SERVIÇO OU MERCADORIA?
Reforma tributária sinaliza alento ao setor da construção civil

Por Vitor Fantaguci Benvenuti e João Vitor Prado Brilharinho

Foto: Elza Fiúza/Agência Brasil

A aprovação da reforma tributária foi marcada por muitas promessas de melhorias, como a unificação de tributos e a simplificação das obrigações acessórias. Nos âmbitos estadual e municipal, uma das principais mudanças foi a extinção do ISS e do ICMS, que serão substituídos pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), um tributo de competência compartilhada, que inclusive terá legislação unificada.

Apesar das incertezas que ainda permeiam esse novo tributo, a mudança tem o potencial de garantir uma maior segurança jurídica ao setor da construção civil, que há mais de uma década vem enfrentando diversos impasses judiciais sobre a tributação das atividades pelo ISS ou ICMS. A situação impacta diretamente a eficiência das empresas e, no final das contas, o valor final pago por contratantes de obras e investidores.

Fazendo uma breve contextualização, as atividades exercidas pelas empresas do ramo de construção civil envolvem diversas etapas e procedimentos específicos, desde a produção dos materiais até a sua aplicação no local da obra.

Com a evolução tecnológica, alguns procedimentos passaram a ser executados de forma industrializada, o que inclusive ensejou o surgimento de novos modelos de negócio, como a chamada ‘‘construção industrializada’’ ou ‘‘modular’’. Nesse segmento, estruturas pré-moldadas são fabricadas fora do canteiro de obras, para depois serem transportadas ao local da construção, onde apenas é feita a montagem.

No entanto, o sistema tributário brasileiro sempre se pautou na tradicional distinção entre mercadoria (obrigação de dar) e serviço (obrigação de fazer), suscitando divergências quando falamos de atividades mistas, que envolvem simultaneamente a prestação de um serviço e o fornecimento de mercadorias.

A diferenciação é reforçada pela determinação expressa de que incide ISS nos serviços de construção civil, com exceção do ‘‘fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços’’, que fica sujeito ao ICMS. Essa previsão já constava do Decreto-Lei 406/1968, que instituiu o ISS, tendo sido reproduzida nos itens 7.02 e 7.05 da Lei Complementar 116/2003, que atualmente regulamenta o referido imposto.

Portanto, a depender das particularidades do procedimento executado, as autoridades fiscais podem divergir sobre a sua classificação como ‘‘serviço’’ ou ‘‘fornecimento de mercadoria’’, o que gera um impacto direto sobre o tributo a ser recolhido e obrigações acessórias a serem cumpridas pelas empresas.

Apesar da pacificação do entendimento quanto a algumas situações específicas ao longo dos anos, como a incidência apenas do ISS sobre o fornecimento de concreto (Súmula 167 do STJ), o surgimento de novas técnicas e outras particularidades de cada caso podem ensejar discussões casuísticas sobre qual tributo deve incidir, gerando insegurança jurídica para o setor da construção civil.

Incertezas no ISS

Não bastasse isso, as incertezas também envolveram a delimitação da base de cálculo do ISS, por conta da interpretação dos tribunais a respeito do disposto no art. 9º, § 2º, do Decreto-Lei 406/1968 (posteriormente replicado no art. 7º, § 2º, da Lei Complementar 116/2003), dispositivo que autoriza a dedução do valor de materiais fornecidos pelo prestador dos serviços da base de cálculo do ISS.

Inicialmente, o STJ entendia que tal dedução só seria possível para materiais produzidos pelo prestador fora do local da obra que tenham sofrido a incidência do ICMS. A lógica era que, se o material sofreu a incidência do ICMS, consequentemente não é uma ‘‘prestação de serviço’’ e, assim, pode ser deduzido da base de cálculo do ISS.

