foto: Diego Beck/Imprensa TRF-4

O ajuizamento da ação anulatória não afasta, por si só, a exigibilidade do crédito executado. No entanto, em face de iminente penhora de bens, a Justiça pode suspender a execução fiscal se já reconheceu, noutra ação, a nulidade do processo administrativo que lastreou a Certidão de Dívida Ativa da União (CDA), mesmo que esta decisão ainda não tenha transitado em julgado.

Assim, a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), por maioria, manteve despacho do juízo da 2ª Vara Federal de Criciúma (SC) que suspendeu uma execução fiscal movida pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) contra uma mulher acusada de cometer infração ambiental naquela comarca.

Com o desprovimento do agravo de instrumento, a execução foi suspensa até a decisão definitiva sobre a ação que contestou a lisura do procedimento administrativo, que apresentou fortes indícios de cercear a defesa da executada. Em decorrência, também permanece suspenso o cumprimento do mandado de penhora.

‘‘Assim, apesar da ausência de trânsito em julgado do acórdão proferido no feito anulatório, entendo que a execução deve ser suspensa, porquanto há verossimilhança na alegação de que o título é destituído de certeza e liquidez’’, definiu a desembargadora-relatora Luciane Amaral Corrêa Münch, voto vencedor neste julgamento.

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5003908-20.2018.4.04.7204 (Criciúma-SC)

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RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
Sócios de empresa em recuperação judicial respondem por dívidas trabalhistas

Secom/TRT-1

A 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1, Rio de Janeiro) negou provimento a um agravo de petição (AP) interposto pelos sócios da Angel’s Serviços Técnicos Eireli, empresa de serviços gerais em processo de recuperação judicial. Condenados a responder subsidiariamente pelo inadimplemento dos créditos trabalhistas de um ex-empregado, os empresários alegaram que a inclusão do seu nome no polo passivo da execução só caberia se comprovada má administração da empresa – o que não ocorreu.

Acompanhando o voto da desembargadora-relatora Claudia Regina Vianna Marques Barrozo, o colegiado observou que, ainda que a empresa executada se encontre em recuperação judicial, é possível a instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica para se atingir os bens dos sócios.

Execução trabalhista

O estabelecimento foi condenado em primeira instância, pelo juízo da 24ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, a pagar verbas trabalhistas por atraso no pagamento de salários e verbas rescisórias. Ao iniciar a fase executória, não foram encontrados bens que pudessem garantir a satisfação dos débitos. Frustrada a execução da empresa, o juízo julgou procedente o incidente de desconsideração da personalidade jurídica interposto pelo trabalhador, incluindo os sócios no polo passivo da ação.

Inconformados, os empresários interpuseram o recurso de agravo de petição (AP). Os sócios executados alegaram que a empresa se encontra em recuperação judicial, na 2ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, onde houve determinação expressa para que todas as ações e execuções fossem suspensas. Os empresários afirmaram que o trabalhador deveria habilitar o seu crédito nos autos do processo de recuperação judicial.

Sustentaram, ainda, que a inclusão dos sócios no polo passivo da execução só caberia se comprovada má administração da empresa, com demonstração cabal de que houve fraude na gestão e que os proprietários agiram de maneira desonesta e com abuso de direito, o que não ocorreu no caso em questão.

Possibilidade de redirecionamento da execução

A relatora do acórdão, ao analisar a alegação de suspensão da execução, lembrou que, conforme o disposto no artigo 6º da Lei nº 11.101/2005 (Lei de Recuperação Judicial), a abertura do processo de recuperação judicial suspende o curso de todas as execuções pelo prazo de 180 dias, salvo disposição judicial que amplie esse prazo. No presente caso, a magistrada verificou que o referido prazo já está superado e não há, nos autos, prova de que foi prorrogado judicialmente.

‘‘Revendo posicionamento até então adotado, passo a defender o entendimento de que, nos casos em que a empresa executada está submetida a processo de recuperação judicial ou falência, há possibilidade de redirecionamento da execução, na Justiça do Trabalho, contra os sócios responsabilizáveis ou responsáveis subsidiários, antes mesmo de encerrado o processo no Juízo Universal’’, afirmou a desembargadora.

