CURSO REMODELADO
Faculdade pode cobrar mais de calouro, desde que prove aumento de custos

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é lícito às faculdades cobrarem mensalidades mais altas dos calouros, em comparação com as dos alunos veteranos, desde que comprovem aumento de custos decorrente de alterações no método de ensino.

Por maioria de votos, o colegiado reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) que havia determinado a uma faculdade de Brasília que cobrasse de um grupo de alunos do primeiro semestre de Medicina a mesma mensalidade estipulada para os veteranos do curso. O TJDFT também determinou que a instituição devolvesse a diferença paga a mais pelos calouros.

No voto acompanhado pela maioria do colegiado, o ministro Moura Ribeiro explicou que, conforme destacado na sentença que julgou improcedentes os pedidos dos calouros, o curso de Medicina da faculdade foi remodelado, com a introdução de métodos considerados mais adequados.

Ministro Moura Ribeiro foi o voto vencedor
Foto: Flickr/STJ

Segundo o ministro, a cobrança de valor adicional nas mensalidades deve ocorrer apenas nos períodos que guardem relação com o aumento de custos e deve ser proporcional a este, nos termos do artigo 1º, parágrafo 3º, da Lei 9.870/1999.

Autores não questionaram julgamento antecipado do processo

Divergindo da relatora do recurso especial (REsp), ministra Nancy Andrighi – para quem os autos deveriam retornar à instância de origem para apurar se as provas documentais comprovavam o aumento de custos –, o ministro Moura Ribeiro apontou que os alunos se manifestaram nos autos, em réplica, sobre os documentos juntados pela faculdade em relação ao preço das mensalidades.

Segundo Moura Ribeiro, o juízo de primeiro grau entendeu que a solução do caso não exigia a produção de outras provas e, por isso, determinou a conclusão dos autos para sentença, não tendo os autores da ação questionado o julgamento antecipado.

‘‘Não seria o caso de retorno dos autos para apurar as planilhas e os documentos que justificariam cobrança de mensalidade a maior dos calouros, autores da ação, ressaltando que no momento oportuno quedaram-se inertes’’, concluiu o ministro ao restabelecer a sentença. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2087632

ESPECIAL STJ
Teoria menor da desconsideração da pessoa jurídica e o CDC na jurisprudência

Arte: IDEC

A fim de garantir a satisfação de um crédito e evitar situações de abuso nas relações de consumo, a legislação brasileira estabeleceu a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica.

A medida consiste em estender os efeitos das obrigações da empresa a seus sócios, permitindo que a execução de uma dívida seja redirecionada da pessoa jurídica devedora à pessoa física do sócio ou acionista. Quanto aos pressupostos de sua incidência, a teoria da desconsideração se subdivide em duas: teoria maior e teoria menor.

Como regra geral, o ordenamento jurídico brasileiro adota a teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica, prevista no artigo 50 do Código Civil (CC). O dispositivo preceitua que a desconsideração somente pode ser autorizada mediante clara comprovação de que houve abuso da personalidade, seja por desvio de finalidade da pessoa jurídica (PJ), seja por confusão patrimonial entre os seus bens e os dos sócios.

Risco empresarial não é de quem contrata com a pessoa jurídica

De outro lado, o Código de Defesa do Consumidor (CDC), no parágrafo 5º de seu artigo 28, dispõe norma que ficou conhecida como teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica. O CDC admite a aplicação da medida a partir da simples demonstração do estado de insolvência da empresa ou do fato de que a personalidade jurídica representa obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados, sem que seja necessário comprovar fraude ou abuso de direito.

Para essa teoria, quem tem de suportar o risco da atividade empresarial é o empresário, e não o consumidor. A possibilidade de aplicação da teoria menor gerou controvérsias: há quem aplauda a regra e há aqueles que a contestam.

