AMBIENTE TÓXICO
TRT-RS condena Simers a pagar R$ 30 mil a advogada que desenvolveu depressão em função das humilhações

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Se existe nexo de causalidade entre o ambiente laboral tóxico e a patologia desenvolvida pelo empregado ao longo da duração do contrato de trabalho, o empregador tem de indenizá-lo na esfera moral. Afinal, o empregador responde de forma objetiva pelos danos causados por empregados, chefes ou prepostos no exercício da função ou em razão dela.

Firme neste entendimento, a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) manteve sentença que condenou o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) por abusos praticados contra uma advogada negra que desenvolveu quadro de ansiedade e depressão nos quase 20 anos de contrato de trabalho. A conduta foi considerada tão grave que o colegiado aumentou o valor dos danos morais, que se elevou de R$ 15 mil para R$ 30 mil.

Desembargador Marçal Figueiredo
Foto: Secom/TRT-4

O relator do recurso ordinário trabalhista (ROT), desembargador Marçal Henri dos Santos Figueiredo, destacou que o Simers não produziu nenhuma prova capaz retirar a força da perícia médica ou de comprometer as alegações que embasaram o reconhecimento do nexo de causalidade entre doença psíquica e o ambiente laboral. Com isso, cabe reconhecer a responsabilidade do empregador no processo de desencadeamento/agravamento da patologia psíquica.

‘‘Cumpre frisar ser obrigação do empregador o fornecimento de um meio ambiente de trabalho salutar, ponto em que falhou a reclamada ao permitir que, por conta do comportamento irregular de um superior hierárquico da reclamante, fosse a trabalhadora exposta a condições indignas de trabalho, tratamento humilhante e degradante, em conduta incompatível com seu bem-estar na relação de emprego’’, anotou no acórdão.

Figueiredo também lembrou que a instituição e seu presidente firmaram, em 2012, termo de ajuste de conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho (MPT-RS) em face de atos caracterizadores de assédio moral. Ou seja, a corroborar a narrativa da reclamante, já havia um histórico de condutas agressivas e ofensivas praticadas pelo presidente da instituição.

Ambiente de trabalho estressante, tenso e abusivo

Na petição inicial da ação reclamatória, Denise da Silva Teixeira noticia que trabalhou para o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), com sede em Porto Alegre, entre 2 de maio de 2000 e 2 de janeiro de 2019, exercendo a função de advogada. Diz que o ambiente de trabalho era extremamente estressante, tenso, abusivo e com sobrecarga de tarefas.

Em função deste quadro, afirma que passou a sofrer com ansiedade, insônia, desânimo, instabilidade e irritabilidade, resultado da somatização das circunstâncias a que era submetida em seu local de trabalho. Refere que incontáveis foram os dias de crise com o travamento de coluna e grave quadro de dor aguda/crônica. Informa que foi diagnosticada com transtorno misto ansioso e depressivo – Classificação Internacional de Doenças (CID) F 41.2. Garante que todos os excessos de atividades, cobranças, desrespeitos e abuso psicológico determinaram o aparecimento e o agravamento da doença.

Por tais motivos, pede ao juízo da 30ª Vara do Trabalho de Porto Alegre o pagamento de indenização de R$ 30 mil por danos morais e R$ 15 mil pelos danos materiais – despesas com tratamento médico.

Em defesa, o Simers nega a existência de nexo causal entre a patologia alegada pela autora e as atividades realizadas no curso do contrato de trabalho. Diz que as atividades da reclamante eram básicas, exclusivas e rotineiras do cargo de advogado, com horários flexı́veis. Argumenta que sempre ofereceu um ambiente de trabalho saudável, fazendo ‘‘cobranças normais’’ à área de advocacia.

