TROCA DE GÁS
Exposição breve a risco não dá direito a adicional de periculosidade, decide TRT-SC

Reprodução TRT-SC/FreePik

Ficar exposto a risco durante períodos extremamente curtos não é suficiente para obter o direito de receber adicional de periculosidade. O entendimento é da 1ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina) em ação na qual um trabalhador reivindicou compensação por lidar com o perigo envolvido na substituição de cilindros de gás.

O caso aconteceu em Itajaí, litoral norte do Estado, envolvendo um operador de empilhadeira e uma empresa de transportes. Após encerramento do contrato de emprego, o homem procurou a Justiça do Trabalho, alegando que frequentemente substituía cilindros de gás na empilhadeira, uma tarefa que considerava perigosa devido à proximidade com agentes inflamáveis e a falta de delimitação de área de risco.

A empresa, por sua vez, contestou o argumento, defendendo que a brevidade e a frequência dessas trocas não configuravam um risco suficiente para justificar o pagamento do adicional.

Perícia

A juíza Rosilaine Barbosa Ishimura Sousa, responsável pelo caso na 3ª Vara do Trabalho de Itajaí, julgou o pedido do autor improcedente. Em sua decisão, a magistrada enfatizou que a avaliação pericial demonstrou que as atividades desempenhadas pelo reclamante não se classificavam como perigosas segundo os critérios normativos.

Além disso, Rosilaine Sousa também destacou que, de acordo com a perícia, a troca dos cilindros de gás, embora regular, era feita de forma breve, não justificando o adicional de periculosidade.

A magistrada ainda fez referência à Súmula 364 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que estabelece a não concessão do adicional em situações em que a exposição a riscos é considerada de ‘‘tempo extremamente reduzido’’.

Recurso

Insatisfeito com o teor da sentença, o autor da reclamatória recorreu. No entanto, a 1ª Câmara do Tribunal, sob a relatoria do juiz convocado Carlos Alberto Pereira de Castro, manteve a decisão de primeiro grau.

Castro ressaltou que o próprio reclamante informou ao perito sobre o curto período de exposição a riscos.  ‘‘A tarefa da troca do vasilhame de gás da empilhadeira era realizada no tempo de dois a cinco minutos e de uma a três vezes por semana, caracterizando atividade eventual e mensurada em tempo ínfimo’’, frisou o relator no acórdão.

‘‘Assim, mantenho a conclusão da prova técnica com base no artigo 195, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), pois nos autos não existem outros elementos de prova capazes de elidir o laudo pericial’’, concluiu o juiz.

A decisão ainda está em prazo para recurso de revista para o Tribunal Superior do Trabalho (TST). Com informações de Carlos Nogueira, Secretaria de Comunicação Social/TRT-12.

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ATOrd 0001043-35.2021.5.12.0047 (Itajaí-SC)

LAW AND ECONOMICS
Cresce a influência da Economia nas decisões da Justiça brasileira

Por Luciano Benetti Timm

Reprodução Econlib.Org

O uso do Judiciário para resolver disputas chegou a níveis preocupantes no Brasil, com custos bilionários e riscos de graves impactos para a sociedade. Para sair dessa armadilha, a mais alta Corte do país tem cada vez mais recorrido à Análise Econômica do Direito. O Congresso Anual da Associação Brasileira de Direito e Economia (ABDE), nos dias 30 de novembro e 1º de dezembro, na PUCPR, em Curitiba, marca a consolidação dessa corrente formada por juristas e economistas que buscam com dados científicos alertar para as consequências das decisões.

Um dos marcos mais recentes do avanço da Análise Econômica do Direito é a providência inédita do ministro Luís Roberto Barroso, ao assumir a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), de ter chamado para a sua equipe um economista, Guilherme Resende, que era economista-chefe do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

Essa escolha demarca a incorporação de uma nova perspectiva no STF. Em Direito, normalmente a gente olha para trás: matou alguém, qual a prova do crime? O Cade olha para a frente. Quando você incorpora consequência na decisão, tem de olhar para a frente. E isso é algo que os economistas fazem melhor, porque usam estatística.

É inegável que muitas políticas públicas hoje são feitas pelo Judiciário, e elas têm de ser baseadas em evidências, para evitar a atuação ideológica. Veja o caso dos planos de saúde: uma ordem para baixar o preço pode até ser popular, mas eleva o risco de falência das empresas, o que é pior para os consumidores. Decisões muito fáceis e ideológicas talvez não sejam o melhor caminho para a própria sociedade.