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o REsp 279.273, a ministra Nancy Andrighi reconheceu a dissidência doutrinária suscitada pela inovação do parágrafo 5º do artigo 28 do CDC. Contudo, ela defendeu que o disposto no parágrafo 5º não tem relação de dependência com o caput do artigo, argumentando favoravelmente à sua aplicação, e destacou a importância da interpretação sistemática do dispositivo quando de seu emprego em casos concretos.

‘‘A lei, aplicada com prudência, encontrará seus próprios limites por meio da atividade interpretativa dos tribunais, não sendo aconselhável que se ceife a iniciativa legislativa de plano, iniciativa essa que conferiu novos contornos ao instituto da desconsideração da personalidade da pessoa jurídica’’, declarou Nancy Andrighi.

Aplicação da teoria menor protege interesses vulneráveis

Situações que envolvem a aplicação da teoria menor são comuns nos julgamentos do STJ, sobretudo em casos nos quais são tutelados interesses considerados especialmente vulneráveis. O entendimento pela teoria menor costuma ser adotado com o objetivo de proteger direitos de indivíduos e grupos sociais envolvidos em relações jurídicas assimétricas – caso da relação de consumo.

No já mencionado REsp 279.273, fixou-se a compreensão de que a teoria menor da desconsideração, acolhida excepcionalmente no direito do consumidor e no direito ambiental, deve incidir com a mera prova de que a pessoa jurídica não pode pagar suas obrigações, independentemente da existência de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial.

‘‘Para a teoria menor, o risco empresarial normal às atividades econômicas não pode ser suportado pelo terceiro que contratou com a pessoa jurídica, mas pelos sócios e/ou administradores desta, ainda que estes demonstrem conduta administrativa proba, isto é, mesmo que não exista qualquer prova capaz de identificar conduta culposa ou dolosa por parte dos sócios e/ou administradores da pessoa jurídica’’, destacou a ministra Nancy Andrighi

Entendimento semelhante foi adotado no julgamento do AREsp 823.555, da Quarta Turma. Para o relator, ministro Antonio Carlos Ferreira, nas relações de consumo, é possível haver a desconsideração da personalidade jurídica quando esta representar simples obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores, nos termos do artigo 28 do CDC.

AREsp 1.560.415, também da Quarta Turma, relatado pelo ministro Marco Buzzi, reforçou o entendimento jurisprudencial da corte no sentido de que a aplicação da teoria menor da desconsideração é justificada pelo mero fato de a personalidade jurídica representar um obstáculo à reparação dos danos causados ao consumidor.

Responsabilização pessoal vincula-se à prática de atos de gestão

Alguns julgados da corte discutem os limites da responsabilização, como o REsp 1.900.843, da Terceira Turma. De acordo com o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, cujo entendimento prevaleceu no acórdão, apesar de não se exigir prova de abuso ou fraude para fins de aplicação da teoria menor, o parágrafo 5º do artigo 28 do CDC não dá margem para admitir a responsabilização pessoal de quem, embora seja sócio, não desempenhe atos de gestão, ressalvada a prova de que tenha contribuído, ao menos culposamente, para a prática de atos de administração.

Se, por um lado, os sócios que não tenham praticado atos de gestão não podem ser responsabilizados pela teoria menor, por outro, gestores que não integrem o quadro societário da empresa também não. A tese foi fixada pela Terceira Turma no julgamento do REsp 1.862.557, também em acórdão de relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. Com base em lições doutrinárias, o relator concluiu que somente seria possível responsabilizar o administrador não sócio por incidência da teoria maior, especificamente, quando houvesse comprovado abuso da personalidade jurídica.

‘‘O parágrafo 5º do artigo 28 do CDC não dá margem para admitir a responsabilização pessoal de quem não integra o quadro societário da empresa, ainda que nela atue como gestor’’, afirmou Cueva.

De forma parecida, a Quarta Turma, no julgamento do REsp 1.860.333, de relatoria do ministro Marco Buzzi, entendeu que, ao contrário do que acontece com a teoria maior, a menor não admite a extensão de responsabilidade pessoal a administradores que não integrem o quadro societário de uma empresa, por ausência de previsão legal expressa.

