NEGÓCIO INEXISTENTE
Interesse do legítimo proprietário precede o de terceiro de boa-fé que compra imóvel a partir de escritura falsa

Reprodução/Ilustração: Portal.Loft.Com.Br

​O legítimo proprietário de um imóvel tem o direito de reivindicá-lo, em detrimento do terceiro adquirente de boa-fé, caso o registro na matrícula tenha sido cancelado por estar amparado em escritura pública inexistente.

Esse entendimento levou a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a negar provimento ao recurso especial (REsp) de uma empresa que, após adquirir um imóvel com base em escritura pública de compra e venda falsa, buscava ficar com o bem invocando a proteção conferida ao terceiro adquirente de boa-fé, prevista no artigo 54, parágrafo 1º, da Lei 13.097/2015.

‘‘Essa norma, contudo, não regulamenta especificamente as consequências jurídicas na hipótese de ocorrer o cancelamento do registro anterior, situação tratada expressamente no artigo 1.247 do Código Civil (CC), que não foi revogado pela referida Lei 13.097/2015 e permanece vigente’’, destacou a relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi.

A discussão teve origem quando o espólio do legítimo proprietário ajuizou ação para provar que o imóvel nunca foi vendido ao réu e que a suposta escritura de compra e venda registrada anos mais tarde seria falsa. Posteriormente, o bem foi vendido a uma empresa, que reivindicou o direito de ficar com ele por ter adotado todas as cautelas necessárias ao comprá-lo.

As instâncias ordinárias declararam a inexistência da escritura pública, sendo nulas as operações de compra e venda. Aplicando o artigo 1.247, parágrafo único, do CC, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) afirmou que o cancelamento do registro de título aquisitivo dá ao proprietário o direito de reivindicação, independentemente da boa-fé e do título do terceiro adquirente.

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Imprensa/TSE

Lei 13.097/2015 não regula cancelamento de registro anterior de imóvel

Nancy Andrighi observou que os registros públicos buscam garantir a autenticidade, a segurança e a eficácia dos atos jurídicos, como previsto no artigo 1º da Lei 6.015/1973. No entanto – continuou –, se isso não ocorrer, o artigo 1.247 do CC permite a retificação ou a anulação do ato.

‘‘Conforme o parágrafo único desse dispositivo, ‘cancelado o registro, poderá o proprietário reivindicar o imóvel, independentemente da boa-fé ou do título do terceiro adquirente’. A presente hipótese se amolda ao artigo 1.247 do CC, tendo em vista que o registro na matrícula do imóvel não exprimia a verdade’’, analisou a ministra.

Quanto à aplicação do artigo 54, parágrafo 1º, da Lei 13.097/2015, Nancy Andrighi lembrou que esse normativo aborda diversos temas, incluindo questões envolvendo registros na matrícula dos imóveis e a proteção do adquirente de boa-fé. Porém, alertou a relatora, ele não regulamenta especificamente as consequências jurídicas do cancelamento do registro anterior, situação que é tratada no artigo 1.247 do CC.

‘‘O objetivo do artigo 54 da Lei 13.097/2015 foi homenagear o princípio da concentração de dados na matrícula do imóvel, de modo a retirar do adquirente o ônus de diligenciar por eventuais ações, assegurando a sua posição de boa-fé por ter confiado no registro, não podendo a ele serem opostos eventuais direitos que interessados tinham sobre o imóvel, mas não registraram’’, detalhou.

Código Civil apresenta solução equilibrada para conflito de interesses

Segundo a ministra, apesar de o caso trazer o conflito de interesses legítimos de partes que confiaram no registro do imóvel, o proprietário jamais poderia imaginar que perderia a sua propriedade por meio da simples apresentação de uma escritura fraudulenta em cartório.

‘‘Não por outro motivo que o CC regulamenta essa problemática de forma específica e equilibrada, protegendo, em um primeiro momento, o legítimo proprietário, e, após, o adquirente de boa-fé’’, concluiu a relatora.