Em 2010, sob o rito de repercussão geral (Tema 247), no âmbito de um processo em que litigavam o município de Betim (MG) e uma construtora, o STF foi levado a analisar se o art. 9º, § 2º, do Decreto-Lei 406/1968 (dispositivo que previa originalmente a possibilidade de dedução dos materiais da base de cálculo do ISS) teria sido recepcionado pela Constituição Federal de 1988.

Na ocasião, o STF entendeu pela recepção do dispositivo, reconhecendo a possibilidade de dedução dos materiais da base de cálculo do ISS e, no caso concreto, reformando o acórdão do STJ.

Contudo, o município de Betim recorreu da decisão, alegando que a constitucionalidade da dedução de materiais fornecidos pelo prestador de serviços da base de cálculo do ISS não afetaria a conclusão do STJ sobre a extensão da dedutibilidade. Em outras palavras, ainda que seja possível a dedução, ela somente poderia se dar em relação aos materiais que tenham sido produzidos fora do local da obra e tenham sofrido a incidência do ICMS, não sendo possível a dedutibilidade de todo e qualquer material.

De fato, a decisão do STF suscitou dúvidas quanto à sua extensão. Tanto é que, depois de 2010, o próprio STJ reformou sua jurisprudência e passou a autorizar a dedutibilidade do ISS em relação a todos os materiais, e não apenas aqueles produzidos fora do local da obra e que tenham sofrido a incidência do ICMS.

O recurso do município de Betim no RE 603.497 foi julgado somente em 2020, quando o STF esclareceu seu posicionamento anterior, reafirmando que é constitucional a dedutibilidade do valor de materiais da base de cálculo do ISS, mas que o STJ deveria delimitar a extensão dessa dedutibilidade.

Assim, diante da decisão do Supremo, o STJ decidiu retomar seu posicionamento anterior, de que a dedutibilidade se aplica apenas aos materiais que tenham sofrido a incidência do ICMS.

Esse breve histórico mostra que, ao longo das últimas décadas, o setor de construção civil vem enfrentando insegurança jurídica na definição de suas atividades como ‘‘serviço’’ ou ‘‘mercadoria’’, suportando todos os problemas decorrentes dessa incerteza.

Por vezes, as empresas optam por executar uma atividade de forma menos eficiente do ponto de vista técnico, unicamente para não enfrentar um longo embate judicial e eventuais autos de infração.

Neste aspecto, a substituição do ICMS/ISS pelo IBS tem o potencial de encerrar discussões judiciais que afetam negativamente o setor, atingindo a almejada neutralidade da tributação, a fim de que incidências tributárias não sejam um fator determinante na definição de um modelo de negócio empresarial.

Ainda assim, existem questões importantes que, até o momento, continuam incertas e exigem atenção dos contribuintes. É o caso do regime diferenciado para a construção civil, que, de fato, está previsto no texto da reforma, mas, na prática, pode não atender a todas as expectativas do setor.

Outro ponto relevante é a incerteza sobre a efetiva carga tributária que será suportada pelas empresas do ramo, que até então vem sendo discutida apenas no plano das estimativas, sem uma definição concreta. Portanto, apesar dos possíveis benefícios da criação do IBS, é necessário que os contribuintes, especialmente do setor da construção civil, tenham cautela e acompanhem atentamente a regulamentação da reforma tributária.

Vitor Fantaguci Benvenuti e João Vitor Prado Brilharinho são sócios da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados

INSEGURANÇA JURÍDICA
Reoneração da folha de pagamento: desventuras em série

Por Eduardo Diamantino e Lara Fernanda de Oliveira Prado

Diamantino Advogados Associados

Já faz um tempo que se diz que o Brasil está em desvantagem competitiva com outros países e um dos principais fatores é a carga tributária sobre salários. Virou lugar-comum dizer que, do jeito que está, só exportaremos produtos brutos.

Daí surgiu a desoneração da folha. A ideia é simples: implementada em 2011, foi prorrogada sucessivas vezes, de modo que, com isso, há mais de uma década os setores selecionados pela lei podem substituir a tradicional contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a folha de pagamentos por alíquotas variáveis de 1 a 4,5% sobre a receita bruta das empresas.