Ata de audiência escancara os abusos

Durante a audiência de instrução na 30ª Vara do Trabalho, uma das testemunhas, que trabalhou como assessor da presidência do Simers de 2004 a 2019, confirma que a autora da reclamatória era uma ‘‘pessoa tranquila e determinada, dotada de grande desenvoltura verbal’’, se posicionando nas reuniões. Entretanto, com o passar do tempo – registra no depoimento –, ela ‘‘se encolheu’’, demonstrando receio em desenvolver as suas atividades. Em outras palavras, ‘‘murchou’’ profissionalmente.

Segundo o depoente, em razão de diversas advertências verbais, principalmente do presidente e de diretores, a autora passou a ter mais cuidado em se posicionar. Tais advertências decorriam do fato de que ela não correspondia às expectativas das defesas dos médicos. Noutras palavras: a conduta profissional da advogada se chocava com as promessas feitas pela direção do Sindicato, no âmbito jurídico, aos seus associados. O clima era tão tenso que a advogada entrava e saia chorando das reuniões.

Ainda pelo relato, o presidente Paulo de Argollo Mendes – que ficou duas décadas à testa da entidade – passava trabalhos para a autora, mas sonegava informações essenciais. Quando ela apresentava o resultado do trabalho, era humilhada pelo dirigente, na frente de outros advogados e de membros da diretoria.

Quando as peças não estavam do seu agrado, Argollo xingava-a de ‘‘má advogada, ignorante e analfabeta’’, por produzir só ‘‘porcaria’’. Em várias ocasiões, foi necessária intervenção em razão dos excessos da conduta do então presidente. Em suma: o presidente não tolerava o fato da autora não atender as demandas jurídicas que entendia cabíveis, além de não admitir ser contrariado. Comportava-se como um autocrata à frente da instituição, pois o ‘‘Simers cria suas próprias leis’’ – era ‘‘voz corrente’’ na diretória, à época.

Na percepção do depoente, o presidente alimentava o conflito com a advogada para criar condições para a dispensa dela, já que a profissional mantinha um bom relacionamento com muitos médicos. Além disso, a vice-presidente, Maria Rita de Assis Brasil, era um obstáculo para a dispensa, já que a considerava uma grande profissional.

Sentença parcialmente procedente

A juíza do trabalho Fernanda Probst Marca disse restou comprovada a tese posta na peça inicial, de que o ambiente de trabalho era extremamente hostil e prejudicial à saúde psíquica dos trabalhadores, especialmente pela conduta antiprofissional adotada pelo presidente do Sindicato.

Nesse quadro, ficou evidenciada a existência de concausa entre o quadro clínico compatível com a CID 10 F41.2 – transtorno misto ansioso e depressivo – que acomete a autora e o ambiente de trabalho existente, na forma declinada no laudo pelo perito médico. Concausa, segundo a doutrina, é fato independente e estranho na produção do resultado; ou causa não ligada à atividade laborativa, porém concorrente.

A julgadora citou o artigo 21, inciso I, da Lei 8.213/91, que equipara a acidente do trabalho ‘‘o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação’’. Noutros termos, o legislador equiparou as concausas a acidente de trabalho – o chamado ‘‘acidente por equiparação’’.

‘‘Comprovado o nexo concausal, a culpa do reclamado decorre da previsão contida no inc. III do art. 932 e no art. 933, ambos do Código Civil, que dispõem que o empregador responde objetivamente pelos danos causados por seus empregados ou prepostos no exercício do trabalho que lhes competir ou em razão dele, ainda mais quando tais atos foram praticados, segundo a prova testemunhal produzida nos autos, pelo corpo diretivo do sindicato demandado’’, fulminou na sentença.

Como a conduta patronal causou dor íntima e sofrimento à psiquê da autora, restaram violados os direitos de personalidade elencados no inciso X do artigo 5º da Constituição – honra, bom nome e reputação. No caso em exame, o dano moral, presumido, decorre do desenvolvimento da patologia psíquica ao longo da duração do contrato de trabalho. O quantum reparatório arbitrado: R$ 15 mil.

