INTERESSES MAIORES
Plano de saúde não pode recusar contratação com consumidor inscrito em cadastro de inadimplentes

O simples fato de o consumidor possuir negativação nos cadastros de inadimplentes não justifica, por si só, que a operadora recuse a contratação de plano de saúde, decidiu, por maioria de votos, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Segundo o colegiado, negar o direito à contratação de serviços essenciais por esse motivo constitui afronta à dignidade da pessoa, além de ser incompatível com os princípios do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

‘‘Não há dúvida de que a autonomia da vontade e a liberdade de contratar seguem merecedoras de relevância, mas é preciso lembrar que sempre estarão limitadas ao atendimento da função social do contrato’’, afirmou o ministro Moura Ribeiro no voto que foi acompanhado pela maioria do colegiado.

A consumidora ajuizou ação contra a Unimed – Cooperativa de Serviços de Saúde dos Vales do Taquari e Rio Pardo, no Rio Grande do Sul, após sua adesão ter sido negada em virtude da existência de negativação nos cadastros restritivos, por débito anterior ao pedido de contratação.

Em primeiro e segundo graus, a Justiça gaúcha determinou que a operadora efetuasse a contratação do plano de saúde pretendido pela autora, vedando qualquer exigência de quitação de dívidas para que fosse concluída a adesão.

No recurso ao STJ, a operadora alegou que a recusa na contratação tinha o objetivo de evitar a inadimplência já presumida da contratante. A operadora também sustentou que, nos termos da Lei 9.656/1998, não há impedimento à recusa de contratação com pessoas que estejam negativadas nos cadastros de inadimplentes.

Liberdade contratual deve ser exercida nos limites da função social do contrato

Ministro Moura Ribeiro foi o voto vencedor
Foto: Flickr/STJ

O ministro Moura Ribeiro destacou que, conforme previsto no artigo 421 do Código Civil, a liberdade contratual deve ser exercida nos limites da função social do contrato. Dessa forma, para o ministro, as relações jurídicas contratuais envolvem algo maior e estão acima da vontade e da liberdade das partes.

Moura Ribeiro explicou que não pode a parte, ao seu exclusivo desejo, agir pensando apenas no que melhor lhe convém, principalmente nos casos de contratos de consumo de bens essenciais como água, energia elétrica, saúde e educação.

‘‘Em casos tais sobrepõem-se interesses maiores, visto que não há propriamente um poder de autonomia privada, porque o contratante (em especial o aderente) não é livre para discutir e determinar o conteúdo da regulação contratual. Nem sempre é livre, sequer, para contratar ou não contratar, visto que colocado diante de um único meio de adquirir bens ou serviços essenciais e indispensáveis à vida’’, completou.

Fornecedor não pode se recusar, sem justa causa, a prestar produtos e serviços

Segundo o ministro, ao se submeter ao mercado de consumo, o fornecedor não pode se recusar, sem justa causa, a prestar os produtos e serviços oferecidos. ‘‘Na hipótese dos autos, com todo respeito, não parece justa causa o simples temor, ou presunção indigesta, de futura e incerta inadimplência do preço’’, ponderou.

De acordo com Moura Ribeiro, além de não se saber a razão da negativação anterior – tampouco se houve motivo justo para a restrição –, o fato de o consumidor possuir registro em cadastro de inadimplentes não significa que ele também deixará de honrar obrigações futuras.

Por fim, o ministro registrou que a prestação dos serviços sempre pode ser interrompida se não houver o pagamento correspondente. Como consequência, para Moura Ribeiro, exigir que a contratação seja efetuada apenas mediante ‘‘pronto pagamento’’, nos termos do que dispõe o artigo 39, inciso IX, do CDC, equivale a impor ao consumidor uma desvantagem manifestamente excessiva, o que é vedado pelo artigo 39, inciso V, do Código.

