ABUSO DE POSIÇÃO
É ilegal cobrar tarifa para entrega de cargas em terminais retroportuários, diz STJ

Divulgação Cade

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria, que a cobrança da tarifa Terminal Handling Charge 2 (THC2) pelos operadores portuários, em relação aos terminais retroportuários, configura abuso de posição dominante, na modalidade de compressão de preços (price squeeze). Para o colegiado, a prática viola a Lei 12.529/2011, que regula a defesa da concorrência no Brasil.

O entendimento foi fixado durante o julgamento de ação ajuizada pela empresa retroportuária Marimex, que questionava a cobrança da THC2 – também chamada de Serviço de Segregação e Entrega (SSE) – pela operadora portuária Embraport. A tarifa era exigida para separação, transporte e entrega de cargas do porto nos terminais retroportuários.

Segundo a Marimex, a THC2 já estaria incluída na tarifa box rate (THC), cobrada para o desembarque da carga do navio. A empresa alegou que a cobrança adicional representaria pagamento em duplicidade.

Embora, em primeira instância, o pedido tenha sido julgado improcedente, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) determinou o afastamento da cobrança, por entender que a exigência da THC2 violava regras concorrenciais.

No recuso ao STJ, a Embraport sustentou a legalidade da cobrança da THC2, com base na Lei 10.233/2001 e na Resolução 2.389/2012 da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), que regula o setor. A empresa argumentou que a agência teria competência regulatória para definir tarifas, promover revisões e reajustes tarifários e reprimir ações que atentem contra a livre concorrência ou infrações de ordem econômica.

Ministra Regina Helena Costa foi a relatora
Foto: Imprensa/STJ

Acesso às instalações portuárias garante ambiente competitivo

Para a relatora, ministra Regina Helena Costa, a competência regulatória conferida à Antaq pela Lei 10.233/2001 incorporou a concepção de que a garantia de acesso às instalações portuárias por todos os atores do mercado constitui elemento indispensável ao incentivo do cenário competitivo, especialmente para impedir a concentração de serviços em reduzido número de prestadores.

Ela apontou que os operadores portuários detêm posição dominante no mercado de infraestrutura portuária, podendo atuar tanto nas atividades de movimentação de cargas nos portos quanto no seu posterior armazenamento, em concorrência com os retroportos. Essa integração vertical pode gerar ganhos de eficiência, mas também viabilizar práticas que prejudiquem a concorrência.

Cobrança de serviço essencial não pode criar vantagens injustas

Conforme explicou a ministra, aplica-se ao caso a teoria das infraestruturas essenciais, segundo a qual o detentor da infraestrutura deve garantir acesso às instalações indispensáveis ao exercício de atividades econômicas pelos demais atores do mercado, especialmente quando a oferta de um produto ou serviço não se viabiliza sem acesso ou fornecimento essencial.

De acordo com essa teoria, é possível exigir tarifas para o acesso à infraestrutura essencial, mas a cobrança não pode criar vantagens econômicas injustas para um competidor em detrimento de outros, sob pena de violar os princípios da livre concorrência previstos no artigo 36 da Lei 12.529/2011.

No entendimento da relatora, permitir que os terminais portuários exijam a THC2 de seus competidores diretos no mercado de armazenagem de bens oriundos do exterior como tarifa de acesso a insumo essencial ao exercício de suas atividades possibilita a compressão dos preços praticados pelos retroportos.

Ao negar provimento ao recurso, Regina Helena Costa concluiu que a cobrança configuraria as práticas vedadas pela legislação antitruste de dificultar a constituição ou o desenvolvimento de concorrente; de impedir o acesso de competidor às fontes de insumos ou matérias primas; e, ainda, discriminar adquirentes ou fornecedores de serviços mediante a fixação diferenciada de condições de prestação de serviço. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 1899040

APREENSÃO FISCAL
TRF-4 anula provas de descaminho obtidas por violação de correspondência no Paraná

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Divulgação RFB

A abertura de pacote suspeito pela Receita Federal do Brasil (RFB), por supostamente conter objeto sujeito a pagamento de tributos, sem prévia intimação de interessados, viola os direitos de informação e de ampla defesa da pessoa fiscalizada e, por consequência, o direito constitucional de sigilo de correspondência.