Mas a disputa e o roteiro em torno da mais recente prorrogação do benefício são rocambolescos. O Congresso aprovou a Lei 14.784/2023 em outubro do ano passado, mantendo o regime até 2027. O Executivo vetou, e o Congresso derrubou o veto. Assim, a lei passou a valer. Inconformado, o Executivo editou a Medida Provisória 1.202/2023, para revogá-la por outra, a MP 1.208/2024, de fevereiro deste ano.

Na prática, depois de todo esse embaraço travado pelo Legislativo e Executivo, estava finalmente valendo a desoneração da folha. Incansável, a Fazenda achou por bem adicionar mais um componente no imbróglio: o Judiciário.

A Advocacia-Geral da União recorreu à Ação Direta de Inconstitucionalidade 7.633 no Supremo Tribunal Federal. O argumento principal é que a Lei 14.784/2023 não teria vindo acompanhada de previsão do impacto orçamentário para a redução da arrecadação que tal medida provocaria, logo, ofenderia o artigo 113 do ADCT da Constituição. Distribuída ao ministro Cristiano Zanin, foi concedida a liminar passando a valer imediatamente a reoneração integral da folha (20%).

Em primeiro lugar, é necessário ponderar que a desoneração não foi propriamente criada, mas mantida pela legislação de 2023, o que afasta a aplicação do artigo 113 do ADCT. O próprio STF já se manifestou nesse sentido. Em entendimento sobre a extensão do mesmo regime no âmbito da ADI 6632/DF, o então ministro do STF Ricardo Lewandowski (hoje no Executivo) destacou que a simples prorrogação do prazo de vigência não pode ser interpretada como uma nova instituição. Nesse sentido, cai por terra o fundamento de suposta inconstitucionalidade.

De qualquer modo, ao conceder liminares de grande impacto como essa, é crucial considerar a magnitude das repercussões. Empresas há anos se beneficiam desse incentivo fiscal, baseando seus planejamentos financeiros nessa prerrogativa estabelecida desde 2011, de modo que uma reversão abrupta desse benefício, como a imposta por uma medida judicial, não apenas interrompe esses planos, mas também desencadeia uma série de consequências negativas.

Planejamento financeiro

Não pode o contribuinte ter que incorporar ao seu planejamento financeiro os intrincados ajustes do Orçamento da União, sujeitos a disputas completamente alheias à vontade do pagador de impostos. Até porque, se a lei foi mesmo promulgada sem previsão orçamentária, não seria o caso de crime de responsabilidade fiscal? E seria o contribuinte, terceiro de boa-fé, quem deveria sofrer as consequências disso?

Uma das mais importantes funções dos tribunais superiores é garantir a segurança jurídica. Pacificar as relações entre os cidadãos brasileiros. Contrariamente, ao mudar a jurisprudência da corte em uma liminar no plenário virtual para atender a um determinado argumento orçamentário, atropelou-se a segurança jurídica, promovendo o completo oposto.

Como se não bastasse, depois de toda a confusão causada com a liminar, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou acordo que estabelece um modelo híbrido de desoneração em que a tributação vai aumentando em um quarto por ano. O modelo prevê uma diminuição gradual da cobrança da CPRB (Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta). A alíquota será de 5% em 2025; 10% em 2026; 15% em 2027, chegando ao patamar de 20% em 2028. O pitoresco é que o acordo tenha sido formatado como um projeto de lei, em desafio à própria lógica de um entendimento recíproco.

Nesse ínterim, ficam algumas perguntas: se o problema era a ausência de previsão de impacto orçamentário, como isso foi resolvido? Isso deixou de ser problema? Ou na verdade era só fumaça para garantir uma maior arrecadação? E ainda, se a liminar foi concedida para resolver essa questão, suspendendo seus efeitos, esse acordo pode mudar a questão orçamentária e a convicção do ministro prolator?

