RECLAMAÇÃO
STF cassa reconhecimento de vínculo de emprego de corretor com construtora

‘‘É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada’’, diz a tese prevalente na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324 e do Recurso Extraordinário (RE) 958252. Ou seja, o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que é lícita a terceirização em todas as etapas do processo produtivo.

Assim, o ministro Nunes Marques cassou decisão da Justiça do Trabalho gaúcha que havia reconhecido vínculo de emprego de um corretor de imóveis com a MRV Engenharia e Participações Ltda. Ao julgar procedente o pedido da empresa na Reclamação (RCL) 61514, o relator determinou que seja proferida outra decisão, com base no entendimento da Corte sobre a matéria.

Corretor

O caso teve origem em ação ajuizada por um corretor de Porto Alegre, buscando o reconhecimento do vínculo de emprego com a construtora, como vendedor de imóveis, entre junho de 2014 e janeiro de 2018, com a anotação na carteira de trabalho e o pagamento de verbas decorrentes.

Requisitos

O pedido foi julgado procedente na primeira instância, que entendeu que estavam presentes os requisitos da relação de emprego do artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) manteve esse entendimento, e o trâmite de recurso de revista foi negado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Prestação de serviços

Ministro Nunes Marques foi o relator
Foto: Carlos Moura/SCO/STF

No STF, a empresa alegava ter firmado contrato de prestação de serviços de corretagem imobiliária com corretor autônomo, conforme previsto na Lei 6.530/1978, e que a Justiça do Trabalho teria desconsiderado esse contrato e presumido que a negociação era ilícita, sem que fosse demonstrada fraude. Para a construtora, houve violação da jurisprudência do Supremo no sentido da permissão constitucional de formas alternativas de trabalho diversas da relação de emprego.

Precedentes

Em sua decisão, o ministro Nunes Marques observou que não há nos autos indícios de exercício abusivo da contratação com a intenção de fraudar a relação de emprego. Ele lembrou que, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324, o STF reconheceu que a terceirização não resulta, isoladamente, na precarização do trabalho, na violação da dignidade do trabalhador ou no desrespeito a direitos previdenciários.

Ele citou ainda decisões da Corte na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 48, que reconheceu a natureza civil da relação comercial entre empresa e transportadores autônomos; e na ADI 5625, em que o Plenário validou contratos de parceria firmados entre salões de beleza e trabalhadores autônomos.

Segundo o ministro, embora não tratem especificamente de contratos de corretagem imobiliária, esses julgados exemplificam a validade de relações civis de prestação de serviços, nos termos do entendimento firmado na ADPF 324. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Leia aqui a íntegra da decisão

Reclamação 61.514/RS

REGULAÇÃO ESTATAL
Distribuidora vai pagar multa de R$ 700 mil por vender remédio acima do preço permitido

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve multa de R$ 700 mil imposta à Victória Comércio de Produtos Hospitalares Ltda, sediada em Porto Alegre, por ter vendido remédios acima dos preços permitidos pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) do Rio Grande do Sul. A decisão foi unânime.

A multa, no valor inicial de cerca de R$ 1 milhão, foi aplicada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que entendeu que a empresa cobrou muito além do permitido pelo medicamento ‘‘Sevelamer 800mg’’, indicado para doença renal crônica.

Na ação ajuizada para tentar anular a multa, a distribuidora alegou que o preço praticado foi resultado de um termo de ajustamento de conduta (TAC) firmado por ela com o Ministério Público do Rio Grande do Sul, a Secretaria de Saúde e a produtora do medicamento.

Após o juízo de primeiro grau julgar o pedido improcedente, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) considerou que o TAC celebrado com autoridades estaduais não afasta a competência da União, por meio da Anvisa, para regular os preços no setor. Contudo, o TRF-4 considerou desproporcional o valor da multa e o reduziu ao patamar de R$ 700 mil.

Recurso não impugnou fundamento suficiente para manter a multa

Ministro Gurgel Faria foi o relator
Foto: Imprensa/STJ

No recurso especial (REsp) aviado no STJ, a distribuidora sustentou que, conforme o artigo 4º da Lei 10.742/2003, a multa seria ilegal, pois a norma é direcionada exclusivamente às empresas produtoras de medicamentos, e não às distribuidoras. Alegou, ainda, que o acórdão do TRF-4 violou o artigo 5º, parágrafo 6º, da Lei 7.347/1985, e ofendeu os princípios da confiança legítima, da proporcionalidade e da razoabilidade.

O ministro Gurgel de Faria, relator do REsp na Primeira Turma, observou que as alegações da empresa recorrente não têm a capacidade de invalidar a aplicação da multa, na medida em que o artigo 4º da Lei 10.742/2003, segundo o entendimento das instâncias ordinárias, não foi o único dispositivo legal que embasou a imposição da sanção.

De acordo com o ministro, a autuação da empresa também foi fundamentada no artigo 8º da Lei 10.742/2003, o qual é suficiente para a manutenção da multa, uma vez que estabelece que o descumprimento de atos estipulados pela CMED, bem como de norma prevista na própria Lei 10.742/2003, sujeita-se às sanções administrativas previstas no artigo 56 da Lei 8.078/1990.

‘‘No caso, conforme se observa do acórdão recorrido, a empresa recorrente teria descumprido atos emanados pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos, na forma do artigo mencionado, pelo que, independentemente da aplicação ou não do artigo 4º em relação àquela, a sanção se manteria por conta de outro fundamento que nem sequer foi impugnado no apelo’’, declarou.

Assinatura de TAC não exclui a atuação da Anvisa

Quanto à alegação de violação ao artigo 5º, parágrafo 6º, da Lei 7.347/1985, o relatou afirmou que até poderia ser considerada, se as mesmas autoridades que firmaram o TAC tivessem, em desrespeito aos limites daquele acordo, fixado a multa.

Contudo, o ministro apontou que o TAC – firmado para disciplinar questão relacionada à prestação de saúde no Rio Grande do Sul – não tem o efeito de excluir a atuação da Anvisa, a qual agiu em âmbito distinto (regulação do setor farmacêutico e dos preços de medicamentos).

Sobre o valor da multa, Gurgel de Faria ressaltou que, nos termos da jurisprudência do STJ, ele só poderia ser alterado em recurso especial se fosse flagrantemente irrisório ou excessivo, situação não verificada no caso. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.916.816

Leia o acórdão do TRF-4

AÇÃO ANULATÓRIA
TRT-15 derruba acordo coletivo que excluiu vigilantes da base de cálculo da cota de aprendizes

Em tutela de urgência, o desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15, Campinas-SP), João Batista Martins César, determinou a suspensão dos efeitos de cláusula de convenção coletiva de trabalho (CCT) que excluía das funções que exigiam porte de arma e curso de formação de vigilante da base de cálculo da cota de aprendizagem e para pessoas com deficiência (PcDs).

Na decisão, o magistrado ressaltou que ‘‘a educação profissional, aí incluída a aprendizagem, além de ser um direito fundamental no nosso ordenamento jurídico, é um direito universal, e todos os esforços devem ser feitos para a sua efetivação’’.

A ação anulatória foi proposta pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em face de CCT celebrada entre  o Sindicato das Empresas de Segurança Privada, Segurança Eletrônica e Cursos de Formação do  Estado de São Paulo, Sindicato (Sesvesp) e Sindicato dos Empregados em Empresas de Segurança e Vigilância de  Presidente Prudente e  Região,  a qual  rejeitava as cotas de aprendizes e de pessoas com deficiência na formação de profissionais de segurança privada.

‘‘O atendimento à porcentagem exigida na cota de aprendizagem, deve ser feito exclusivamente através do dimensionamento do setor administrativo’’, afirmava a 26ª cláusula da CCT.

Des. João Batista Martins César
Reprodução Zoom Meeting

Em sua fundamentação, o magistrado mencionou entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST) ‘‘pela possibilidade de contratação de jovens aprendizes na função de segurança privada’’, sendo que ‘‘se impõe a necessidade de cômputo do número desses profissionais na apuração dos montantes mínimos e máximos de vagas a serem ocupadas por aprendizes, na forma dos arts. 428 e 429 da CLT’’.

Nesse percurso, João Batista Martins César evidenciou que ‘‘a limitação da base de cálculo da cota prevista no artigo 429 da CLT por norma coletiva transpassa o interesse coletivo das categorias representadas, para alcançar e regular direito difuso dissociado das condições de trabalho’’. O desembargador ainda ressaltou que tal cláusula ‘‘ignora o direito fundamental à qualificação profissional de nossos adolescentes e jovens’’.

Também apontou que os sindicatos profissional e patronal não detêm legitimidade para dispor sobre matéria alusiva aos interesses difusos dos trabalhadores. ‘‘Trata-se de matéria de ordem e de políticas públicas, que não é passível de negociação coletiva, sob pena de violação do art. 611 da CLT’’, reforça o magistrado.

Lei do Jovem Aprendiz

A Lei 10.097/00 prevê que os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a 5%, no mínimo, e 15% por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional. Com informações da Comunicação Social do TRT-15.

Clique aqui para ler a liminar

0048205-18.2023.5.15.0000 (Campinas-SP)

CARANGUEJO DE MANGUE
Multa administrativa por infração ambiental independe de prévia aplicação de advertência

Caranguejo-uçá
Foto: Divulgação/Ibama

A validade das multas administrativas por infração ambiental, previstas na Lei 9.605/1998, independe da prévia aplicação da penalidade de advertência. A tese foi fixada pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento de recurso repetitivo.

Segundo a relatora do Tema 1.159, ministra Regina Helena Costa, deve-se adotar, na interpretação das normas ambientais, a perspectiva da máxima proteção ao meio ambiente.

Na origem, o caso envolve a conduta de pescar caranguejo-uçá (Ucides cordatus) no período da andada (defeso), o que se amolda à infração administrativa ambiental prevista no artigo 35, inciso I, do Decreto 6.514/2008, com base legal no artigo 70 combinado com o artigo 34 – ambos da Lei 9.605/1998.

A ministra lembrou que a Lei 9.605/1998 – que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente – não estabeleceu nenhuma ordem hierárquica entre as penalidades administrativas por descumprimento da legislação ambiental, previstas no seu artigo 72. Para a relatora, não há nenhuma previsão legal expressa que condicione a validade da aplicação da pena de multa ao infrator ambiental à prévia imposição da penalidade de advertência.

‘‘O aspecto decisivo eleito pela apontada lei para balizar a cominação das sanções administrativas por infrações ambientais foi, a priori, a gravidade do fato, aferida pela autoridade competente, à vista da situação fática’’, afirmou no voto.

Multa é aplicada nos casos mais graves de degradação ambiental

Ministra Regina Helena Costa foi a relatora
Foto: Imprensa/STJ

De acordo com a relatora, essa opção legislativa atende à efetividade da tutela administrativa ambiental, pois a advertência tem o papel de sancionar apenas as transgressões administrativas menos lesivas ao meio ambiente, ou de conceder ao autuado um prazo para corrigir a irregularidade (artigo 5º, parágrafo 2º, do Decreto 6.514/2008).

Ao citar doutrina sobre a matéria, a ministra ponderou que, nos casos em que a infração ambiental possa causar danos ecológicos graves ou irreversíveis – ou seja, quando se trata de irregularidades insanáveis –, não há sentido em dar tal prazo ao infrator.

Regina Helena Costa observou que, quando o legislador considera necessário estabelecer gradações entre hipóteses legais, o faz de modo explícito, empregando locuções inequívocas, como ‘‘sucessivamente’’ ou ‘‘na seguinte ordem’’.

Na sua avaliação, a aplicação direta da multa nos casos mais graves incentiva o cumprimento voluntário das leis e dos regulamentos ambientais, pois a punição financeira é mais eficaz para desencorajar a prática de novas agressões ao meio ambiente.

A ministra ponderou que a penalidade de advertência tem caráter fundamentalmente educativo, sendo pouco empregada pelo poder de polícia ambiental – responsável pela concretização do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Tal poder, explicou a julgadora, permite a adoção de medidas preventivas, tais como a advertência e a exigência de licenças e autorizações para o exercício de atividades potencialmente lesivas à biodiversidade, assim como também a atuação repressiva, a exemplo da aplicação de multas e interdições. Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.984.746

DEFICIÊNCIA LEVE
Motorista com plena visão monocular não tem direito à isenção de IPI na compra de carro 

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: Blog NewLentes

São isentas de IPI na compra de automóveis, segundo a leitura do artigo 1º, inciso IV, da Lei 8.989/95, as pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, por intermédio de seu representante legal. Já o parágrafo 1º é revelador: considera deficiente quem é impedido de participar, plena e efetivamente, na sociedade em igualdade de condições com os demais.

Por não se enquadrar no ‘‘espírito’’ deste dispositivo, um advogado teve o pedido de isenção negado pela 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), após ter perdido a disputa com a Fazenda Nacional no primeiro grau da Justiça Federal de Porto Alegre.

‘‘Ora, o impetrante [advogado, autor do mandado de segurança] tem plena visão monocular, razão pela qual foi habilitado pelo Detran para dirigir automóveis de passeio, categoria B, até 08 de julho de 2032, o que, por si só, já evidencia que sua deficiência visual não é severa nem profunda, pois, se o fosse, certamente o Detran não o teria habilitado a dirigir automóveis’’, escreveu no acórdão o relator da apelação, desembargador Rômulo Pizzolatti.

Legislador beneficia deficiente rico

Desembargador Rômulo Pizzolatti 
Foto: Sylvio Sirangelo/ACS/TRF-4

Para o relator, a deficiência do autor não é desconsiderada pelo ordenamento jurídico, que por diversas maneiras lhe favorece a participação na sociedade, destacando-se, entre elas, a reserva de cotas para deficientes nos concursos públicos. Entretanto, especificamente em relação à isenção de IPI, a sua situação não é equiparável à daqueles que realmente necessitariam do apoio legal.

‘‘Como outras tantas leis que descansam tranquilamente à sombra dos órgãos de controle da constitucionalidade das leis, a isenção do IPI para aquisição de veículos automotores pelos deficientes não é lei para pobres, a grande maioria da população brasileira. Melhor faria o nosso legislador impudente [sem pudor] e aporófobo [nojo de pobre] se, em vez de favorecer os deficientes ricos, concedesse um vale utilizável pelos deficientes pobres para pagar o uber ou o táxi quando necessário’’, alfinetou Pizzolatti.

O autor já entrou com recurso especial (REsp) para tentar reverter a decisão no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Mandado de segurança

O advogado gaúcho Lucca Silveira Finocchiaro enviou requerimento ao Sistema de Concessão Eletrônica de Isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados (Sisen), da Receita Federal, buscando a isenção prevista no artigo 1º, inciso IV, da Lei 8.989/95, informando ser portador de invisualidade monocular.

O pedido administrativo de isenção, entretanto, restou indeferido, por não atender os requisitos legais. Dentre os motivos, o fisco federal destacou, ipsis literis: ‘‘Não houve a indicação da(s) condição(ões) em que se enquadra o deficiente visual/auditivo. (Enquadramento legal: art. 1º, inciso IV e artigo 2º, incisos II e III do Decreto nº 11.063, de 4 de maio de 2022)’’.

Finocchiaro, então, impetrou mandado de segurança (MS) contra ato do delegado da Receita Federal em Recife, local de origem do automóvel, para obter provimento judicial que reconheça a isenção pretendida.

Sentença de improcedência

O juízo da 14ª Vara Federal de Porto Alegre, em análise de mérito, denegou a segurança, por não vislumbrar ilegalidade no estabelecimento de critérios de aferição da deficiência visual por ato do Poder Executivo.

O juiz federal Fábio Soares Pereira disse que a Lei 14.126/21, que inclui a cegueira monocular como hipótese de deficiência, é geral e não supera, no ponto, a lei especial, que estabelece requisitos específicos para a concessão de isenção de IPI.

‘‘Na espécie, a documentação médica acostada indica que o autor possui acuidade visual de 20/400 no olho esquerdo e de 20/20 no olho direito (1.4, 1.5 e 1.6). Desse modo, não havendo enquadramento nas hipóteses descritas no art. 2º, III, do Decreto n.º 11.063/2022, a parte impetrante não faz jus à isenção pleiteada’’, definiu o juiz federal na sentença.

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5038069-38.2022.4.04.7100 (Porto Alegre)                                       

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