Outro exemplo são as plataformas de entrega. Para o consumidor, ter de se deslocar até um local para adquirir ou consumir um produto é menos eficiente do que recebê-lo em casa. Se aumentar o risco de condenações judiciais ao prestar o serviço, as empresas começarão a jogar no preço o risco de condenação.

O setor aéreo no Brasil sofre com uma litigância desproporcional. Emocionalmente todo mundo que perdeu um voo pode ver um motivo para ser indenizado. Caso isso ocorra, porém, essa despesa da companhia irá compor o preço, e ele continuará aumentando com frequência, porque a infraestrutura brasileira é pobre. É comum, quando ocorre uma chuva, o aeroporto ter de suspender a operação, e isso a empresa não tem como evitar, nem é responsabilidade dela. Na média internacional, a margem de lucro dessas empresas é de 2% – quando não têm prejuízo, como vem sendo o caso nos últimos anos. Se os processos comerem metade dessa margem, a tendência é de as empresas deixarem o país. Para o passageiro, é melhor ter três opções do que uma. Mas, se fica muito caro operar, o resultado é um monopólio natural: sobrará uma só.

Luciano Benetti Timm

Um tema recente é o dos apagões de energia. Ao tratá-los, é preciso lembrar que eventos extremos são imprevisíveis. Talvez com a repetição deles, daqui a dois, três anos, seja possível identificar um novo padrão. Antes disso, é simplista culpar a concessionária por um evento extremo. É mais complexo. A lição não é sair multando e expondo a empresa. É preciso buscar as causas. Pode ser que a prefeitura não tenha feito a poda das árvores como deveria, e elas caem na fiação. E toda decisão traz efeitos: caso se chegue à conclusão de que a solução é colocar a fiação para baixo da terra, o que multiplicaria o custo, é necessário ver quem vai pagar. A ciência ajuda a resolver esses dilemas, se a gente quiser trabalhar com evidências, em vez de seguir com crenças.

A Análise Econômica do Direito se apresenta como uma alternativa para derrubar o alto grau de judicialização. O Brasil é um caso único: tem hoje mais de 80 milhões de processos. O segundo país nesse ranking é a Índia, com em torno de 30 milhões, só que a Índia tem quase sete vezes mais população do que o Brasil. O impacto é no bolso do cidadão, porque cada processo tem um custo. R$ 100 bilhões é o que nós, brasileiros, gastamos por ano com disputas judiciais. E 50% já foi julgado, então o Judiciário não segue os seus próprios precedentes.

Para saneamento básico, o orçamento da União é em torno de R$ 1 bi. Significa que gastamos 100 vezes mais em disputa do que em saneamento. Em 10 anos, a gente já poderia ter entregado para a população brasileira saneamento completo, mas está torrando recurso público em disputas repetitivas. Do ponto de vista do contribuinte, é péssimo. O Judiciário precisa se racionalizar, e a Análise Econômica do Direito, com evidências, tem muito a contribuir para isso.

Luciano Benetti Timm é professor da FGV-SP e sócio do CMT Advogados

DIREITO À SAÚDE
Concessionária não pode suspender energia de consumidora com diabetes, decide TJSP

A Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL) está proibida de cortar a energia elétrica de uma consumidora com diabetes que se encontra inadimplente. E o Município de Barretos (SP) ainda deve bancar a metade do valor das faturas mensais enquanto durar o tratamento médico.

A decisão é da 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) ao manter sentença proferida pelo juiz Carlos Fakiani Macatti, titular da 2ª Vara Cível de Barretos.

A mulher é portadora de diabetes mellitus e, em razão da patologia, precisa de refrigeração contínua de seus medicamentos, mas não tem condições financeiras de pagar as contas de energia elétrica.

Atendimento de saúde integral

Em seu voto, o relator da apelação, desembargador Jarbas Gomes, apontou que a Constituição Federal estabelece que os serviços públicos de saúde deverão oferecer atendimento integral à população, incluindo o custo de energia elétrica derivado do uso de aparelhagem médica.

‘‘Logo, é injustificável que o ente procure eximir-se do encargo sob quaisquer pretextos’’, escreveu.

Risco de lesão irreversível

O magistrado também destacou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que fixou balizas para que a interrupção de energia seja legítima, dentre as quais a necessidade de que o corte não tenha potencial de lesão irreversível.

‘‘Por envolver questão de saúde, no caso, deve-se abster o corte de energia elétrica, que pode acarretar lesão irreversível à integridade física da autora. Isso não implica a sua prestação de maneira gratuita, sendo certo que a concessionária dispõe de todos os outros meios admitidos em direito para cobrar os valores não adimplidos pelo consumidor’’, concluiu.

Completaram o julgamento os desembargadores Oscild de Lima Júnior e Afonso Faro Jr. A votação foi unânime. Com informações da Comunicação Social do TJSP.

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1004576-15.2023.8.26.0066 (Barretos-SP)

PRETENSÃO INÚTIL
Reconhecimento da prescrição impede cobrança judicial e extrajudicial da dívida

Reprodução Anoreg

O reconhecimento da prescrição impede tanto a cobrança judicial quanto a cobrança extrajudicial da dívida. Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), pouco importa a via ou o instrumento empregado na cobrança, uma vez que a pretensão se encontra praticamente inutilizada pela prescrição.

No caso analisado, um homem ajuizou ação contra a Itapeva Recuperação de Créditos Ltda, buscando o reconhecimento da prescrição de um débito, bem como a declaração judicial de sua inexigibilidade.

Após o pedido ser julgado improcedente em primeira instância, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) deu provimento à apelação, concluindo pela impossibilidade de cobrança extrajudicial da dívida, tendo em vista que a prescrição era incontroversa.

No recurso especial (REsp) aviado no STJ, a empresa alegou que a ocorrência da prescrição não impediria o exercício legítimo da cobrança extrajudicial, pois não foi extinto o direito em si, mas apenas a possibilidade de ele ser exigido na Justiça. Sustentou também que o fato de a prescrição atingir o direito do credor de se valer da ação de cobrança para reclamar o pagamento não elimina o débito nem a situação de inadimplência existente.

Direito subjetivo não é suficiente para permitir a cobrança extrajudicial

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Pedro França/Agência Senado

A relatora do REsp na Terceira Turma do STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou que a pretensão é um instituto de direito material que pode ser compreendido como o poder de exigir um comportamento positivo ou negativo da outra parte da relação jurídica. Dessa forma, segundo a ministra, antes do nascimento da pretensão, já existem, mas em situação estática, o direito subjetivo e o dever, que, especificamente no âmbito das relações jurídicas obrigacionais – como no caso dos autos –, são o crédito (direito subjetivo) e o débito (dever).

‘‘A pretensão não se confunde com o direito subjetivo, categoria estática, que ganha contornos de dinamicidade com o surgimento da pretensão. Como consequência, é possível a existência de direito subjetivo sem pretensão ou com pretensão paralisada’’, declarou.

Nancy Andrighi também destacou que, na doutrina brasileira, à luz do Código Civil de 1916, era relativamente comum se apontar como alvo da eficácia da prescrição a própria ação. Contudo, de acordo com a ministra, o artigo 189 do Código Civil de 2002 mudou esse entendimento ao estabelecer expressamente que o alvo da prescrição é a pretensão.

‘‘Não se desconhece que o crédito (direito subjetivo) persiste após a prescrição, contudo, a sua subsistência não é suficiente, por si só, para permitir a cobrança extrajudicial do débito, uma vez que a sua exigibilidade, representada pela dinamicidade da pretensão, foi paralisada. Por outro lado, nada impede que o devedor, impelido, por exemplo, por questão moral, em ato de mera liberalidade, satisfaça a dívida prescrita’’, disse a relatora.

Pretensão se submete ao princípio da indiferença das vias

A ministra ainda ressaltou que a pretensão se submete ao princípio da indiferença das vias; ou seja, pode ser exercida tanto judicial quanto extrajudicialmente. Com isso, ela indicou que, ao cobrar extrajudicialmente o devedor – por exemplo, enviando-lhe notificação para pagamento ou fazendo ligações para o seu telefone –, o credor está, efetivamente, exercendo sua pretensão, ainda que fora do processo.

No entanto, Nancy Andrighi explicou que, uma vez paralisada a eficácia da pretensão em razão do transcurso do prazo prescricional, não será mais possível cobrar o devedor, seja judicial, seja extrajudicialmente.

‘‘Não há, portanto, duas pretensões, uma veiculada por meio do processo e outra veiculada extrajudicialmente. Independentemente do instrumento utilizado, trata-se da mesma pretensão, haurida do direito material. É a pretensão, e não o direito subjetivo, que permite a exigência da dívida. Uma vez prescrita, resta impossibilitada a cobrança da prestação’’, concluiu, negando provimento ao REsp. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.088.100

AMBIENTE TÓXICO
TRT-RS condena Simers a pagar R$ 30 mil a advogada que desenvolveu depressão em função das humilhações

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Se existe nexo de causalidade entre o ambiente laboral tóxico e a patologia desenvolvida pelo empregado ao longo da duração do contrato de trabalho, o empregador tem de indenizá-lo na esfera moral. Afinal, o empregador responde de forma objetiva pelos danos causados por empregados, chefes ou prepostos no exercício da função ou em razão dela.

Firme neste entendimento, a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) manteve sentença que condenou o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) por abusos praticados contra uma advogada negra que desenvolveu quadro de ansiedade e depressão nos quase 20 anos de contrato de trabalho. A conduta foi considerada tão grave que o colegiado aumentou o valor dos danos morais, que se elevou de R$ 15 mil para R$ 30 mil.

Desembargador Marçal Figueiredo
Foto: Secom/TRT-4

O relator do recurso ordinário trabalhista (ROT), desembargador Marçal Henri dos Santos Figueiredo, destacou que o Simers não produziu nenhuma prova capaz retirar a força da perícia médica ou de comprometer as alegações que embasaram o reconhecimento do nexo de causalidade entre doença psíquica e o ambiente laboral. Com isso, cabe reconhecer a responsabilidade do empregador no processo de desencadeamento/agravamento da patologia psíquica.

‘‘Cumpre frisar ser obrigação do empregador o fornecimento de um meio ambiente de trabalho salutar, ponto em que falhou a reclamada ao permitir que, por conta do comportamento irregular de um superior hierárquico da reclamante, fosse a trabalhadora exposta a condições indignas de trabalho, tratamento humilhante e degradante, em conduta incompatível com seu bem-estar na relação de emprego’’, anotou no acórdão.

Figueiredo também lembrou que a instituição e seu presidente firmaram, em 2012, termo de ajuste de conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho (MPT-RS) em face de atos caracterizadores de assédio moral. Ou seja, a corroborar a narrativa da reclamante, já havia um histórico de condutas agressivas e ofensivas praticadas pelo presidente da instituição.

Ambiente de trabalho estressante, tenso e abusivo

Na petição inicial da ação reclamatória, Denise da Silva Teixeira noticia que trabalhou para o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), com sede em Porto Alegre, entre 2 de maio de 2000 e 2 de janeiro de 2019, exercendo a função de advogada. Diz que o ambiente de trabalho era extremamente estressante, tenso, abusivo e com sobrecarga de tarefas.

Em função deste quadro, afirma que passou a sofrer com ansiedade, insônia, desânimo, instabilidade e irritabilidade, resultado da somatização das circunstâncias a que era submetida em seu local de trabalho. Refere que incontáveis foram os dias de crise com o travamento de coluna e grave quadro de dor aguda/crônica. Informa que foi diagnosticada com transtorno misto ansioso e depressivo – Classificação Internacional de Doenças (CID) F 41.2. Garante que todos os excessos de atividades, cobranças, desrespeitos e abuso psicológico determinaram o aparecimento e o agravamento da doença.

Por tais motivos, pede ao juízo da 30ª Vara do Trabalho de Porto Alegre o pagamento de indenização de R$ 30 mil por danos morais e R$ 15 mil pelos danos materiais – despesas com tratamento médico.

Em defesa, o Simers nega a existência de nexo causal entre a patologia alegada pela autora e as atividades realizadas no curso do contrato de trabalho. Diz que as atividades da reclamante eram básicas, exclusivas e rotineiras do cargo de advogado, com horários flexı́veis. Argumenta que sempre ofereceu um ambiente de trabalho saudável, fazendo ‘‘cobranças normais’’ à área de advocacia.

Ata de audiência escancara os abusos

Durante a audiência de instrução na 30ª Vara do Trabalho, uma das testemunhas, que trabalhou como assessor da presidência do Simers de 2004 a 2019, confirma que a autora da reclamatória era uma ‘‘pessoa tranquila e determinada, dotada de grande desenvoltura verbal’’, se posicionando nas reuniões. Entretanto, com o passar do tempo – registra no depoimento –, ela ‘‘se encolheu’’, demonstrando receio em desenvolver as suas atividades. Em outras palavras, ‘‘murchou’’ profissionalmente.

Segundo o depoente, em razão de diversas advertências verbais, principalmente do presidente e de diretores, a autora passou a ter mais cuidado em se posicionar. Tais advertências decorriam do fato de que ela não correspondia às expectativas das defesas dos médicos. Noutras palavras: a conduta profissional da advogada se chocava com as promessas feitas pela direção do Sindicato, no âmbito jurídico, aos seus associados. O clima era tão tenso que a advogada entrava e saia chorando das reuniões.

Ainda pelo relato, o presidente Paulo de Argollo Mendes – que ficou duas décadas à testa da entidade – passava trabalhos para a autora, mas sonegava informações essenciais. Quando ela apresentava o resultado do trabalho, era humilhada pelo dirigente, na frente de outros advogados e de membros da diretoria.

Quando as peças não estavam do seu agrado, Argollo xingava-a de ‘‘má advogada, ignorante e analfabeta’’, por produzir só ‘‘porcaria’’. Em várias ocasiões, foi necessária intervenção em razão dos excessos da conduta do então presidente. Em suma: o presidente não tolerava o fato da autora não atender as demandas jurídicas que entendia cabíveis, além de não admitir ser contrariado. Comportava-se como um autocrata à frente da instituição, pois o ‘‘Simers cria suas próprias leis’’ – era ‘‘voz corrente’’ na diretória, à época.

Na percepção do depoente, o presidente alimentava o conflito com a advogada para criar condições para a dispensa dela, já que a profissional mantinha um bom relacionamento com muitos médicos. Além disso, a vice-presidente, Maria Rita de Assis Brasil, era um obstáculo para a dispensa, já que a considerava uma grande profissional.

Sentença parcialmente procedente

A juíza do trabalho Fernanda Probst Marca disse restou comprovada a tese posta na peça inicial, de que o ambiente de trabalho era extremamente hostil e prejudicial à saúde psíquica dos trabalhadores, especialmente pela conduta antiprofissional adotada pelo presidente do Sindicato.

Nesse quadro, ficou evidenciada a existência de concausa entre o quadro clínico compatível com a CID 10 F41.2 – transtorno misto ansioso e depressivo – que acomete a autora e o ambiente de trabalho existente, na forma declinada no laudo pelo perito médico. Concausa, segundo a doutrina, é fato independente e estranho na produção do resultado; ou causa não ligada à atividade laborativa, porém concorrente.

A julgadora citou o artigo 21, inciso I, da Lei 8.213/91, que equipara a acidente do trabalho ‘‘o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação’’. Noutros termos, o legislador equiparou as concausas a acidente de trabalho – o chamado ‘‘acidente por equiparação’’.

‘‘Comprovado o nexo concausal, a culpa do reclamado decorre da previsão contida no inc. III do art. 932 e no art. 933, ambos do Código Civil, que dispõem que o empregador responde objetivamente pelos danos causados por seus empregados ou prepostos no exercício do trabalho que lhes competir ou em razão dele, ainda mais quando tais atos foram praticados, segundo a prova testemunhal produzida nos autos, pelo corpo diretivo do sindicato demandado’’, fulminou na sentença.

Como a conduta patronal causou dor íntima e sofrimento à psiquê da autora, restaram violados os direitos de personalidade elencados no inciso X do artigo 5º da Constituição – honra, bom nome e reputação. No caso em exame, o dano moral, presumido, decorre do desenvolvimento da patologia psíquica ao longo da duração do contrato de trabalho. O quantum reparatório arbitrado: R$ 15 mil.

‘‘Por fim, indefere-se o pedido de pagamento de todas as despesas havidas com tratamentos, por falta de suporte probatório que ampare a pretensão, notadamente porque os documentos […] dizem respeito a serviço de quiropraxia, portanto, sem relação direta com a necessidade de eventual tratamento da patologia psíquica que acomete a autora’’, concluiu a juíza na sentença de parcial procedência.

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ATOrd 0021265-34.2020.5.04.0030 (Porto Alegre)

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