ACORDO DE DIVÓRCIO
Segurado que se obriga judicialmente a manter ex-esposa em seguro de vida não pode retirá-la unilateralmente

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou nula a alteração de beneficiária de seguro de vida em grupo realizada por segurado da Capemisa Seguradora de Vida e Previdência S.A., que se obrigou, em acordo de divórcio homologado judicialmente, a manter a ex-esposa como única favorecida do contrato.

Para o colegiado, ao se comprometer a manter a ex-mulher como beneficiária, o segurado renunciou à faculdade de livre modificação da lista de agraciados e garantiu a ela o direito condicional (em caso de morte) de receber o capital contratado.

No mesmo julgamento, o colegiado entendeu que o pagamento feito a credores putativos – ou seja, credores aparentes – não poderia ser reconhecido no caso dos autos, pois a seguradora agiu de forma negligente ao não tomar o cuidado de verificar quem, de fato, tinha direito a receber o benefício.

Na origem, a mulher ajuizou ação contra a seguradora para anular a nomeação dos beneficiários de seguro de vida deixado por seu ex-marido falecido, que refez a apólice após o segundo casamento e a excluiu da relação de favorecidos. No processo, a ex-esposa provou que fez um acordo judicial de divórcio com o segurado, em que constava que ela seria a única beneficiária do seguro de vida em grupo ao qual ele havia aderido.

O juízo de primeiro grau julgou improcedente a ação por considerar que a Capemisa agiu de boa-fé ao pagar a indenização securitária aos beneficiários registrados na apólice, de modo que não poderia ser responsabilizada pela conduta do segurado.

O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), entretanto, reformou a sentença e determinou que a ex-esposa recebesse a indenização sob o fundamento de que a estipulação feita no acordo de divórcio tornava ilícita a exclusão da mulher como beneficiária do seguro.

Ao STJ, a seguradora alegou que o pagamento feito por terceiro de boa-fé a credor putativo é válido. Dessa forma, argumentou, não poderia ser responsabilizada por seguir o disposto na apólice, em situação de aparente legalidade.

Ministro Villas Boas Cueva foi o relator
Foto: Gustavo Lima/STJ

Segurado desrespeitou direito garantido à ex-esposa

Segundo o relator do caso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, o artigo 791 do Código Civil (CC) permite a substituição de beneficiários do contrato de seguro de vida pelo segurado, a menos que a indicação esteja vinculada à garantia de alguma obrigação ou o próprio segurado tenha renunciado a tal faculdade.

Nesse contexto, apontou, se o segurado abrir mão do direito de substituição do beneficiário, ou se a indicação não for feita a título gratuito, o favorecido deve permanecer o mesmo durante toda a vigência do seguro de vida. Segundo explicou o relator, nessa situação, o beneficiário ‘‘não é detentor de mera expectativa de direito, mas, sim, possuidor do direito condicional de receber o capital contratado, que se concretizará sobrevindo a morte do segurado’’.

No caso dos autos, em razão do acordo homologado pela Justiça em que havia obrigação de manter a ex-esposa como beneficiária exclusiva do seguro de vida, o ministro Cueva entendeu que ‘‘o segurado, ao não ter observado a restrição que se impôs à liberdade de indicação e de alteração do beneficiário no contrato de seguro de vida, acabou por desrespeitar o direito condicional da ex-esposa, sendo nula a nomeação na apólice feita em inobservância à renúncia a tal faculdade’’.

Devedor deve demonstrar boa-fé e postura diligente

Em relação ao pagamento feito aos credores que aparentemente teriam direito ao crédito (credores putativos), Villas Bôas Cueva destacou que sua validade depende da demonstração da boa-fé objetiva do devedor. Dessa forma, segundo ele, seria necessária a existência de elementos suficientes para que o terceiro tenha sido induzido a acreditar que a pessoa que se apresenta para receber determinado valor é, de fato, o verdadeiro credor.

Por outro lado, o relator ressaltou que a negligência ou a má-fé do devedor tem como consequência o duplo pagamento: uma, ao credor putativo e outra, ao credor verdadeiro, sendo cabível a restituição de valores a fim de se evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes.

