DIREITO DE PASSAGEM
Metrô de São Paulo pode cobrar da TIM pelo uso dos túneis para passar cabos de telefonia

A Segunda Tuma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, autorizou a Companhia do Metropolitano de São Paulo a cobrar da operadora TIM pelo uso de áreas subterrâneas para a passagem de cabos de fibra ótica necessários à prestação dos serviços de telefonia móvel e de internet banda larga. Para o colegiado, os túneis urbanos do metrô são bens de uso especial, o que afasta a gratuidade requerida pela operadora de telefonia.

A turma negou provimento ao recurso com o qual a TIM buscava manter, sem custos, a exploração do espaço dos túneis do metrô paulistano para a instalação de infraestrutura e de redes de telecomunicações. A operadora argumentava que, conforme o artigo 12 da Lei Geral de Antenas (Lei 13.116/2015), o direito de passagem em bens públicos, como o subsolo, deveria ser isento de qualquer cobrança.

A disputa judicial teve início após o fim do contrato de concessão que, por 20 anos, regulou o uso dos túneis do metrô para a passagem da rede de fibra ótica da TIM. Fracassadas as tentativas de renovação do contrato, a questão foi levada ao Judiciário.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) decidiu que os túneis do metrô são bens de uso especial, uma vez que não são utilizados de forma geral e indistinta pela coletividade, e a circulação livre de pessoas não é permitida nesses locais.

Ao STJ, a operadora alegou que o pagamento de tarifa pelos usuários dos trens não retira dos túneis a característica de bens de uso comum. Para a TIM, a cobrança pretendida oneraria os serviços de telecomunicações e, em última instância, prejudicaria os interesses da população como um todo.

Túneis não têm característica essencial dos bens de uso comum

O relator na Segunda Turma, ministro Afrânio Vilela, destacou que a gratuidade prevista no artigo 12 da Lei 13.116/2015 é uma exceção à política estabelecida pelo artigo 11 da Lei 8.987/1995 (Lei de Concessões), que permite a obtenção de receitas adicionais por meio de fontes complementares, visando à modicidade tarifária.

Segundo o ministro, essa exceção não se aplica ao direito de passagem que a TIM pretende exercer nos túneis do metrô, pois tais túneis não se enquadram nas situações previstas na Lei Geral das Antenas, como vias públicas, faixas de domínio ou outros bens públicos de uso comum.

O magistrado esclareceu que os túneis do metrô carecem de uma característica essencial para serem classificados como bens de uso comum: estarem sujeitos aos princípios da isonomia e da generalidade e à ausência de restrições.

Subsolos do metrô estão afetados ao serviço de transporte metroviário

Afrânio Vilela apontou que, na realidade, os túneis devem ser tratados como bens de uso especial, conforme o artigo 99, inciso II, do Código Civil, que define os bens públicos com base em sua destinação, incluindo no rol dos bens de uso especial os edifícios ou terrenos destinados a serviços ou estabelecimentos da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive autarquias.

‘‘A partir da norma civil, os bens de uso especial destinam-se à execução dos serviços públicos e, por isso mesmo, são considerados instrumentos desses serviços, e têm uma finalidade pública permanente’’, escreveu no voto.

‘‘Os subsolos do metrô não são destinados ao uso genérico, isonômico e para fins diversos de interesse privado ou público, mas estão afetados ao serviço público de transporte metroviário de passageiros, amoldando-se mais adequadamente à definição de bem de uso especial de uso administrativo externo, porquanto o seu uso é restrito aos usuários do serviço de transporte subterrâneo’’, explicou o relator.

O ministro afirmou, ainda, que a aplicação do Decreto 10.480/2020 deve se manter afastada, já que há excesso regulatório nesse decreto, especialmente no artigo 9º, que de forma inadequada proíbe a cobrança de contraprestação pelo direito de passagem para a instalação de infraestrutura de telecomunicações em bens públicos de uso comum. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 1990245

OMISSÃO NA PREVENÇÃO
TJSP mantém multa ambiental por desídia após incêndio atingir área de preservação permanente

A 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve auto de infração ambiental no valor de R$ 14 mil imposto pelo Estado de São Paulo à Bracell SP Celulose, multada após incêndio de origem desconhecida em plantação de cana-de-açúcar atingir área de preservação permanente (APP).

Para o relator do recurso, desembargador Roberto Maia, a responsabilização da empresa – que buscava anulação da multa na Vara Única de Getulina (SP) – não vem da conduta de atear o fogo em si, mas de outras que contribuíram para o resultado, como como falta de manutenção dos aceiros (faixa de terreno sem vegetação que serve como barreira para impedir a propagação de incêndios).

‘‘No presente caso, somando-se ao descuido dos aceiros, extraem do Boletim de Ocorrência outras relevantes falhas que denotam omissão deliberada da recorrida [Bracell,] assumindo o risco do resultado, quais sejam, inexistência de ponto de observação, o descuido com o trato da plantação e principalmente a ausência de combate ao incêndio pela apelada’’, escreveu o magistrado no acórdão.

Completaram o julgamento os desembargadores Paulo Ayrosa e Paulo Alcides.

A votação foi unânime. Redação Painel de Riscos com informações da Comunicação Social do TJSP.

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1000938-42.2023.8.26.0205 (Getulina-SP)

JURISPRUDÊNCIA REVISITADA
Acessibilidade, direitos da pessoa com deficiência e a responsabilidade das empresas nos julgados do STJ

A Constituição de 1988 não trouxe muitos avanços na questão da pessoa com deficiência (PcD). Segundo Heloisa Helena Barboza e Vitor de Azevedo Almeida Junior, no artigo ‘‘Reconhecimento e inclusão das pessoas com deficiência’’, os dispositivos constitucionais dedicados a esse tema são voltados à habilitação e à reabilitação da PcD para fins de sua integração à vida comunitária, com ‘‘feição assistencialista’’.

Contudo, a incorporação, com status constitucional, da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, por força do Decreto 6.949/2009, alterou o tratamento da questão no Brasil, ao colocá-la no patamar dos direitos humanos e ao adotar o modelo social de deficiência.

A partir daí, explicam os autores, passou a prevalecer o princípio da inclusão no lugar da integração. A inclusão se distingue ‘‘por chamar a sociedade à ação; isto é, por exigir que a sociedade se adapte para acolher as pessoas com deficiência’’, a fim de atender às necessidades de todos os seus membros, sem exceção’’.

Segundo o artigo, os fortes impactos da convenção de 2008 no ordenamento jurídico brasileiro só foram sentidos efetivamente após a edição da Lei 13.146/2015 – Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI) –, que compilou direitos e deveres que antes estavam dispersos em outras leis, decretos e portarias.

Acessibilidade na pauta do Judiciário

O Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, celebrado em 21 de setembro, é um marco importante na mobilização pela inclusão social, reforçando a importância da conscientização e da luta contra o capacitismo – nome dado à discriminação e ao preconceito contra a PcD.

Tendo a acessibilidade como um objetivo estratégico e como valor institucional desde 2022, o STJ conta atualmente com dois ministros, 155 servidores, 174 profissionais terceirizados e três estagiários com deficiência. Em sua atividade judicante, ao longo do tempo, o tribunal tem tomado decisões que procuram assegurar a máxima efetividade aos direitos desse grupo social – por exemplo, determinando a realização de obras de acessibilidade ou garantindo indenização nos casos de violação de tais direitos.

Empresa foi obrigada a construir rampa de acesso e indenizar cadeirante

Em 2023, a Terceira Turma do STJ manteve decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que obrigou um estabelecimento comercial a construir rampa de acesso para pessoas com deficiência e o condenou a pagar indenização de danos morais no valor de R$ 5 mil para o autor da ação.

O recurso teve origem em ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de indenização por dano moral ajuizada por um homem com deficiência que, devido à falta de adaptações no prédio, não conseguia entrar no estabelecimento comercial em sua cadeira de rodas.

Condenada pelo juízo de primeiro grau e pelo TJRJ, a empresa recorreu ao STJ sob o fundamento de que, além de ser inaplicável o Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao caso, ela não estaria obrigada a ter rampa de acesso em seu estabelecimento, uma vez que não fez obra ou reforma desde que a Lei 10.098/2000 entrou em vigor.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que, se a pessoa com deficiência, no exercício de suas atividades cotidianas, figura em determinado momento como consumidora, também está protegida pelas disposições do CDC.

No caso em que o comerciante deixa de cumprir com seu dever de garantir acessibilidade, esclareceu a ministra, fica configurado o fato do serviço por fortuito interno, uma vez que a pessoa com deficiência sofreu um dano extrapatrimonial por não conseguir entrar no estabelecimento; o serviço foi defeituoso por não ser executado a contento em prol do consumidor; e o prejuízo decorreu da inação do comerciante, que tem o dever de garantir a acessibilidade aos consumidores.

‘‘É dever de todos os fornecedores da cadeia de consumo zelar pela disponibilização de condições adequadas de acesso ao seu interior, a fim de permitir a participação, sem percalços, do público em geral, inclusive das pessoas com deficiência, pois é a sociedade que deve se adaptar, eliminando as barreiras físicas, de modo a permitir a integração das pessoas com deficiência ao seio comunitário’’, disse a ministra Nancy Andrighi ao julgar o REsp 2.041.463.

Falta de estrutura adaptada em show também gera dever de indenizar

Devido à falta de adaptação da estrutura montada para um show, a Terceira Turma manteve a condenação de uma associação a pagar R$ 10 mil pelos danos morais sofridos por um cadeirante. Ele comprou ingresso para camarote em um show realizado na cidade de Limeira (SP), mas, por falta de condições de acessibilidade, enfrentou diversos problemas de locomoção no local.

Para o colegiado, a associação, em conjunto com outras empresas que organizaram o evento, teve responsabilidade pelos danos sofridos pelo cadeirante.

Segundo o processo, o consumidor só comprou o ingresso depois de ser informado pela organizadora de que o espaço tinha estrutura adaptada para pessoas com problemas de mobilidade. Entretanto, ao chegar ao local, ele encontrou diversas barreiras físicas no camarote e não conseguiu nem mesmo utilizar o banheiro.

Em primeira instância, o juízo condenou a associação ao pagamento de danos morais de R$ 5 mil, valor elevado para R$ 10 mil pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). No recurso especial (REsp), a entidade alegou que o camarote para o qual o cadeirante comprou ingresso foi montado, explorado e administrado por outra empresa; por isso, ela não teria responsabilidade pelos transtornos vividos pelo consumidor.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, afirmou que a associação era, com outras empresas, encarregada de organizar o evento, estando dentro da mesma cadeia de fornecimento, e, por essa razão, era solidariamente responsável pelos danos.

Além disso, a relatora verificou que havia falta de acessibilidade na própria entrada do local do evento, a cargo da associação.

Obrigação de bancos fornecerem documentos em braille

Com base nos direitos à acessibilidade e à informação, tanto a Terceira quanto a Quarta Turma do STJ já condenaram instituições bancárias a confeccionarem em braille os documentos necessários para o atendimento de clientes com deficiência visual. Nos dois casos, a ação civil pública (ACP) foi proposta pela Associação Fluminense de Amparo aos Cegos.

O relator do REsp 1.315.822 na Terceira Turma foi o ministro Marco Aurélio Bellizze. Ele observou que, ainda que não houvesse, como de fato há, um sistema legal protetivo específico para as pessoas com deficiência, ‘‘a obrigatoriedade da utilização do método braille nas contratações bancárias estabelecidas com pessoas com deficiência visual encontra lastro, para além da legislação consumerista in totum aplicável à espécie, no próprio princípio da dignidade da pessoa humana’’.

O ministro determinou o pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 50 mil em favor do Fundo de Defesa de Direitos Difusos.

No REsp 1.349.188, julgado pela Quarta Turma, o relator, ministro Luis Felipe Salomão, ressaltou que a não utilização do método braille durante todo o ajuste bancário com pessoa com deficiência visual a impede de exercer, em igualdade de condições com as demais pessoas, seus direitos básicos de consumidor.

‘‘Além de intolerável discriminação e evidente violação dos deveres de informação adequada, consubstancia vulneração à dignidade humana da pessoa com deficiência’’, disse o relator.

‘‘A acessibilidade é direito fundamental e, para se ter o pleno acesso à informação, pode ser exigível uma adaptação razoável dos meios informacionais, para que se alcance a igualdade de oportunidade, sem que haja qualquer tipo de discriminação em razão da deficiência, consagrando-se o respeito à diversidade e à persecução de justiça material’’, expressou no voto, ao julgar o REsp 1.349.188.

Danos morais por falta de acessibilidade no embarque em avião

A Quarta Turma, ao julgar o REsp 1.611.915, condenou uma companhia aérea a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil a passageiro com deficiência de locomoção, por não lhe ter oferecido meio seguro, digno e independente de embarque e desembarque.

Para entrar e sair do avião, o passageiro teve de ser levado no colo de funcionários da empresa, que o carregaram pela escada, de maneira insegura e vexatória, mesmo ele tendo avisado a companhia da sua condição. O embarque e o desembarque ocorreram na pista, e não foi oferecido modo mais adequado para atender o passageiro.

Ao STJ, a companhia alegou não seria sua a responsabilidade de garantir acessibilidade, mas da Infraero, que administrava o aeroporto. Por isso, argumentou que o defeito na prestação do serviço teria ocorrido por culpa de terceiro, o que excluiria sua responsabilidade pelos danos.

O relator do recurso, ministro Marco Buzzi, afirmou que o Brasil, ao aderir à Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, teve a preocupação de afastar o tratamento discriminatório de tais pessoas, assegurando a acessibilidade para permitir sua independência ao executar tarefas do cotidiano. ‘‘A acessibilidade é princípio fundamental desse compromisso multilateral, de dimensão concretizadora da dignidade humana’’, destacou.

De acordo com o ministro, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), na Resolução 9/2007, que estava em vigor na época dos fatos, ‘‘atribuiu compulsoriamente às concessionárias de transporte aéreo a obrigação de promover o embarque do indivíduo possuidor de dificuldade de locomoção, de forma segura, com o emprego de elevadores ou outros dispositivos apropriados’’.

Segundo Buzzi, ficou configurado no caso o defeito na prestação do serviço, em razão da ausência dos meios necessários para o adequado acesso do cadeirante ao interior da aeronave com segurança e dignidade.

Universidade deve fazer obras para garantir acessibilidade em suas instalações

Em 2016, a Segunda Turma manteve decisão judicial que determinou a realização de obras em todos os prédios da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), para torná-los acessíveis às pessoas com deficiência ou com dificuldades de locomoção.

Na origem do caso, foi ajuizada ação civil pública pelo Ministério Público Federal (MPF), após mais de uma década de solicitações à reitoria da universidade para que adaptasse os edifícios da instituição de ensino. No entendimento do relator do recurso no STJ, ministro Herman Benjamin, a sentença que fixou prazos para o início e a conclusão das obras – e que foi mantida em segunda instância – não era abusiva.

‘‘Não se mostra abusiva nem ilegal a fixação de prazo para o início e o fim das obras de acessibilidade nos prédios da UFPE’’, declarou o ministro em seu voto, acrescentando que a recalcitrância da universidade em cumprir a determinação do Ministério Público impunha que se fixasse um período razoável para a finalização do empreendimento.

Benjamin afirmou que a teoria da reserva do possível não se aplicava ao caso, ao contrário do que sustentava a universidade, pois desde o ano 2000 ela contava com dotação orçamentária específica para a adaptação de edifícios.

‘‘Se um direito é qualificado pelo legislador como absoluta prioridade, deixa de integrar o universo de incidência da reserva do possível, já que a sua possibilidade é, preambular e obrigatoriamente, fixada pela Constituição ou pela lei’’, afirmou. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

REsp 1912548

REsp 1315822

REsp 1349188

REsp 1611915

REsp 1607472

OMISSÃO DO EMPREGADOR
Professor recebe bilhetes homofóbicos, e escola é condenada a pagar danos morais no valor de R$ 40 mil

A ausência de discriminação na contratação de professores homossexuais não isenta a escola da responsabilidade em reprimir posturas e atitudes homofóbicas de alunos e pais, pois são condutas antijurídicas que maculam o meio ambiente laboral.

Nesse passo, a 7ª Vara do Trabalho de Florianópolis condenou o Colégio Catarinense (Associação Antônio Vieira – ASAV) a pagar dano moral no valor de R$ 40 mil a um professor de arte vítima de tratamento discriminatório em razão de sua orientação sexual.

Segundo a juíza do trabalho Danielle Bertachini, a escola particular de não agiu adequadamente diante das ofensas homofóbicas – por meio de bilhetes – sofridas pelo reclamante em sala de aula, configurando dano moral. Ou seja, a conduta omissiva da escola violou direitos de personalidade assegurados no inciso X do artigo 5º da Constituição – privacidade, intimidade, honra e imagem –, ensejando o dever de indenizar.

‘‘Tratou-se, pois, de conduta ilícita cometida no ambiente escolar, ainda que de forma omissiva e culposa pela reclamada [escola], a qual merece ser reprimida porquanto tratou-se de ato discriminatório nos termos do art. 3º, IV, da Constituição Federal, o que fere o princípio da igualdade previsto no art. 5º também da Carta Maior’’, disparou na sentença a julgadora.

Pedidos de amizade no Instagram

O caso teve início em 2023, quando, em determinada manhã, o professor estava ministrando aulas para turmas do ensino médio e começou a receber solicitações de amizade no Instagram. Ao perceber que os pedidos vinham de alunos da escola – e considerando que seu perfil na rede social era pessoal –, ele optou por recusá-los.

O dia de trabalho seguiu. Entretanto, ao longo de uma das aulas, o docente percebeu que a turma estava silenciosa, algo pouco comum. Foi quando, ao se aproximar de sua mesa, encontrou diversos bilhetes contendo termos de cunho homofóbico, com tipo de papel e escrita que remetiam a bilhetes utilizados em uma performance artística publicada por ele no YouTube.

No vídeo, o autor elenca em pequenos papéis os insultos comumente dirigidos a pessoas da comunidade LGBTQIA+. Ao final, bate os papéis com água em um liquidificador e bebe o produto, encenando uma crítica à homofobia presente na sociedade.

Dispensa sem explicações

Apesar do abalo emocional, o professor continuou a aula. Seu intuito, conforme relatado no processo, era recolher os bilhetes e, posteriormente, mostrá-los à coordenação da escola, aproveitando o momento para despertar nos alunos o debate acerca da importância do respeito e combate a atitudes discriminatórias.

Entretanto, no mesmo dia, além de perceber ‘‘olhares de deboche nos corredores’’, o professor foi chamado por uma funcionária ao Setor de Recursos Humanos (RH). Lá, recebeu a notícia de que seu contrato de experiência não seria renovado.

Mesmo após questionar o motivo da dispensa, o professor não obteve explicações claras. O fato lhe chamou a atenção, pois dias antes havia recebido elogios da coordenadora da escola por meio de mensagem.

Ação reclamatória

Passado o episódio, o profissional ingressou com uma ação reclamatória na Justiça do Trabalho, solicitando indenização por danos morais, alegando que o colégio não tomou medidas adequadas diante das ofensas homofóbicas. Também argumentou que a decisão de não renovar seu contrato ocorreu em razão da repercussão, especialmente entre pais e alunos, do trabalho artístico publicado no YouTube.

Já a instituição mantida pelos padres jesuítas, em sua defesa, argumentou que a dispensa do professor ocorreu no exercício do ‘‘direito potestativo’’ do empregador de não renovar o contrato de experiência.