Tipo societário é irrelevante para aplicação da teoria menor

Ao julgar o AREsp 1.811.324, a Quarta Turma decidiu que o tipo societário da empresa não é fator determinante para a aplicabilidade da teoria menor. O precedente estabelecido pelo colegiado foi citado pelo ministro Cueva quando do julgamento do REsp 2.034.442, ao admitir a desconsideração da personalidade jurídica de sociedades anônimas, desde que seus efeitos se limitem às pessoas que detenham efetivo controle sobre a gestão da companhia.

‘‘Embora admitida a aplicação da teoria menor para fins de desconsideração da personalidade jurídica de sociedades anônimas, seus efeitos estarão sempre restritos aos acionistas que detêm efetivo poder de controle sobre a gestão da companhia, dispensadas, sob a disciplina dessa específica teoria, a comprovação de abuso da personalidade jurídica ou a prática de ato ilícito, infração à lei ou ao estatuto social’’, disse o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

A desconsideração da personalidade de sociedade cooperativa foi o tema do julgamento do REsp 1.766.093, em que se discutiu o cabimento da medida contra membros do conselho fiscal da entidade. Relator do voto prevalente no julgamento, o ministro Cueva entendeu que não era possível responsabilizar as duas recorrentes sem que houvesse a mínima presença de indícios de que tivessem contribuído, ao menos culposamente, e com desvio de função, para a prática de atos de administração.

A recorrência do tema nos julgados do tribunal levou à publicação da edição 162 de Jurisprudência em Teses, com o título Direito do Consumidor – VI. A ferramenta seleciona e apresenta a interpretação do STJ sobre assuntos específicos, citando os precedentes mais recentes da corte.  Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

REsp 279273

REsp 1900843

REsp 1862557

REsp 1860333

AREsp 1811324

REsp 2034442

REsp 1766093

VIOLAÇÃO DA BOA-FÉ
TJSP invalida venda de empresa por inclusão de crédito do qual não é titular

A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), em julgamento estendido, reconheceu a invalidade da venda de uma empresa por incluir em seu preço final valores de precatórios dos quais não era titular. O entendimento do colegiado é de que se tratou de uma operação de crédito a non domino [quem não tem poder de disposição sobre a coisa].

A demanda foi promovida pelos representantes de uma empresa que foi vendida em 2003, por R$ 1 milhão, valor estabelecido com base em dois laudos de avaliação contratados pela compradora. O presidente do conselho administrativo da sociedade alienada era também, na época, acionista majoritário da adquirente e não informou às auditorias que a sociedade adquirida era titular de créditos de precatórios a serem recebidos da União e avaliados em, pelo menos, R$ 560 milhões.

Posteriormente, após reestruturação acionária envolvendo outras sociedades, a adquirente foi vendida por US$ 327,4 milhões, incluindo na operação os créditos futuros.

Em primeira instância, o pedido de declaração de inexistência da transação que envolvia os créditos foi considerado improcedente.

Des. Azuma Nishi foi o voto vencedor
Foto: José Luis da Conceição/OAB-SP

O relator do voto vencedor, desembargador Azuma Nishi, apontou que ficou evidente que a primeira transação teve seu valor limitado pelos laudos de avaliação.

‘‘É muito comum nestes contratos de aquisição de participação societária estipular obrigações e responsabilidades, delimitar passivos, excluir ativos, não compreendidos no negócio de compra e venda da participação societária’’, explicou o magistrado, destacando, ainda, que quando há a inclusão de ativos não escriturados no negócio, o reflexo imediato é o aumento do preço, ou, caso as partes não entrem em acordo, na exclusão do item na operação.

‘‘Se inegavelmente a formulação do preço não contemplou o Crédito IAA, também inegável que o negócio não contemplou tal ativo contingente, ainda mais em se tratando de ativo de tamanha relevância, principalmente se comparado com o montante da transação’’, salientou o relator, ao comparar o valor da operação, R$ 1 milhão, e o valor do crédito, R$ 560 milhões.