No que diz respeito ao redirecionamento da execução aos sócios, citando entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a relatora explicou que a Lei nº 11.105/2005 apenas impede esse redirecionamento quando o patrimônio dos sócios já está devidamente afetado. Nessa hipótese, não caberia à Justiça do Trabalho buscar também atingir os sócios. Mas, não estando inseridos no processo de recuperação judicial ou falência, é cabível o redirecionamento da execução.

‘‘Como se vê, prevalece o entendimento de que, havendo sócios da empresa devedora, a execução pode ser imediatamente direcionada a estes, independentemente do desfecho do processo falimentar ou de recuperação judicial. Assim, eventual habilitação dos créditos no Juízo da Recuperação Judicial trata-se tão somente de uma expectativa de satisfação do crédito trabalhista naquela seara, mas não impede o prosseguimento da execução contra os sócios da demandada perante esta Justiça Especializada. Ademais, os sócios respondem patrimonialmente’’, explicou a relatora, ressaltando que, de acordo com os artigos 790 e 795 do Código de Processo Civil (CPC), os sócios respondem patrimonialmente pelas dívidas da sociedade que integram.

Por fim, observou a magistrada que, para a desconsideração da personalidade jurídica, na esfera trabalhista, basta haver a confusão patrimonial entre os bens dos sócios e da empresa, não sendo necessária a comprovação de fraude ou má administração.

‘‘Conforme a teoria menor (teoria objetiva), para que o sócio seja atingido, basta a constatação de que a pessoa jurídica não possua bens suficientes para o pagamento da dívida, com fulcro no artigo 28, parágrafo 5º, do Código de Defesa do Consumidor; ou seja, não há necessidade de comprovação de fraude do sócio ou, mesmo, da obrigatoriedade de sua participação na fase de conhecimento para a desconsideração da personalidade jurídica, visto que o objetivo maior é a satisfação do débito do trabalhador”, concluiu a magistrada, que manteve a sentença proferida na 24ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, determinando o prosseguimento da execução contra os sócios da empresa executada.

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0100449-75.2019.5.01.0024 (Rio de Janeiro)

APROPRIAÇÃO INDÉBITA
Advogado que reteve R$ 1,5 milhão de clientes idosos é condenado pelo TJ-RS

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O crime de apropriação indébita (artigo 168 do Código Penal) se consuma no momento em que o agente, livre e conscientemente, inverte o domínio da coisa alheia móvel que se encontra na sua posse, passando a dispô-la como se fosse o proprietário.  Assim, a menos que fique evidente a total falta de intenção de inverter este domínio, a restituição do bem não exclui a tipicidade criminal nem afasta a punibilidade do agente.

Por isso, a 8ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) confirmou sentença que condenou criminalmente um advogado por ter se apropriado de valores de clientes de um mesmo clã familiar na Comarca de Porto Alegre. Ficou claro, ao longo do processo, que o advogado levantou um alvará judicial no valor de R$ 2,2 milhões e não repassou a quantia integral aos seus clientes, retendo R$ 1,5 milhão.

A condenação foi por apropriação indébita majorada – o crime se deu em razão do ofício de advogado, como tipifica o inciso III, parágrafo 1º, do caput do artigo 168. A pena: um ano e quatro meses de reclusão – convertida na dosimetria em prestação de serviços comunitários –, além de multa.

O réu ainda tentou levar o caso para os tribunais superiores, mas a 2ª Vice-Presidência da corte inadmitiu o recurso especial (REsp) e o recurso extraordinário (RE) em direção, respectivamente, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em abril, o processo transitou em julgado.

Investimentos frustrados

A relatora da apelação-crime na 8ª Câmara Criminal, desembargadora Fabianne Breton Baisch, disse que a documentação e a narrativa coerente e convincente das vítimas não foram desconstruídas por nenhuma outra prova trazida aos autos pela defesa, o que a levou a se alinhar integralmente aos fundamentos da sentença proferida pela 11ª Vara Criminal do Foro Central da Capital.

Segundo a desembargadora-relatora, no contraditório, o réu admitiu ter investido o dinheiro dos clientes na empresa XP Investimentos, acabando por perder toda a quantia. Ou seja, ele dispôs dos valores sacados no alvará judicial como se lhe pertencessem, ainda que tivesse a intenção de devolvê-los mais tarde. No entanto, só procurou os clientes dois anos depois, quando já oferecida a denúncia do Ministério Público e firmados os acordos extrajudiciais para devolução dos valores – que não foram adimplidos.