Como se vê, Brasília tem sido pródiga em criar soluções das quais emanam novos problemas. A estabilidade e a confiança do estado dependem não apenas da capacidade de resolver impasses de forma consistente, mas também de evitar que tais respostas não prejudiquem o ambiente de negócios e o desenvolvimento econômico do país.

Lara Fernanda de Oliveira Prado é sócia da área cível e trabalhista e Eduardo Diamantino é tributarista especializado em agronegócio e sócio do Diamantino Advogados Associados

INSEGURANÇA JURÍDICA
Subvenções estaduais para investimentos, uma discussão que ainda vai longe

Por Guilherme Saraiva Grava

Diamantino Advogados Associados

Ao mesmo tempo em que a União projeta arrecadar R$ 35 bilhões neste ano com a tributação federal de subvenções estaduais para investimentos, os contribuintes navegam por incertezas e inseguranças em relação ao tema.

A discussão parecia ter encontrado fim com a nova Lei 14.789, promulgada no apagar das luzes de 2023 a partir da conversão da Medida Provisória 1.185/2023. Mas a verdade é que a mudança de rumos é tão brusca que a nova lei ainda gera dúvidas, inclusive pelas emendas que a MP sofreu no decorrer de sua tramitação no Congresso Nacional. A impressão é que, para solucionar um problema, criou-se outro.

Para mergulhar no assunto, é preciso entender logo de início que o regime inaugurado pelo Governo Federal inverte a lógica que existia até então – e essa é a chave fundamental da análise, examinada a partir da ótica da arrecadação.

Anteriormente, o que se tinha era um sistema que visava isentar da tributação federal os incentivos atrelados a iniciativas e projetos de desenvolvimento regional. Se um benefício fiscal (um crédito presumido de ICMS, por exemplo), estivesse atrelado a uma iniciativa desse tipo, concedia-se isenção federal de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Porém, a conexão entre uma coisa e outra precisava estar clara. Se a relação entre o benefício e um investimento não estivesse nítida (o que poderia decorrer da forma como o estado regulamentou a benesse), a União usava o benefício da dúvida em seu favor e prosseguia com a tributação normalmente.

A premissa pode parecer simples, mas diversos fatores complicavam o cenário e criavam problemas no dia a dia das empresas. Muitas dessas discussões giravam em torno dos critérios para se demonstrar o vínculo entre o benefício e o investimento, tema que foi objeto de mais de uma alteração na lei, mas que a Receita Federal insistia em interpretar à luz de pareceres da década de 1970, contrariando precedentes recentes na jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), além de enorme insegurança jurídica.

Para evitar esse cenário, a nova lei aprovada teve como objetivo simplificar a questão – pelo menos do ponto de vista da União. A partir de agora, todo e qualquer benefício fiscal concedido pelos estados estará sujeito à arrecadação federal. Subvenções estaduais, de qualquer natureza, ainda que para investimentos de interesse público, são tributadas. Ponto final.

A diferença é que, com o advento da nova lei, benesses atreladas a projetos de desenvolvimento passam a gerar créditos aos contribuintes, enquanto as demais, não. Trata-se de um cenário bem diferente e amplamente favorável à União, porque o valor do crédito fica limitado a 25% do valor aplicado na implementação e expansão do negócio.

Na prática, isso significa dizer que aquela isenção, que antes era concedida, agora virou um crédito tributário muito menor e que, como se não bastasse, só poderá ser aproveitado em um período futuro, depois de a empresa estar habilitada junto ao Governo Federal.

A situação, certamente, levará muitos contribuintes a judicializar a questão, ainda que a União tenha tentado simplificar a matéria. Mesmo com o novo sistema, as teses há muito discutidas sobre a violação ao pacto federativo ou ao conceito de receita permanecem. Resta saber como o tema será tratado pelo Poder Judiciário.