Para o ministro, a situação do processo indica que a seguradora não adotou a cautela necessária para pagar o seguro à verdadeira beneficiária.

‘‘Ao ter assumido a apólice coletiva, deveria ter buscado receber todas as informações acerca do grupo segurado, inclusive as restrições de alteração no rol de beneficiários, de conhecimento da estipulante. Diante da negligência, pagou mal a indenização securitária, visto que tinha condições de saber quem era o verdadeiro credor, não podendo se socorrer da eficácia do pagamento a credor putativo’’, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso especial (REsp) da seguradora. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia aqui o acórdão

REsp 2009507

REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO
TRF-4 livra sócio da Tresmaiense de responder por dívidas fiscais da massa falida

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Reprodução

O redirecionamento da execução fiscal com base em indícios de crime falimentar depende da individualização da conduta do sócio para o qual é redirecionado o processo. Sem demonstração de conduta irregular, incabível o redirecionamento.

Nesse fundamento, a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) manteve sentença da 23ª Vara Federal de Porto Alegre que excluiu o empresário Hary Dockhorn, um dos sócios da extinta Transportadora Tresmaiense Ltda., do polo passivo de várias execuções fiscais manejadas pela Fazenda Nacional (União) contra a Massa Falida.

Absolvição na esfera criminal

No processo, o empresário alegou que a empresa foi dissolvida de forma regular, por meio do processo de falência, e que não tinha poderes de gestão, pois reside em Curitiba e a administração estava em Porto Alegre. Tanto que acabou absolvido, com trânsito em julgado, no processo penal em que respondeu com outros dois sócios, pelo crime de apropriação indébita previdenciária, tipificado no artigo 168-A do Código Penal (CP). Ou seja, ele e os demais denunciados não tinham poder de mando para decidir sobre o recolhimento ou não das contribuições à Previdência Social dos empregados.

A Fazenda Nacional, por sua vez, defendeu a legitimidade passiva do empresário para responder pelos créditos fiscais exequendos, dada a independência das instâncias cível e criminal. Afirmou que este exerceu a função de gerência da sociedade empresária de novembro de 1960 até a decretação de falência.

A juíza federal Marila da Costa Perez disse que, inobstante a independência das esferas civil e criminal, a prova da sentença absolutória revelou que o empresário não detinha, efetivamente, poderes de administração junto à Transportadora Tresmaiense. Assim, não poderia ser responsabilizado pelos atos ilícitos a ele imputados, não importando a natureza do crédito executado.

Juiz federal Andrei Pitten Velloso
Foto: Divulgação/IARGS

Exclusão do polo passivo da execução fiscal

‘‘Não se trata de vinculação à sentença proferida na ação penal, mas sim de considerar as circunstâncias fáticas lá adotadas como razão de decidir para absolvição do Sr. Hary Dockhorn, as quais valem também para excluir sua responsabilidade pessoal pelos débitos tributários da empresa falida’’, sintetizou a juíza na sentença, ao julgar procedente o pedido de exclusão do empresário do polo passivo da execução fiscal.

O relator que negou a apelação da União na 1ª Turma do TRF-4, juiz federal convocado Andrei Pitten Velloso, explicou que o redirecionamento da execução aos sócios só deve ocorrer se houver indícios de crime falimentar – o que deve ser verificado caso a caso –, já que a falência, por si só, não atrai a sua responsabilidade pessoal ou a dos administradores da empresa.

Velloso constatou que, em 19 de março de 2019, a Massa Falida da Transportadora Tresmaiense Ltda. ajuizou ação de responsabilidade em desfavor de apenas dois sócios – Nelson José Schiavi (sucessão) e João Adelar Schiavi –, eximindo Hary Dockhorn de toda e qualquer responsabilidade pelos fatos contidos no relatório que serviu de fundamento para o redirecionamento das execuções fiscais.

‘‘Ante o exposto, não demonstrada a atuação do autor na prática dos crimes falimentares, é incabível o redirecionamento da execução fiscal. (…) Deve ser mantida, portanto, a sentença’’, cravou no acórdão.