Por fim, Nancy Andrighi salientou que o adquirente de boa-fé pode pleitear indenização por perdas e danos contra o réu do processo, que lhe vendeu o imóvel de forma indevida. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2115178

ATAQUE À HONRA
Faxineira acusada injustamente de furtar celular em hospital vai ganhar R$ 10 mil de reparação moral

A acusação de furto, sem prova, constitui ofensa grave o bastante para causar constrangimento, pois afeta diretamente a honra, a boa fama, a autoestima e a imagem da pessoa, bens juridicamente tutelados pelo artigo 5º da Constituição.

Firme no fundamento, a 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) manteve sentença que condenou em danos morais a empresa Veman Engenharia de Manutenção e Gestão de Ativos Ltda, que presta serviços para o Hospital Leforte, na capital paulista. Motivo: uma de suas faxineiras, autora da ação, foi acusada injustamente de furtar o aparelho celular de uma médica.

Os integrantes do colegiado consideraram a ofensa grave e confirmaram a obrigação do empregador de indenizar a trabalhadora em R$ 10 mil.

Acusação precipitada de furto

A reclamante contou que estava preenchendo relatório de limpeza, quando foi surpreendida por uma médica, que a acusou de ter roubado o seu celular. Mais tarde, o segurança do local encontrou o aparelho embaixo do travesseiro da sala de descanso que a profissional de saúde havia utilizado horas antes. Três dias após o fato, a médica pediu desculpas à faxineira.

O acórdão esclarece que a empresa reclamada não negou, especificamente, o incidente envolvendo o celular, apenas se ateve a outras questões reivindicadas no processo – a peça inicial embutia vários pedidos trabalhistas. O representante da empresa, ouvido nos autos, afirmou desconhecimento do fato.

A desembargadora-relatora, Beatriz Helena Miguel Jiacomini, disse que a acusação de furto, sem prova, constitui ofensa grave. Ainda que tenha havido pedido de desculpas após a localização do bem – destacou –, ‘‘a imputação, em si, do fato delituoso, faz recair sobre a empregada a imagem de pessoa não confiável’’.

Por essa razão, a magistrada manteve a obrigação de indenizar e o quantum reparatório definidos no juízo de origem. Redação Painel de Riscos com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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ATOrd 1000890-11.2023.5.02.0041 (São Paulo)

PRESUNÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO
Aurora vai pagar dano moral por demitir empregado dias após testemunhar em sindicância de assédio sexual

Um ex-operador de produção da Cooperativa Central Aurora Alimentos, despedido após ser testemunha em uma sindicância sobre assédio sexual, deve receber indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil.

A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) considerou que a cooperativa empregadora não provou que a dispensa sem justa causa não teve viés discriminatório. O acórdão reformou, no aspecto, a sentença do juízo da 4ª Vara do Trabalho de Passo Fundo.

O empregado prestou depoimento como testemunha no dia 10 de novembro de 2022, e, em 23 de novembro, foi dispensado. A vítima do suposto assédio, a mãe dela e outra testemunha que prestou depoimento na sindicância também foram despedidas, enquanto o acusado de assédio seguiu trabalhando.

Falta de provas da dispensa discriminatória

Segundo depoimento do representante da cooperativa, ‘‘ele trabalhava melhor do que os outros empregados que foram dispensados’’.

No entendimento do juízo da 4ª Vara do Trabalho de Passo Fundo, o ônus de provar a discriminação era do empregado. A sentença, no entanto, concluiu que a discriminação não ficou comprovada. O juiz Evandro Luís Urnau observou que, no mesmo mês em que o operador foi despedido, acabaram dispensados outros 134 empregados.

Segundo o magistrado, a ocorrência de dispensa 13 dias depois do depoimento na sindicância é o único elemento do processo que pode ser considerado como indício de discriminação.

‘‘Reforço que não há no Direito Pátrio a exigência de motivação das despedidas (exceto empregados públicos). Eventual conduta discriminatória precisaria estar firmemente demonstrada para se reconhecer algum vício na resilição’’, concluiu o juiz, indeferindo o pedido de indenização neste aspecto – a reclamatória trazia outros pedidos.

Desembargador Clóvis Schuch Santos
Foto: Secom/TRT-4

Reforma da sentença no TRT-RS

O reclamante recorreu ao TRT-RS. O relator do caso na 3ª Turma, desembargador Clóvis Fernando Schuch Santos, afirmou causar estranheza que as pessoas ouvidas na sindicância tenham sido despedidas sem justa causa logo após os depoimentos, menos o suposto assediador, que seguiu trabalhando.

‘‘Veja-se que o representante da parte ré, em seu depoimento, diz que as testemunhas foram dispensadas por faltas injustificadas ou algo semelhante. Ora, comumente, a despedida por faltas injustificadas ou situações assim relevantes se dá na modalidade de justo motivo, mostrando-se, assim, contraditório o depoimento’’, destacou o magistrado.

Ele ressaltou, também, que a dispensa abusiva e discriminatória constitui presunção favorável ao empregado, conforme enunciado da Súmula 443 do TST. Segundo o desembargador, a cooperativa não conseguiu fazer prova contrária a essa presunção.

Nessa linha, a Turma, por maioria, com voto divergente do desembargador Francisco Rossal de Araújo, considerou que a despedida teve caráter discriminatório. Em decorrência, condenou a empregadora ao pagamento de uma indenização por danos morais ao operador. A reparação foi fixada no valor de R$ 10 mil.

Também participou do julgamento o desembargador Marcos Fagundes Salomão. Cabe recurso do acórdão para o Tribunal Superior do Trabalho (TST). Redação Painel de Riscos com informações de Bárbara Frank (Secom/TRT-4).

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ATOrd 0020796-21.2023.5.04.0664

DESEMPENHO DA LOJA
Remuneração variável pode ser revista durante a vigência do contrato de trabalho, decide TRT-SC

Respeitando certos critérios, o empregador tem o direito de ajustar a sua política de remuneração variável para se adequar ao mercado, mesmo que isso leve a uma redução nos ganhos do trabalhador.

O entendimento é da 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina) em ação reclamatória movida por uma gerente da Telefonica Brasil em Florianópolis, alegando que as mudanças nas regras de pagamento às quais estava submetida resultaram em prejuízo contratual.

Ao procurar a Justiça do Trabalho, a empregada relatou que a sua remuneração era composta por duas partes: uma fixa e outra variável.

Ela explicou que, inicialmente, a fórmula de cálculo era simples, com base na produtividade. Entretanto, ao longo do tempo, a empresa teria mudado a estrutura diversas vezes, passando a adotar critérios mais complexos, com a inclusão de novos parâmetros para o cálculo e um índice de satisfação dos clientes ao visitarem a loja.

A gerente alegou que as mudanças foram unilaterais e prejudiciais, resultando em uma redução significativa de seus ganhos mensais. Além disso, argumentou na ação que o novo sistema transferia parte do risco econômico da atividade para os empregados, o que seria ilegal.

Poder diretivo

No primeiro grau, a 6ª Vara do Trabalho de Florianópolis indeferiu o pedido, entendendo que a autora não havia demonstrado que as mudanças configuravam prejuízo direto ou inobservância dos direitos trabalhistas.

A sentença proferida pelo juiz Charles Baschirotto Felisbino, da 6ª Vara do Trabalho de Florianópolis, concluiu que o empregador agiu dentro de seu poder diretivo ao ajustar a política remuneratória de acordo com as necessidades do mercado.

O magistrado também destacou que, desde o início do contrato, a remuneração variável paga pela ré não configurava comissões, mas sim premiações. Isso permitia a fixação de critérios para apuração e regras de restrição de resultados, conforme o cenário observado.

Des. Cesar Pasold Júnior foi o relator
Foto: Secom/TRT-12

Jus variandi

Insatisfeita com a decisão de primeiro grau, a autora recorreu para o Tribunal, insistindo no argumento de que as alterações foram lesivas ao seu contrato de trabalho. No entanto, ao analisar o caso, a 5ª Turma do TRT-SC manteve o entendimento do juízo de primeiro grau.

