PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO
O ITCMD e a Reforma Tributária

Por Vitor Fantaguci Benvenuti

Diamantino Advogados Associados

Recentemente, com a aprovação da PEC 45/2019 na Câmara dos Deputados, muito tem se falado a respeito dos impactos das medidas e do aumento de carga tributária de diversos setores da economia. Um dos pontos que mais chama a atenção da mídia refere-se às alterações no Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), popularmente chamado de ‘‘imposto sobre heranças’’.

Sem a pretensão de esgotar o debate sobre o tema, cabe aqui fazer alguns apontamentos sobre as principais mudanças e o que podemos esperar nesse novo cenário político.

Em primeiro lugar, foi alterado o local em que o imposto é devido, no que se refere à transmissão de bens móveis, títulos e créditos, em decorrência de falecimento (causa mortis).

Atualmente, o imposto é recolhido em favor do estado onde era domiciliado o de cujus. Com a mudança, o imposto deverá ser pago ao estado onde se processar o inventário ou arrolamento. Essa alteração exige especial atenção dos contribuintes que estão com planejamento sucessório em curso, uma vez que cada estado possui regramentos específicos sobre as alíquotas do imposto.

Outra mudança foi a previsão de não incidência de ITCMD sobre as doações filantrópicas.

A Emenda Constitucional 126/2022 já havia inaugurado movimento nesse sentido, ao prever a impossibilidade de cobrança de ITCMD sobre as doações destinadas, no âmbito do Poder Executivo da União, a projetos socioambientais ou destinados a mitigar os efeitos das mudanças climáticas e às instituições federais de ensino.

De acordo com o texto aprovado pela Câmara, também não estarão sujeitas ao ITCMD as doações destinadas a instituições sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social, inclusive as organizações assistenciais e beneficentes de entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos, e por elas realizadas na consecução dos seus objetivos sociais, observadas as condições estabelecidas em lei complementar.

A ideia foi ampliar a abrangência das instituições sem fins lucrativos que poderiam ser beneficiadas, sem limitar o benefício apenas a algumas causas, exigindo-se somente que haja uma finalidade de relevância pública e social e determinadas condições a serem estabelecidas em lei complementar.

Além disso, previu-se não incidência de ITCMD nas doações recebidas e realizadas por estas instituições, desde que vinculadas à consecução dos seus objetivos sociais.

Outra mudança foi a autorização constitucional de cobrança do ITCMD sobre transmissões envolvendo partes residentes ou domiciliadas no exterior, mesmo antes da edição de uma lei complementar sobre o assunto.

Trata-se de uma resposta legislativa à jurisprudência do STF, que, em 2021, decidiu ser inviável a cobrança de ITCMD nesses casos, até que haja lei complementar disciplinando a cobrança (RE 851.108).

Basicamente, a Câmara aproveitou a tramitação da PEC para antecipar a inevitável exigência do ITCMD nessas hipóteses – até porque já havia determinação do STF para que o Congresso Nacional editasse lei complementar sobre o tema (ADO 67). Por fim, um dos pontos mais polêmicos foi a previsão de que o ITCMD será progressivo em razão do valor da transmissão ou da doação.

A rigor, a progressividade do ITCMD já era possível, por expressa autorização do STF, sob o regime da Repercussão Geral (RE 562.045/RS).

Agora, porém, o texto constitucional parece impor a obrigação de progressividade às alíquotas do ITCMD, que ainda não é adotada por alguns estados, como São Paulo. Apesar da grande repercussão midiática, é possível que, no curto prazo, a mudança no texto constitucional não traga grandes efeitos práticos.

Primeiro, porque já há diversos estados que adotam a progressividade nas alíquotas de ITCMD.

Segundo, porque, ainda que determinado estado opte por não instituir a progressividade, possivelmente não haverá maiores consequências, considerando que a interferência federal na autonomia dos estados já vem gerando atritos suficientes entre os entes federados.

Contudo, a mudança abre portas para a edição de uma nova resolução do Senado que aumente a alíquota máxima do ITCMD, aproveitando o contexto político de grandes alterações tributárias.

Vale lembrar que, de acordo com a Constituição Federal, a alíquota máxima do ITCMD deve ser fixada por resolução do Senado – que, atualmente, é de 8%.

Caso esse percentual seja majorado, os estados poderão aumentar de forma significativa as alíquotas do ITCMD em suas legislações locais, o que certamente traria grande impacto à população em geral.

Em conclusão, tem-se que, apesar do apelo midiático envolvendo o ‘‘imposto sobre heranças’’, as alterações no ITCMD são tímidas para grande parte da população, ao menos do ponto de vista jurídico e no curto prazo.

Porém, a aprovação da PEC inaugura um contexto político preocupante, que dá margem para que sejam realizadas mudanças mais significativas, o que exige a atenção dos contribuintes.

Vitor Fantaguci Benvenuti é sócio da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados (DAA)

RECLAMAÇÃO
STF cassa decisão que reconheceu vínculo de emprego entre médica e hospital

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou decisão da Justiça do Trabalho que havia reconhecido o vínculo de emprego entre uma médica e o Hospital Prohope Ltda, sediado em Salvador (BA). A decisão se deu na Reclamação (RCL) 61115.

Em ação reclamatória, a médica alegou que sua atividade no hospital, de 1996 a 2013, tinha todas as características da relação de emprego, como a execução de tarefas de forma contínua, sob subordinação jurídica, técnica e econômica, mediante salário fixo e mensal.

Em sua defesa, o hospital sustentou que a prestação de serviços se dera em razão de contrato firmado entre duas pessoas jurídicas e que a médica era, inclusive, sócia fundadora e administradora da empresa, que tinha contratos com diversos outros hospitais.

Pejotização

Ministro Alexandre de Moraes
Foto: Banco de Imagens/STF

O juízo da 39ª Vara do Trabalho de Salvador acolheu a pretensão da médica, e o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (TRT-5) manteve a sentença, ao considerar que houve fraude trabalhista resultante do fenômeno da ‘‘pejotização’’. Recurso do hospital ao Tribunal Superior do Trabalho (TST) fora rejeitado.

Divisão do trabalho

Na reclamação ao STF, o Hospital Prohope alegou que a decisão teria contrariado entendimento do Supremo sobre a constitucionalidade da terceirização de atividade-fim ou meio das empresas (ADPF 324) e sobre a possibilidade de organização da divisão do trabalho não só pela terceirização, mas de outras formas desenvolvidos por agentes econômicos (RE 958252, Tema 725 da repercussão geral).

Outras formas

Em sua decisão, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que a interpretação conjunta dos precedentes citados permite o reconhecimento da licitude de outras formas de relação de trabalho que não a de emprego, regida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Elas abrangem a própria terceirização ou, em casos específicos, os contratos de natureza civil firmados com transportadores autônomos ou de parceria entre salões de beleza e profissionais do setor.

Ele lembrou ainda que, em caso análogo, também envolvendo discussão sobre pejotização, a Primeira Turma do STF já decidiu na mesma direção. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Leia aqui a íntegra da decisão

RCL 61115

INSEGURANÇA JURÍDICA
STF cassa decisão que reconheceu vínculo de emprego entre escritório e advogada associada

Ministro Gilmar Mendes                                                     Foto: Carlos Moura/STF

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais) que havia reconhecido o vínculo de emprego de uma advogada com a banca Décio Freire Advogados Associados. Segundo o ministro, a decisão desconsiderou a condição de associada da advogada e não observou a jurisprudência do Supremo sobre a matéria.

A decisão se deu na Reclamação (RCL) 55769, em que o escritório alegava que a decisão do TRT mineiro teria violado o entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a licitude de outras formas de organização da produção e de pactuação da força de trabalho além do regime da CLT (Tema 725 da repercussão geral).

Contrato-realidade

De acordo com os autos, a advogada havia firmado contrato de associação, averbado pela seccional da OAB, sem prova de coação ou fraude para sua celebração. Na reclamatória trabalhista, ela alegou que estariam presentes todos os requisitos da relação de emprego, como cumprimento de jornada de trabalho e diretrizes definidas pelo escritório para execução de suas atividades, além de inserção dos seus serviços na organização produtiva da empresa.

Para o TRT-MG, a relação de emprego, por se tratar de um contrato-realidade, não se apega a registros formais, mas se revela por meio dos requisitos dispostos na CLT.

Insistência da Justiça do Trabalho

Em sua decisão, o ministro Gilmar Mendes afirmou que, apesar do entendimento firmado pelo STF no julgamento da Arguição de Descumprimento (ADPF) 324 e do Recurso Extraordinário (RE) 958252, a Justiça do Trabalho insiste em aplicar a Súmula 331 do TST, que distingue a terceirização na atividade-meio e na atividade-fim.

Para o ministro-relator, essa conduta gera insegurança jurídica e compromete avanços econômicos e sociais, frustrando a evolução dos meios de produção, ‘‘os quais têm sido acompanhados por evoluções legislativas nessa matéria’’. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Leia aqui a íntegra da decisão

RCL 55769

TELETRABALHO
O fisco, a Justiça do Trabalho e o reembolso de despesas com internet e energia elétrica

Por Joice Müller

Reprodução: Catho

Recentemente, em 11 de maio de 2023, foi publicado no Diário Oficial da União a Solução de Consulta Cosit nº 87/2023, na qual a Receita Federal esclarece que o reembolso de despesas de internet e energia elétrica no regime de trabalho home office trata-se de verba indenizatória, desde que necessárias à atividade da empresa e à manutenção da fonte produtora e devidamente comprovadas pelo beneficiário mediante documentação hábil e idônea.

Consequentemente, as despesas são dedutíveis na determinação do lucro real das empresas, e o trabalhador não precisa incluir o valor recebido a tais títulos na base de cálculo de seu Imposto de Renda.

A mencionada resposta do órgão fiscal reforça o entendimento consagrado na reforma da legislação trabalhista (Lei 13.467, de 2017), que alterou o parágrafo 2º do artigo 457, ao citar expressamente que a contraprestação de importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao Contrato de Trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário.

Cumpre destacar que não há previsão legal que obrigue a empresa a custear as despesas do empregado em home office. Mesmo a Lei nº 14.442, de 2022, criada para estabelecer as regras de teletrabalho, não menciona a obrigatoriedade de custeio pelo empregador. Ainda, em seu artigo 75-D, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) condiciona tal necessidade de pagamento à existência de contrato escrito entre as partes – ou com a categoria de trabalhadores ou mediante regulação via regimento interno da empresa.

Em pesquisa na jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul), há divergência entre as turmas quanto à necessidade de custeio das despesas do empregado em home office pela empresa, sendo muitas decisões condicionadas à prova, por parte do funcionário, da necessidade de receber o reembolso de valores.

No entanto, são raras as decisões do colegiado que determinam a integração das verbas de custeio em questão na base salarial do trabalhador, o que fatalmente ocorre quando as empresas não observam a forma exigida para realizar o pagamento: a orientação é que a parcela seja paga como ajuda de custo ou reembolso, sempre tendo como base os recibos dos valores pagos pelo colaborador, sendo fundamental que a empresa exija a comprovação de despesas do trabalhador.

Dentro desse contexto, não há dúvidas de que a ajuda de custo tem natureza indenizatória e corresponde a pagamento para ressarcir o funcionário de despesa necessária ao desempenho de suas funções, não integrando o salário.

Por fim, a ajuda de custo deve ser igual ou próxima ao valor das contas de luz e internet usualmente pagas pelo trabalhador. É que, se demonstrado o acréscimo patrimonial pelo empregado, em ação judicial trabalhista, poderá ser retirado o caráter indenizatório da verba.

Joice Müller, advogada trabalhista, pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. Integra a equipe de Cesar Peres Dulac Müller Advogados (CPDMA), com atuação no RS e SP 

FINS LUCRATIVOS
STF afasta imunidade tributária a concessionária de aeroporto

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) que havia concedido imunidade tributária à Inframérica, concessionária do aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN). A decisão foi proferida na Reclamação (RCL) 60726.

Imunidade recíproca

A Inframérica havia ajuizado ação para afastar a cobrança do IPTU referente à área do aeroporto de 2012 a 2017. O magistrado de primeiro grau julgou procedente o pedido, por entender que a imunidade tributária recíproca, que impede entes federativos de cobrarem tributos uns dos outros, seria extensível à empresa. O TJRN manteve a decisão.

Na reclamação ao Supremo Tribunal Federal, o município sustentava que a concessionária não tem direito à imunidade tributária, pois é pessoa jurídica de direito privado exploradora de atividade econômica.

Direito privado

Em sua decisão, Barroso observou que a imunidade tributária recíproca alcança apenas empresas públicas e sociedades de economia mista prestadoras de serviços essenciais e exclusivos.

Ele lembrou que o STF, no julgamento dos temas 437 e 385 da repercussão geral, firmou entendimento sobre a incidência de IPTU sobre imóvel de ente público cedido a ente privado e a impossibilidade de extensão da imunidade recíproca a empresa privada com fins lucrativos arrendatária de imóvel público.

Assim, para o ministro, a decisão questionada não poderia estender o benefício à Inframérica. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Leia aqui a íntegra da decisão

RCL 60726