NORMA INVÁLIDA
Marítimo não pode tirar férias em período de desembarque, diz TST

Foto: Reprodução Labore Saúde Ocupacional

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) considerou inválida norma coletiva que permitia que as férias de um trabalhador marítimo coincidissem com os períodos de folga. De acordo com o colegiado, as férias não podem fazer parte da negociação coletiva porque são direitos inegociáveis do trabalhador. Por unanimidade, a Turma condenou a empresa ao pagamento em dobro das férias pedidas pelo trabalhador marítimo.

Férias e folgas

O trabalhador era marinheiro de máquinas em embarcações da Bourbon Marítima Offshore Ltda., que prestava serviços para a Petrobras na Bacia de Macaé, no litoral do Rio de Janeiro. Na reclamação trabalhista, disse que sua jornada era de 28 dias de trabalho e 28 dias de folga. Esse regime estava previsto nas normas coletivas da categoria, cuja redação permitia que as férias fossem usufruídas concomitantemente com as folgas e que as duas acabassem se confundindo.

Segundo ele, a empresa nunca havia concedido férias aos tripulantes no período aquisitivo, no qual pagava remuneração integral correspondente aos períodos de folga, mas sem conceder anualmente férias de 30 dias sem prejuízo da remuneração.

Desembarque

A Bourbon, em sua defesa, argumentou que, nos termos da norma coletiva, as férias eram tiradas concomitantemente com os períodos de desembarque, sem nenhum prejuízo aos trabalhadores.

Vantagens

O juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1, Rio de Janeiro) julgaram improcedente o pedido. O TRT observou que a norma coletiva da Petrobras assegurava 180 dias de descanso por ano, computadas folgas e férias, período maior do que o concedido aos demais empregados regidos pela CLT, entre férias, folgas e feriados. Desse modo, não se poderia falar em ilegalidade ou em nulidade do acordo coletivo, ‘‘que deve ser respeitado’’.

Direito indisponível

Ministro Godinho Delgado foi o relator
Foto: Renato Araújo/Agência Brasil

Mas, segundo o ministro Maurício Godinho Delgado, relator do recurso de revista (RR) do marítimo, a cláusula suprime o direito ao descanso e ‘‘desestrutura completamente a proteção jurídica dada às férias’’. Segundo o ministro, a questão tem especial relevância para os trabalhadores marítimos, que passam longos períodos embarcados e sem a possibilidade de estreitar os laços familiares e afetivos.

‘‘Sem sombra de dúvida, a norma coletiva se mostra inválida, porque transaciona direito social trabalhista indisponível’’, afirmou.

Superpoder

Godinho Delgado ressaltou que o entendimento jurisprudencial que prevalece no TST acompanha a tendência de reconhecimento da negociação coletiva como um dos mais importantes métodos de solução de conflitos. “Todavia, não se trata de um superpoder da sociedade civil, e não se pode, de forma inusitada, rebaixar ou negligenciar o patamar dos direitos individuais e sociais fundamentais dos direitos trabalhistas imperativamente fixados pela ordem jurídica do país”, afirmou. “Há limites objetivos à criatividade jurídica na negociação coletiva“. Com informações de Ricardo Reis, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

Clique aqui para ler o acórdão

RR-100004-48.2019.5.01.0027

CRIMINALIZAÇÃO EMPRESARIAL
Portaria RFB nº 319/2023 e a divulgação de informações sobre benefícios fiscais

Por Vitor Fantaguci Benvenuti                   

Diamantino Advogados Associados

Recentemente, a Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Portaria RFB nº 319/2023, determinando a divulgação de listas de informações a respeito de incentivos, renúncias, benefícios ou imunidades de natureza tributária, cujos beneficiários sejam pessoas jurídicas.

Embora a medida tenha amparo legal – mais especificamente, no art. 198, § 3º, inciso IV, do Código Tributário Nacional (CTN) –, o que chama atenção e certamente divide opiniões é o contexto político dessa divulgação.

Sem a pretensão de esgotar o debate sobre o tema, cabe aqui fazer alguns apontamentos sobre os impactos da publicidade dessas informações e seus possíveis problemas.