‘‘A contratação de serviços essenciais não mais pode ser vista pelo prisma individualista ou de utilidade do contratante, mas pelo sentido ou função social que tem na comunidade, até porque o consumidor tem trato constitucional, não é vassalo, nem sequer um pária’’, concluiu a negar provimento ao recurso da operadora. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.019.136

INVASÃO DE PRIVACIDADE
Empregador que tirou fotos para provar aptidão de empregado afastado pagará dano moral

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Empregador que fotografa o funcionário em sua casa, sem autorização, viola direitos de personalidade assegurados no inciso X do artigo 5º da Constituição (a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas), obrigando-se a indenizá-lo nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil – aquele que, por ato ilícito, causar dano a alguém tem o dever de repará-lo.

Por isso, a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) condenou a Suhma Engenharia e Construções Ltda, nos autos de uma ação revisional, em reconvenção, a pagar R$ 10 mil por xeretar a vida de um pedreiro que, apesar de afastado por doença na coluna, procurava emprego na sua atividade. Ele recebia pensão mensal por ter sido acometido de doença equiparada a acidente de trabalho.

Perícia atestou recuperação do trabalhador

O colegiado, no cerne da ação principal, manteve o comando da sentença da 3ª Vara do Trabalho de Santa Cruz do Sul (RS) que declarou o fim da incapacidade laborativa do empregado. Por consequência, desobrigou o empregador de continuar pagando a pensão mensal enquanto durasse a incapacidade – como decidido em anterior ação trabalhista que tramitou na mesma vara e que desembocou na revisional ajuizada pela empresa.

Desembargador Alexandre Corrêa da Cruz foi o relator
Foto: Secom/TRT-4

Para o relator do recurso ordinário na 2ª Turma, desembargador Alexandre Corrêa da Cruz, embora a discopatia degenerativa lombar seja doença incurável, a perícia médica atestou plena recuperação da capacidade laborativa do pedreiro. Logo, com alteração do quadro de saúde, correta e justificável a revisão da decisão original que condenou o empregador ao pensionamento.

‘‘Portanto, com fundamento nos subsídios trazidos pelo laudo pericial produzido nesses autos, a ação revisional deve ser julgada procedente, reconhecendo-se como descabido o pagamento da pensão mensal até então devida’’, cravou no acórdão.

Captura de imagens invasivas também violou a LGPD

Corrêa, entretanto, em reconvenção, acolheu os argumentos do pedreiro réu, de que as fotos tiradas em frente da casa violaram direito a sua intimidade. As fotografias, a mando do empregador, foram feitas sem conhecimento nem anuência da parte ré na revisional, com a intenção de ‘‘provar capacidade laborativa’’ – as imagens mostram o pedreiro executando seu trabalho, aguardando ordens e dirigindo.

O relator disse que a conduta da empresa também violou o ‘‘princípio da finalidade e da necessidade de tratamento’’, nos termos do artigo 6º, incisos I e III, da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), bem como o direito fundamental de proteção de dados – expresso no artigo 5º, inciso LXXIX, da Constituição.

‘‘Ora, o laudo pericial médico realizado pelo perito de confiança do juízo trata-se de meio de prova necessário e suficiente a comprovar a capacidade laboral do trabalhador, sendo desproporcional a invasão de privacidade do demandado, com fotografias tiradas sem o seu conhecimento’’, resumiu, no voto, o desembargador-relator.

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Revisional – 0020685-98.2021.5.04.0731 (S. Cruz do Sul-RS)

Reclamatória – 0020018-14.2018.5.04.0733 (S. Cruz do Sul-RS)

 

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EXECUÇÕES
Recuperação judicial não impede redirecionamento a sócio após desconsideração da personalidade jurídica

​O deferimento de pedido de recuperação judicial de empresa que tem a sua personalidade jurídica desconsiderada não impede o andamento da execução redirecionada aos sócios, decidiu, por unanimidade, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

De acordo com o colegiado, eventual constrição dos bens dos sócios não afeta o patrimônio da empresa em recuperação, tampouco atinge a sua capacidade de reestruturação.

No mesmo julgamento, a turma entendeu que a desconsideração da personalidade jurídica com base na teoria menor, prevista pelo artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), também se aplica às sociedades anônimas.

