DANO PÓS-CONTRATUAL
Gravação telefônica com más referências de vendedora é prova válida contra ex-empregador

Reprodução Secom/TST

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) considerou válida a gravação de uma ligação telefônica apresentada por uma vendedora para pedir indenização por dano pós-contratual à Delta Administradora e Corretora de Seguros Ltda., de Cuiabá (MT). Na gravação, o ex-empregador dava informações negativas sobre a trabalhadora a uma pessoa supostamente interessada em contratá-la.

A decisão segue o entendimento do TST sobre a validade desse tipo de prova quando a ligação é gravada sem conhecimento do outro interlocutor.

Vendedora não conseguia novo emprego

Na ação, a vendedora, que trabalhou na Delta de 2017 a 2019, disse que, após a dispensa, foi chamada para várias entrevistas e processos seletivos, que ‘‘ocorriam de forma positiva’’, mas, ao final, não era selecionada, ‘‘ainda que tivesse larga experiência para as vagas ofertadas’’. Diante de tantas negativas, mesmo em situações em que a contratação já parecia certa, passou a suspeitar que o antigo patrão estaria dando más referências a seu respeito.

Ela então pediu a duas pessoas conhecidas que ligassem para a empresa pedindo referências e, segundo seu relato, as informações fornecidas eram inverídicas e desabonadoras. Na ação, ela alegou que essa conduta prejudicou, de forma explícita, seu acesso ao mercado de trabalho no ramo para o qual se qualificou.

Gravações foram feitas sem conhecimento do ex-empregador

O juízo de primeiro grau rejeitou o pedido de indenização da trabalhadora, e a sentença foi confirmada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (MT). Para o TRT, a prova era ilícita, por ter sido obtida por meio de uma simulação e sem o conhecimento do interlocutor. Além disso, não havia nenhuma comprovação de uma situação real de pedido de referência.

No recurso ao TST, a trabalhadora sustentou que a comprovação dos fatos não se resumiu à gravação, porque o sócio proprietário, em seu depoimento, confirmou o diálogo gravado e admitiu que ‘‘apenas disse que não recomendava a ex-empregada em função do seu desempenho na empresa’’.

TST considera gravação válida como prova

O relator do recurso (RR) de revista da trabalhadora, ministro Hugo Scheuermann, assinalou que o entendimento prevalecente no TST é de que a gravação telefônica realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro é lícita como prova, ainda que quem gravou não faça parte da relação contratual e processual.

Scheuermann também registrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a tese jurídica de que é lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro (Tema 237 de repercussão geral).

Reconhecida a licitude da gravação telefônica, a Primeira Turma determinou o retorno dos autos à Vara do Trabalho para que prossiga no julgamento dos pedidos da vendedora. Com informações da jornalista Lourdes Tavares, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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RR-446-14.2020.5.23.0009

RISCO DO NEGÓCIO
Bancário que cursou MBA Executivo às expensas do banco se livra de ressarci-lo após demissão por justa causa

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Não tem valor legal o contrato de patrocínio educacional que prevê o reembolso de mensalidades pagas pelo empregador ao final do curso de aprimoramento profissional oferecido ao empregado. Afinal, o empregador tem interesse na evolução do empregado – mas este não pode bancar os riscos do negócio, ainda mais engessado num contrato de adesão.

A conclusão é da Quinta Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1, Rio de Janeiro) ao prestigiar sentença que impediu o Banco Bradesco de cobrar 75% das despesas do ‘‘Curso de MBA Executivo em Negócios Bancários’’ de um empregado que acabou demitido por justa causa após 18 anos de contrato de trabalho.

Desembargadora Márcia Campos foi a relatora
Foto: Secom /TRT-1

A relatora do recurso ordinário no Regional, desembargadora Márcia Regina Leal Campos, tal como o juízo de primeiro grau, disse que na época da realização do curso o bancário não havia celebrado nenhum contrato com o banco – o que só viria a ocorrer meses mais tarde. Tanto que, no espaço de duração do curso (outubro/2019 a abril/2021), as despesas foram inteiramente bancadas pelo empregador, sem qualquer ônus para o empregado.

‘‘E não poderia ser diferente. Isso porque o interesse na realização do curso era do empregador, que obteria um aprimoramento em sua gestão, evidentemente voltada ao lucro do negócio. Aliás, a capacitação do empregado é utilidade derivada da atividade econômica do empregador (art. 458, §2º, II, da CLT) e se insere no risco do negócio, de modo que não pode ser transferida ao empregado’’, cravou no acórdão.

Para a relatora, contrato é modalidade de negócio jurídico que visa regular situação futura, de modo que as partes conhecem, de antemão, os direitos e obrigações que lhes são afetos. No caso dos autos, a formalização do contrato de patrocínio ocorreu três meses depois de findo o curso, sendo que o autor a ele aderiu em agosto de 2021, quando já passados quatro meses do término do curso.

‘‘A pactuação de condições visando regular situação pretérita e já ultimada é por demais desarrazoada, ainda mais quando se está diante de um contrato de adesão, em que um dos contratantes (empregado) não detém autonomia da vontade e lhes são atribuídas condições e obrigações pecuniárias não previamente ajustadas. Trata-se, a toda evidência, de alteração prejudicial ao obreiro, não admitida no ordenamento jurídico trabalhista, de modo que não pode ser validada, ainda que não tenha havido vício de consentimento por parte do ex-empregado’’, fulminou a desembargadora-relatora no acórdão.

O banco tentou levar a reapreciação do caso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), mas o corregedor regional do TRT-1, desembargador Marcelo Augusto Souto de Oliveira, negou seguimento ao recurso de revista (RR) na fase de admissibilidade. O mesmo ocorreu logo em seguida no âmbito do TST, quando o ministro Aloysio Corrêa da Veiga negou provimento ao agravo de instrumento interposto para derrubar a decisão que barrou o RR no Regional.

Ação de cobrança

Na ação de cobrança ajuizada contra o ex-empregado na 4ª Vara do Trabalho de Campos dos Goytacazes (RJ), o banco alegou que a cláusula 4.7 do contrato de patrocínio educacional prevê, em caso de demissão por justa causa, que o empregado deve restituir 75% do valor do curso – desde que a rescisão trabalhista tenha ocorrido 12 meses após a sua conclusão.

O juiz do trabalho Luís Guilherme Bonin, mesmo reconhecendo a revelia do réu, julgou improcedente o pedido de condenação ao pagamento do valor a título de patrocínio educacional. A revelia ocorre quando o réu não apresenta defesa, não comparece ao processo ou não responde às alegações do autor da ação, mesmo tendo sido citado. Neste caso, o juiz pode presumir que as alegações do autor são verdadeiras.

Na fundamentação, o julgador observou que o contrato de patrocínio foi assinado em 30 de agosto de 2021, quatro meses após a conclusão do MBA, que ocorreu em 29 de abril de 2021. Destacou que a cláusula quinta, que trata da vigência, estabeleceu que os efeitos do contrato retroagem a 1º de outubro de 2019. Contudo – advertiu –, o contrato não pode regular ‘‘situações pretéritas’’ em prejuízo do trabalhador, que é a parte vulnerável na relação trabalhista.

‘‘Além disso, chama a atenção do juízo a ausência dos comprovantes de pagamento de mensalidade nos autos, assim como a ausência de informações quanto à razão pela qual foi aplicada a pena máxima de justa causa ao empregado, já que também não consta informações sobre punições anteriores’’, agregou o julgador na sentença de improcedência.

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ATOrd 0100009-36.2023.5.01.0284 (Campos do Goytacazes-RJ)

 

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IMPRECISÃO TÉCNICA
Ação para buscar patrimônio de sócio de empresa falida é incidental, não autônoma, diz STJ

Reprodução Web

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o pedido para que o patrimônio pessoal do sócio seja alcançado na falência tem natureza processual de incidente, e não de ação autônoma. Desse modo, o ato judicial de primeiro grau que soluciona a questão é uma decisão interlocutória, e o recurso cabível para impugná-lo é o agravo de instrumento.

