COMBINAÇÃO FREQUENTE
TRT-SP vê vínculo empregatício em trabalho doméstico prestado por três dias na mesma semana

Arte: Blog Guia Trabalhista

A legislação brasileira, desde 2015, considera empregado doméstico quem presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa, pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de dois dias na semana.

Assim, nesse fundamento, a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) reconheceu o vínculo empregatício de diarista que prestava serviços por três dias na casa de uma família paulistana.

Nos autos da ação reclamatória, os empregadores alegaram que a mulher prestava serviços de diarista somente dois dias na semana, revezando-se com outra profissional. Acrescentaram que o labor três vezes semanais ocorria de forma esporádica.

No entanto, o juiz-relator do recurso no TRT-SP, Pérsio Luís Teixeira de Carvalho, pontuou que, tendo sido admitida a prestação de serviços e havendo discordância apenas sobre a natureza da relação jurídica mantida entre as partes, os patrões deveriam provar a descaracterização da habitualidade da atividade – o que não foi feito.

Além disso, documento juntado ao processo intitulado de ‘‘Rescisão de Acordo de Trabalho’’, com assinatura de um dos empregadores, informa que a mulher chegou a trabalhar três vezes por semana ‘‘quando combinado’’.

Na decisão, o magistrado destaca que, como a prova não foi impugnada pelos reclamados, ‘‘infere-se que concordaram com sua veracidade e teor’’. Ainda, os depoimentos das testemunhas não foram considerados porque uma delas não trabalhou na residência no mesmo período que a autora e a outra prestou depoimento indigno de credibilidade.

Para julgar, o relator avaliou também os pagamentos, realizados de forma mensal. Ele calculou que a quantia paga, considerando o valor incontroverso da diária informado pelas partes, correspondia a aproximadamente 15 diárias mensais.

‘‘O que notoriamente suplanta o limite de 2 diárias semanais previsto no art. 1º da LC nº 150/2015”, ponderou o magistrado. Painel de Riscos com informações da Secretaria de Comunicação (Secom) do TRT-2.

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1001088-90.2022.5.02.0006 (São Paulo)

EVASÃO FISCAL
TJRS decide manter fora do Simples empresa criada pelo Grupo Tevah para reduzir ICMS

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: Divulgação Tevah Outlet

A Lei Complementar 123/2006 (que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte) contempla duas situações para exclusão de micro e pequenas empresas enquadradas no Simples Nacional. Pela dicção do artigo 3º, exclusão obrigatória, quando extrapolarem o limite de faturamento. Pelo artigo 29, de ofício, se forem constituídas por interpostas pessoas.

A constatação sinérgica destas duas situações levou o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) a confirmar sentença que negou a reinclusão de uma fábrica de roupas no regime tributário simplificado. A empresa é administrada, informalmente, pela família Tevah, que fracionou juridicamente o seu grupo econômico para recolher menos tributos – especialmente, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Des. Miguel Ângelo da Silva
Foto: Imprensa TJRS

Para o relator da apelação na 22ª Câmara Cível do TJRS, desembargador Miguel Ângelo da Silva, o laudo que embasou o auto de lançamento do fisco estadual – ancorado numa operação policial de combate à sonegação de ICMS – mostrou claramente a formação de grupo econômico integrado pela empresa autora da ação anulatória.

‘‘Aludido laudo, pois, cujas conclusões não foram infirmadas [invalidadas] pela prova dos autos, revela o agir fraudulento da demandante em conjunto com outras empresas no intuito de blindagem patrimonial, com a utilização, outrossim, de subterfúgios que evidenciam senão sofisticada engenharia de evasão fiscal, sobretudo com a formação de verdadeiro grupo econômico de fato constituído para fins de, dentre outros aspectos, usufruir irregularmente da sistemática de tributação implementada pelo Simples Nacional. Logo, descabe cogitar da sua desconstituição’’, anotou no acórdão.

Ação anulatória de débito fiscal

C. A. Donida (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – Eireli) ajuizou ação anulatória, contra o Estado do Rio Grande do Sul, para desconstituir o termo administrativo que a excluiu do Simples Nacional e o auto de lançamento que constituiu crédito tributário de ICMS referente ao período de janeiro de 2009 a dezembro de 2013 no valor de R$ 1,35 milhão mais multa qualificada de 120% e juros.