O relator do recurso ordinário, desembargador Cesar Luiz Pasold Júnior, ressaltou que, ao contrário do que foi alegado pela autora, a remuneração variável dos cargos pelos quais ela passou está vinculada ao desempenho da loja como um todo – e não ao desempenho individual.

De acordo com o desembargador, embora a conduta da empresa tenha acarretado menor ganho à trabalhadora, a alteração dessa política durante o contrato, desde que observados certos requisitos, tal como a proibição da redução nominal ou objetiva das comissões e premiações, ‘‘insere-se no jus variandi do empregador e deve ser legitimada, sob pena de impedir a liberdade de gestão empresarial’’.

Pasold Júnior ainda defendeu que, se o empregador fosse impedido de alterar a política de metas e prêmios, teria que oferecer diferentes sistemas de remuneração para empregados antigos e novos, o que violaria a isonomia prevista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Ou então demitir funcionários antigos, o que seria prejudicial aos próprios trabalhadores.

Além disso, o acórdão também ressaltou que a autora, como comissionista mista, tinha um salário fixo garantido, o que, na visão do relator, assegurava uma certa estabilidade financeira, mesmo com a variação nos bônus recebidos.

A defesa da reclamante já entrou com embargos declaração, pendentes de julgamento. Redação Painel de Riscos com informações de Carlos Nogueira, da Secretaria de Comunicação Social (Secom)/TRT-12.

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ATOrd 0000360-60.2023.5.12.0036 (Florianópolis)

DOCUMENTAÇÃO INCOMPLETA
Vara Empresarial de Porto Alegre nega recuperação judicial à associação de saúde

Juiz Gilberto Schäfer
Foto: Divulgação/Ajuris

Ante à falta de preenchimento dos requisitos específicos da Lei de Recuperação Judicial e Falência (Lei 11.101/2005), a Vara Regional Empresarial de Porto Alegre indeferiu o pedido recuperacional do Instituto de Saúde e Desenvolvimento Humano (ISDH).

A associação civil sem fins lucrativos não comprovou o tempo mínimo de dois anos de atividade regular, conforme exigido pela Lei, obrigando o juiz Gilberto Schäfer a extinguir o processo sem análise do mérito.

De acordo com o magistrado, a autora da ação estava inativa e não apresentou toda a documentação contábil exigida, tampouco comprovou benefícios econômicos e sociais que justificassem o deferimento do pedido.

Ausência de pressupostos legais

‘‘A inobservância de todos os requisitos legais resulta na ausência de pressupostos para o desenvolvimento válido e regular do processo. Conforme constatado previamente, verificou-se a incompletude da documentação e a inatividade da parte autora há cinco anos. Não estando a empresa em atividade, seja potencial ou real, não há objeto a ser protegido, o que constitui impedimento para o deferimento da recuperação judicial’’, destacou o Juiz.

Na fundamentação da sentença, o magistrado fez referência a precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que permitem ao juiz indeferir a petição inicial quando não há comprovação de atividade econômica, seja ela potencial ou real.

Laudo de constatação prévia

O Juizado da Vara Empresarial adota o uso de laudo de constatação prévia como condição para o deferimento da recuperação judicial, conforme o artigo 51-A da Lei 11.101/05, alterada pela Lei 14.112/2012. Esse laudo verifica se a atividade econômica está em funcionamento e se o proponente da ação possui condições para continuar operando. Também certifica a regularidade da documentação, oferecendo uma visão clara da situação do requerente.

Para o juiz Gilberto Schäfer, o laudo de constatação prévia é fundamental para filtrar casos que não atendem aos requisitos mínimos da Lei e evitar o uso indevido ou fraudulento da recuperação judicial. ‘‘Esse documento técnico é uma ferramenta essencial para garantir a transparência e a eficácia do processo’’, constatou.

Da sentença, cabe recurso de apelação ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). Redação Painel de Riscos com informações de Sabrina Barcelos Corrêa, da Divisão de Imprensa do TJRS.

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5115164-26.2024.8.21.0001(Porto Alegre)