Em primeiro lugar, de acordo com a Portaria, as informações serão relativas ao ano-calendário 2021. Contudo, a própria RFB reconhece a possibilidade de divulgação de dados incompletos, inexatos ou desatualizados, que deverão ser corrigidos mediante requerimento administrativo, o qual estará sujeito a ritos e prazos específicos.

Daí já se percebe o potencial surgimento de ações judiciais, seja para questionar a mora na retificação das informações, seja para pleitear indenizações pelos danos causados pela divulgação de dados incorretos – especialmente neste contexto político de ‘‘recriminação’’ das pessoas jurídicas que fazem jus a benefícios fiscais regularmente concedidos.

Outro ponto que merece atenção é a previsão de que as informações serão ampliadas gradativamente.

Embora a Portaria trate especificamente de benefícios fiscais, o art. 198, § 3º, do CTN (dispositivo que fundamentou essa divulgação), também autoriza, em tese, a publicação de informações sobre inscrições em dívida ativa e representações fiscais para fins penais de pessoas jurídicas.

Como se sabe, a despeito da presunção de legalidade dos atos administrativos, o fato de um débito ter sido inscrito em dívida ativa não implica uma presunção absoluta de que o tributo é realmente devido, ou que o contribuinte tenha agido com má-fé perante a Administração.

Afinal, é perfeitamente possível e comum que débitos fiscais sejam cancelados em ações judiciais, observados os trâmites legais.

A divulgação simplista dessas informações – sem uma atualização imediata sobre o cancelamento de débitos ou sem a indicação de que estão com sua exigibilidade suspensa, por exemplo – é capaz de prejudicar a imagem da pessoa jurídica no ambiente concorrencial.

A representação fiscal para fins penais, por sua vez, é questão que também exige cautela, especialmente por conta da ampla gama de atos que, em tese, podem configurar crime contra a ordem tributária (Lei nº 8.137/90).

Por conta disso, é ao menos possível que, na rotina empresarial contábil, determinado tributo seja suprimido em decorrência de simples equívocos no envio de declarações, sendo que a legislação possui mecanismos próprios para tratar dessas hipóteses (aplicação de multas, denúncia espontânea etc.).

Porém, diante de uma declaração equivocada que ensejou a redução de tributo, também é possível que a autoridade fiscal entenda pela configuração, em tese, de crime contra a ordem tributária e dê prosseguimento a uma representação fiscal para fins penais.

Com a publicidade desses dados, estar-se-ia diante da divulgação de informações relativas a um possível crime, identificado de forma preliminar por autoridades fiscais (incompetentes para verificar a efetiva ocorrência do tipo penal), e que poderia ter origem em um simples equívoco do contribuinte no envio de declaração, sem qualquer dolo ou má-fé.

Até meados de 2022, o art. 6º da Portaria RFB nº 1.750/2018 não trazia qualquer limitação no sentido de que meros equívocos na transmissão de declarações não poderiam ensejar a representação fiscal para fins penais.

Apenas com a edição da Portaria nº RFB nº 199, de 13 de julho de 2022, é que se incluiu essa restrição, prevendo que a representação só será feita se ‘‘devidamente comprovada a ocorrência dos fatos que configuram, em tese, os crimes previstos no art. 2º e que afastem a alegação de mero erro na transmissão das informações à base de dados da RFB’’.

Por se tratar de norma infralegal no âmbito da RFB, contudo, esse dispositivo poderia vir a ser revogado, em concomitância com a edição de nova portaria determinando divulgação de dados sobre representações fiscais para fins penais de pessoas jurídicas.

Em conclusão, tem-se que a iniciativa da Administração em agir de forma transparente é perfeitamente válida.

Porém, a possibilidade de divulgação de informações equivocadas e desatualizadas, aliada à intenção política de ‘‘recriminar’’ as pessoas jurídicas perante a opinião pública, exige muita atenção para eventuais excessos da Administração.

Vitor Fantaguci Benvenuti é advogado da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados

Publicado originalmente n’O Estado de São Paulo, em 29/5/2023

LAW AND ECONOMICS
CMT Advogados lança em Porto Alegre a quinta edição de ‘‘Direito e Economia no Brasil’’

Corrente que conecta o ambiente jurídico aos preceitos da Economia, a Análise Econômica do Direito (AED) tem em Direito e Economia no Brasil, coordenado por Luciano Benetti Timm, uma obra de referência. O livro acaba de ganhar sua quinta edição.