É evidente que a mudança de cenário ocasionará impactos que não serão suportados por todos os contribuintes da mesma forma. Essa nova regra de habilitação junto ao Governo Federal, por exemplo, pode atender a algumas empresas, a depender da maneira como os benefícios estaduais lhes foram concedidos e como os valores foram aplicados em iniciativas de desenvolvimento. As companhias que não conseguirem se habilitar, certamente irão se insurgir. E não lhes faltarão motivos.

Entretanto, a prática do novo regime ainda é uma incógnita, e os pontos já regulamentados pela Instrução Normativa 2.170/2023, da Receita Federal, não são suficientes para dizer como o sistema funcionará e quais exigências irão condicionar a fruição do novo crédito (ou deixar de fora benefícios nunca tributados).

Se por um lado as regras de transação e autorregularização propostas pela nova lei parecem querer colocar as polêmicas do passado em pratos limpos, o sistema de habilitação e adesão ao novo regime parecem querer interditar um debate que sempre existiu e ainda persiste: faz sentido a União tributar um benefício estadual como se fosse renda?

A verdade é que essa disputa ainda não foi superada e as discussões sobre a natureza jurídica dos benefícios, assim como do equilíbrio do pacto federativo, permanecem vivas como nunca. Até agora, a única certeza é que estamos distantes do ponto final, com risco de as dúvidas só serem resolvidas nos tribunais.

Guilherme Saraiva Grava é sócio da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados

PROTEÇÃO AO COMPRADOR
Nova lei garante transparência e segurança em transações imobiliárias

Por Matheus Cannizza e Geovanna Nicolete

Reprodução: site da Aripar

A averbação de constrições judiciais em matrículas de imóveis é um procedimento fundamental para assegurar a transparência e segurança nas transações imobiliárias.

A ausência dessa averbação pode acarretar sérios prejuízos aos compradores de boa-fé, uma vez que podem desconhecer a existência de ônus sobre o imóvel, como penhoras, hipotecas judiciárias ou outras medidas constritivas decorrentes de processos judiciais.

Agora, este procedimento conta com uma novidade trazida pela Lei 14.825/2024, que tem como objetivo garantir a eficácia dos negócios jurídicos relativos a imóveis sem averbação na matrícula, mediante decisão judicial, de qualquer tipo de constrição judicial.

A nova lei consiste na inclusão de um inciso V no artigo 54 da Lei 13.097/2015, que trata das hipóteses de proteção dos adquirentes de imóveis. Este novo inciso prevê a averbação, mediante decisão judicial, de qualquer tipo de constrição judicial incidente sobre o imóvel ou sobre o patrimônio do titular do imóvel, incluindo aquelas provenientes de ações de improbidade administrativa ou oriundas de hipotecas judiciárias.

Tal medida representa um avanço na proteção dos direitos dos compradores. Afinal, a averbação judicial de constrições garante que eventuais ônus sobre o imóvel sejam devidamente registrados, possibilitando que outros interessados tenham pleno conhecimento da situação jurídica do bem.

Além disso, concentrar essas ações na matrícula do imóvel tem como objetivo reduzir a burocracia, eliminando a necessidade de terceiros realizarem várias diligências para verificar se há alguma situação que possa levar à anulação do contrato de compra e venda.

É importante ressaltar que a eficácia da Lei está condicionada à efetiva implementação e fiscalização por parte dos órgãos competentes, especialmente dos cartórios de registro de imóveis.

De todo modo, a Lei 14.825/2024 representa um importante avanço na legislação brasileira. A medida contribui de forma positiva para incrementar a transparência e segurança jurídica nas transações imobiliárias, protegendo os direitos dos adquirentes e promovendo a integridade no âmbito da administração pública.