A denúncia do MP

O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) protocolou denúncia-crime contra o advogado Athos Stock da Rosa na 11ª Vara Criminal da Capital por cinco fatos delituosos, em tese, cometidos contra os herdeiros do espólio de Nelson Correa de Barros.

Segundo relata a peça inicial, os crimes teriam ocorrido no interior da agência do Banrisul do Foro Central, onde eram expedidos os alvarás para os herdeiros, após a liberação pelo cartório da 2ª Vara de Família e Sucessões, juízo do inventário. Athos representou todos os herdeiros nos autos da de ação de desapropriação de uma área rural que pertenceu ao falecido e na ação de inventário.

Segundo o MP, o primeiro fato, ocorrido no dia 7 de janeiro de 2014, teria envolvido a apropriação indébita de R$ 431 mil; o segundo fato, no dia 20 de maio de 2015, de R$ 249,8 mil; o terceiro, no dia 11 de dezembro de 2015, de R$ 159,6 mil; o quarto, no dia 4 de fevereiro de 2016, de R$ 2,2 milhões; e o quinto fato, no dia 31 de outubro de 2016, de R$ 200 mil. Todas as vítimas tinham mais de 60 anos.

Após a audiência de instrução, realizada em 21 de fevereiro de 2018, o MP apresentou memoriais, requerendo a parcial procedência da ação penal. No efeito prático, pediu a condenação do acusado nas sanções relativas ao quarto fato e a sua absolvição com relação aos demais fatos descritos na denúncia.

Sentença de parcial procedência

Ao proferir a sentença, a juíza Cláudia Junqueira Sulzbach ponderou que as vítimas não souberam afirmar sequer o montante que lhes seria devido, tampouco o que teria sido indevidamente retido pelo réu com relação ao 1°, 2°, 3° e 5° fatos, tal como havia percebido o MP, após a fase de instrução do processo.

‘‘Ademais, o réu apresentou diversos comprovantes de transferências realizadas às vítimas (…). Embora os repasses, conforme afirmado pelo próprio acusado, não estejam integralmente comprovados, havendo dúvida quanto à existência do delito, imperativa a aplicação do princípio in dubio pro reo, com a absolvição do acusado quanto aos fatos de n° 1, 2, 3 e 5’’, escreveu a juíza na sentença.

A autoria e a materialidade do delito descrito no quarto fato da denúncia, entretanto, ficaram suficientemente demonstradas nos autos, pois, além das testemunhas, o próprio réu confessou em juízo que reteve indevidamente a quantia de R$ 1,5 milhão, proveniente do alvará sacado no dia 4 de fevereiro de 2016.

‘‘O recebimento da quantia pelo acusado restou comprovado pelo Alvará 2.659/143-2016 (fl. 283), e os repasses, em valores inferiores aos devidos, pelos comprovantes apresentados às fls. 284/320 dos autos, resultando, após o desconto do valor devido ao réu a título de honorários advocatícios, em um saldo de R$ 1.550.287,81 (um milhão quinhentos e cinquenta mil duzentos e oitenta e sete reais e oitenta e um centavos) em favor das vítimas’’, concluiu.

Neste cenário, a juíza Cláudia Junqueira Sulzbach julgou parcialmente procedente a ação penal, condenando o advogado Athos Stock da Rosa como incurso nas sanções do artigo 168, parágrafo 1º, inciso III, do Código Penal, com a incidência

da agravante do artigo 61, inciso II, alínea “h”, do mesmo Código – aumento da pena pelo fato do réu ter cometido o crime contra pessoas idosas. A pena estabelecida: um ano e quatro meses de reclusão, convertida em prestação de serviços comunitários e multa.

Como o advogado fez um acordo de ressarcimento de valores com seus clientes, a magistrada deixou de fixar indenização às vítimas. O advogado também foi poupado de pagar as custas judiciais, por ter sido representado  no processo pela Defensoria Pública estadual.