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

5014815-75.2018.4.04.7100 (Porto Alegre)

 

COLABORE COM ESTE PROJETO EDITORIAL.

DOE PELA CHAVE-PIX: jomar@painelderiscos.com.br

DOENÇA OCUPACIONAL
TRT-RS vê como acidente de trabalho a morte por Covid-19 de um eletricista de hospital

Foto: Divulgação

Se a contaminação fatal pelo vírus da Covid-19 ocorreu nas dependências do empregador e o empregado estava exposto diariamente a agentes biológicos infectocontagiosos, desprovido de equipamento de proteção individual (EPI), há nexo causal entre doença, atividade exercida e meio ambiente laboral.

Assim, reconhecendo a responsabilidade civil do empregador, a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) acolheu recurso para condenar o Hospital São Vicente de Paulo, de Passo Fundo (RS), a indenizar, em danos morais e materiais, pela morte de um eletricista em julho de 2020, após contrair a doença.

A decisão, unânime no colegiado de segundo grau, reformou sentença proferida pelo juízo da 3ª Vara do Trabalho de Passo Fundo.

Com isso, o filho do trabalhador, com transtorno do espectro autista, deverá receber pensão vitalícia correspondente a um terço da remuneração recebida pelo pai, a título de danos materiais. O colegiado também determinou o pagamento de R$ 150 mil como reparação moral.

Exposição a agentes biológicos sem EPI

Segundo o processo, o empregado trabalhou no hospital de dezembro de 2002 até o óbito, em julho de 2020. Ele fazia a manutenção preventiva e corretiva de máquinas e equipamentos. Na atividade, conforme o Perfil Profissional Profissiográfico (PPP), estava exposto a agentes biológicos infecciosos e infectocontagiosos.

No Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), constavam ‘‘possíveis danos à saúde’’ e ‘‘risco de transmissão de doenças’’. Por outro lado, na ficha de registro, não havia informação sobre a entrega de EPIs para a proteção do trato respiratório do trabalhador.

Para o juízo de primeiro grau, no entanto, não foi comprovada a existência de nexo causal ou concausal entre a Covid-19 e as atividades prestadas em benefício da empresa.

Des. Fabiano Beserra foi o relator
Foto: Secom/TRT-4

Desatenção às medidas de prevenção

O filho do trabalhador recorreu ao TRT-RS e obteve a reforma da sentença. O relator do acórdão, desembargador Fabiano Holz Beserra, ressaltou que a desatenção do hospital com as medidas de prevenção à contaminação dos trabalhadores pelo vírus da Covid-19 não era novidade.

Em 2021, o magistrado já havia concedido um mandado de segurança, impetrado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), no qual foi constatada a ‘‘existência de grave risco à saúde e à vida dos empregados’’ da instituição hospitalar.

Para o desembargador, o trabalho no ambiente hospitalar, o número de colegas contaminados e as inúmeras denúncias que ensejaram o ajuizamento de ações pelo MPT permitem o reconhecimento do nexo causal entre a contaminação e o trabalho no hospital.

A culpa do empregador gerou o dever de indenizar

‘‘O nexo causal entre o infortúnio que levou o trabalhador a óbito é evidente. Acerca da culpa do empregador, tenho por configurada, pela ausência de comprovante de entrega de EPIs, não acompanhamento adequado do trabalhador e não fornecimento de condições seguras de trabalho’’, destacou o relator no acórdão.

‘‘Assim, em se tratando de danos experimentados em razão do acidente de trabalho, resultam configuradas as condições para o reconhecimento da responsabilidade civil, geradora do dever de reparação estabelecido no art. 7º, inc. XXVIII, da CRFB’’, concluiu Fabiano Beserra. O dever de indenizar encontra respaldo nas disposições dos artigos 186 e 927 do Código Civil.

Também participaram do julgamento o juiz convocado Edson Pecis Lerrer e a desembargadora Rosane Serafini Casa Nova. Ainda cabe recurso da decisão. Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia/Secom/TRT-4.

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

ATOrd 0020718-64.2022.5.04.0663 (Passo Fundo-RS)

ELON MUSK
X deve esclarecer questões encaminhadas pela PGR, determina Alexandre de Moraes

Reprodução X

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu medidas requeridas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) no âmbito do Inquérito (INQ) 4957, instaurado para apurar condutas do dono e CEO da rede social X, Elon Musk.

