PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
Incidência de ISS sobre preço total de diárias de hotel é constitucional, decide STF

Divulgação FastHotel

O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou constitucional a incidência do Imposto sobre Serviços (ISS) sobre o preço total das diárias pagas em hospedagem. A decisão foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5764.

Na ação, a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH) questionava o item 9.01 da lista anexa à Lei Complementar 116/2003. Seu argumento era de que o imposto não poderia incidir sobre a totalidade das receitas das diárias pagas pelos hóspedes, mas apenas sobre os serviços prestados, ou seja, excluindo-se a parcela relativa à locação do imóvel propriamente dita.

Atividade mista

Ministro André Mendonça foi o relator
Foto: Banco de Imagens/STF

Em seu voto, o ministro André Mendonça (relator) afirmou que a relação negocial de hospedagem não se confunde com o contrato de locação de imóvel, isento de ISS. Segundo ele, há relações mistas ou complexas em que não é possível claramente segmentar as obrigações (compra e venda ou serviços). Nessas circunstâncias, o entendimento do STF é de que, se a atividade for definida como serviço em lei complementar, como no caso dos autos, é cabível a cobrança do ISS de competência municipal.

Dessa forma, a seu ver, os contratos de hospedagem em hotéis, flats, apart-hotéis, hotéis-residência, hotelaria marítima, motéis, pensões e outros, previstos na lei questionada, são preponderantemente serviços para fins de tributação pelo ISS.

O relator acrescentou que, de acordo com a Política Nacional de Turismo (Lei 11.771/2008), o dever dos meios de hospedagem é prestar serviços de alojamento temporário e outros serviços necessários aos usuários, mediante a cobrança de diária.

A ADI 5764 foi julgada improcedente na sessão virtual encerrada em 29 de setembro. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

ADI 5764

PERSEGUIÇÃO PATRONAL
Libbs Farmacêutica vai pagar R$ 100 mil por ‘‘congelar’’ promoção de dirigente sindical

Reprodução MVA Engenharia

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve a condenação da Libbs Farmacêutica Ltda. ao pagamento de dano moral a um propagandista de João Pessoa (PB) que passou a sofrer assédio após se tornar dirigente sindical. O recurso da empresa foi acolhido apenas reduzir valor da indenização, que caiu de R$ 200 mil para R$ 100 mil.

Diretoria

Na reclamatória trabalhista, o reclamante disse que fora admitido em 2007 e, em outubro de 2010, passou a fazer parte da diretoria do sindicato da categoria. Foi quando, segundo ele, começou a sofrer assédio moral pela empresa.

Segundo ele, o gerente distrital teria orientado os colegas a se afastarem dele, e sua promoção fora ‘‘congelada’’, com suas avaliações estagnadas.

Viagens

A situação teria se agravado em 2014, quando foi transferido para um setor de viagens – que, de acordo com seu relato, foi usado como forma de punição a pessoas que assumem entidades representativas de classe e adquirem estabilidade provisória. Na ação, ele disse que o gerente distrital teria dito à equipe que queria ‘‘vê-lo sofrer por ter que ficar duas semanas longe de casa e das filhas’’. Também disse que passou a ser excluído da participação nos eventos e de grupos de WhatsApp.

Requisitos

A farmacêutica negou a prática das condutas apontadas e sustentou que o propagandista não havia sido promovido porque não preenchia os requisitos. Acrescentou que não há previsão legal para que haja a reclassificação de função de empregado.

Conduta persecutória

O juízo da 7ª Vara do Trabalho de João Pessoa entendeu caracterizado o assédio por conduta antissindical e condenou a empresa a pagar indenização de R$ 300 mil. O Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região (PB) manteve essa conclusão, ao constatar, entre outros pontos, que o empregado havia obtido pontuação e não fora promovido, mesmo estando nas mesmas condições dos colegas.

De acordo com o TRT, era nítida a conduta persecutória da empresa, traduzida na transferência dos empregados estáveis para um mesmo setor, onde estavam sujeitos a viagens constantes, e na coação dos demais integrantes da equipe para que os mantivessem fora do seu convívio social. Todavia, optou por reduzir o valor da condenação para R$ 200 mil.

Agressividade

Ministro Hugo Scheuermann foi o relator
Foto: Secom/ TST

No recurso ao TST, a Libbs reiterou que não havia nenhum tipo de orientação para que a equipe se afastasse do empregado. Segundo a empresa, as atitudes dele para com os colegas é que não eram muito amistosas, pois ele agia de maneira agressiva e abusiva. Sobre o valor da condenação, disse que ‘‘supera, e muito, o razoável’’, e pediu que fosse reduzido para R$ 3 mil.

Razoável

Segundo o relator, ministro Hugo Carlos Scheuermann, a prática relatada com detalhes pelo TRT, caracterizada por atos de retaliação, suprime a liberdade sindical e configura descumprimento dos deveres do empregador, ‘‘dentre eles o de zelar pela segurança, pelo bem-estar e pela dignidade do empregado no ambiente de trabalho’’.

Contudo, em relação ao valor da condenação, o relator destacou que, apesar da gravidade da conduta da empresa e da seriedade das lesões morais sofridas pelo empregado, não é razoável a estipulação do valor elevado pelo TRT.

Jurisprudência

Ao propor o montante de R$ 100 mil como reparação, o ministro lembrou que a jurisprudência do TST, ao analisar processos em que se discutiu a quantificação do dano moral decorrente de conduta antissindical reiterada (assédio), tem fixado valores inferiores ao fixado pelo Tribunal Regional.

A decisão foi unânime, e a empresa já interpôs embargos à Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do TST. Com informações de Ricardo Reis, coordenador de Editoria e Imprensa da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

Clique aqui para ler o acórdão

RR-132005-10.2015.5.13.0022

VÍNCULO EMPREGATÍCIO
A condenação da Uber e a nova face da subordinação no Direito do Trabalho

Por Lara Fernanda de Oliveira Prado

A recente condenação da Uber em ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) trouxe à tona questões cruciais sobre a natureza da relação de trabalho nesta era de gig economy. O cerne da controvérsia reside nos cinco elementos fático-jurídicos que definem a relação de emprego no Brasil, tendo em vista que a ausência de qualquer um desses elementos exclui a configuração do vínculo empregatício.

De acordo com a inteligência dos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), uma relação de emprego existe quando são comprovadas a não eventualidade dos serviços prestados, a pessoalidade do trabalhador contratado, a onerosidade e a subordinação jurídica. Desta feita, o ponto mais importante deste debate é o preenchimento, ou não, desse último requisito na relação dos motoristas com a empresa.

Conforme estabelecido pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), para que a subordinação seja configurada, é necessária a presença de todos os componentes do poder hierárquico do empregador: os poderes diretivos, fiscalizatório, regulamentar e disciplinar. Sem a convergência concreta de todos, não há subordinação jurídica e, por conseguinte, relação de emprego. Portanto, ao analisar o caso da Uber, é preciso ponderar se os meios telemáticos utilizados são realmente capazes de controlar e dirigir a prestação de serviços.

O impasse da demanda tem início com as profundas transformações ocorridas em meio à globalização, reestruturação do sistema produtivo e revolução tecnológica, que desafiam a clareza do conceito em debate, outrora bem definido. Na época do surgimento do Direito do Trabalho (século da Revolução Industrial), a subordinação era facilmente identificável, haja vista que a supervisão direta dos trabalhadores era mais palpável. Acontece que, num mundo em constante transmutação das formas de trabalho, a objetividade na caracterização desse elemento precisa ser reavaliada.

Embora as relações de trabalho tenham evoluído e novas modalidades tenham surgido, essas não foram acompanhadas de regulamentação específica, de modo que, diante de tal lacuna, a questão em tela permanece altamente controversa e sujeita a debates acalorados.

Nesse ínterim, alguns tribunais entendem que a Uber não exerce uma subordinação plena sobre seus motoristas, enquanto outros sustentam o contrário. Porém, é necessário frisar que a competência para regulamentar a contenda é do Poder Legislativo. Aliás, o TST já se manifestou nesse sentido: ‘‘As novas formas de trabalho devem ser reguladas por lei própria e, enquanto o legislador não a edita, não pode o julgador aplicar indiscriminadamente o padrão da relação de emprego’’.

Plataforma impõe os preços

Fato é que o trabalho por meio de plataformas digitais é uma realidade singular, que mescla características tanto do trabalho autônomo quanto de uma relação, em certa medida, ‘‘subordinada’’. Uma defesa sólida para o reconhecimento de vínculo reside na imposição unilateral de preços pela plataforma, o que impacta diretamente na precificação do serviço, atribuição tradicionalmente do próprio trabalhador no trabalho autônomo.

Entretanto, outros aspectos da subordinação não se apresentam claramente definidos a ponto de configurar uma relação empregatícia, como a questão da fiscalização. Argumenta-se que o motorista que atua na plataforma possui autonomia para determinar quando estará disponível para prestar o serviço de transporte, o que leva à tese do ‘‘trabalho exercido pela plataforma tecnológica e não para ela’’.

Surge, então, duas indagações cruciais: o controle exercido pela empresa, como o rastreamento das rotas e a avaliação da prestação de serviço pelo passageiro, está direcionado primariamente à fiscalização do motorista ou à proteção do consumidor? As sanções, como a atribuição de uma baixa nota no aplicativo e, em último caso, a exclusão do motorista da plataforma, visam assegurar a qualidade do serviço ao consumidor final ou necessariamente implicam subordinação?

É que a verdadeira subordinação demanda um controle mais efetivo e restritivo por parte do empregador, algo que a Uber parece não impor. Isso porque a empresa proporciona aos motoristas uma notável liberdade e maior flexibilidade se comparada ao tradicional regime da CLT, em que o requisito é nitidamente delineado, acompanhado de uma inspeção eficaz e direta.

Estes são pontos e contrapontos que suscitam incertezas quanto à determinação da natureza da relação, e ressaltam a indispensabilidade da regulamentação para lidar com as nuances dessas novas formas de trabalho. A ausência de legislação específica torna qualquer reconhecimento de vínculo empregatício, nesses casos, passível de questionamentos quanto à sua legalidade, dada a vedação à interpretação extensiva na aplicação de sanções.

Embora a subordinação possua um conceito relativamente aberto, este não deve ser demasiadamente expandido pelo Judiciário para abranger formas de emprego não previstas anteriormente. Nesse sentido, a sentença proferida em primeira instância extrapolou os limites de um conceito sequer consolidado nos tribunais superiores e em análise na academia, de modo que uma única decisão judicial pode ter um impacto desmedido nesse cenário em evolução.

Em conclusão, o caso Uber ilustra a necessidade premente de regulamentação para abordar as complexidades das relações de trabalho na era dos aplicativos. Enquanto a subordinação permanece uma questão em aberto, a resposta adequada não é a imposição de vínculos empregatícios através de decisões judiciais, mas sim a formulação de leis específicas que abordem essa nova realidade laboral de forma justa e equitativa. É hora de o Poder Legislativo assumir a responsabilidade e fornecer orientações claras.

Lara Fernanda de Oliveira Prado é sócia da área cível e trabalhista no escritório Diamantino Advogados Associados.

SETE ANOS
Paciente ganha dano moral por demora excessiva no tratamento dentário

A demora excessiva no tratamento dentário, além de ser falha de serviço à luz do Código de Defesa do Consumidor (CDC), atenta contra os direitos de personalidade elencados no inciso X do artigo 5º da Constituição – privacidade, intimidade, honra e imagem – e enseja o pagamento de danos morais.

Por isso, a 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal (TJDFT) manteve sentença que condenou a Lotus Tratamentos Odontológicos Ltda ao pagamento de indenização a uma consumidora por demora excessiva em tratamento odontológico. A decisão fixou a quantia de R$ 4 mil, bem como determinou a rescisão contratual dos serviços. A decisão foi unânime.

A autora conta que, em 30 de janeiro de 2017, celebrou contrato com a ré para realização de tratamento ortodôntico, pelo valor de R$ 100. Relata que a empresa executou o serviço de modo divergente do combinado, uma vez que a previsão era que o tratamento fosse finalizado em seis meses e já dura mais de seis anos. Declara ainda que, ao tentar rescindir o contrato, foi informada que a decisão implicaria pagamento de multa.

Na defesa, a ré sustenta que sempre teve muita clareza na prestação dos serviços e que houve faltas, remarcações e quebras de peças, que contribuíram para o atraso do tratamento dentário. Declara que não existe prova concreta de que houve dano moral à autora e que a situação consiste em ‘‘mero dissabor’’.

Na decisão, a Turma menciona a demora para a conclusão do tratamento dentário e considera que o prazo de quase sete anos de espera ‘‘foge à normalidade’’. Ressalta que a demora frustra as expectativas da consumidora, o que evidencia falha na prestação dos serviços.

Assim, “[…] sem dúvida, os atributos da personalidade da autora foram maculados, como ressaltado na sentença, em especial sua integridade psíquica e sua dignidade”, concluiu o acórdão. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJDFT.

Clique aqui para ler o acórdão

0703288-19.2023.8.07.0007 (Brasília)

DIREITO DE OPOSIÇÃO
Contribuição assistencial para todos: avanço ou retrocesso?

Por Daniela Minervina Silva da Paz

Reprodução Sinfae

Recentemente, o Brasil se viu envolto em intensos debates sobre as contribuições assistenciais, um tema amplamente discutido após uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em 11 de setembro de 2023, no âmbito do Tema 935 da Repercussão Geral, abrindo espaço para reflexões sobre avanços e retrocessos no cenário sindical do país.

Nessa decisão, o STF deliberou pela constitucionalidade da cobrança de contribuições assistenciais de trabalhadores, independentemente de estarem filiados a sindicatos, desde que seja assegurado o direito de oposição. O objetivo dessa contribuição é custear as despesas dos sindicatos com a negociação coletiva, incluindo assembleias e greves.

A fundamentação para tal decisão reside no entendimento de que os benefícios provenientes de acordos e convenções coletivas devem beneficiar todos os trabalhadores, independentemente de sua filiação, em virtude da ampla representatividade dos sindicatos, um direito garantido no artigo 8º da Constituição Federal.

No entanto, essa determinação do STF vem gerando debates acalorados e repercussões significativas no financiamento das instituições sindicais. Isso porque, anteriormente, a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) considerou inconstitucional a chamada ‘‘contribuição sindical obrigatória’’, reduzindo substancialmente o financiamento dos sindicatos. Já a recente decisão do STF, alinhada aos argumentos apresentados pelos ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, reconhece a constitucionalidade da cobrança de contribuições assistenciais por meio de acordos ou convenções coletivas para todos os trabalhadores.

Isso levanta preocupações legítimas sobre a liberdade individual dos trabalhadores. Ao invés de garantir a escolha pessoal de se associar ou não a um sindicato, essa decisão impõe uma obrigação financeira a todos, independentemente de seu consentimento, embora tenha como salvaguarda o ‘‘direito de oposição’’. Vale destacar que a contribuição sindical obrigatória, antes da Reforma Trabalhista, representava uma fonte significativa de financiamento para os sindicatos, com o Ministério da Economia relatando arrecadações de cerca de R$ 3,5 bilhões em 2016. Após a eliminação dessa obrigatoriedade, houve uma queda substancial nesse valor, com relatos de declínios de até 90% nas receitas sindicais.

A falta de regulamentação clara sobre como exercer esse direito de oposição pode criar um ambiente propício para abusos e controvérsias, como no caso de trabalhadores que não desejam pagar, mas enfrentam obstáculos burocráticos, taxas para exercer a oposição ou prazos rigorosos. Uma sugestão relevante seria modernizar o processo de oposição, permitindo o exercício desse direito por meios eletrônicos.

Num mundo cada vez mais digital, seria sensato permitir que os trabalhadores exerçam seu direito de oposição por meio eletrônico, como por e-mail. Isso eliminaria a necessidade de deslocamento físico até o sindicato para apresentar uma carta de oposição, tornando o processo mais acessível e eficaz.

Este é um dilema que transcende o aspecto legal e alcança questões de princípio: até que ponto o Estado e os sindicatos podem impor obrigações financeiras aos trabalhadores numa sociedade que valoriza a liberdade de escolha?

As discussões sobre as contribuições assistenciais e a ponte que liga a liberdade individual e a sustentabilidade sindical estão apenas no começo e poderão render muitos conflitos. O tema aqui abordado constitui o marco de um capítulo que vai moldar profundamente as relações no cenário sindical do país nos próximos anos.

Daniele Minervina Silva da Paz é sócia da área trabalhista no escritório Diamantino Advogados Associados (DAA)