JURISPRUDÊNCIA SUPERIOR
Temas 390/STF e 569/STJ: prescrição intercorrente nas execuções tributárias

Por Vitor Fantaguci Benvenuti e Savio Nascimento da Silva                                                                                                       

Diamantino Advogados Associados

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou o julgamento do Tema 390 da repercussão geral (RE nº 636.562/SC), que discutia a constitucionalidade da prescrição intercorrente em execuções fiscais de natureza tributária, tal como prevista no artigo 40 da Lei nº 6.830/80 (Lei de Execuções Fiscais,  LEF).

De acordo com esse dispositivo, quando o devedor não for localizado ou não forem encontrados bens penhoráveis para pagamento da dívida, o juiz deve suspender o curso da execução fiscal (artigo 40, caput).

Decorrido o prazo máximo de um ano de suspensão, o juiz deve determinar o arquivamento do processo (artigo 40, §2º). A partir dessa decisão, inicia-se a contagem do prazo prescricional (artigo 40, §4º) – que, se decorrido, ensejará a extinção do débito e da respectiva execução fiscal.

A questão analisada pelo STF envolveu a possibilidade de a Lei de Execuções Fiscais (Lei ordinária) disciplinar a contagem da prescrição intercorrente, já que a Constituição Federal prevê a necessidade de Lei Complementar para tratar desse tema (artigo 146, III, ‘‘b’’).

Em decisão unânime, os ministros do STF entenderam que, ao prever a necessidade de suspensão do processo pelo prazo máximo de um ano, a Lei de Execuções Fiscais apenas determinou o marco processual que dá início à contagem do prazo prescricional, sem nada alterar a sua duração, que é de cinco anos, conforme previsão expressa do artigo 174 do Código Tributário Nacional (recepcionado pela CF/1988 com status de Lei Complementar).

Em seu voto, o ministro relator Luís Roberto Barroso explicou que a suspensão de um ano tem natureza meramente processual, destacando ainda que compete exclusivamente à União legislar sobre direito processual, conforme artigo 22, I, da CF/1988. Ao final do julgamento, foi fixada a seguinte tese:

‘‘É constitucional o artigo 40 da Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF), tendo natureza processual o prazo de um ano de suspensão da execução fiscal. Após o decurso desse prazo, inicia-se automaticamente a contagem do prazo prescricional tributário de cinco anos.’’

Note-se que, além de declarar a constitucionalidade da suspensão de um ano, o STF determinou o início automático da contagem do prazo prescricional, independentemente da efetiva determinação de arquivamento dos autos pelo juiz.

A decisão do STF merece elogios, pois garante segurança jurídica e combate a eternização dos litígios, especialmente nos casos em que os juízes não determinam o arquivamento dos autos, impedindo o início da contagem do prazo prescricional (se considerada a literalidade da lei – artigo 40, §2º, da LEF).

O problema, porém, também existia com relação ao início do prazo de suspensão do processo.

A rigor, não havendo uma determinação judicial expressa, também era possível que, na prática, magistrados impedissem o início do prazo de suspensão (artigo 40, caput) e, por consequência, do prazo prescricional (artigo 40, §§2º e 4º).

Exatamente por isso que, em 2018, no julgamento do Tema 569 (REsp nº 1.340.553/RS), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou o entendimento de que a suspensão ‘‘tem início automaticamente na data de ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido’’.

Naquela ocasião, o STJ também afirmou que, ‘‘havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de um ano de suspensão inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável durante o qual o processo deveria estar arquivado sem baixa na distribuição’’.

Agora, a constitucionalidade dessa forma de contagem do prazo prescricional tributário foi validada pelo STF, no julgamento do Tema 390.

Por fim, o STJ também determinou que as petições apresentadas pela Fazenda Pública durante os prazos de suspensão (um ano) e de prescrição (cinco anos) devem ser apreciadas, mesmo após o término da contagem. Significa dizer que, antes de decretar a prescrição intercorrente, o juiz deve apreciar as petições fazendárias apresentadas nesse período.

Isso porque, caso o pedido de citação ou de penhora seja frutífero, a prescrição será interrompida retroativamente, na data de protocolo da petição (segundo o STJ, o mero peticionamento não tem o condão de interromper o prazo prescricional).

Em uma análise conjunta dos precedentes vinculantes do STJ (Tema 569) e do STF (Tema 390), finalmente os Tribunais Superiores delimitaram, de forma clara, como deve se dar a contagem do prazo prescricional em execuções fiscais de natureza tributária.

Aliás, por se tratar de julgamentos em sede de recurso repetitivo e repercussão geral, as teses firmadas pelos Tribunais Superiores devem ser aplicadas, obrigatoriamente, por todos os juízes e Tribunais (artigo 927, III, CPC).

Agora, cabe ao Fisco ser diligente, atentando-se ao início automático do prazo de suspensão e do prazo prescricional. Ao contribuinte, cabe evitar discussões contrárias às teses vinculantes do STJ e do STF.

