Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)
Foto: Agência Alesc
A Lei 7.713/88, que isenta do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) o aposentado por doença grave, exige tão somente o diagnóstico da enfermidade listada no inciso XIV do seu artigo 6º. Para o deferimento e/ou manutenção da isenção, portanto, não há necessidade da presença de sintomas, de incapacidade total ou de internação hospitalar.
Na prevalência deste entendimento, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em reforma de sentença, declarou nula a cobrança de crédito tributário movida pela Receita Federal em Florianópolis contra um servidor aposentado da Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina (Alesc). A isenção foi contestada depois que uma nova perícia médica concluiu que o autor da ação anulatória – aposentado por invalidez em 1982 – não era portador de cardiopatia hipertensiva.
Respaldo legal para a isenção
A relatora da apelação, desembargadora Maria de Fátima Freitas Labarrère, afirmou que, em 2011, quando a concessão da aposentadoria foi declarada irregular, já havia laudo oficial atestando a doença geradora do benefício fiscal. E mais: a alegação de fraude/irregularidade na concessão da aposentadoria não foi cabalmente comprovada.
Desa. Maria de Fátima foi a relatora
Foto: Imprensa/TRE-RS
‘‘Não é possível, portanto, fazer retroagir a cessação da isenção fiscal, na medida em que, durante a vigência da benesse, havia respaldo legal para sua concessão, sendo nulo o auto de lançamento para cobrança do tributo naquele período’’, escreveu no acórdão.
STJ decide na mesma linha
A relatora destacou a manifestação da ministra Eliana Calmon, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o REsp 1125064/DF. Excerto daquele acórdão, no ponto: ‘‘Reconhecida a neoplasia maligna, não se exige a demonstração da contemporaneidade dos sintomas, nem a indicação de validade do laudo pericial, ou a comprovação de recidiva da enfermidade, para que o contribuinte faça jus à isenção de Imposto de Renda prevista no art. 6º, inciso XIV, da Lei 7.713/88’’.
Por fim, Labarrère destacou que, em casos análogos ao dos autos, também envolvendo outros servidores da Alesc que tiveram suas aposentadorias contestadas, o TRF-4 entende não ser possível retroagir a cessação da isenção fiscal. Logo, considerou nulo o auto de lançamento para cobrança do tributo no quinquênio anterior ao período.
Diagnóstico de cardiopatia grave
O autor trabalhou como servidor efetivo da Alesc até junho de 1982 quando, após diagnóstico de cardiopatia hipertensiva (CID 402.0/7 – revisão 1965), se aposentou por invalidez. Por se tratar de doença grave, pediu e obteve isenção do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF).
Em 2011, motivada por uma reportagem-denúncia do programa Fantástico, da Rede Globo, a Gerência de Perícia Médica do Instituto de Previdência de Santa Catarina (Iprev) reavaliou 153 processos de aposentadorias por invalidez e conclui que 16 servidores estavam aptos a voltar ao trabalho. Neste lote, estava o nome do autor, que teve de se submeter à nova inspeção médica, ocasião em que a autarquia considerou ‘‘insuficiente’’ o laudo médico expedido em 1982.
Laudo que concedeu aposentadoria por invalidez contestado
A nova perícia médica confirmou a suspeita: o laudo pericial apresentado no ato da concessão da aposentadoria por invalidez era insuficiente para atestar, com absoluta certeza, a existência da doença diagnosticada há quase 30 anos. No efeito prático, em agosto de 2011, foi declarada a capacidade laboral do autor.
Como consequência direta do novo cenário, a Receita Federal (Fazenda Nacional) revisou o processo de concessão da isenção, concluindo pela inexistência da doença desde o início – havia só um atestado no prontuário médico. E instaurou procedimento administrativo para cobrar do contribuinte os valores correspondentes ao Imposto de Renda do ano de 2006, com multa de 75% e juros de mora.
Ação de inexigibilidade de crédito tributário
Em resposta, o autor ajuizou ação anulatória de débito fiscal na 2ª Vara Federal de Florianópolis para ver declarada a inexigibilidade do crédito tributário decorrente da revogação da isenção.
Como fundamentos principais, alegou persistência da doença incapacitante e a nulidade do lançamento do débito fiscal, pela invalidade do processo administrativo que o declarou apto ao trabalho na Alesc. A validade do ato administrativo ainda pende de exame pela Justiça Comum Estadual em outras demandas judiciais.
Sentença de improcedência
O juiz federal Leonardo Cacau Santos La Bradbury advertiu que a possível anulação do processo administrativo que derrubou a aposentadoria por invalidez, na esfera estadual, não impede o fisco, na esfera federal, de exercer a autotutela a qualquer momento. Ou seja, a suspeita de várias fraudes nos atos de certificação da doença o autoriza a exigir prova da continuidade das condições necessárias para o implemento da hipótese de incidência da isenção.
Ele explicou que a Receita Federal não está desconstituindo uma situação jurídica de isenção para não isenção, tampouco declarando a nulidade daquela isenção, mas apenas reconhecendo a inexistência daquela situação fática original. É que, inexistindo parcela do suporte fático, nunca houve a incidência da norma de isenção. Noutras palavras: sem doença incapacitante, não há incidência da norma de isenção.
Para o juiz, a doença ‘‘jamais existiu’’
O julgador de primeiro grau ainda ressaltou que o caso posto nos autos não trata de não-isenção de Imposto de Renda em razão de não mais existirem os sintomas, mas da constatação fática de que a doença grave jamais existiu.
‘‘A respeito da situação fática, o autor manifestou-se, com veemência, contrário à realização da perícia médica, chegando a impetrar mandado de segurança para esse fim, vinculado à ação nº 5018657-25.2016.4.04.7200, conexa à presente. A improcedência do pedido, portanto, é medida que se impõe’’, definiu Bradbury, julgando improcedente a ação anulatória de débito fiscal.
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5023171-84.2017.4.04.7200 (Florianópolis)
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