Diferentemente da teoria maior, trazida pelo artigo 50 do Código Civil (CC), a teoria menor admite a desconsideração apenas com a demonstração do estado de insolvência da empresa e de que a personalidade jurídica constitui obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados, sem a necessidade de comprovação de desvio de finalidade ou da confusão patrimonial entre os sócios e a sociedade empresária.

No caso dos autos, a desconsideração da personalidade jurídica da empresa em recuperação ocorreu no âmbito de uma ação de consumo. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), segundo o qual a recuperação judicial não alcançaria as demandas envolvendo os devedores solidários, a exemplo dos sócios e dos administradores.

Ao STJ, os recorrentes alegaram ser acionistas – e não sócios – das empresas que tiveram a personalidade jurídica desconsiderada e que o veto ao parágrafo 1° do artigo 28 do CDC excluiria sua responsabilização pela teoria menor, uma vez que não seria possível a desconsideração das sociedades anônimas. Eles também defenderam a suspensão do cumprimento da execução em virtude do deferimento do pedido de recuperação judicial.

Tipo societário para fins de aplicação da teoria menor é irrelevante

Ministro Villas Boas Cuêva foi o relator
Foto: Imprensa/STJ

O relator do caso no colegiado, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, citou precedentes do STJ (entre eles o REsp 1.658.648 e o REsp 1.900.843) para destacar que a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, embora não exija a prova de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, não possibilita a responsabilização pessoal de quem não integra o quadro societário da empresa, ainda que atue nela como gestor, e de quem, mesmo que tenha a condição de sócio, não desempenha atos de gestão na sociedade.

Por outro lado, segundo o relator, a desconsideração da personalidade jurídica fundamentada na teoria menor pode ser admitida para sociedades anônimas, desde que seus efeitos se restrinjam às pessoas que detenham efetivo controle sobre a gestão da companhia. Nesse sentido, o ministro apontou precedente estabelecido pela Quarta Turma no AREsp 1.811.324, no qual o colegiado definiu que o tipo societário da empresa não é fator determinante para a aplicabilidade da teoria menor.

Em relação ao pedido de suspensão das execuções, Villas Bôas Cueva comentou que, conforme decidido pela Segunda Seção no REsp 1.333.349, o deferimento da recuperação judicial, a despeito de suspender as ações e as execuções contra e sociedade em recuperação, não impede o prosseguimento das execuções nem gera a suspensão ou a extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários.

‘‘Justamente por não afetar o patrimônio do devedor principal, ou seja, da empresa em recuperação, é que o legislador ressalvou os direitos e os privilégios dos credores contra coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (artigo 49, parágrafo 1º, da LREF), admitindo o prosseguimento de eventuais execuções contra eles instauradas’’, completou.

No caso concreto analisado, o ministro Cueva ressaltou que, segundo as instâncias ordinárias, os recorrentes são acionistas e controladores da sociedade, e, por consequência, possuem o poder de controle sobre a gestão da sociedade anônima que teve a personalidade desconsiderada.

‘‘No caso, portanto, não há óbice a que os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica recaiam sobre o patrimônio dos recorrentes’’, concluiu no voto. Com informações da Assessoria de Imprensa.

Leia o acórdão no REsp 2.034.442

RESOLUÇÃO VÁLIDA
STJ confirma decisão que autoriza corte de energia com aviso prévio de 15 dias

Reprodução internet

Os atos normativos editados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não correspondem à lei federal. Logo, não desafiam análise de recurso especial (REsp).

O entendimento é da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao manter acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) que considerou lícita a interrupção do fornecimento de energia elétrica após comunicação formal realizada com antecedência mínima de 15 dias, na forma da Resolução 456/2000 Aneel (atualmente revogada).