Para lançá-la, Timm recebe o desembargador Ney Wiedemann Neto (TJRS), o promotor de justiça Gustavo Munhoz (MPRS), a advogada Cristina Ferreira (sócia da Garrastazu Advogados) e o professor Ronald Hillbrecht (UFRGS) no Carvalho, Machado e Timm Advogados (CMT Advogados), em Porto Alegre, no dia 21 de junho. Além de assistir ao debate, será uma oportunidade de adquirir o recém-lançado livro, no local do evento.

Ao longo das 480 páginas de Direito e Economia no Brasil – Estudos Sobre a Análise Econômica do Direito, Luciano Timm, sócio-fundador do CMT e professor, e demais autores, entre eles os outros fundadores do escritório, Cristiano Carvalho e Rafael Bicca Machado, compõem um guia introdutório dessa corrente cada vez mais relevante para produzir soluções jurídicas a questões complexas do ambiente dos negócios.

A obra, com prefácio do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux, pode ser lida por aqueles que não têm qualquer iniciação à Economia e, ao mesmo tempo, dada a abordagem feita pelos autores, garante também uma compreensão mais profunda do tema aos já iniciados na matéria.

O livro foi concebido para fornecer ao operador do Direito argumentos sólidos para apresentação de casos ou fundamentos da decisão. ‘‘Se o Law and Economics não veio para fazer tábua rasa do conhecimento e da prática jurídica, a verdade é que esta ferramenta analítica fornece ao jurista um relevante recorte metodológico que muito contribui para análise e solução de problemas jurídicos, desvelando a natureza do comportamento humano, os interesses em jogo, as consequências das decisões e a pragmática do Direito em ação (law in action)’’, escreve o ministro Luiz Fux.

Para facilitar a leitura dos textos, a estrutura traz autonomia e independência entre os capítulos. As exceções são os iniciais (1, 2, 3 e 4), que introduzem a análise econômica do Direito, microeconomia, a macroeconomia e a teoria dos jogos e podem facilitar a compreensão de todos os textos subsequentes.

Sobre o coordenador da obra

O advogado Luciano Benetti Timm é sócio do CMT Advogados, professor da FGV SP, doutor e mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), pós-doutor na UC Berkeley no Departamento de Direito, Negócios e a Economia, Master of Laws (LLM) em Direito Econômico Internacional pela Universidade de Warwick (Inglaterra), presidiu a Associação Brasileira de Direito e Economia (ABDE) e o Instituto de Direito e Economia do Rio Grande do Sul (Iders) e foi secretário nacional de Defesa do Consumidor.

Os demais autores

Alexandre Bueno Cateb, Antônio José Maristrello Porto, Ari Francisco de Araujo Jr., Bruno Meyerhof Salama, Claudio Djissey Shikida, Cristiano Carvalho, Eduardo Goulart Pimenta, Fabiano Teodoro de Rezende Lara, Flávia Santinoni Vera, Ivo Gico Jr., Jairo Saddi, Jean Carlos Dias, João Francisco Menegol Guarisse, Luciana Luk-Tai Yeung, Marcos Nobrega, Nadia de Araujo, Nuno Garoupa, Paulo Furquim de Azevedo, Pery Francisco Assis Shikida, Rafael Bicca Machado, Rodrigo Dufloth, Ronald A. Hilbrecht e Tom Ginsburg

SERVIÇO

O quê: Direito e Economia no Brasil – Estudos Sobre a Análise Econômica do Direito; 5ª edição (ISBN: 978.566.515.7758)

Editora: ‎Editora Foco

Páginas: ‎480

Quanto: R$ 229

Quando: lançamento em 21 de junho, às 19h

Onde: CMT Advogados POA (Av. Carlos Gomes, 1.340/Sala 602 – Auxiliadora, Porto Alegre)

Quem: debate com Luciano Benetti Timm (sócio-fundador do CMT Advogados, professor e coordenador da obra), Ney Wiedemann (desembargador do TJRS), Gustavo Munhoz (promotor de Justiça do MPRS), Cristina Ferreira (sócia da Garrastazu Advogados) e Ronald Hillbrecht (professor da UFRGS)

ACIDENTE DE TRABALHO
Empregador vai pagar dano moral a motorista que foi agredido por passageiros no RJ

A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1, Rio de Janeiro) confirmou sentença que condenou a Rodoviária Âncora Matias a pagar indenização por danos morais, no valor de R$ 50 mil, além de pensão mensal vitalícia, a um motorista que sofreu agressão de dois passageiros que tentavam sair do coletivo sem pagar as passagens.

O colegiado entendeu que, diante do conjunto probatório, ficou configurada a ocorrência de acidente de trabalho típico, com a aplicação da teoria do risco objetivo. O voto que pautou a decisão foi da desembargadora relatora Evelyn Corrêa de Guamá Guimarães. A decisão foi unânime.

Lesão corporal no ambiente de trabalho

Na petição inicial da ação reclamatória, o trabalhador disse que foi vítima de crime de lesão corporal grave no ambiente de trabalho. Ao impedir dois passageiros de seguirem viagem sem pagar as passagens, acabou agredido por eles, sofrendo traumatismo craniano. O fato, inclusive, recebeu grande destaque da imprensa carioca, conforme registrou o site G1, da Globo, na edição de 18 de dezembro de 2013.

O reclamante alegou que o acidente de trabalho lhe deixou com várias sequelas, passando a receber o benefício previdenciário de auxílio-doença. Pediu o pagamento de indenização por danos morais e pensão vitalícia.

Em sua defesa, o empregador alegou que não poderia ser responsabilizado por um risco assumido pelo próprio trabalhador. Afinal, orientava seus funcionários a não iniciar ou continuar qualquer tipo de discussão com os usuários das linhas de ônibus.

Sentença de procedência

O juiz Bruno de Andrade Macedo, em exercício na 31ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, acolheu os pedidos do motorista. Assim, condenou a empresa ao pagamento de R$ 50 mil, a título de indenização por danos morais, além de pensão mensal vitalícia no percentual de 9% da remuneração recebida pelo trabalhador desde a data do acidente.

O magistrado entendeu que as agressões sofridas pelo motorista durante o serviço configuraram acidente de trabalho, com a responsabilização objetiva da empresa. É que, diante dos constantes casos de violência, a atividade desenvolvida pela companhia oferece riscos anormais à integridade física e psíquica de seus empregados.

Recurso ordinário trabalhista no TRT-RJ

Desembargadora Evelyn Guamá
Foto: Imprensa/Amatra I

Inconformada, a empregadora recorreu da sentença, interpondo recurso ordinário trabalhista (ROT) no TRT-RJ. Argumentou que a alegada lesão não foi desencadeada por sua imprudência ou negligência, mas por ação de terceiros. Sustentou que, na ocorrência do acidente, não houve culpa da empresa, mas exclusivamente da vítima.

Na 4ª Turma, o recurso foi relatado pela desembargadora Evelyn Corrêa de Guamá Guimarães que, no voto, acompanhou o entendimento do primeiro grau. Ela pontuou que os agressores eram clientes da empresa, utilizando os seus serviços. Por isso, tiveram acesso ao trabalhador, em razão do seu ofício, dentro do veículo por ele conduzido na condição de motorista.

A desembargadora-relatora acrescentou que o motorista tornou-se vítima do crime em razão da cobrança de valores pelo serviço prestado pela empregadora. Assim, a relatora observou ser incontroverso o fato de o motorista ter sofrido acidente de trabalho típico, durante a jornada e no ambiente laboral.

‘‘Assertivamente entendeu o julgador, eis que o caso em análise atrai, inexoravelmente, a aplicação da teoria do risco, imputando à ré a responsabilidade objetiva pelos danos decorrentes do acidente trabalhista sofrido pelo empregado. Assim, preconiza o art. 927 do CC que, independente da culpa, há a obrigação de reparar as consequências do ato lesivo, uma vez que a atividade econômica da ré implica, por sua própria natureza, risco para os seus trabalhadores, o que é agravado pela violência crescente no Estado do RJ’’, salientou a relatora.

Ademais, a relatora observou que todo o conjunto probatório apontou para o fato de que o motorista foi vítima do crime por exercer seu ofício para a empresa de forma zelosa e obstinada. Assim, a desembargadora manteve a indenização por dano moral fixada em R$ 50 mil, considerando o porte econômico da empresa e o caráter pedagógico da indenização.

‘‘Igualmente razoável o percentual de 9% arbitrado ao pensionamento indenizatório do dano material, ante a redução parcial da capacidade laboral, que se encontra amparado pelo laudo pericial do Juízo e pela aposentadoria por invalidez noticiada. Pelo exposto, não tendo a ré se desvencilhado do encargo probatório quanto às excludentes que suscita, mantenho integralmente a sentença de origem, devendo a recorrente ser responsabilizada objetivamente pelas reparações’’, concluiu. Redação Painel de Riscos com informações da Secom/TRT-RJ.

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0101252-42.2016.5.01.0031 (Rio de Janeiro)

 

FACULDADE DO CREDOR
Desistência de ação de consignação de pagamento não autoriza a devolução, ao autor, do valor depositado em juízo

Reprodução Siplan

A extinção da ação de consignação de pagamento após o oferecimento de contestação, em razão da desistência do autor, permite ao credor levantar os valores depositados em juízo, não sendo viável a retomada do valor pelo autor.

Este foi o entendimento firmado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar um recurso em que devedor e credor disputavam o levantamento do depósito.

No caso dos autos, uma devedora ajuizou ação revisional com consignação em pagamento contra um fundo de investimento, sob a alegação de ter celebrado contrato de financiamento para aquisição de veículo, o qual estipulava encargos financeiros abusivos.

Na contestação, o fundo se limitou a impugnar a pretensão revisional por considerar que o montante depositado era insuficiente. A autora, então, pediu desistência da ação, e o réu concordou, desde que pudesse resgatar a quantia já depositada em juízo.

O juízo de primeiro grau homologou o pedido de desistência, julgando extinto o processo sem resolução de mérito, autorizando o resgate, pelo fundo, dos valores depositados. No entanto, o Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) determinou que o alvará para o levantamento do montante fosse expedido em favor da autora-devedora, sob o fundamento de que, extinta a ação de consignação em pagamento sem julgamento de mérito, as partes integrantes da relação processual voltam ao status quo ante.

Réu poderá levantar a quantia se, na contestação, alegar apenas a insuficiência do depósito

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Imprensa/TSE

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial (REsp) do fundo de investimento, observou que, apesar de o pagamento ser a forma habitual de extinção das obrigações, o ordenamento jurídico admite outras modalidades extintivas, dentre as quais se encontra a consignação em pagamento, que pode ser proposta nas situações previstas no artigo 335 do Código Civil (CC).

A relatora destacou que, ajuizada a ação consignatória, o juiz analisará a regularidade formal da petição inicial e, sendo positiva a conclusão, intimará o autor para efetuar o depósito no prazo determinado em lei (artigo 542, inciso I, do Código de Processo Civil – CPC). Atendida tal determinação, o réu será citado e intimado para apresentar contestação ou requerer o levantamento do montante depositado.

No entanto, segundo Nancy Andrighi, na hipótese de o réu contestar o pedido, alegando apenas a insuficiência do depósito, ele poderá, concomitantemente, levantar a quantia ou a coisa depositada (artigo 545, parágrafo 1º, do CPC), tratando-se de uma faculdade do credor, a qual independe da concordância do consignante.

Não é razoável que, havendo pagamento da dívida, o autor desista da ação e levante valores

A ministra ressaltou que, como o depósito é ato do consignante, ele poderá levantá-lo antes da citação ou da contestação, circunstância que equivale à desistência da ação. Contudo, de acordo com a relatora, após o oferecimento da contestação, em que se alega a insuficiência do depósito, o autor somente pode levantar a quantia depositada mediante concordância do réu.

Nancy Andrighi explicou, ainda, que a inexistência de controvérsia sobre o valor depositado e ofertado voluntariamente pelo autor corrobora a viabilidade de o réu levantar a referida quantia quando o devedor desiste da ação.

‘‘É totalmente descabido que, havendo pagamento da dívida, ainda que parcial, e já tendo sido ofertada contestação, o autor possa desistir da ação e levantar os valores, obrigando que o credor inicie um outro processo para receber o que lhe é devido, quando, de antemão, já se tem um valor incontroverso’’, concluiu a relatora ao dar provimento ao REsp do fundo de investimento. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.032.188