Na origem, foi apresentado nos autos da ação de falência de uma construtora de Porto Alegre o pedido de extensão dos efeitos da quebra da personalidade jurídica para a pessoa física do sócio. O juízo, ao julgar o pedido improcedente, tratou a pretensão como ‘‘ação de responsabilidade’’ e chamou o seu próprio pronunciamento de ‘‘sentença’’.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) não conheceu da apelação interposta por entender que se tratava de um incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Assim, o recurso cabível contra a decisão seria o agravo de instrumento.

Para a corte gaúcha, o princípio da fungibilidade recursal (que permite à Justiça, em certos casos, receber um recurso errado como se fosse o correto) não seria aplicável no caso, porque teria havido erro grosseiro na interposição de apelação para impugnar uma decisão interlocutória.

Ação de responsabilização de sócio não se confunde com incidente de desconsideração

A relatora do recurso especial (REsp) no STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou que a ação de responsabilização de sócios é demanda autônoma que segue o disposto no artigo 82 da Lei 11.101/2005. Segundo ela, esse procedimento tem como objetivo ressarcir a sociedade falida em razão de prática dos próprios sócios ou administradores e é decidido por ato judicial que tem a natureza de sentença, sendo cabível o recurso de apelação.

A ministra enfatizou que a ação autônoma de responsabilização não deve ser confundida com o caso em análise, que trata, na verdade, de incidente de desconsideração da personalidade jurídica –, instituto incluído na Lei de Falências em 2019, por meio do artigo 82-A, com o objetivo de responsabilizar pessoalmente o sócio pelas dívidas da falida.

A relatora lembrou que, quando o instituto da desconsideração ainda não havia sido integrado ao texto legislativo, o STJ já entendia que o patrimônio dos sócios poderia ser atingido, de forma incidental, nas hipóteses de fraude, abusos, desvios, entre outras, e em tais casos não era necessário o ajuizamento de ação autônoma, bastando um requerimento nos autos da falência.

De acordo com a ministra, tanto nos casos de desconsideração da personalidade jurídica quanto nos incidentes admitidos anteriormente pela jurisprudência do STJ, o recurso cabível é o agravo de instrumento, porque se trata de decisões interlocutórias, conforme o artigo 1.015, inciso IV, do Código de Processo Civil (CPC).

Imprecisão técnica justifica aplicação do princípio da fungibilidade

Ao determinar o processamento do recurso interposto em segunda instância, a ministra reconheceu que o comportamento do juízo ensejou dúvida objetiva quanto à natureza do ato judicial impugnado.

Segundo explicou, a imprecisão técnica do ato judicial – por exemplo, ao dizer que se tratava de uma ‘‘sentença’’ – afasta a configuração de erro grosseiro da parte recorrente e possibilita a aplicação do princípio da fungibilidade recursal para permitir a análise do recurso pelo tribunal de origem. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2135344

MICHELUCCIO
TJSP reconhece direito de uso de marca por restaurante após utilização prolongada sem oposição

A inércia prolongada do titular de uma marca em reivindicar o seu direito de uso exclusivo em determinado nicho de mercado leva à presunção de que o concorrente pode continuar utilizando tal sinal distintivo, especialmente se estiver localizado noutra cidade.

Esta, em apertada síntese, é a decisão da 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo rejeitou alegação de uso indevido de marca em ação movida por Paschoal Café e Massas Ltda. (Micheluccio Pizza Artezanalle), localizada no Brooklin Paulista, em São Paulo, contra o Restaurante e Pizzaria Monte Alegre Ltda. (Micheluccio Pizzas), localizado em Sorocaba (SP).

Consta nos autos que a apelante (ré) utiliza a marca em disputa desde 1994, quando celebrou contrato de franquia com o titular do registro. Embora o registro da franqueadora tenha sido extinto em 2013, a empresa continuou a utilizar a marca sem oposição.