Assim, o STJ deixou de analisar o mérito de recurso interposto pelo Ministério Público Federal (MPF) e por uma concessionária de energia,

Na origem, o MPF ajuizou ação civil pública (ACP) contra concessionárias de energia elétrica do Rio Grande do Sul para que o fornecimento de energia aos usuários residentes no Estado não fosse interrompido por falta de pagamento com base na Resolução 456/2000 da Aneel.

De acordo com o autor da ação, o serviço de energia elétrica tem caráter essencial e sua supressão representaria uma restrição arbitrária ao direito do cidadão. O MPF também considerou exíguo o prazo de 15 dias para aviso aos usuários sobre a suspensão do serviço.

Em julgamento de embargos infringentes, o TRF-4 reformou sentença e reconheceu a validade da resolução da Aneel em relação ao prazo de comunicação prévia sobre a interrupção do fornecimento de energia. Para o tribunal, entendimento contrário poderia causar desequilíbrio econômico-financeiro nos contratos e ameaçar a própria a prestação do serviço, uma vez que as limitações ao corte de fornecimento de energia se relacionariam diretamente com o aumento da inadimplência.

Resolução é ato normativo que não corresponde a lei federal

Em seu voto, o relator do caso no STJ, ministro Francisco Falcão, ressaltou a inadequação do emprego do recurso especial como instrumento de análise de portarias, resoluções, regimentos ou outras normas que não se enquadrem no conceito de lei federal.

“Especificamente quanto à Resolução 456/2000 da Aneel, esta corte já decidiu que a resolução não corresponde a lei federal, não se amoldando o recurso especial ao ditame da alínea ‘‘a’’ do inciso III do art. 105 da CF/1988’’, concluiu Falcão. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

REsp 1250127

DIREITO DO CONSUMIDOR
Itaú vai pagar dano moral por encerrar conta sem avisar o correntista

A 2ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) manteve decisão que condenou, por unanimidade, o Itaú Unibanco S/A a indenizar correntista que teve conta encerrada sem prévia comunicação.

A decisão determinou o reestabelecimento provisório da conta do autor da ação indenizatória, para que ele possa sacar os valores. Além disso, o correntista será indenizado no valor R$ 2 mil, por danos morais.

O autor relata que é cliente do banco e que teve sua conta encerrada de forma unilateral. Ele alega que o réu reteve a quantia que ele tinha em sua conta corrente e condicionou o saque do valor à eventual ordem judicial.

Nesse sentido, como estava impossibilitado de movimentar o dinheiro, relata que acionou a Justiça para requerer a restituição do valor, bem como indenização por danos morais.

Serviço defeituoso

O réu argumenta que não houve falha na prestação dos serviços, já que o banco possui direito de rescindir contratos, conforme a sua conveniência e necessidade. Sustenta que agiu no exercício regular de direito, uma vez que fez a devida notificação prévia no endereço informado.

Por fim, o banco ainda defende que, de acordo com o Banco Central (Bacen), a comunicação prévia só é obrigatória em caso de constatação de irregularidades graves na conta do correntista e que não houve incidência de danos morais, pois os valores foram creditados na conta de origem do autor.

Desembargador Fernando Tavernard

Ao julgar o caso, a Turma esclarece que, de acordo com o Bacen, a comunicação prévia da intenção de rescindir o contrato deve conter a situação que motivou a rescisão e estipular prazo para eventual regularização da pendência. Dessa forma, para o colegiado, a comunicação realizada por e-mail, enviado após o encerramento da conta, não cumpre os requisitos do Bacen.

Sem meios para saque

Finalmente, a Justiça do DF pontua que o banco não comprovou que prestou informação clara e adequada ao consumidor sobre os motivos do encerramento da conta, tampouco disponibilizou meios para o saque dos valores depositados.

Assim, ‘‘a ausência de informação ao consumidor e dos motivos relevantes que deram causa ao encerramento da conta, além da comprovação de que o consumidor utilizava a conta encerrada para recepção de seu salário e os demais abalos derivados da abrupta ruptura do vínculo negocial, subsidiam a reparação por dano extrapatrimonial’’, concluiu o relator da apelação, desembargador Fernando Tavernard Lima. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJDFT.

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