‘‘A conduta da reclamada, ao atribuir ao reclamante a função de transporte de dinheiro sem lhe oferecer treinamento específico para lidar com os correspondentes riscos, evidencia a prática de ato ilícito apto a violar os direitos da personalidade, caracterizando o dano moral in re ipsa.’’
A ementa sintetiza bem o que decidiu a Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-18, Goiás) ao prover recurso de um motorista de caminhão que transportava valores para um distribuidor Coca-Cola (Refrescos Bandeirantes Indústria e Comércio Ltda.) em Rio Verde (GO).
O juízo da 2ª Vara do Trabalho de Rio Verde havia negado os pedidos feitos pelo motorista porque entendeu não haver dano ou culpa da empresa. O trabalhador, entretanto, em recurso ao Regional, pediu a reforma da sentença argumentando que era obrigado a transportar valores dentro do caminhão.
Salientou que, ao fazer a cobrança, recebia o dinheiro que era colocado em um cofre, sob a sua responsabilidade. Na falta de cofre dentro do veículo, no entanto, ou quando o cofre apresentava problema, ou ainda, nos casos em que não coubesse todo o valor, ele precisava guardar o dinheiro no bolso ou colocar em uma pochete de sua propriedade.
Ao analisar o recurso ordinário no TRT-18, o desembargador Daniel Viana Júnior ressaltou que, para haver reparação de danos morais, é indispensável a demonstração dos elementos essenciais: o ato ilícito, doloso ou culposo; o dano experimentado; e o nexo de causalidade entre o ato e o dano.
Dano moral presumido
O julgador explicou também que o dano moral, segundo os julgamentos mais recentes, não requer a demonstração da lesão acarretada para a vida pessoal da vítima, pois é possível presumi-la diante das circunstâncias fáticas.
Para o relator, a empresa não negou o recebimento de valores por seus motoristas quando da entrega dos produtos e ainda afirmou que a atividade fazia parte de sua função, acrescentando que o veículo dispõe de cofre boca de lobo. Para a indústria, a atividade de entrega de produtos não configura atividade de risco específico ou extraordinário, sujeitando-se aos mesmos índices de segurança dos demais cidadãos que circulam pelas cidades brasileiras.
Daniel analisou a prova oral e observou que o autor informou que transportava no caminhão cerca de R$ 14.000,00 a R$ 15.000,00 e que ‘‘ocorria de parte do dinheiro não caber no cofre’’ do veículo.
‘‘Incontroversa a existência de transporte de valores pelo reclamante, a despeito do valor transportado, certo é que a reclamada não ofereceu treinamento específico para o exercício da função de transporte de valores ou mesmo para lidar com os correspondentes riscos’’, destacou o desembargador.
Para Viana Júnior, a Lei 7.102, de 20 de junho de 1983, prescreve que o transporte de valores pode ser efetuado com a presença de dois vigilantes. ‘‘Ora, não se pode admitir que o motorista e o ajudante, ambos sem o devido treinamento para transporte de valores, sejam considerados ‘vigilantes’ para os termos da lei’’, emendou o relator.
Ele também citou outras decisões recentes da Segunda Turma do TRT de Goiás com relação ao tema e considerou assertivo deferir ao motorista o pagamento de indenização por dano moral no importe de R$ 4 mil, valor que corresponde a aproximadamente duas vezes a última remuneração do trabalhador.
Para o desembargador, o valor é razoável, proporcional, compatível com as normas legais pertinentes e adequado aos seus fins pedagógico e compensatório. Redação Painel de Riscos com informações da Coordenadoria de Comunicação Social do TRT-18.
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ATOrd 0011383-31.2023.5.18.0102 (Rio Verde-GO)