‘‘Por fim, indefere-se o pedido de pagamento de todas as despesas havidas com tratamentos, por falta de suporte probatório que ampare a pretensão, notadamente porque os documentos […] dizem respeito a serviço de quiropraxia, portanto, sem relação direta com a necessidade de eventual tratamento da patologia psíquica que acomete a autora’’, concluiu a juíza na sentença de parcial procedência.

Clique aqui para ler o acórdão dos embargos declaratórios

Clique aqui para ler o acórdão do recurso ordinário

Clique aqui para ler a ata de audiência

Clique aqui para ler a sentença

ATOrd 0021265-34.2020.5.04.0030 (Porto Alegre)

COLABORE COM ESTE PROJETO EDITORIAL.

DOE PELA CHAVE-PIX: jomar@painelderiscos.com.br

DISCRIMINAÇÃO RACIAL
Agente da EPTC chamado de ‘‘negão’’ em reunião vai ganhar um salário de dano moral

O trabalhador tem nome. A menos que se comprove que ele se apresenta com este apelido, ou assim se identifica socialmente, o uso da expressão ‘‘negão’’ como vocativo é discriminação racial.

A decisão é da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) ao condenar a Empresa Pública de Transporte e Circulação S.A. (EPTC), de Porto Alegre, a indenizar um agente de fiscalização de trânsito chamado de “negão” pelo superior hierárquico durante reunião de trabalho. Ele vai receber um salário como compensação pelo dano moral, presumido, resultante da discriminação.

Assédio moral

Na reclamatória trabalhista, o agente de trânsito disse que esse chefe pressionava toda a equipe para aumentar o número de multas aplicadas aos condutores de veículos de Porto Alegre. Para atingir esse objetivo, ele relatou que o gerente de fiscalização de trânsito cometia assédio moral de modo sistemático, e foi nesse contexto que, segundo ele, se deu a discriminação.

Gravação de reuniões

Para comprovar as alegações de assédio moral e tratamento preconceituoso, o agente de trânsito gravou o áudio de algumas reuniões na empresa, e, em uma delas, o gerente se refere a ele como ‘‘negão’’. O empregado público disse que levou esse fato ao conhecimento da empresa, mas a situação teria sido relativizada pela diretoria como ‘‘mera impropriedade vocabular’’.

Segundo ele, as gravações eram provas inequívocas de que recebia tratamento diferenciado, ameaçador e humilhante diante dos demais colegas. ‘‘As palavras falam por si’’, argumentou na inicial.

‘‘Tratamento informal’’

O agente também juntou ao processo vídeos em que o gerente, ao se defender numa ação civil pública (ACP) relativa às cobranças, sustenta que se trata de ‘‘vício de linguagem’’ e de ‘‘forma de tratamento informal corriqueira’’ na empresa. Entretanto, o empregado observou que, durante 1h40min gravados de reunião com o plantão, o tratamento ‘‘negão’’ é direcionado apenas a ele.

Sem intenção de ofender

Ao indeferir o pedido de indenização, a juíza da 17ª Vara do Trabalho de Porto Alegre entendeu que o chefe, ao usar a palavra ‘‘negão’’ no contexto do áudio, não teve a intenção de ofender o agente de trânsito em razão de sua raça. Para ela, o uso do termo teve um caráter apenas vocativo, até mesmo porque não era acompanhado de adjetivos que pudessem dar uma conotação pejorativa.

‘‘Uma infeliz colocação’’

O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) teve o mesmo entendimento da magistrada de primeira instância. Segundo o voto prevalecente, a conduta do chefe não passou de ‘‘uma infeliz colocação’’, e a expressão fora utilizada como vocativo, que poderia ser substituído sem alterar o sentido do discurso.

Vocativo racial 

Ministra Kátia Arruda foi a relatora
Foto: Secom/TST

Para a relatora do recurso do agente ao TST, ministra Kátia Arruda, a utilização de vocativos (termos de chamamento) relacionados à cor da pele é, em regra, associado à cor de pele preta.

