URCAMP
‘‘Pedra da Lua’’ pode integrar bens que serão vendidos para quitar dívidas trabalhistas

O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) realizou mediação entre a Fundação Átila Taborda – mantenedora do Centro Universitário da Região da Campanha (Urcamp) – e as entidades que representam o grupo de credores trabalhistas.

A sessão foi mediada pelo vice-presidente do TRT-4, desembargador Alexandre Corrêa da Cruz, com a presença da juíza auxiliar da Vice-Presidência, Luciana Caringi Xavier, e da juíza do trabalho Adriana Seelig, coordenadora do Juízo Auxiliar de Execução (JAE).

Ficou acertado que a chamada ‘‘Pedra da Lua’’ – fragmento de formação rochosa lunar – poderá ser incluída no rol de bens passíveis de venda para quitação dos créditos trabalhistas.

O material trazido da lua por astronautas norte-americanos foi doado no início da década de 1970 pelo então presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, ao então presidente do Brasil, general Emílio Médici. A ‘‘Pedra da Lua’’ foi doada por Médici tempos depois ao Museu Dom Diogo de Souza, que é administrado pela Urcamp. A instituição de ensino e o museu ficam em Bagé, terra natal do general.

Os representantes da instituição de ensino disseram que vão diligenciar a respeito da documentação referente ao artefato no prazo de 30 dias. Caso seja encontrada a documentação, será analisada pelo JAE – responsável por dar efetividade à execução trabalhista –, a possibilidade de o artefato ser incluído no rol de bens da instituição. A Fundação não se opõe à venda do artefato  para pagamento da dívida trabalhista.

Além disso, será discutido junto ao JAE o restabelecimento dos pagamentos permanentes aos credores preferenciais. Também vão tratar da efetivação de atos de execução e definição dos critérios de venda de bens, inclusive indicação de leiloeiro.

Pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), esteve presente o procurador regional Marcelo Goulart. Com informações de Eduardo Matos, da Secom/TRT-4.

Leia aqui a ata da reunião de mediação

DEMARCAÇÕES DE TERRAS
STF contemplou a ‘‘teoria do indigenato”

Por Lívia Bíscaro de Carvalho

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Além de afastar a tese do Marco Temporal para demarcação de terras indígenas, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a tese de repercussão geral com 13 itens para o Tema 1.031, o que terá efeito vinculante a orientar o julgamento de outros processos.

A decisão do STF alinha-se à ‘‘teoria do indigenato’’, que sustenta o direito originário dos povos indígenas às terras que ocupavam antes da formação do estado brasileiro. Seu oposto é a ‘‘teoria do fato indígena’’, em que a data da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988, é a referência para o reconhecimento das terras ocupadas – e serve de sustentação para o Marco Temporal.

Os debates não são novos. A tese do ‘‘fato indígena’’ surgiu em 2008 com o parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima, quando esse critério foi usado – o documento foi redigido pelo vice-procurador da República Roberto Gurgel. Em 2009, o STF decidiu que os indígenas tinham direito à terra em disputa, pois viviam nela na data da promulgação da Constituição.

Na época, o STF definiu uma série de parâmetros para a demarcação dos territórios indígenas brasileiros. Em 2017, a publicação do Parecer Normativo 1/2017, publicado pela AGU, também abriu brechas para aplicação da tese do Marco Temporal ao determinar a adoção de uma série de restrições às demarcações das terras indígenas – chamadas ‘‘salvaguardas institucionais’’ no caso Raposa Serra do Sol, tornando-as mais tarde sem efeito vinculante.

O fato é que a presença dos povos indígenas no território brasileiro existe desde antes da chegada dos portugueses ao país e mesmo as constituições anteriores à de 1988 cuidaram de assegurar a posse de áreas em que estivessem localizados com caráter permanente.