Clique aqui para ler a decisão que inadmitiu o REsp  e o RE

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001/2.17.0049352-1 (Porto Alegre)

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CREDIT SCORING
Execução de sentença coletiva de direitos individuais homogêneos por associação se sujeita a condições

Imprensa STJ

A associação que figura como autora de ação civil pública (ACP) pode propor o cumprimento de sentença coletiva na tutela de direitos individuais homogêneos. No entanto, como essa legitimidade é subsidiária, cabe apenas quando não houver habilitação de beneficiários ou o número destes for incompatível com a gravidade do dano, nos termos do artigo 100 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) restringiu a legitimidade de uma associação para propor o cumprimento de sentença em ação civil pública ajuizada por ela.

No processo de conhecimento, a Serasa e a Associação Comercial, Industrial e Empresarial de Ponta Grossa (PR) foram condenadas a fornecer gratuitamente o histórico de consultas, entre outras informações, quando da prática do credit scoring – sistema desenvolvido para avaliação do risco na concessão de crédito ao consumidor mediante atribuição de notas, com base em modelos estatísticos e variáveis de decisão.

Em primeiro grau, o juiz determinou o arquivamento da execução movida pela entidade autora, por concluir que caberia a eventuais consumidores interessados ajuizar o cumprimento individual da sentença. A decisão foi reformada pelo Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), que determinou o retorno dos autos à primeira instância para o prosseguimento da execução.

Esclarecimentos sobre credit scoring dependem de prévio requerimento do consumidor

Ministra Nancy Andrighi
Foto: Lucas Pricken/STJ

Relatora do recurso especial (REsp) da Serasa, a ministra Nancy Andrighi explicou que os interesses individuais homogêneos podem ser conceituados como aqueles pertencentes a um ‘‘grupo, categoria ou classe de pessoas determinadas ou determináveis, que compartilhem prejuízos divisíveis, de origem comum, normalmente oriundos das mesmas circunstâncias de fato’’.

A magistrada verificou que, em relação ao credit scoring – cuja legalidade foi reconhecida pela Segunda Seção em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 710) –, eventuais esclarecimentos sobre os critérios utilizados para valorar informações pessoais e atribuir pontuações pressupõem prévio requerimento dos interessados. Isso demonstra que tal direito pode não ser do interesse de todos os consumidores, mas apenas daqueles que pretendem obter crédito e estão sujeitos à negativa em razão de sua pontuação.

‘‘O interesse em tais esclarecimentos diz respeito, portanto, a um número determinável de consumidores unidos por um objeto divisível de origem comum, evidenciando o seu caráter de direito individual homogêneo, nos termos do artigo 81, parágrafo único, III, do CDC’’, esclareceu a ministra no voto.

Legitimidade subsidiária para liquidação e execução da sentença coletiva

Segundo a relatora, embora o artigo 98 do CDC se refira à execução da sentença coletiva, as particularidades da fase executiva impedem a atuação dos legitimados coletivos na forma de substituição processual. É que o interesse social que autorizaria a sua atuação no processo de conhecimento está vinculado ao núcleo de homogeneidade do direito – elemento que não é preponderante na fase executiva.

Por conta disso, esclareceu, o artigo 100 do CDC previu hipótese específica e acidental de tutela dos direitos individuais homogêneos pelos legitimados do rol do artigo 82, que poderão figurar no polo ativo do cumprimento de sentença por meio da denominada recuperação fluida (fluid recovery).

‘‘Conforme a jurisprudência desta corte, a legitimação prevista no artigo 97 do CDC aos sujeitos elencados no artigo 82 do CDC é subsidiária para a liquidação e execução da sentença coletiva, implementando-se no caso de, passado um ano do trânsito em julgado, não haver habilitação por parte dos beneficiários ou haver em número desproporcional ao prejuízo em questão, nos termos do artigo 100 do CDC’’, afirmou.

No caso em análise, a ministra observou que o TJ-PR decidiu que a associação teria legitimidade para promover o cumprimento de sentença, na qualidade de substituto processual dos direitos individuais homogêneos reconhecidos na ação civil pública. Para ela, contudo, o acórdão violou parcialmente o artigo 100 do CDC, pois não condicionou a legitimidade (subsidiária) da associação às hipóteses previstas no dispositivo.