‘‘Não é usual na sociedade brasileira a utilização de vocativos relacionados à pele branca, de modo que não há como falar que limitar um trabalhador, no seu ambiente profissional, à cor da sua pele – retirando-lhe sua identidade como indivíduo único – não configura discriminação racial’’, ressaltou.

A partir da transcrição do áudio, a ministra concluiu que o termo não foi empregado em um contexto em que o próprio trabalhador se identificasse com ela, ‘‘mas de modo grosseiro’’.

Racismo recreativo

Segundo a ministra, o racismo, muitas vezes – como no caso do racismo recreativo – se camufla de humor ou de vocativo e acaba sendo relativizado pela sociedade. ‘‘Não é porque se trata de prática comum que é uma atitude correta e despida de preconceitos’’, explicou.

‘‘A discriminação racial – independentemente da intenção de quem a pratica ou de sua consciência acerca da configuração da ação como discriminatória – é agressão grave, que fere direitos de personalidade e causa dano moral presumido.’’

Visão estruturalmente violenta

A relatora citou ainda em seu voto um precedente da Terceira Turma do TST em que outro empregado também havia sido chamado de ‘‘negão’’. Naquele caso, os ministros entenderam que ‘‘não há espaço para o que o Judiciário trabalhista chancele uma visão estruturalmente violenta e excludente’’.

Por unanimidade, a Turma condenou a empresa ao pagamento de indenização no valor de um salário do agente de trânsito. Com informações de Bruno Vilar e Carmem Feijó, da Secretaria de Comunicação (Secom) do TST.

Clique aqui para ler o acórdão

RR-20658-94.2019.5.04.0017

PROVA DE LOCOMOÇÃO
Trabalhadora que faltou à audiência para levar filho ao médico tem pena de confissão revertida

‘‘Viola o princípio do devido processo legal e da ampla defesa a aplicação de pena de confissão pela ausência da parte que deveria prestar depoimento quando esta apresentar justificativa de atendimento médico emergencial de filho no mesmo horário de realização da audiência.’’

Assim entendeu a 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1, Rio de Janeiro), por unanimidade, ao reformar sentença que havia aplicado a pena de confissão pelo não comparecimento da trabalhadora em audiência. A decisão teve a relatoria do desembargador Angelo Galvão Zamorano.

No caso em análise, a profissional foi contratada por uma empresa em 2013 para exercer o cargo de consultora comercial. Ela acionou a Justiça do Trabalho para requerer o pagamento de diferenças salariais, horas extras, entre outros direitos trabalhistas.

A trabalhadora não compareceu à audiência de instrução designada. Na ocasião, a sua advogada, que estava presente, requereu prazo para justificar a ausência, o que foi indeferido pelo juízo de primeiro grau. Assim, foi encerrada a instrução processual.

A sentença proferida pela primeira instância declarou a pena de confissão da trabalhadora quanto à matéria de fato, diante de sua ausência na audiência de instrução. Dessa forma, a sentença tomou como verdadeiros os argumentos trazidos pela empresa em sua defesa, resultando no indeferimento dos pedidos formulados pela consultora.

Ademais, em sede de embargos de declaração, o primeiro grau decidiu que o atestado médico apresentado pela trabalhadora não comprovava sua impossibilidade de locomoção, tampouco a relação de maternidade entre ela e o paciente que necessitou de cuidados médicos. Inconformada, a profissional apresentou recurso ordinário.

Recurso ordinário provido

A trabalhadora argumentou que sua ausência à audiência foi devidamente justificada. Afirmou que juntou aos autos um atestado médico comprovando que acompanhou o filho em atendimento de emergência no mesmo dia e horário da audiência. Assim, requereu a nulidade da sentença e o retorno dos autos à vara de trabalho de origem para a reabertura da instrução processual.

Des. Angelo Galvao Zamorano
Reprodução: Linkedin

Em segundo grau, o processo teve como relator o desembargador Angelo Galvão Zamorano. Inicialmente, o magistrado observou que a trabalhadora juntou aos autos atestado médico que comprovava que ela estava acompanhando seu filho no momento em que se realizou a audiência. Entretanto, observou o relator que o juízo de primeiro grau considerou que o documento não era suficiente para justificar a ausência da profissional, uma vez que não atendia aos critérios estabelecidos na Súmula 122 do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

‘‘Em relação à ausência de indicação de impossibilidade de locomoção, não se aplica ao caso, posto que, havendo a necessidade de atendimento médico de urgência no mesmo horário da realização da audiência, não há como se exigir tal circunstância, sendo óbvio que, em caso de problemas de saúde que demandem atendimento emergencial, a pessoa deve procurar atendimento médico’’, afirmou o relator.

Portanto, observando que também ficou comprovada a maternidade, conforme certidão de nascimento juntada aos autos, o relator entendeu que a sentença violou o devido processo legal e a ampla defesa.

‘‘Impõe-se o acolhimento da nulidade postulada pela reclamante, com a consequente remessa dos autos à Vara de Origem, a fim de seja reaberta a instrução, colhido seu depoimento pessoal e proferida nova sentença da forma que entender de direito’’, concluiu o desembargador. Com informações da Secretaria de Comunicação Social do TRT-RJ.

O TRT-RJ não informa o número do processo

ACORDO COLETIVO
Cláusula que prevê benefícios apenas para sindicalizados é nula, decide TST

A negociação coletiva restrita aos filiados ou contribuintes do sindicato viola os princípios da representatividade sindical, da unicidade e da liberdade de sindicalização e, portanto, representa conduta antissindical.

Nesse fundamento, a Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) considerou nulas as cláusulas de um acordo coletivo que condicionavam a concessão de benefícios custeados pelo empregador à sindicalização do empregado. Para o colegiado, a medida gera discriminação nas relações de trabalho.

Exclusividade

O acordo foi firmado entre o Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Município de Anápolis (Sittra) e a Transportadora São José do Tocantins Ltda., de Anápolis (GO). Entre os benefícios exclusivos a associados do sindicato estavam o fornecimento de cesta básica e estabilidade pré-aposentadoria.

As cláusulas foram questionadas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), mas sua validade foi mantida pelo juízo de primeiro grau e pelo Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-18).

Autonomia da vontade coletiva

Segundo o TRT, a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) ‘‘mudou para sempre’’ o direito coletivo do trabalho, e as cláusulas prestigiam o princípio constitucional da autonomia da vontade coletiva.

De acordo com esse entendimento, os benefícios haviam sido estabelecidos pelo sindicato representante dos empregados, legitimamente constituído para defender seus interesses, e não caracterizaria coação para que se filiassem.

Ingerência

No recurso de revista (RR) aviado ao TST, em combate à decisão, o MPT sustentou que a legítima opção dos trabalhadores de não se sindicalizar passaria a ser punida, já que ficariam privados, só por esta escolha, de benefícios custeados pelo empregado.

‘‘Abrir esta porta é impor o fim da efetiva liberdade de sindicalização’’, sustentou o órgão. ‘‘Começando-se por uma cesta básica, outros benefícios e preferências poderão ser excluídos’’, complementou.

De acordo com esse argumento, a medida seria um claro ato de ingerência, por meio de financiamento empresarial das atividades rotineiras ou de fortalecimento do sindicato de trabalhadores.

Conduta antissindical

O relator do recurso, ministro Cláudio Brandão, reconheceu que o direito à negociação coletiva está constitucionalmente assegurado, mas a negociação coletiva restrita aos filiados ou contribuintes do sindicato viola os princípios da representatividade sindical, tornando-se conduta antissindical.

A seu ver, a negociação coletiva nestes termos compromete,  ‘‘ainda que por via oblíqua’’, o desenvolvimento da categoria do sindicato, ao contrapor, de um lado, a pressão pela sindicalização e, por outro, a discriminação daqueles que não o fazem.

A decisão do colegiado foi unânime. Com informações de Ricardo Reis, coordenador de Editoria e Imprensa da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

Clique aqui para ler o acórdão

RRAg-10590-53.2020.5.18.0052

CASO BRUMADINHO
Defensoria Pública deve fiscalizar e executar TAC firmado com a Vale, decide STJ

Barragem de Brumadinho, em Minas Gerais
Foto: Guilherme Venaglia/Agência Brasil

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), somente a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) pode verificar eventual descumprimento do termo de ajustamento de conduta (TAC) firmado por ela com a Vale S.A., bem como é a instituição legitimada para exigir a sua execução. O TAC regulamenta a indenização extrajudicial dos atingidos pelo rompimento da barragem de Brumadinho (MG), em 2019.

O colegiado aplicou a jurisprudência da corte segundo a qual, em regra, apenas os órgãos públicos legitimados para firmar o TAC e fiscalizar seu cumprimento podem executá-lo.

No caso em julgamento, uma das vítimas ajuizou ação contra a Vale para executar o TAC firmado com a Defensoria Pública mineira e receber o valor de R$ 100 mil, em razão dos danos psicológicos sofridos em decorrência da tragédia.

O pedido foi indeferido em primeiro grau, mas o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) – estado onde a ação foi proposta – julgou a ação procedente, reconhecendo a legitimidade da autora para ajuizar a execução. Para o tribunal, a Defensoria funcionou como mera substituta processual das vítimas, que seriam as reais legitimadas.

Ao STJ, a mineradora sustentou, entre outros pontos, que a autora da ação não teria legitimidade, já que não fez parte da relação jurídica.

Legitimidade para fiscalizar e executar o TAC

Ministro Villas Boas Cuêva foi o relator
Foto: Imprensa STJ

O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator do recurso no STJ, lembrou que a execução de qualquer acordo pressupõe que ele tenha sido descumprido, caso contrário não haverá necessidade de que seja exigido em juízo. ‘‘Em regra, quem pode responder se o acordo está sendo ou não cumprido são os órgãos responsáveis pela fiscalização de sua execução’’, disse.

O relator apontou precedente da Primeira Turma no sentido de que os termos de ajustamento de conduta ‘‘somente podem ser executados pelos órgãos públicos competentes para celebrá-los, até mesmo porque são eles os responsáveis pela fiscalização do mesmo’’.

Segundo o ministro, o TAC em questão trata de uma obrigação de fazer, relativa a viabilizar acordos extrajudiciais entre a Vale e as vítimas de danos materiais e morais decorrentes do rompimento da barragem que tenham interesse nessa via de resolução de conflitos e sejam assistidas pela Defensoria Pública. O cumprimento do acordo, esclareceu, seria verificado em reuniões mensais entre os signatários.

‘‘Assim, a parte lesada não teria como verificar o descumprimento do termo de compromisso, isto é, se a Vale S.A. está comparecendo às audiências para formulação dos acordos com pessoas com poderes para firmá-los, ou se os acordos com outras vítimas estão obedecendo aos parâmetros financeiros previstos, nem mesmo para exigir o seu cumprimento’’, disse o ministro.

TAC estabelece parâmetros financeiros para a celebração dos acordos

Cueva verificou que, embora o TAC trate da reparação extrajudicial para as vítimas e os seus familiares – direitos individuais homogêneos que poderiam ser executados pelas pessoas lesadas –, ele não cuida de obrigação de pagar quantia certa, mas sim estabelece parâmetros financeiros para a celebração dos acordos.

‘‘Eventual inexecução do termo de ajustamento de conduta somente poderia ser verificada pela Defensoria Pública e daria ensejo à execução de uma obrigação de fazer, com a fixação de multa cominatória, de modo a ser novamente viabilizada a realização de acordos extrajudiciais com a assistência da Defensoria dentro dos parâmetros financeiros eleitos’’, afirmou.

O relator ponderou que, na hipótese, como não está previsto no TAC um direito de titularidade da autora da ação que teria sido descumprido, não há como reconhecer sua legitimidade para propor a execução. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.080.812