A autora informou que foi excluída do Simples Nacional em janeiro de 2009 pelos seguintes motivos: não ter dado ciência ao fisco gaúcho de que sua receita bruta foi superior ao limite estabelecido no artigo 3º, inciso II, da LC 123/2006; não comunicou o exercício de atividade vedada ao enquadramento no Simples; e também porque constituiu empresa em nome de interposta pessoa, como prevê o inciso IV do artigo 29 do Estatuto.

No caso concreto, segundo a petição inicial, o ato administrativo de exclusão foi fundamentado na existência de grupo econômico entre a C. A. Donida e a empresa Top Marcas e Franquias Ltda, chamado, pela fiscalização tributária, de Grupo Tevah. Seria uma estratégia criada pelos sócios da THV Comércio do Vestuário Ltda, pertencente a Eduardo e Daniel Tevah, com o intuito de reduzir o recolhimento de tributos.

Citado pela 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Porto Alegre, o Estado do Rio Grande do Sul apresentou contestação. Em suma, defendeu a participação da autora no grupo econômico Tevah, ratificando as conclusões do auto de lançamento. Indicou que, para fins de limites de enquadramento no Simples Nacional, devem ser somados os faturamentos das três empresas que compõe o Grupo Tevah – e não apenas o da empresa C. A. Donida.

Sustentou que o faturamento do Grupo Tevah alcançou R$ 6,4 milhões, ao passo que o limite para inclusão e manutenção no Simples Nacional era de R$ 2,4 milhões no exercício de 2008 (base para 2009). Por esta razão, a autora não poderia estar enquadrada no Simples Nacional.

Diluição de patrimônio 

Procurador de Justiça José Túlio Babosa
Foto: Imprensa MPRS

Para o procurador de justiça José Túlio Barbosa, representante do Ministério Público na 22ª Câmara Cível do TJRS, o auto de lançamento mostra, a partir do relatório da ‘‘Operação Efeito Dominó’’, que os irmãos Tevah, acossados pelas centenas de débitos fiscais, criaram a Top Marcas e Franquias Ltda para franquear e administrar as suas lojas e cobrar royalties de produtos da marca Tevah. Além disso, constituíram a empresa C.A. Donida para industrializar os produtos Tevah, repassando para esta o antigo parque industrial da THV.

Através dessas iniciativas, segundo Barbosa, os irmãos Tevah diluíram o patrimônio de sua empresa, envolvida em vultoso débito fiscal – mais de R$ 23 milhões à época do ajuizamento da ação anulatória –, terceirizando as lojas para outras empresas, através de franquias. E mais: dilapidaram o seu próprio parque industrial, já que o locaram para a C.A. Donida por irrisórios R$ 25 mil por ano. Em síntese, o objetivo era, primeiramente, fugir das consequências da insolvabilidade fiscal e, depois, evadir-se da responsabilidade fiscal futura.

‘‘A efetividade do esquema idealizado, reclama, obviamente, o comando de fato e sua ocultação das autoridades tributárias, sem o que poderiam estas, como fizeram, demonstrar a constituição de um grupo empresarial, oculto sob o rol de sócios irreais, emissão de documentos fiscais inidôneos e administração efetiva pelos controladores, tudo acobertado pelo manto da regularidade empresarial modernizada’’, escreveu o procurador de justiça no parecer enviado à 22ª Câmara Cível, como registra o acórdão de apelação.

Sentença de parcial procedência

No primeiro grau, a 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Porto Alegre tomou como correta a exclusão da parte autora do regime simplificado de tributação, pela questão de interposta pessoa e também pela falta de comunicação ao fisco estadual. Tudo com base em dois dispositivos, combinados, da Lei Complementar 123/2006: artigos 3º e 29.

Entretanto, o juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente a ação anulatória, determinando ao fisco estadual a exclusão do crédito tributário lançado nas operações de industrialização por encomenda dos demais clientes da autora, não envolvidos nas prestações de serviço simuladas entre as empresas do Grupo Tevah e suas franqueadas. Também determinou a amortização dos valores já recolhidos a título de ICMS na sistemática do Simples Nacional e, por fim, redução da multa para o patamar não confiscatório de 100%.

Juíza Marialice Bianchi
Foto: Imprensa Ajuris

Ao fundamentar a sentença, a juíza Marialice Camargo Bianchi disse que a ‘‘Operação Efeito Dominó’’, tocada pela Receita Estadual, Policia Civil e pelo MPRS, constatou a constituição de empresas mediante a utilização de interpostas pessoas, todas integrantes de um grupo econômico de fato – o Grupo Tevah –, a fim de usufruir do Simples Nacional e de se beneficiar do diferimento do ICMS, para reduzir o seu recolhimento. Tudo sob a administração informal dos irmãos Tevah.

A magistrada ‘‘pinçou’’ alguns fatos do auto de lançamento, composto por 71 páginas, que justificam a participação de C. A Donida no Grupo Tevah: Carlos Aurélio Donida foi funcionário da empresa THV Comércio do Vestuário Ltda. de junho de 1990 a janeiro de 2007, e a empresa autora foi constituída em dezembro de 2006; a partir de janeiro de 2007, funcionários demitidos da THV foram admitidos pela C.A. Donida, que locou da THV toda a estrutura de sua fábrica; o contrato de locação do imóvel em que opera a empresa C.A. Donida tem como avalistas os irmãos Tevah; simulação de operações por conta e ordem de terceiro; ingerência direta na C. A. Donida, pelo presidente e pelo diretor comercial da Top Marcas, mandando modificar, controlar e informar custos de produção (não só de mão-de-obra, como se fosse de fato mero prestador de serviços, mas também custo de matéria prima); os Tevah pediam o estudo de alternativas para melhoria da qualidade; isso além de ordens de cunho pessoal, como produzir roupas para uso próprio e pedidos para consertos de calha e da piscina das suas residência e de membro da família Tevah.

‘‘Verifica-se que a relação dos sócios da THV com a Autora encontra-se além do controle de padrões de marca e de qualidade dos procedimentos corriqueiros do ramo de confecções,  […]. A corroborar o exposto, destaca-se outro excerto da peça fiscal que demonstra que Carlos Aurélio Donida não atuava como empresário individual independente, mas como empregado subordinado aos sócios da THV, atendendo, inclusive, demandas de cunho pessoal dos seus superiores mesmo após seu desligamento dessa empresa’’, anotou a magistrada na sentença.

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NORMA INVÁLIDA
Marítimo não pode tirar férias em período de desembarque, diz TST

Foto: Reprodução Labore Saúde Ocupacional

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) considerou inválida norma coletiva que permitia que as férias de um trabalhador marítimo coincidissem com os períodos de folga. De acordo com o colegiado, as férias não podem fazer parte da negociação coletiva porque são direitos inegociáveis do trabalhador. Por unanimidade, a Turma condenou a empresa ao pagamento em dobro das férias pedidas pelo trabalhador marítimo.

Férias e folgas

O trabalhador era marinheiro de máquinas em embarcações da Bourbon Marítima Offshore Ltda., que prestava serviços para a Petrobras na Bacia de Macaé, no litoral do Rio de Janeiro. Na reclamação trabalhista, disse que sua jornada era de 28 dias de trabalho e 28 dias de folga. Esse regime estava previsto nas normas coletivas da categoria, cuja redação permitia que as férias fossem usufruídas concomitantemente com as folgas e que as duas acabassem se confundindo.

Segundo ele, a empresa nunca havia concedido férias aos tripulantes no período aquisitivo, no qual pagava remuneração integral correspondente aos períodos de folga, mas sem conceder anualmente férias de 30 dias sem prejuízo da remuneração.

Desembarque

A Bourbon, em sua defesa, argumentou que, nos termos da norma coletiva, as férias eram tiradas concomitantemente com os períodos de desembarque, sem nenhum prejuízo aos trabalhadores.

Vantagens

O juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1, Rio de Janeiro) julgaram improcedente o pedido. O TRT observou que a norma coletiva da Petrobras assegurava 180 dias de descanso por ano, computadas folgas e férias, período maior do que o concedido aos demais empregados regidos pela CLT, entre férias, folgas e feriados. Desse modo, não se poderia falar em ilegalidade ou em nulidade do acordo coletivo, ‘‘que deve ser respeitado’’.

Direito indisponível

Ministro Godinho Delgado foi o relator
Foto: Renato Araújo/Agência Brasil

Mas, segundo o ministro Maurício Godinho Delgado, relator do recurso de revista (RR) do marítimo, a cláusula suprime o direito ao descanso e ‘‘desestrutura completamente a proteção jurídica dada às férias’’. Segundo o ministro, a questão tem especial relevância para os trabalhadores marítimos, que passam longos períodos embarcados e sem a possibilidade de estreitar os laços familiares e afetivos.

‘‘Sem sombra de dúvida, a norma coletiva se mostra inválida, porque transaciona direito social trabalhista indisponível’’, afirmou.