Nesse inquérito, Musk é investigado pelo suposto cometimento dos crimes de obstrução à Justiça (inclusive em organização criminosa) e incitação ao crime.

A PGR quer saber dos representantes do X no Brasil se Musk determinou a publicação de postagens em perfis suspensos por determinação judicial. Outra informação necessária diz respeito a eventual reabilitação de perfil que tenha sido suspenso por ordem judicial e, em caso afirmativo, quem na empresa determinou o ato e quantos e quais perfis teriam sido reativados.

Na decisão, o ministro Alexandre de Moraes autorizou as medidas pleiteadas por estarem em conformidade com a investigação que apura as condutas de Elon Musk. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Leia aqui a íntegra da decisão

INQ. 4957

JORNADA EXAUSTIVA
Hamburgueria é responsável por acidente de trajeto que deixou atendente paraplégico

A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconheceu a responsabilidade da FCD Hambúrgueres Comércio de Alimentos Ltda. (Rede Bob’s) pelo acidente sofrido por um atendente de balcão da loja do Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, em Confins (MG), após uma jornada de trabalho exaustiva. Ele dormiu enquanto pilotava sua motocicleta no trajeto para casa e ficou paraplégico.

O colegiado restabeleceu decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais) que havia reconhecido a relação entre o acidente e o trabalho e deferido indenização por danos morais e materiais. Com isso, o processo retorna à Quarta Turma do TST, que havia decidido em sentido contrário ao julgar o recurso de revista do trabalhador.

Paralisia

O atendente trabalhava das 21h50min às 5h50min, e o acidente ocorreu por volta das 6h da manhã, provocando lesão na coluna e paralisia irreversível das pernas. Na ação trabalhista, ele sustentou que, no turno de 25 para 26 de maio de 2015, tinha sido submetido a trabalho exaustivo, em razão da falta de oito empregados da sua equipe de 13 pessoas. O cansaço teria reduzido sua atenção na condução do veículo.

Prova oral

O pedido de indenização foi julgado improcedente pelo juízo de primeiro grau. Mas o TRT da 3ª Região destacou que a empresa não havia comprovado seus argumentos sobre a jornada do empregado naquele dia, pois o controle de ponto não tinha sido preenchido. Também levou em conta o depoimento do gerente, relatando que, no dia, muitos empregados haviam faltado.

Considerando as condições físicas do trabalhador e o fato de o trabalho ter contribuído para o evento (concausalidade), o TRT condenou a empresa a pagar indenização de R$ 200 mil por dano material e de R$ 80 mil por dano moral.

Ministro Cláudio Brandão foi o relator
Foto: Secom/TRT-5

Menor movimento

Ao examinar o recurso de revista da empresa, a Quarta Turma do TST isentou-a de responsabilidade pelo acidente, por entender que não ocorrera uma ausência significativa de empregados no dia e que a jornada do atendente não tinha sido estendida. Ainda de acordo com a Turma, ‘‘o turno noturno é o que tem menor movimento’’.

Sem respaldo

Para o relator dos embargos opostos pelo trabalhador à SDI-1, ministro Cláudio Brandão, a constatação da Quarta Turma de que o turno noturno é menos movimentado não tem respaldo na decisão do TRT, pois não há nenhuma afirmação a respeito. Além disso, a conclusão de que não teria havido faltas significativas nem elastecimento da jornada do atendente não combina com o contexto fático-probatório delineado no voto vencedor do TRT, que registrou que o gerente havia admitido essas circunstâncias.

Voto vencido

Brandão constatou que a Turma, para absolver a FCD no julgamento do recurso de revista, considerou fundamentos do voto vencido no TRT. Ocorre que a SDI-1 pacificou o entendimento de que só é possível usar fatos registrados no voto vencido quando não forem contrários aos delineados no voto vencedor, como no caso.

A decisão foi unânime. Com informações da jornalista Lourdes Tavares, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

Clique aqui para ler o acórdão

RR-10535-68.2016.5.03.0179