Leia o acórdão no REsp 1.955.899-PR

SERVIÇO DEFEITUOSO
Transporte em desacordo com o combinado com o cliente causa dano moral

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Em se tratando de transporte de coisa, a responsabilidade é contratual e objetiva, e a obrigação da transportadora, de resultado. Assim, compete à empresa transportadora entregar a mercadoria em seu destino, conforme o convencionado pelas partes contratantes. Contudo, se o transporte for feito em desacordo com o combinado, causando avarias na carga, há falha na prestação do serviço, ensejando reparação na esfera moral.

Neste fundamento, a 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) confirmou sentença que determinou o pagamento de R$ 8 mil, a título de danos morais, a uma instaladora de móveis comerciais que teve parte da carga avariada em território paraguaio por culpa do transportador. A Justiça gaúcha ainda livrou a empresa autora de pagar R$ 52,2 mil de despesas complementares, relativas às diárias de viagem, já que o serviço não foi prestado conforme o combinado.

Na Justiça brasileira, já está pacificado o entendimento de que a pessoa jurídica sofre dano moral, nos termos do artigo 52 do Código Civil (CC) e da Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que diz: ‘‘A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”. Ou seja, fará jus à indenização sempre que seu bom nome, credibilidade ou imagem forem atingidos por algum ato ilícito.

 Ação declaratória

A autora ajuizou, perante a 2ª Vara Cível da Comarca de Canoas, uma ação declaratória de inexigibilidade de débito cumulada com indenização por danos morais em face da transportadora, que estava lhe cobrando R$ 52,2 mil a título de ‘‘despesas complementares de viagem’’. Afinal, a duplicata de cobrança havia sido levada ao cartório de protestos, o que causou a inscrição da parte autores nos cadastros restritivos de crédito.

No caso concreto, narrou que contratou o transporte de nove cargas fechadas de móveis, em duas carretas fechadas, com destino à loja Zara, em Assunção, no Paraguai, como combinado. Salientou que o transportador estava ciente de que as mercadorias não poderiam ser carregadas em carretas de modelo Sider, pois poderiam sofrer avarias. É que a carroceria deste modelo de caminhão possui lonas retráteis em suas laterais, o que facilita a carga e descarga de materiais de grande volume. É indicada para a acomodação de cargas em palets ou racks, geralmente alimentos e produtos de higiene e limpeza, mas não de móveis planejados – o caso dos autos.

Ocorre que, ao ingressar no Paraguai, a carga dos dois caminhões sofreu baldeação para um único veículo, subcontratado pela ré, justamente uma carreta modelo Sider, com placas daquele país. Resultado: parte dos móveis chegou ao seu destino com avarias, gerando reclamações do cliente comprador.

Sentença procedente

A juíza Káren Rick Danilevicz Bertoncello julgou procedentes os pedidos formulados na ação, declarando a inexistência da dívida da parte autora, pela nulidade da duplicata de R$ 52,2 mil, e condenando a ré ao pagamento de indenização de R$ 8 mil a título de danos morais. Afinal, com base em testemunhas e documentos (inclusive manifesto de carga e troca de emails entre as partes), ficou claro o acerto de que a carga – antes da contratação do serviço de transporte – não poderia ser transportada em caminhão modelo Sider, somente em caminhão-baú. A corroborar com o acervo probatório, as fotografias anexadas aos autos confirmam as avarias em alguns dos móveis transportados.

Citando os artigos 749 e 750 do CC, a julgadora observou que o prestador de serviços de transportes de mercadorias tem o dever de zelar pela carga transportada, garantindo que alcance o seu destino incólume. Noutras palavras, é objetiva a sua responsabilidade pelos danos ocorridos durante a prestação do serviço para o qual foi contratada.

Segundo a juíza, o protesto não retrata exercício regular do direito pelo demandado, sendo devido, portanto, o ressarcimento dos prejuízos. ‘‘Assim, no que diz com o dano extrapatrimonial alegado na [peça] vestibular resta plenamente demonstrado, mormente porque no caso concreto trata-se de dano in re ipsa, o qual prescinde de prova, pois o protesto do título de maneira ilícita ao Cartório de Protestos de Títulos traz à parte abalo de crédito’’, arrematou na sentença.

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Ação Declaratória 008/1.16.0011431-3/RS

 Jomar Martins é editor da revista eletrônica PAINEL DE RISCOS