Alegou, ainda, que a decisão foi baseada em relatos sobre a ‘‘inabilidade do docente’’ para lidar com conflitos com os alunos do ensino médio – que, em tese, seriam ‘‘mais questionadores’’ –, e não por qualquer motivo discriminatório.

A ré também argumentou que possui outros professores homossexuais no quadro de docentes, o que seria incompatível com a postura da qual estava sendo acusada.

Juíza Danielle Bertachini
Captura Instagram

Tratamento discriminatório

Ao analisar o caso na 7ª Vara do Trabalho de Florianópolis, a juíza Danielle Bertachini acolheu o pedido do autor para indenização por danos morais, arbitrando a reparação em R$ 40 mil.

Na sentença, a magistrada observou que a escola não apresentou justificativas plausíveis para não renovar o contrato do docente, especialmente por não ter oferecido feedbacks ou chances de melhoria quanto à suposta ‘‘inabilidade’’ com os alunos.

A escola já recorreu da condenação ao Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina) por meio de recurso ordinário, ainda pendente de julgamento.

Protocolos para julgamento sem discriminação 

Em agosto deste ano, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) lançaram os protocolos para julgamentos sem discriminação, documentos que orientam a magistratura sobre como considerar diversidade, inclusão e trabalho escravo e infantil em suas decisões.

As orientações propõem um olhar sem vieses ou preconceitos e com observação aos processos históricos e culturais de desigualdade. Além disso, há diretrizes para servidores e servidoras e recomendações para advogados e advogadas.

Foram lançados três protocolos: Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva da Infância e da Adolescência; Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva de Enfrentamento do Trabalho Escravo Contemporâneo; e Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva Antidiscriminatória, Interseccional e Inclusiva, que aborda as questões de gênero e sexualidade, raça e etnia e pessoa com deficiência e idosa. Redação Painel de Riscos com informações de Carlos Nogueira, da Secretaria de Comunicação Social (Secom)/TRT-12.

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ATOrd 0000601-31.2023.5.12.0037 (Florianópolis) 

PORTABILIDADE
Vara de São Paulo obriga Porto Seguro a aceitar idoso em plano de saúde empresarial

O Poder Judiciário tem o dever de cumprir, nos limites de suas atribuições constitucionais, o disposto no artigo 3º, inciso IV, da Constituição Federal, além do artigo 4º, da Lei 10.741/2003 (Estatuto da Pessoa Idosa).

Assim, a 42ª Vara Cível da Comarca de São Paulo determinou que Porto Seguro – Seguro Saúde S/A aceite a portabilidade de um empresário idoso de 76 anos, sem imposição de novas carências, confirmando a antecipação de tutela concedida liminarmente.

De acordo com os autos, o autor procurou o plano de saúde da ré e foi informado que, no plano empresarial em questão, somente beneficiários com até 73 anos poderiam ser aceitos, o que levou à recusa do seu nome.

Em resposta, a empresa do autor, Abaima Participações Ltda., optou por contratar o plano de saúde para os beneficiários aceitos e realizar a portabilidade do autor.

No entanto, a ré recusou a aceitação do autor na nova apólice sem apresentar qualquer justificativa. O plano anterior, no qual o autor ainda está incluído, está prestes a ser cancelado, uma vez que restou apenas um beneficiário na apólice.

Na sentença, o juiz André Augusto Salvador Bezerra observou que a requerida não acostou provas que justificassem a recusa do autor.

‘‘Limitou-se a alegar fatos genéricos, que não elide o fato de exercer uma atividade de interesse público, a ponto de se submeter a agências reguladoras e a legislações específicas. Tal circunstância, contudo, não pode ser legitimada pelo Judiciário, a quem cabe, acima de tudo, observar a isonomia e os direitos daqueles que se encontram em patamar social e econômico desfavorável perante o poder econômico’’, escreveu na sentença.

Da sentença, cabe recurso de apelação ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).  Redação Painel de Riscos com informações da Comunicação Social do TJSP.

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1080152-72.2024.8.26.0100 (São Paulo)