Inclusive, pela ‘‘teoria do indigenato’’ a ocupação de terras ultrapassa tão somente a habitação para incluir espaços de relevância para cultura e exploração, tal como está disposto atualmente no artigo 231 da Constituição Federal. Em contraponto, a teoria do ‘‘fato indígena’’ considera o direito à terra uma concessão do estado, decorrente da ocupação, a partir da promulgação da Constituição de 1988. Ou seja, o texto constitucional de 1988 não estabeleceu limite temporal para o início da ocupação tradicional, bem como o direito dos indígenas sobre suas terras não depende de qualquer legitimação.

Diante deste impasse, o STF afastou a tese do ‘‘fato indígena’’ por 9 votos a 2, julgando o Marco Temporal inconstitucional. No entanto, a indenização, que até então só contemplava as benfeitorias, agora foi ampliada para terra nua se demonstrada a aquisição de boa-fé, inclusive com direito de regresso da União contra o ente federativo que titulou a área.

Na prática, é louvável que se reconheça o erro do estado e, consequentemente, os direitos daqueles que estão na posse e na exploração da área por terem adquirido títulos presumivelmente legítimos. Afinal, reconhecer a terra como pública não é motivo para deixar de compensar financeiramente aquele que investiu recursos baseados em ato jurídico revestido de boa-fé. O mesmo raciocínio, inclusive, deve ser adotado para faixa de fronteira.

De todo modo, ainda há incertezas se a indenização terá apuração justa e em prazo razoável a fim de que essa suposta compensação pela perda do bem não se torne mais uma longa disputa como em alguns tipos de desapropriação.

As discussões ultrapassam os limites do Judiciário. No final de 2023, o Congresso Nacional promulgou a Lei 14.701/23, que restabeleceu o Marco Temporal com a derrubada do veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a este dispositivo. Ocorre que o Congresso não pode restabelecer algo que o Supremo julgou inconstitucional – e uma série de ações contra a nova lei aponta isso para a Corte. Como se vê, é um debate que está longe de terminar.

Lívia Bíscaro Carvalho é coordenadora da área cível no escritório Diamantino Advogados Associados

RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
A importância de analisar a posição de dependência econômica das empresas

Por Lara Fernanda de Oliveira Prado

No intricado cenário das relações contratuais empresariais brasileiras, surge uma questão que transcende a mera formalidade dos acordos: a dependência econômica.

A reflexão sobre esse tema ganhou destaque à luz de um processo judicial recente, com o julgamento do Recurso Especial 1.989.291-SP, que gerou debates sobre a paridade contratual e o exercício abusivo de posição dominante. Este conflito evidenciou a complexidade das relações comerciais entre uma empresa multinacional e um representante brasileiro.

O cerne da polêmica está na validade de uma cláusula de limitação de responsabilidade, que foi objeto de análise da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A decisão do STJ, ao validar a cláusula de limitação de responsabilidade em favor da multinacional, destaca a presunção de paridade nas relações contratuais comerciais. Contudo, é imperativo questionar se esta presunção é consistente com a realidade das relações de poder subjacentes a tais contratos.

Avaliação da dependência econômica

Nesta relação, o distribuidor brasileiro viu-se numa posição de dependência econômica da multinacional, o que comprometeu significativamente a sua capacidade de negociação. A multinacional, detentora de maior poder econômico e de mercado, aproveitando a sua supremacia contratual, impôs cláusulas desfavoráveis ​​cujo único objetivo era aumentar abusivamente os seus lucros em detrimento do distribuidor.

Surge então a necessidade de repensar a liberdade contratual ilimitada nos contratos comerciais, de abordar situações em que uma das partes se encontra em clara desvantagem, de considerar a presença de assimetrias de poder e vulnerabilidades que as prejudicam excessivamente.

A dependência econômica contratual não é uma mera abstração jurídica, é uma realidade vivida por diversas empresas que se encontram numa posição de inferioridade e sem poder de negociação, face aos gigantes corporativos. O exercício abusivo de uma posição dominante pode mesmo conduzir a concorrência desleal e dificuldades financeiras.

Dessa forma, a admissão irrestrita de cláusulas limitantes de responsabilidade incentiva a sua maior elaboração nos contratos societários. Acontece que o reforço desta cultura contratual é problemático, pois impede que a parte vulnerável seja compensada pela verdadeira magnitude do dano que lhe foi causado.

Neste contexto, é importante considerar a teoria do terceiro contrato, introduzida pela doutrina italiana, que reconhece a existência de uma categoria contratual intermediária entre o contrato clássico e o contrato de consumo. Esta teoria aplica-se especialmente às relações entre empresas, nas quais uma das partes se encontra numa posição fraca em relação à outra.

Sob esse ângulo, haveria uma intervenção judicial criteriosa, com delicado equilíbrio entre a proteção dos contratantes mais vulneráveis ​​e a preservação do princípio da autonomia contratual. Diante disso, destaca-se a importância de identificar no caso específico a real dependência econômica de uma das partes e verificar se houve abuso derivado desta situação.

Assim, o reconhecimento do terceiro contrato como uma categoria contratual distinta abre caminho para uma abordagem mais equilibrada das relações comerciais. Isto porque os extremos estabelecidos no domínio do direito contratual não abrangem todas as variedades contratuais que, pelas suas características específicas, não se enquadram neste binário. É preciso buscar uma regulamentação que leve em conta as particularidades das relações.

Enquanto os países europeus buscam soluções para enfrentar a dependência econômica contratual, aproximando-a do abuso de posição dominante no contexto da legislação antitruste ou da aplicação de princípios do direito do consumidor, o Brasil carece de estrutura para enfrentar esse problema.

Vale destacar que a presunção de paridade estabelecida pelo Código Civil Brasileiro é relativa (art. 421-A.), podendo ser descartada em função de elementos específicos que justificam o desequilíbrio entre as partes. No entanto, a interpretação desta presunção e a regulação da liberdade contratual deixam margem para divergências entre os tribunais. Enquanto alguns seguem uma abordagem mais cautelosa, utilizando princípios do Código de Defesa do Consumidor e do Código de Processo Civil, outros adotam uma postura mais liberal, priorizando a autonomia da vontade das partes sem restrições, conforme decidiu o STJ no REsp 1.989.291.

Esta reflexão torna-se relevante para empresas que buscam segurança jurídica em suas transações comerciais. Portanto, é fundamental promover um diálogo mais amplo e detalhado sobre a dependência econômica nas relações contratuais, considerando as suas implicações no ambiente empresarial. Só assim será possível criar soluções jurídicas mais equitativas e adaptadas às complexidades destas interações comerciais.

Lara Fernanda de Oliveira Prado é sócia da área cível e trabalhista no escritório Diamantino Advogados Associados

Painel de Riscos divulgou o desfecho do julgamento do STJ

JUDICIALIZAÇÃO
Negativas de planos fazem mal à saúde de pacientes e empresas

Por Maria Letícia Mesquita

Diamantino Advogados Associados

Quando se trata de planos e seguro saúde, uma das frequentes insatisfações de seus beneficiários são as negativas de serviço. O cerne da dúvida permeia sobre o limite das negativas por parte de tais empresas. Afinal, as recusas são abusivas?

Em recente decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) condenou um convênio privado a garantir a uma beneficiária cobertura domiciliar para tratamento medicamentoso de bipolaridade. A decisão se pautou principalmente na Lei 14.454/2022, que introduziu o parágrafo 13 no artigo 10 da Lei 9.656/98, ao afirmar, categoricamente, que ‘‘cabe ao médico escolhido pelo beneficiário estabelecer qual o método e os materiais mais adequados para o tratamento da condição’’.

No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem fixado, desde 2022, que o rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) tem caráter exemplificativo. Apesar de os magistrados terem que analisar a particularidade de cada caso, a postura demostra cada vez mais a inclinação do Judiciário a adotar entendimentos pró-consumidor na matéria.

Por fim, demonstrando que os planos e seguradoras de saúde não conseguirão se eximir de suas obrigações, o STJ determinou (REsp 1.945.959) que uma empresa fosse compelida a ressarcir o Estado de Santa Catarina por atendimento não emergencial determinado judicialmente, via SUS, de paciente segurado. Tal medida se baseia no seguinte raciocínio: rejeitar o pedido do ente público na ação regressiva proposta culminaria no ‘‘patrocínio Estatal da atividade privada’’, conforme apontado pelo ministro Gilmar Mendes no RE 597.064/RJ.

Como se as excessivas negativas administrativas já não fossem o suficiente, o problema ganha novos contornos a partir de uma nova e ousada alternativa dos empresários do ramo: o não cumprimento de decisões judiciais. Em apenas um plano, um dos maiores do mercado, estima-se que apenas nos últimos seis meses de 2023 a operadora tenha descumprido aproximadamente uma centena de decisões judiciais em caráter de urgência – média de uma desobediência a cada dois dias.

Sobre a argumentação de que está apenas exercendo seu direito à ampla defesa, a seguradora agora é alvo de inquérito instaurado pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) para apurar a suposta conduta irregular e abusiva praticada pelo grupo.

Em um país em que o acesso à saúde privada através de empresas do ramo já é realidade para mais de 22% da população, segundo dados da ANS, e a adesão a esse tipo de contrato é exponencial, ficam os questionamentos: é possível harmonizar os interesses dos clientes com a sustentabilidade financeira do negócio? Onde residirá a livre iniciativa empresarial dos ofertantes quando se há vasta judicialização da demanda em desfavor de suas negativas?

A resposta passa por uma conduta defendida por magistrados: as seguradoras poderão escolher para quais tipos de enfermidade oferecerão cobertura, mas não poderão limitar as modalidades de tratamento e intervenções médicas. Garantir uma prestação de serviço de qualidade se mostra muito palpável quando se observa que o necessário é apenas respeitar os critérios médicos e científicos estabelecidos por aqueles que já acompanham os segurados.

A consequente diminuição de judicialização de demandas se mostra benéfica tanto para consumidores quanto para as empresas, uma vez que os processos judiciais englobam não apenas o tratamento ou medicamento requerido, mas também verbas indenizatórias e custas processuais.

A quem insiste em descumprir decisões que revertem negativas abusivas negativas, cabe à ANS, junto com o Judiciário, investigar e coibir a prática com seriedade e da maneira mais ágil possível. É iminente a necessidade de garantir a que o princípio da dignidade da pessoa humana em seu acesso à saúde coexista em harmonia e bom funcionamento com o aspecto financeiro almejado pelas empresas do ramo.

Maria Letícia Mesquita é sócia da área cível no escritório Diamantino Advogados Associados.

ATERRO SANITÁRIO
Ônus de comprovar pagamento de obrigação é do devedor, reafirma TJSC

Divulgação Versa Engenharia Ambiental

A 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve sentença que determinou ao Município de Laguna (SC), sul do Estado, o pagamento de três notas fiscais (NFs) emitidas pela Versa Engenharia Ambiental, que prestou serviços de destinação final de resíduos em aterro sanitário.

Os serviços cobrados pela empresa, com os três documentos juntados à ação de cobrança, ultrapassam R$ 458 mil.

Após a condenação em 1º grau, o Município recorreu da sentença para sustentar que a primeira nota fiscal, emitida em novembro de 2016, foi integralmente paga. Mas, para o desembargador relator da apelação, Sérgio Roberto Luz, os comprovantes anexados aos autos pela parte apelante não comprovam de forma fidedigna o pagamento da dívida.

‘‘Meras anotações feitas à mão nas cópias das folhas de cheques, e extratos de transferências bancárias, não são demonstração idônea de que aqueles valores foram destinados ao pagamento da nota fiscal’’, reforçou o relator no acórdão.

Seu voto cita ainda decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que determina que ‘‘o ônus da prova do pagamento de obrigação que é objeto de cobrança, seja mediante ação ordinária, seja mediante execução, é do devedor, máxime quando o fato constitutivo do direito fora devidamente evidenciado’’, bem como decisão da própria 2ª Câmara de Direito Público com o mesmo entendimento.

Foi negado provimento ao recurso do Município, em voto seguido de forma unânime pelos demais integrantes do colegiado. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJSC.

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Apelação 5002473-07.2020.8.24.0040