Superpoder

Godinho Delgado ressaltou que o entendimento jurisprudencial que prevalece no TST acompanha a tendência de reconhecimento da negociação coletiva como um dos mais importantes métodos de solução de conflitos. “Todavia, não se trata de um superpoder da sociedade civil, e não se pode, de forma inusitada, rebaixar ou negligenciar o patamar dos direitos individuais e sociais fundamentais dos direitos trabalhistas imperativamente fixados pela ordem jurídica do país”, afirmou. “Há limites objetivos à criatividade jurídica na negociação coletiva“. Com informações de Ricardo Reis, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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RR-100004-48.2019.5.01.0027

CRIMINALIZAÇÃO EMPRESARIAL
Portaria RFB nº 319/2023 e a divulgação de informações sobre benefícios fiscais

Por Vitor Fantaguci Benvenuti                   

Diamantino Advogados Associados

Recentemente, a Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Portaria RFB nº 319/2023, determinando a divulgação de listas de informações a respeito de incentivos, renúncias, benefícios ou imunidades de natureza tributária, cujos beneficiários sejam pessoas jurídicas.

Embora a medida tenha amparo legal – mais especificamente, no art. 198, § 3º, inciso IV, do Código Tributário Nacional (CTN) –, o que chama atenção e certamente divide opiniões é o contexto político dessa divulgação.

Sem a pretensão de esgotar o debate sobre o tema, cabe aqui fazer alguns apontamentos sobre os impactos da publicidade dessas informações e seus possíveis problemas.

Em primeiro lugar, de acordo com a Portaria, as informações serão relativas ao ano-calendário 2021. Contudo, a própria RFB reconhece a possibilidade de divulgação de dados incompletos, inexatos ou desatualizados, que deverão ser corrigidos mediante requerimento administrativo, o qual estará sujeito a ritos e prazos específicos.

Daí já se percebe o potencial surgimento de ações judiciais, seja para questionar a mora na retificação das informações, seja para pleitear indenizações pelos danos causados pela divulgação de dados incorretos – especialmente neste contexto político de ‘‘recriminação’’ das pessoas jurídicas que fazem jus a benefícios fiscais regularmente concedidos.

Outro ponto que merece atenção é a previsão de que as informações serão ampliadas gradativamente.

Embora a Portaria trate especificamente de benefícios fiscais, o art. 198, § 3º, do CTN (dispositivo que fundamentou essa divulgação), também autoriza, em tese, a publicação de informações sobre inscrições em dívida ativa e representações fiscais para fins penais de pessoas jurídicas.

Como se sabe, a despeito da presunção de legalidade dos atos administrativos, o fato de um débito ter sido inscrito em dívida ativa não implica uma presunção absoluta de que o tributo é realmente devido, ou que o contribuinte tenha agido com má-fé perante a Administração.

Afinal, é perfeitamente possível e comum que débitos fiscais sejam cancelados em ações judiciais, observados os trâmites legais.

A divulgação simplista dessas informações – sem uma atualização imediata sobre o cancelamento de débitos ou sem a indicação de que estão com sua exigibilidade suspensa, por exemplo – é capaz de prejudicar a imagem da pessoa jurídica no ambiente concorrencial.

A representação fiscal para fins penais, por sua vez, é questão que também exige cautela, especialmente por conta da ampla gama de atos que, em tese, podem configurar crime contra a ordem tributária (Lei nº 8.137/90).

Por conta disso, é ao menos possível que, na rotina empresarial contábil, determinado tributo seja suprimido em decorrência de simples equívocos no envio de declarações, sendo que a legislação possui mecanismos próprios para tratar dessas hipóteses (aplicação de multas, denúncia espontânea etc.).

Porém, diante de uma declaração equivocada que ensejou a redução de tributo, também é possível que a autoridade fiscal entenda pela configuração, em tese, de crime contra a ordem tributária e dê prosseguimento a uma representação fiscal para fins penais.

Com a publicidade desses dados, estar-se-ia diante da divulgação de informações relativas a um possível crime, identificado de forma preliminar por autoridades fiscais (incompetentes para verificar a efetiva ocorrência do tipo penal), e que poderia ter origem em um simples equívoco do contribuinte no envio de declaração, sem qualquer dolo ou má-fé.

Até meados de 2022, o art. 6º da Portaria RFB nº 1.750/2018 não trazia qualquer limitação no sentido de que meros equívocos na transmissão de declarações não poderiam ensejar a representação fiscal para fins penais.

Apenas com a edição da Portaria nº RFB nº 199, de 13 de julho de 2022, é que se incluiu essa restrição, prevendo que a representação só será feita se ‘‘devidamente comprovada a ocorrência dos fatos que configuram, em tese, os crimes previstos no art. 2º e que afastem a alegação de mero erro na transmissão das informações à base de dados da RFB’’.

Por se tratar de norma infralegal no âmbito da RFB, contudo, esse dispositivo poderia vir a ser revogado, em concomitância com a edição de nova portaria determinando divulgação de dados sobre representações fiscais para fins penais de pessoas jurídicas.

Em conclusão, tem-se que a iniciativa da Administração em agir de forma transparente é perfeitamente válida.

Porém, a possibilidade de divulgação de informações equivocadas e desatualizadas, aliada à intenção política de ‘‘recriminar’’ as pessoas jurídicas perante a opinião pública, exige muita atenção para eventuais excessos da Administração.

Vitor Fantaguci Benvenuti é advogado da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados

Publicado originalmente n’O Estado de São Paulo, em 29/5/2023

CARÁTER REMUNERATÓRIO
Contribuição previdenciária incide sobre auxílio-alimentação pago em dinheiro, decide STJ

Alimentação do trabalhador
Reprodução: AgregaConsulting

​‘‘Incide a contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o auxílio-alimentação pago em pecúnia’’, diz a tese estabelecida pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos.

O relator, ministro Gurgel de Faria, esclareceu que a questão em debate no Tema 1.164 se refere à natureza jurídica do auxílio-alimentação pago em dinheiro para fins de incidência da contribuição previdenciária a cargo do empregador; ou seja, se essa verba se enquadra no conceito de salário para que possa compor a base de cálculo do referido tributo.

Não se discute – destacou – a natureza dos valores contidos em cartões pré-pagos, fornecidos pelos empregadores, de empresas como Ticket, Alelo e VR Benefícios, cuja utilização depende da aceitação em estabelecimentos credenciados, como supermercados, restaurantes e padarias.

Requisitos para compor base de cálculo da contribuição previdenciária patronal

Ministro Gurgel de Faria foi o relator
Foto: Imprensa STJ

Segundo o relator, a contribuição previdenciária devida pelo empregador é uma das espécies de contribuições para o custeio da seguridade social e encontra-se prevista na alínea ‘‘a’’ do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal.

Nesse sentido, Gurgel de Faria lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF), ao examinar o RE 565.160, julgado sob o rito da repercussão geral (Tema 20), fixou a tese de que ‘‘a contribuição social a cargo do empregador incide sobre ganhos habituais do empregado, a qualquer título, quer anteriores, quer posteriores à Emenda Constitucional 20/1998’’.

Para o ministro, desse julgamento é possível extrair dois requisitos para que determinada verba componha a base de cálculo da contribuição previdenciária patronal: habitualidade e caráter salarial.

O caso em análise, afirmou o relator, envolve o auxílio-alimentação, parcela que constitui benefício concedido aos empregados para custear despesas com alimentação, ‘ necessidade essa que deve ser suprimida diariamente, sendo, portanto, inerente à sua natureza a habitualidade’’.

Auxílio-alimentação pago em dinheiro tem natureza salarial

Ao citar os artigos 22, inciso I, e 28, inciso I, da Lei 8.212/1991, o relator ponderou que há uma correspondência entre a base de cálculo da contribuição previdenciária devida pelo empregador e a base de cálculo do benefício previdenciário a ser recebido pelo empregado, sendo que ambas levam em consideração a natureza salarial das verbas pagas.

‘‘A parcela paga ao empregado com caráter salarial manterá essa natureza para fins de incidência de contribuição previdenciária patronal e, também, de apuração do benefício previdenciário’’, explicou.

O ministro lembrou que o STJ, ao julgar o REsp 1.358.281, sob o rito dos repetitivos, explicitou no que consiste o caráter salarial e o indenizatório das verbas pagas aos empregados para definir sua exclusão ou inclusão na base de cálculo da contribuição previdenciária.

Na ocasião, foi fixada a tese de que não devem sofrer a incidência do referido tributo ‘‘as importâncias pagas a título de indenização, que não correspondam a serviços prestados nem a tempo à disposição do empregador’’.

Por fim, da análise da alteração legislativa feita, em 2017, no artigo 457, parágrafo 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), Gurgel de Faria disse que o auxílio-alimentação pago habitualmente não tem caráter remuneratório, exceto quando for feito em dinheiro, hipótese em que deve ser reconhecida sua natureza salarial – entendimento já adotado anteriormente pelo STJ. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.995.437