Independentemente de eventuais divergências sobre o mérito desses julgamentos, finalmente, Fisco e contribuinte passaram a ter ciência das verdadeiras ‘‘regras do jogo’’ da prescrição intercorrente nas execuções fiscais tributárias.

Vitor Fantaguci Benvenuti é sócio da área tributária e Savio Nascimento da Silva é estagiário no escritório Diamantino Advogados Associados.

LEI KANDIR
Decisão sobre ICMS no deslocamento de mercadorias pelo mesmo contribuinte vale a partir de 2024

Ministro Edson Fachin foi o relator
Foto: Carlos Moura/SCO/STF

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que declarou a inconstitucionalidade de dispositivo da Lei Kandir (Lei Complementar 87/1996), que possibilitava a cobrança do ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica, terá eficácia somente a partir do exercício financeiro de 2024.

Por maioria de votos, o colegiado modulou os efeitos do julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 49, realizado em 2021. O resultado foi proclamado na sessão de quarta-feira (19/4).

Segurança jurídica

Prevaleceu o voto do relator do processo, ministro Edson Fachin, que apontou a necessidade de segurança jurídica na tributação e equilíbrio do federalismo fiscal. Segundo ele, é necessário preservar as operações praticadas e as estruturas negociais concebidas pelos contribuintes, sobretudo em relação a beneficiários de incentivos fiscais de ICMS em operações interestaduais. Apontou, ainda, risco de revisão de incontáveis operações de transferências realizadas e não contestadas nos cinco anos que precederam a decisão de mérito.

Foram ressalvados da modulação os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito. Caso termine o prazo para que os Estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos de mesmo titular, ficará reconhecido o direito dos sujeitos passivos de transferirem esses créditos.

Foi feito, ainda, um esclarecimento pontual do acórdão de mérito para afirmar a declaração de inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do artigo 11, parágrafo 3º, inciso II, da Lei Complementar 87/1996, excluindo do seu âmbito de incidência apenas a cobrança do ICMS sobre as transferências de mercadorias entre estabelecimentos de mesmo titular.

Julgamento

O voto do relator foi seguido pelos ministros Ricardo Lewandowski (aposentado), Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e Rosa Weber.

Divergiram os ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Nunes Marques, Luiz Fux e André Mendonça, que votaram pela eficácia da decisão de mérito após 18 meses, contados da data de publicação da ata de julgamento dos embargos de declaração. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

ADC 49 

PRESUNÇÃO DE DANO
Transportadora indenizará encarregado por não conseguir comprovar improbidade

Galpão Estapostes
Captura Youtube

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou a Estapostes Transportes Rodoviários a pagar indenização no valor de R$ 10 mil a um encarregado de expedição, dispensado por justa causa em razão de suposto ato de improbidade não comprovado. A decisão segue o entendimento de que, no caso da reversão da justa causa nessa circunstância, o dano moral é presumido.

Acusação de fraude

O trabalhador era o responsável pelo pagamento das cartas de fretes emitidas em favor dos motoristas carreteiros autônomos que trabalhavam na filial da empresa em Hortolândia (SP). Ao demiti-lo, a Estapostes alegou que ele fraudava pagamentos relativos a fretes em cartão criado em nome de terceiro.

Segundo a empregadora, o encarregado programava um motorista da frota própria e logo cancelava a programação, como se tivesse errado o registro no sistema. Na sequência, ele programava carga de um motorista autônomo, solicitando o pagamento em duplicidade.

Reversão da justa causa

Ministro Alberto Balazeiro foi o relator
Foto: Imprensa ANPT

O empregado conseguiu converter a justa causa em dispensa imotivada no Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15, Campinas/SP), porque a empresa não havia comprovado a conduta ilícita. Contudo, para o TRT campineiro, a simples demissão por justa causa, ainda que não provada em juízo e revertida, não gera o direito à indenização quando não tiver causado nenhum dano efetivo ao empregado – a quem cabe prová-lo.

Danos morais presumidos

Segundo o relator do recurso de revista (RR) do encarregado, ministro Alberto Balazeiro, a decisão do TRT contraria o entendimento já firmado pelo TST, de que, se a justa causa tiver como fundamento a atribuição de ato de improbidade ao trabalhador, não se exige provas dos danos imateriais. Logo, configura afronta à honra, à imagem e à dignidade do empregado perante si mesmo e perante terceiros. Com informações de Lara Aliano, da Secretaria de Comunicação (Secom) do TST.

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RR-13241-31.2017.5.15.0122

DIFERENÇAS SALARIAIS
TRT-RS manda equiparar técnico de enfermagem que fazia o mesmo trabalho de colega de maior nível hierárquico

Foto Ilustração: HMV

É devida a equiparação salarial quando equiparando e paradigma, no exercício de funções idênticas, prestam trabalho de igual valor a um mesmo empregador, na mesma localidade.

Assim, a 11ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) confirmou que devem ser pagas diferenças salariais, a título de equiparação, a um técnico de enfermagem que desempenhava as mesmas tarefas de uma colega de maior nível hierárquico no Hospital Moinhos de Vento (HMV). A decisão ratifica, no item, a sentença da juíza Bárbara Fagundes, da 9ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.

Tarefas idênticas, salário menor

O trabalhador reclamante atuou no cargo de técnico de enfermagem ‘‘nível I’’. Ele alegou que fazia as mesmas tarefas que uma colega técnica ‘‘nível II’’, em uma das  salas de recuperação do hospital, mas que o salário da outra profissional era maior. Em abril de 2019, ele recebia R$ 2,5 mil e ela, juridicamente identificada como paradigma no processo trabalhista, R$ 3 mil.

A juíza do trabalho Bárbara Fagundes afirmou que, pela análise da prova testemunhal, o autor da ação reclamatória e a paradigma exerciam as mesmas funções.  ‘‘É irrelevante se as atribuições são diversas na descrição de cargos quando, na prática, os empregados  exercem  as mesmas funções. Assim, é devida a equiparação salarial com a paradigma indicada’’, escreveu na sentença.

A magistrada aplicou ao caso o artigo 461 da CLT e a Súmula nº 6 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que tratam da equiparação salarial. Ela esclareceu que é equiparável apenas o salário base, pois as demais parcelas, como horas extras, adicional noturno, adicional de insalubridade, adicional por tempo de serviço, dentre outras, têm caráter pessoal.

Empregador não provou maior produtividade da paradigma

Desa. Silvana Tedesco foi a relatora
Foto: Secom TRT-4

O Moinhos de Vento recorreu da decisão, por meio de recurso ordinário trabalhista (ROT), ao TRT-RS, mas a condenação foi mantida, no aspecto, por unanimidade. A relatora do acórdão, desembargadora Maria Silvana Rotta Tedesco, concluiu que a empresa não demonstrou que a funcionária paradigma possuía maior produtividade e perfeição técnica que o autor.

Em síntese, a prova produzida nos autos confirmou que o reclamante exercia as mesmas atividades que a paradigma, sem que a parte reclamada tivesse comprovado qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo da equiparação salarial pleiteada na petição inicial. As desembargadoras Flávia Lorena Pacheco e Vania Mattos também participaram do julgamento.

O hospital interpôs recurso de revista (RR) contra a decisão. O recurso passará pela análise de admissibilidade do TRT-4 para eventual envio ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia (Secom/TRT-4).

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ATOrd 0021061-53.2020.5.04.0009  (Porto Alegre)

DOENÇA OCUPACIONAL
Atendente dispensado com depressão será indenizado por estabilidade provisória

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconheceu o direito de um atendente da Telefônica Brasil S.A. à estabilidade provisória em razão de doença ocupacional. Como o período se esgotou e não houve reintegração, a empresa deverá pagar indenização substitutiva equivalente aos salários de 12 meses a partir da dispensa do profissional, vítima de depressão oriunda do trabalho.

O atendente de informações gerais, que trabalhou na Telefônica Brasil em Maringá (PR), de 2011 a 2017, descreveu, na reclamação trabalhista, assédio moral organizacional durante o contrato. Ele afirmou que estava doente quando foi dispensado e que tinha direito à estabilidade provisória.

Laudo pericial

Pela análise dos relatos do trabalhador, associados ao exame físico e aos documentos médicos disponíveis, o laudo pericial concluiu que os serviços do atendente na empresa atuaram como concausa no surgimento do quadro ansioso depressivo. Mas o juízo de primeiro grau, ao julgar improcedente o pedido, destacou que não estava vinculado à conclusão do laudo pericial.

Plenamente capaz

A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9, Paraná). Segundo o TRT, o artigo 118 da Lei 8.213/1991 assegura a estabilidade de 12 meses em caso de acidente do trabalho (ou doença ocupacional), após a cessação do auxílio-doença acidentário. No caso, o trabalhador não foi afastado do trabalho por mais de 15 dias (ou seja, não fruiu o benefício previdenciário) e estava plenamente capaz para o trabalho.

Indenização substitutiva

A relatora do recurso de revista (RR) do trabalhador, ministra Maria Helena Mallmann, observou que a decisão do TRT contraria a jurisprudência do TST, segundo a qual o fundamento para a concessão da estabilidade acidentária é a comprovação do acidente de trabalho, ainda que sem o recebimento do auxílio-doença acidentário (Súmula 378 do TST).

Assim, estando comprovada a existência de nexo concausal entre a doença e o trabalho exercido, é devida a estabilidade acidentária ao atendente da Telefônica. No caso, já estando esgotado o período de estabilidade, deve ser paga a indenização substitutiva, conforme a Súmula 396 do TST. Com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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RR-1952-50.2017.5.09.0872