A conclusão é da maioria dos integrantes da 4ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ao prover embargos infringentes e de nulidade suscitados pelo dono de uma importadora de telefones celulares, inconformado com a decisão da 8ª Turma, que anulou a sentença absolutória da 23ª Vara Federal de Curitiba, fazendo a ação penal por descaminho retornar à origem para sua regular tramitação.

O empresário foi denunciado pelo Ministério Público Federal do Paraná (MPFPR) por transportar, ‘‘em proveito próprio e no exercício de atividade comercial’’, mercadorias de procedência estrangeira desacompanhadas de regular documentação – três celulares da marca chinesa Xiaomi, avaliados em R$ 3.968,90, sendo R$ 1.325,61 a título de tributos federais evadidos (imposto de importação mais imposto sobre produtos industrializados.

Ele já havia sofrido outras apreensões fiscais por fatos semelhantes, inclusive respondendo ação penal por descaminho. O crime é previsto no artigo 334, parágrafo 1º, inciso IV, do Código Penal (CP) – deixar de recolher imposto devido na entrada, saída ou consumo de mercadoria.

No recurso interposto junto à 4ª Seção da Corte – que uniformiza a jurisprudência das turmas penais –, o empresário reprisou o argumento de que a fiscalização da Receita Federal não apontou a existência de indícios sobre o suposto conteúdo ilícito das mercadorias. Nem determinou a intimação do destinatário ou do remetente antes de proceder à abertura dos pacotes suspeitos.

Para a relatora dos embargos infringentes, desembargadora Salise Monteiro Sanchotene, a ilicitude da abertura dos pacotes suspeitos pela Receita Federal do Brasil, sem notificação prévia e antes do prazo legal previsto para defesa, implica nulidade das provas de materialidade obtidas pela autoridade fazendária.

‘‘Sem autorização judicial ou fora das hipóteses legais, é ilícita a prova obtida mediante abertura de carta, telegrama, pacote ou meio análogo, sem prejuízo de que o legislador defina hipóteses fáticas em que a atuação das autoridades públicas não sejam equiparáveis à violação do sigilo a fim de assegurar o funcionamento regular dos correios’’, definiu a relatora, voto que prestigiou a sentença.

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BUSCA DE VÍNCULO
Dias alternados de trabalho em diferentes casas da mesma família não enquadram diarista como empregada doméstica

Reprodução Diarista Online

O vínculo de emprego doméstico exige a prestação de serviço na mesma residência em mais de duas vezes na semana, conforme requisitos do artigo 1º da LC 150/2015.

O entendimento é da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-SC) em ação na qual uma diarista pediu reclassificação como empregada, sustentando que, ao somar os dias de serviço prestados para mãe e filha, ultrapassava o limite máximo semanal permitido sem contrato.

O caso aconteceu em São Bento do Sul, no Norte do estado. A reclamante procurou a Justiça do Trabalho alegando que, durante seis anos, prestou serviços em residências vizinhas. Ela relatou ainda que, somando os dias de trabalho, ia de três a quatro vezes por semana nos dois lugares.

Juntamente com o reconhecimento do vínculo, a mulher também solicitou o pagamento das verbas trabalhistas acumuladas durante todo o período, além de verbas rescisórias.

Pedido improcedente

Na Vara do Trabalho de São Bento do Sul, o juiz Luiz Fernando Silva de Carvalho analisou o caso e decidiu pela improcedência do pedido. O magistrado destacou que, segundo a Lei Complementar 150/2015, o vínculo empregatício no trabalho doméstico se configura a partir da prestação de serviços na mesma residência por mais de dois dias por semana.

Carvalho complementou que a regra aplica-se independentemente se as residências em que os serviços forem prestados pertencem a pessoas da mesma família.

O magistrado também destacou que, apesar de serem mãe e filha, cada uma das rés realizava, separadamente, o pagamento da diarista, o que evidenciou que não houve contratação por uma delas ‘‘para a prestação de serviços em benefício de todos’’.

Ausência de requisitos

Inconformada com a decisão, a reclamante recorreu ao TRT-SC, insistindo no argumento de que a frequência maior do que duas vezes por semana seria, por si só, suficiente para configurar o vínculo empregatício.

No entanto, o relator no caso na 3ª Turma, juiz convocado Hélio Henrique Garcia Romero, manteve o entendimento do primeiro grau. Na decisão, Romero ressaltou que, de acordo com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), constituem requisitos indispensáveis para o reconhecimento da relação de emprego ‘‘a prestação de serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste, em subordinação jurídica, e mediante salário’’.

O magistrado complementou que os autos mostravam a ausência dos requisitos necessários, fato evidenciado por áudios das contratantes, ‘‘sempre perguntando se a autora podia ir em tal dia/horário, além de haver algumas referências de dias em que a autora não precisava ir’’.

Isso, aliado ao fato de que os serviços eram prestados para pessoas que – ‘‘apesar de fazerem parte do mesmo núcleo familiar’’ e serem vizinhas –, possuem residências diferentes, levou Romero a rejeitar o pedido.

A parte autora ainda poderá recorrer da decisão ao Tribunal Superior do Trabalho, por meio de recurso de revista (RR). Redação Painel de Riscos com informações de Carlos Nogueira, da Secretaria de Comunicação Social (Secom)/TRT-12.

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ATOrd 0000110-29.2024.5.12.0024 (São Bento do Sul-RS)

DESRESPEITO AO CONTRADITÓRIO
‘‘Decisão surpresa’’ que adotou fundamento não debatido no processo é anulada pelo TST

Reprodução TRT-10

O julgador não pode adotar fundamentos inéditos ou não debatidos no processo sem dar às partes a oportunidade de se manifestar, conforme previsto no artigo 10 do Código de Processo Civil (CPC) e na Instrução Normativa 39/2016 Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Foi o que decidiu, à unanimidade, a Sétima Turma do TST, ao anular acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (MS) por caracterizar ‘‘decisão surpresa’’. O recurso esteve sob a relatoria do ministro Cláudio Brandão.

Fundamento do TRT era inovatório

O caso envolveu a validade de uma norma coletiva que fixava o tempo de deslocamento (horas in itinere) entre a casa e o trabalho em 40 minutos. O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (MS) manteve a condenação da empresa ao pagamento de diferenças dessas horas, mas com um novo fundamento: a inaplicabilidade da norma coletiva ao trabalhador, por ele pertencer a uma categoria diferenciada (motorista de caminhão). Contudo, esse aspecto não havia sido discutido no processo nem levantado pelas partes, configurando inovação no julgamento.

Direito ao contraditório é um dos pilares processuais

O ministro Cláudio Brandão, relator do recurso de revista da empresa, destacou que a concepção moderna de cooperação processual exige que as partes tenham confiança legítima no processo, o que inclui a garantia de manifestação prévia sobre qualquer fundamento que possa ser usado na decisão. Segundo ele, a decisão do TRT violou esse princípio ao decidir com base em uma questão nova, não apresentada nem debatida.

Processo voltará ao TRT

Diante disso, a Sétima Turma reconheceu a nulidade da decisão e determinou o retorno do processo ao TRT para novo julgamento, a fim de que a decisão regional respeite o contraditório, o dever de consulta e a proibição à decisão surpresa.

Segundo o relator, respeitar esses princípios é essencial para assegurar o equilíbrio e a confiança no processo judicial. Com informações do técnico judiciário Bruno Vilar, compiladas pela Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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Ag-RR-24034-49.2021.5.24.0086

DESABAFO CONJUGAL
TRT-15 mantém justa causa de vigilante que postou vídeo em redes sociais no horário de trabalho

Sede do TRT Campinas
Foto: Denis Simas/Comunicação TRT-15

A 6ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15, Campinas) manteve a justa causa aplicada a um trabalhador que atuava como vigilante em uma agência bancária por ter postado, durante o horário de trabalho, com uniforme e a arma da empresa, um vídeo com discurso machista e misógino em suas redes sociais (especialmente na plataforma Tik Tok), expondo de forma crítica sua própria relação conjugal.

Em seu recurso, negado pelo colegiado, o vigilante terceirizado alegou que a punição da dispensa por justa causa foi desproporcional, uma vez que sua conduta durante os mais de três anos de trabalho foi exemplar, sem registros de advertências ou punições anteriores.

A defesa do reclamante afirmou que, pela análise do vídeo exibido ao processo, ‘‘fica claro que não tinha a intenção de prejudicar a imagem da reclamada, tratando-se apenas de um desabafo pessoal, sem mencionar o nome da empresa ou suas atividades’’.

Além disso, a empresa ‘‘não provou que a suposta falta cometida comprometeu suas atividades ou causou danos à sua imagem e não apresentou prova de normas internas que proibissem a gravação de vídeos no ambiente de trabalho’’.

Para a relatora do acórdão, desembargadora Rita de Cássia Scagliusi do Carmo, a falta grave está devidamente evidenciada. De fato, o vigilante gravou e postou vídeo tratando de assunto relacionado à sua intimidade conjugal, confessando que se encontrava em horário de trabalho, e ainda que não tenha mencionado o nome da empresa no vídeo, ‘‘vestia uniforme e crachá e, ademais, abordando a relação com sua esposa, em tom de reflexão sobre ‘o que querem as mulheres’ […] também permaneceu a maior parte do tempo com a mão sobre a arma de fogo, que portava em razão do trabalho’’.

O colegiado entendeu que, além de estar em horário de trabalho, o trabalhador expôs o empregador em razão, também, do conteúdo de sua fala que, em tom machista, sugere que as mulheres reclamam que ‘‘os homens não prestam, são ‘sem vergonha’, mas são as mulheres que preferem homem que não presta, que bate em mulher, que vive às custas dela, e conclui questionando ‘o que essas mulheres procuram hoje’, já que não querem homem sério como ele’’.

De acordo com a relatora, os ‘‘discursos de ódio têm tomado as redes sociais com repercussões profundamente danosas para toda a sociedade e, em particular, para as mulheres, vítimas não apenas de machismo, mas de impensável misoginia, de que a fala do reclamante está repleta”. Além disso, a ‘‘defesa da ideia de que mulheres preferem homens sem caráter e violentos deve ser rechaçada de forma veemente e para a reclamada é de todo indesejável que esse tipo de postura preconceituosa seja atrelada a sua marca’’, afirmou.

O colegiado lembrou que ‘‘ainda que o momento pessoal fosse delicado para o trabalhador, ao se valer do desabafo nas redes sociais, ele não expôs apenas a sua imagem, mas, também, a de todo trabalhador vigilante, do qual se espera serenidade e equilíbrio, e também a empresa de vigilância, que fornece mão de obra em segurança patrimonial, comprometendo-se com um serviço adequado’’.

Nesse sentido, o colegiado julgou que a atitude do vigilante ‘‘resulta, de fato, em quebra de confiança e exposição indevida da empresa, de seus serviços de segurança, e até do tomador de serviços, onde o reclamante realizava serviço de segurança ostensiva, armado’’, e, por isso, ‘‘tal conduta, por sua gravidade, justifica a punição da dispensa imediata, sem a necessidade de punições anteriores, não prevalecendo a tese de necessidade de gradação das penas’’. Com informações da Comunicação Social do TRT-15.

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ATSum 0010898-33.2023.5.15.0096 (Jundiaí-SP)