Para Azuma Nishi, a admissão dos créditos no negócio seria a chancela do enriquecimento ilícito do empresário que comandou as operações. Ele avaliou que, ‘‘no caso concreto, figurando nos dois polos da transação e detentor das informações a respeito do Crédito IAA, caberia a ele prestar informações aos avaliadores. Ao restar silente sobre a informação, viola o princípio da boa-fé, basilar do sistema jurídico pátrio’’.

Também participaram do julgamento os desembargadores Alexandre Lazzarini, Cesar Ciampolini, Fortes Barbosa, e J. B. Franco de Godoi.

A decisão foi por maioria de votos. Com informações da Comunicação Social do TJSP.

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1057090-76.2019.8.26.0100 (São Paulo)

DANO MORAL
Trabalhador obrigado a rezar ajoelhado no final de reuniões será indenizado

DepsitPhotos/TRT-3

Por ser obrigado a rezar ajoelhado no final das reuniões de serviço, um trabalhador será indenizado em R$ 5 mil em Belo Horizonte, a título de danos morais. Ao longo do contrato de trabalho, ele foi ofendido recorrentemente pelo chefe imediato.

A condenação foi imposta pela 10ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, em sentença proferida pelo juiz do trabalho Marco Antônio Ribeiro Muniz Rodrigues.

A empregadora, uma indústria de bebidas, informou que o tratamento dispensado ao reclamante jamais fugiu aos padrões de normalidade, não vislumbrando justificativa para a indenização pleiteada na peça inicial da ação reclamatória.

Entretanto, testemunha ouvida em um processo similar confirmou a versão do ex-empregado. A testemunha relatou que o tratamento do superior com os empregados não era adequado.

‘‘Ele tachava todos os funcionários de forma pejorativa, chamando-os de molambos, incompetentes, preguiçosos, burros, lixo, porcos e outros xingamentos nas reuniões semanais. Além disso, após as reuniões, o supervisor obrigava os funcionários a orar, por vezes, ajoelhados’’, contou.

Já a testemunha da empregadora confirmou que eram realizadas as orações, mas afirmou que sempre era salientado que, quem não quisesse participar, estava livre para escolher e que não havia obrigatoriedade de se ajoelhar.

Todavia, segundo o julgador, a testemunha enfatizou várias vezes que não era da equipe daquele supervisor, o que tornava impossível relatar sobre os acontecimentos das reuniões em que participava o reclamante.

No entendimento do julgador, tem mais valor o depoimento da primeira testemunha, que era da equipe do gestor e que confirmou as agressões verbais e a obrigatoriedade das orações.

Assim, observado esse quadro e considerada a gravidade da lesão, o grau de culpa da empregadora e o caráter pedagógico da medida para que novos eventos do mesmo tipo sejam desestimulados, o magistrado deferiu ao autor da ação a indenização por danos morais, fixada em R$ 5 mil.

Há recurso ordinário aguardando a data do julgamento no Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais). Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-3. 

O número do processo não foi informado

INSEGURANÇA JURÍDICA
Subvenções estaduais para investimentos, uma discussão que ainda vai longe

Por Guilherme Saraiva Grava

Diamantino Advogados Associados

Ao mesmo tempo em que a União projeta arrecadar R$ 35 bilhões neste ano com a tributação federal de subvenções estaduais para investimentos, os contribuintes navegam por incertezas e inseguranças em relação ao tema.

A discussão parecia ter encontrado fim com a nova Lei 14.789, promulgada no apagar das luzes de 2023 a partir da conversão da Medida Provisória 1.185/2023. Mas a verdade é que a mudança de rumos é tão brusca que a nova lei ainda gera dúvidas, inclusive pelas emendas que a MP sofreu no decorrer de sua tramitação no Congresso Nacional. A impressão é que, para solucionar um problema, criou-se outro.