Matheus Cannizza é coordenador da área cível estratégico e Geovanna Nicolete é estagiária do escritório Diamantino Advogados Associados

APURAÇÃO DE ICMS
Secretaria da Fazenda de SP prorroga prazo para extinguir e-CredRural

Por Douglas Guilherme Filho

No fim de 2023, a Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz) adotou uma medida que surpreendeu milhares de produtores rurais que atuam no Estado, ao prever a extinção do sistema e-CredRural a partir de junho de 2024. Entretanto, para alento dos produtores, recentemente, por meio do Decreto 68.406/2024, a Secretaria prorrogou o prazo para extinção programa, que poderá ser utilizado até 30 de setembro.

O e-CredRural é um sistema que permite aos produtores apurarem créditos de ICMS quando as suas saídas estiverem sujeitas à isenção, não incidência, entre outras hipóteses. Esse crédito é apurado mediante a avaliação dos valores do imposto destacados nas notas de aquisições.

Por meio desse sistema, é permitido que o produtor possa obter um ressarcimento, a fim de adquirir insumos utilizados na produção, diluindo o custo da sua produção/comercialização.

Para a Secretaria da Fazenda, o sistema teria se tornado obsoleto, sendo utilizado por um número reduzido de produtores rurais, após a alteração da formação de apuração do cálculo de um dos principais insumos (combustíveis).

As alternativas dadas pela Sefaz/SP foram duas.

A primeira seria a possibilidade de apurar os créditos anteriores a 30 de abril de 2024 para fins de utilização até 30 de junho de 2024. A medida, na prática, se mostrou inviável, pois haveria um prazo exíguo para que fossem consumidos os montantes apurados nos últimos cinco anos. O novo decreto buscou corrigir em parte esse problema, ao prolongar o prazo de utilização do programa até 30 de setembro de 2024.

Já a segunda opção seria a concessão de créditos outorgados, nos percentuais, respectivamente, de 1% nas operações de saída de café cru, em grão ou em coco, e de 2,4% sobre os demais produtos.

Embora financeiramente essa possibilidade trouxesse maior rapidez ao recebimento dos valores, já que autorizaria que o comprador efetuasse o ressarcimento direto ao produtor, apenas os casos em que as operações estivem sujeitas à isenção, ou não incidência, não abarcando, por exemplo, os casos que as saídas fossem diferidas — ou seja, postergadas para um momento da realização de uma nova operação comercial.

Além disso, esse crédito outorgado seria concedido de maneira transitória, pois a própria legislação que determinou uma data para pôr fim ao e-CredRural previu que esse regime vigoraria até 31 de dezembro de 2024, sem falar que limitaria, substancialmente, o momento a ser recuperado pelo produtor.

Em suma, as alternativas apresentadas não se mostravam vantajosas ao produtor rural, seja por exigir que ele abra mão de créditos apurados no passado, em clara afronta ao princípio da não cumulatividade e do direito adquirido, ou que ele migrasse de um regime simplificado (como é o caso do e-CredRural), para um mais complexo, como o caso do e-CredAc (sistema de créditos acumulados) notadamente nos casos em que a legislação veda a opção pelo crédito outorgado (saída diferida).

De todo modo, mesmo que o produtor tenha fôlego renovado para se preparar para o fim do e-CredRural, a nova legislação ainda impacta no custo de produção ao tentar simplificar as obrigações acessórias. Além disso, impõe ao produtor rural uma série de exigências que não existiam anteriormente, como manter controle de custeio ou preenchimento de SPED, por exemplo.

Diante das complexidades e desafios apresentados pela decisão da Sefaz/SP de extinguir o sistema e-CredRural, a prorrogação do prazo até setembro de 2024 representa um fôlego adicional para os produtores rurais se adaptarem às novas exigências. Essa extensão oferece um tempo precioso para avaliar estratégias, buscar orientação especializada e ajustar os processos internos, visando uma transição com menos sobressaltos. A expectativa é que a iniciativa proporcione maior segurança jurídica e operacional, permitindo uma melhor gestão dos créditos de ICMS e uma adequação mais eficiente ao novo regime vigente.

Douglas Guilherme Filho é coordenador da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados