EXECUÇÃO CIVIL
Procura por ativos do devedor no Simba e Coaf é desvio de finalidade, diz STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, mesmo após tentativas infrutíferas de identificar e penhorar ativos financeiros, não é possível realizar pesquisa no Sistema de Investigação de Movimentações Bancárias (Simba) e no cadastro do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para fins de execução civil.

Por outro lado, o colegiado determinou a expedição de ofício ao Banco Central (Bacen) para que efetue pesquisa no Cadastro Geral de Clientes de Instituições Financeiras (CCS), com o objetivo de localizar bens de titularidade da parte executada.

Cumprimento de sentença

Na origem do caso, trata-se de rescisão contratual de promessa de compra e venda de imóvel, com pedido indenizatório, ajuizada por JNM Comércio de Pedras em Geral Ltda, em face de Votorantim Cimentos S/A, a qual foi julgada improcedente. Em reconvenção, a ação da Votorantim foi julgada parcialmente procedente, a fim de determinar que a ré reconvinda ‘‘dê início às medidas judiciais e extrajudiciais que entender pertinentes ao cumprimento de sua obrigação contratual’’.

Após, sobreveio o trânsito em julgado da decisão. Na fase de cumprimento de sentença, o juízo indeferiu o pedido da Votorantim para que fossem feitas pesquisas de bens da executada no CCS-Bacen e no Simba, bem como expedição de ofício ao Coaf. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão.

No recurso especial (REsp) aviado ao STJ, a empresa credora sustentou que o indeferimento das medidas vai contra os princípios da duração razoável do processo, da proporcionalidade, da razoabilidade e da eficiência.

Simba e Coaf promovem combate à criminalidade

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Lucas Pricken/STJ

A relatora do REsp na Terceira Turma do STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que não é possível atender à pretensão da exequente em relação ao Simba e ao Coaf, pois isso significaria desvio da finalidade desses sistemas, que têm atribuições imprescindíveis no combate à criminalidade.

A ministra apontou que o artigo 5º, inciso XII, da Constituição, estabelece que a proteção ao sigilo bancário pode ser mitigada para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. No entanto, segundo ela, não se pode admitir a devassa de informações sigilosas para a busca de bens que atendam ao interesse meramente privado do credor.

Da mesma forma, a relatora observou que a Lei Complementar 105/2001, que rege o sigilo das operações das instituições financeiras, dispõe que ele só será quebrado na apuração de ilícitos em inquérito ou processo judicial, ou ainda em processo administrativo ou procedimento fiscal nos quais a medida seja indispensável.

Meios atípicos podem ser utilizados subsidiariamente

A ministra ressaltou que, de acordo com o artigo 854 do Código de Processo Civil (CPC), existem sistemas que podem ser utilizados para verificar a existência de bens do devedor, passíveis de controle por atos executivos: BacenJud, RenaJud, Infojud e InfoSeg.

Também apontou que o artigo 139, inciso IV, do CPC, viabiliza a adoção de medidas atípicas como instrumento para a satisfação da obrigação do executado, mas ressaltou que essas medidas não podem se dissociar dos ditames constitucionais. Conforme lembrou Nancy Andrighi, o STJ entende que a adoção de meios executivos atípicos é cabível de modo subsidiário, desde que haja indícios de patrimônio expropriável em nome do devedor.

Quanto ao CCS, a ministra observou que é um sistema de informações cadastrais dos correntistas de instituições financeiras autorizadas pelo Banco Central (Bacen) que não contém dados relativos a valor, movimentação financeira ou saldos de contas e aplicações.

‘‘Inexiste impedimento à consulta ao CCS-Bacen nos procedimentos cíveis, devendo ser considerado como apenas mais um mecanismo à disposição do credor na busca para satisfazer o seu crédito’’, concluiu no voto. Redação Painel de Risco com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no 2.043.328

IMPORTAÇÕES IRREGULARES
TRF-4 vê comércio ilícito de bens apreendidos em aduana e mantém perdimento de veículo transportador

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: Divulgação DB Tesser/Imprensa

Uma vez demonstrado o caráter eminentemente comercial das mercadorias importadas de forma irregular, apreendidas na aduana, a Justiça pode relativizar o princípio da proporcionalidade, autorizando a aplicação da pena de perdimento ao veículo utilizado no transporte.

Com a prevalência deste entendimento, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) acolheu apelação da Fazenda Nacional (União) para manter a pena de perdimento sobre um automóvel Citröen Picasso (ano 2008), apreendido pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) em Alegrete (RS) no dia 22 de novembro de 2019. O veículo transportava uma batedeira e cinco aparelhos de ar-condicionado, adquiridos pelos seus três ocupantes além da cota permitida de US$ 500, na cidade fronteiriça de Rivera (Uruguai).

O juiz federal convocado Rodrigo Becker Pinto, voto vencedor neste julgamento, disse que a ‘‘evidente destinação comercial’’ dos produtos, bem como as condições em que foram apreendidos, indica o ‘‘exercício de atividade ilícita de forma organizada’’ –, justificando a relativização do princípio da proporcionalidade.

‘‘Com efeito, consta do Boletim de Ocorrência acostado aos autos que, além do veículo objeto desta demanda, foi apreendido, na mesma ocasião, um segundo automóvel que viajava em conjunto, no qual foram localizados 05 (cinco) aparelhos de ar-condicionado, além de 04 (quatro) caixas de espumante e uma caixa de licor. Do documento, consta que […] ambos confirmaram que estavam viajando juntos e que estariam vindo da região de Rivera-Uruguai’’, fulminou no voto.

Base jurídica para a pena de perdimento

A pena administrativa de perdimento de veículo, aplicada pela Receita Federal do Brasil (RFB) em apreensões de bens de procedência clandestina, encontra guarida no artigo 5º, inciso XLVI, letra ‘‘b’’, e inciso LIV, da Constituição.

Já no ordenamento legal, está amparada nos artigos 2º e 3º e seu parágrafo primeiro do Decreto-Lei 399/1968 (consolidados no artigo 693 do Regulamento Aduaneiro – Decreto 6.759/2009), bem como no artigo 95, incisos I e II, do Decreto-Lei 37/1966 (artigo 674, incisos I e II, do Decreto-Lei 6.759/2009).

Apreensão de mercadorias na Fronteira

Os autores da ação de restituição alegaram na Justiça que as mercadorias foram adquiridas por valor inferior a US$ 500, supondo, por isso, que ainda estariam dentro da cota de isenção do imposto de importação.

No cerne da questão, eles reclamaram que o valor do veículo, estimado em R$ 16 mil, superava o das mercadorias apreendidas – avaliadas em R$ 7,2 mil. Assim, a Receita Federal não teria justificativa para aplicar a pena de perdimento do veículo.

Vara Federal mandou devolver o veículo

No primeiro grau, o juízo da 1ª Vara Federal de Santa Rosa (RS) julgou procedente o pedido de restituição do veículo, por entender que a autuação aduaneira se mostrou desproporcional, decretando, por consequência, a anulação do ato administrativo de perdimento.

O juiz federal Rafael Lago Salapata levou em conta uma série de circunstâncias: os produtos apreendidos não estavam escondidos em veículo modificado, também não havia comprovação de que os autores comercializavam tais bens, assim como não se tinha notícia de que os tivessem outras mercadorias apreendidas anteriormente.

‘‘Afora isso, o veículo utilizado para transporte é considerado de passeio, possui mais de dez anos de uso e seu valor de mercado é baixo, assim como o valor das mercadorias aprendidas – as quais, quantitativamente, não revelam, por si sós, caracterização da destinação comercial. Assim sendo, impõe-se a procedência do pedido’’, justificou na sentença.

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5004706-20.2019.4.04.7115 (Santa Rosa-RS)

 

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DEVER DE CONFIDENCIALIDADE
Bancária vai pagar dano moral por não pedir segredo de justiça em reclamatória

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Reprodução

O empregador, como pessoa jurídica, é titular de honra objetiva e faz jus à reparação sempre que o seu bom nome, reputação ou imagem – que integram o seu patrimônio imaterial – forem atingidos por algum ato ilícito do empregado.

Assim, o Banco C6 S/A conseguiu, perante a 8ª Vara do Trabalho de São Paulo, condenar em danos morais uma bancária que trabalhava em regime de home office por expor, na ação reclamatória, inúmeros dados sensíveis e estratégicos para documentar os seus pedidos trabalhistas, sem o cuidado de pedir a decretação de segredo de justiça. O valor da reparação: R$ 6 mil.

Da sentença, cabe recurso ordinário ao Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo).

Reconvenção

Na reconvenção – no bojo da contestação a inúmeros pedidos –, o banco disse que a autora da ação reclamatória tinha sob sua guarda informações e acesso privilegiados, em razão de sua atividade profissional.

Ao anexar estes documentos à peça inicial, especialmente os voltados ao monitoramento das operações financeiras realizadas pelos clientes, afirmou que ela feriu as cláusulas de confidencialidade e de proteção de dados estipuladas no contrato de trabalho. Ou seja, além de informações sigilosas da empresa, ela divulgou dados de remuneração de pessoas físicas clientes do banco.

Informações sigilosas

‘‘A autora não pleiteou a decretação de segredo de justiça no feito [processo trabalhista], e os documentos mencionados contêm informações sigilosas sobre operações e dados estratégicos da ré e sua divulgação compromete o segredo de empresa. Assim, entendo que não houve observância ao dever contratual de confidencialidade da autora-reconvinda, e que houve dano ao direito ao segredo empresarial da ré-reconvinte’’, confirmou, na sentença, a juíza do trabalho Katiussia Maria Paiva Machado.

Na seara cível, segundo a juíza, a pessoa jurídica goza da proteção aos direitos da personalidade, no que couber, e pode sofrer dano moral. É o que se depreende da leitura combinada do artigo 52 do Código Civil (CC) e da Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Segredo empresarial tem proteção jurídica

‘‘Os artigos 223-B e 223-D da CLT definem que causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa jurídica, a qual é titular exclusiva do direito à reparação, sendo imagem, a marca, o nome, o segredo empresarial e o sigilo da correspondência são bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa jurídica’’, complementou.

A juíza negou, entretanto, o pedido para ‘‘aniquilar todos os documentos, e-mails, fotografias, capturas de tela e informações relacionados ao Banco C6’’, invocando o artigo 17 da Lei 13.709/2018 (LGPD).

‘‘Contudo, referida obrigação de fazer nos termos em que requerida pela ré-reconvinte [banco] é inexequível, pois não é possível o controle do seu cumprimento ou descumprimento na prática. Ademais, a cláusula de confidencialidade e política de privacidade e proteção de dados impede apenas a divulgação de dados da ré-reconvinte’’, finalizou na sentença.

Banco digital

Segundo informa a Wikipedia, o Banco C6 S/A é uma instituição bancária digital de capital fechado voltada a pessoas físicas e jurídicas, sediada na capital de São Paulo.

O projeto do banco foi iniciado em março de 2018, tendo sido lançado e aberto ao público em geral no dia 5 de agosto de 2019, sob a liderança de Marcelo Kalim, ex BTG Pactual. Tem foco voltado ao varejo de alta renda, setor ainda pouco explorado no Brasil.

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ATOrd 1000241-48.2023.5.02.0008 (São Paulo)

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VENDA CASADA
TJSP mantém multa de R$ 11,2 milhões contra práticas abusivas do Banco do Brasil

Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor em São Paulo (Procon-SP), como órgão de fiscalização das relações de consumo, tem competência administrativa para aplicar sanções àquele que violar normas vigentes, sendo que o seu poder de polícia decorre de normas federal e estadual.

Assim, a 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) não teve dúvidas em manter auto de infração que fixou multa de R$ 11,2 milhões ao Banco do Brasil (BB). A decisão foi unânime no colegiado de segundo grau.

Seis infrações ao CDC

De acordo com os autos do processo, o BB acionou a Justiça após ser multado pela prática de seis infrações ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), dentre estas, a imposição de compra de seguro residencial para análise de solicitação de empréstimo – a chamada ‘‘venda casada’’.

O relator do recurso no TJSP, desembargador Paulo Barcellos Gatti, ressaltou em seu voto que a prática de comercializar seguro juntamente com empréstimo consignado viola o disposto no CDC. O magistrado também apontou que, ‘‘em mais de uma oportunidade, as informações fornecidas pelo banco aos consumidores foram insuficientes’’.

BB teve direito à ampla defesa

Sobre o valor da multa aplicada, o julgador destacou que a instituição bancária teve oportunidade de exercer as garantias constitucionais à ampla defesa e ao contraditório no curso do processo administrativo instaurado pela Fundação.

‘‘Com base nos critérios previamente estabelecidos que, consoante mencionado, tão somente pormenorizou aqueles já descritos no artigo 57, caput, do CDC, o órgão administrativo aplicou, fundamentadamente, a correspondente sanção administrativa, conforme se verifica do demonstrativo de cálculo da multa, inexistindo qualquer desproporcionalidade ou irrazoabilidade no procedimento’’, afirmou no voto.

Completaram a turma julgadora os desembargadores Maurício Fiorito e Ana Liarte. Com informações da Comunicação Social do TJSP.

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1036048-10.2022.8.26.0053 (São Paulo)

CONSUMO MÍNIMO
Cláusula take or pay não dá direito a fornecimento de gás após período contratual

Nos contratos com cláusula take or pay, o pagamento do consumo mínimo não confere ao comprador o direito de, no mês seguinte, obter o produto que deixou de consumir no período anterior, e pelo qual teve de pagar. Foi o que decidiu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao se pronunciar sobre o desfecho de uma ação de cobrança ajuizada em 2010 pela White Martins Gases Industriais, fornecedora de gás comprimido, contra uma microempresa de beneficiamento de minério de ferro em Minas Gerais.

A ação nasceu pelo descumprimento da obrigação de pagar convencionada em contrato de compra e venda do tipo take or pay.

Conforme o processo, a empresa consumidora havia assumido a obrigação de pagar um valor mínimo relativo a certa quantidade de gás. Entretanto, ela deixou de consumir o produto e de pagar o montante devido, mesmo após tratativas para a quitação da dívida.

O juízo de origem condenou a ré a pagar o valor devido, mais juros de mora e correção monetária, com a possibilidade de compensar os valores já pagos. Além disso, o magistrado assegurou à ré o recebimento do produto correspondente ao valor pago, mesmo após o período em que ele deveria ter sido utilizado, sob pena de enriquecimento sem causa da autora da ação. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve a sentença.

Cláusula apresenta vantagens para todas as partes

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Imprensa/TSE

A relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que a cláusula take or pay obriga o comprador a pagar por uma quantidade mínima especificada no contrato, ainda que o insumo não seja utilizado. Segundo apontou, ‘‘uma das partes assume a obrigação de pagar pela quantidade mínima de bens ou serviços disponibilizados, independentemente da flutuação da sua demanda’’.

A relatora destacou que, apesar de não inserida no ordenamento jurídico brasileiro, essa prática está comumente presente em contratos de prestação continuada de fornecimento de produtos. De acordo com a ministra, a inserção dessa cláusula no contrato proporciona ao fornecedor segurança para investir e atender à demanda do adquirente, enquanto este se beneficia ao pagar um preço menor pelo produto.

‘‘Se houver aquisição da quantidade mínima estipulada ou de quantidade superior a ela, o preço a ser pago corresponderá à demanda efetivamente consumida, não se aplicando a cláusula take or pay’’, completou.

Fornecimento do que não foi consumido inutilizaria a cláusula

Nancy Andrighi afirmou que, mesmo não consumindo a quantidade mínima de produto disponibilizada pelo vendedor no período ajustado, o comprador terá de pagar o valor estipulado na cláusula. Ela ressaltou que, nesse modelo contratual, o comprador assume o risco da oscilação da demanda e, em contrapartida, será beneficiado com um preço menor.

‘‘Por se tratar de um contrato de trato sucessivo, no período subsequente, ela não terá direito ao recebimento da diferença entre o volume mínimo, pela qual pagou, e a quantia efetivamente consumida’’, completou a ministra ao apontar que a desconsideração do risco assumido pela adquirente acarretaria a ineficácia da cláusula take or pay.

Com esse entendimento, foi dado provimento parcial ao recurso para afastar a obrigação imposta à fornecedora de entregar o volume de gás correspondente ao valor mínimo efetivamente pago. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.048.957