A apelada (autora da ação), por sua vez, somente obteve o registro do nome em 2016, e, embora tivesse conhecimento do uso da marca pela ré desde 2017, manteve-se inerte por seis anos, até o ajuizamento da ação.
Em seu voto, o relator do recurso de apelação, desembargador Rui Cascaldi, destacou que, considerando as peculiaridades do caso, entre elas o uso prolongado e de boa-fé da marca pela apelante há 30 anos; a inércia da apelada; a distância geográfica entre os estabelecimentos; e a ausência de comprovação de prejuízos, deve-se admitir a convivência entre as marcas, afastando-se a condenação.
‘‘Não se verifica no caso concreto risco de confusão entre os consumidores ou prejuízo à apelada. Isso porque os estabelecimentos estão situados em cidades distantes (São Paulo e Sorocaba), com público-alvo local e distinto (…), circunstância que afasta a possibilidade de desvio de clientela ou diluição da marca, permitindo a convivência harmônica entre os sinais distintivos’’, afirmou.
Os desembargadores Alexandre Lazzarini e Carlos Alberto de Salles completaram a turma julgadora.

A votação foi unânime. Redação Painel de Riscos com informações da Comunicação Social do TJSP.

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1002070-66.2023.8.26.0260 (São Paulo)

RACISMO
Estoquista discriminado por usar cabelo rastafari vai ganhar R$ 20 mil de reparação moral em SP

Foto ilustrativa/ Studio Thanan Rastafari

Impedir, restringir ou tratar diferenciadamente um empregado que faz uso de tranças ou de qualquer outro formato de cabelo associado à cultura negra, sem qualquer justificativa razoável, por si só, configura discriminação. Logo, a conduta patronal, por abusiva, dá margem à reparação por danos morais e à rescisão indireta.

Nesse passo, a 71ª Vara do Trabalho de São Paulo julgou procedente ação reclamatória para reconheceu a rescisão indireta do contrato de um estoquista de rede de varejo Compra Certa Comercial Ltda., vítima de discriminação racial  por causa do penteado afro rastafari no ambiente de trabalho.

Considerando que a situação se tornou insustentável e atingiu a honra e a dignidade do reclamante, a empresa foi condenada ao pagamento de R$ 20 mil por danos morais, além do pagamento de verbas rescisórias.

De acordo com os autos, certo dia, ao chegar ao estabelecimento com tranças, o reclamante ouviu do gerente que não poderia trabalhar com aquele visual, sendo-lhe recomendado retirar ou cortar o cabelo.

A testemunha do autor, ouvida em audiência, disse que presenciou o ocorrido e acrescentou que o chefe tirou uma foto do empregado e, em seguida, mandou-o para casa. Na ocasião, a vítima registrou boletim de ocorrência, que foi juntado aos autos como prova.

Comportamento desrespeitoso

A testemunha da ré, outro gerente presente no dia dos fatos, alegou que o comentário feito foi que o penteado não era ‘‘corte social’’, padrão da loja. Relatou também que, na hora, até brincou com ‘‘o novo visual do reclamante’’.

Entretanto, quando questionado pelo juízo se o penteado feito pelo reclamante seria um ‘‘corte social’’ e por qual motivo houve a distinção, a testemunha da ré não soube responder satisfatoriamente.

Para o juiz Farley Roberto Rodrigues de Carvalho Ferreira, o comportamento dos gerentes foi desrespeitoso e ofensivo. ‘‘Tal conduta, além de discriminatória, excedeu os limites do poder diretivo do empregador, pois evidenciado que, caso o reclamante não procedesse à mudança de visual, a empresa não o aceitaria em virtude das tranças’’.

Na sentença, o magistrado pontuou que o caso ressalta a maneira estrutural como o racismo se apresenta, a se portar sob a clandestinidade do ‘‘padrão da empresa’’. Para o julgador, atitudes racistas, como as manifestadas pelos gerentes, devem ser banidas de qualquer relação social por atingirem a honra e a dignidade da pessoa humana. ‘‘Nesse ponto, a responsabilidade da ré deriva do artigo 932 e 933 do Código Civil, por autorização do artigo 8º, §1º, da CLT’’, complementou.

Da sentença, cabe recurso ordinário trabalhista (ROT) ao Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo). Redação Painel de Riscos com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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ATOrd 1000693-29.2024.5.02.0071 (São Paulo)