Para mergulhar no assunto, é preciso entender logo de início que o regime inaugurado pelo Governo Federal inverte a lógica que existia até então – e essa é a chave fundamental da análise, examinada a partir da ótica da arrecadação.

Anteriormente, o que se tinha era um sistema que visava isentar da tributação federal os incentivos atrelados a iniciativas e projetos de desenvolvimento regional. Se um benefício fiscal (um crédito presumido de ICMS, por exemplo), estivesse atrelado a uma iniciativa desse tipo, concedia-se isenção federal de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Porém, a conexão entre uma coisa e outra precisava estar clara. Se a relação entre o benefício e um investimento não estivesse nítida (o que poderia decorrer da forma como o estado regulamentou a benesse), a União usava o benefício da dúvida em seu favor e prosseguia com a tributação normalmente.

A premissa pode parecer simples, mas diversos fatores complicavam o cenário e criavam problemas no dia a dia das empresas. Muitas dessas discussões giravam em torno dos critérios para se demonstrar o vínculo entre o benefício e o investimento, tema que foi objeto de mais de uma alteração na lei, mas que a Receita Federal insistia em interpretar à luz de pareceres da década de 1970, contrariando precedentes recentes na jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), além de enorme insegurança jurídica.

Para evitar esse cenário, a nova lei aprovada teve como objetivo simplificar a questão – pelo menos do ponto de vista da União. A partir de agora, todo e qualquer benefício fiscal concedido pelos estados estará sujeito à arrecadação federal. Subvenções estaduais, de qualquer natureza, ainda que para investimentos de interesse público, são tributadas. Ponto final.

A diferença é que, com o advento da nova lei, benesses atreladas a projetos de desenvolvimento passam a gerar créditos aos contribuintes, enquanto as demais, não. Trata-se de um cenário bem diferente e amplamente favorável à União, porque o valor do crédito fica limitado a 25% do valor aplicado na implementação e expansão do negócio.

Na prática, isso significa dizer que aquela isenção, que antes era concedida, agora virou um crédito tributário muito menor e que, como se não bastasse, só poderá ser aproveitado em um período futuro, depois de a empresa estar habilitada junto ao Governo Federal.

A situação, certamente, levará muitos contribuintes a judicializar a questão, ainda que a União tenha tentado simplificar a matéria. Mesmo com o novo sistema, as teses há muito discutidas sobre a violação ao pacto federativo ou ao conceito de receita permanecem. Resta saber como o tema será tratado pelo Poder Judiciário.

É evidente que a mudança de cenário ocasionará impactos que não serão suportados por todos os contribuintes da mesma forma. Essa nova regra de habilitação junto ao Governo Federal, por exemplo, pode atender a algumas empresas, a depender da maneira como os benefícios estaduais lhes foram concedidos e como os valores foram aplicados em iniciativas de desenvolvimento. As companhias que não conseguirem se habilitar, certamente irão se insurgir. E não lhes faltarão motivos.

Entretanto, a prática do novo regime ainda é uma incógnita, e os pontos já regulamentados pela Instrução Normativa 2.170/2023, da Receita Federal, não são suficientes para dizer como o sistema funcionará e quais exigências irão condicionar a fruição do novo crédito (ou deixar de fora benefícios nunca tributados).

Se por um lado as regras de transação e autorregularização propostas pela nova lei parecem querer colocar as polêmicas do passado em pratos limpos, o sistema de habilitação e adesão ao novo regime parecem querer interditar um debate que sempre existiu e ainda persiste: faz sentido a União tributar um benefício estadual como se fosse renda?

A verdade é que essa disputa ainda não foi superada e as discussões sobre a natureza jurídica dos benefícios, assim como do equilíbrio do pacto federativo, permanecem vivas como nunca. Até agora, a única certeza é que estamos distantes do ponto final, com risco de as dúvidas só serem resolvidas nos tribunais.

Guilherme Saraiva Grava é sócio da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados