RACISMO
Estoquista discriminado por usar cabelo rastafari vai ganhar R$ 20 mil de reparação moral em SP

Foto ilustrativa/ Studio Thanan Rastafari

Impedir, restringir ou tratar diferenciadamente um empregado que faz uso de tranças ou de qualquer outro formato de cabelo associado à cultura negra, sem qualquer justificativa razoável, por si só, configura discriminação. Logo, a conduta patronal, por abusiva, dá margem à reparação por danos morais e à rescisão indireta.

Nesse passo, a 71ª Vara do Trabalho de São Paulo julgou procedente ação reclamatória para reconheceu a rescisão indireta do contrato de um estoquista de rede de varejo Compra Certa Comercial Ltda., vítima de discriminação racial  por causa do penteado afro rastafari no ambiente de trabalho.

Considerando que a situação se tornou insustentável e atingiu a honra e a dignidade do reclamante, a empresa foi condenada ao pagamento de R$ 20 mil por danos morais, além do pagamento de verbas rescisórias.

De acordo com os autos, certo dia, ao chegar ao estabelecimento com tranças, o reclamante ouviu do gerente que não poderia trabalhar com aquele visual, sendo-lhe recomendado retirar ou cortar o cabelo.

A testemunha do autor, ouvida em audiência, disse que presenciou o ocorrido e acrescentou que o chefe tirou uma foto do empregado e, em seguida, mandou-o para casa. Na ocasião, a vítima registrou boletim de ocorrência, que foi juntado aos autos como prova.

Comportamento desrespeitoso

A testemunha da ré, outro gerente presente no dia dos fatos, alegou que o comentário feito foi que o penteado não era ‘‘corte social’’, padrão da loja. Relatou também que, na hora, até brincou com ‘‘o novo visual do reclamante’’.

Entretanto, quando questionado pelo juízo se o penteado feito pelo reclamante seria um ‘‘corte social’’ e por qual motivo houve a distinção, a testemunha da ré não soube responder satisfatoriamente.

Para o juiz Farley Roberto Rodrigues de Carvalho Ferreira, o comportamento dos gerentes foi desrespeitoso e ofensivo. ‘‘Tal conduta, além de discriminatória, excedeu os limites do poder diretivo do empregador, pois evidenciado que, caso o reclamante não procedesse à mudança de visual, a empresa não o aceitaria em virtude das tranças’’.

Na sentença, o magistrado pontuou que o caso ressalta a maneira estrutural como o racismo se apresenta, a se portar sob a clandestinidade do ‘‘padrão da empresa’’. Para o julgador, atitudes racistas, como as manifestadas pelos gerentes, devem ser banidas de qualquer relação social por atingirem a honra e a dignidade da pessoa humana. ‘‘Nesse ponto, a responsabilidade da ré deriva do artigo 932 e 933 do Código Civil, por autorização do artigo 8º, §1º, da CLT’’, complementou.

Da sentença, cabe recurso ordinário trabalhista (ROT) ao Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo). Redação Painel de Riscos com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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ATOrd 1000693-29.2024.5.02.0071 (São Paulo)

ATUALIZAÇÃO CADASTRAL
STJ afasta IR na fonte sobre transferência de cotas de fundo de investimento a herdeiros

Reprodução: Site STJ /A9 Studio

​A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que não incide Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre a transferência de fundo de investimento por sucessão causa mortis, quando os herdeiros, sem pedir resgate, apenas requerem a transmissão das cotas, dispostos a continuar o relacionamento com a administradora e optando pela manutenção dos valores apresentados na última declaração de IR do falecido.

Dois irmãos impetraram mandado de segurança preventivo para impedir a cobrança do IRRF sobre a transferência de cotas de fundo de investimento que herdaram do pai. Com a abertura do inventário, eles pediram a transferência das cotas com base no valor constante na última declaração do IR apresentada pelo falecido. O banco informou que haveria a incidência do imposto na fonte, o que motivou a ação judicial.

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) entendeu que, embora a sucessão causa mortis não implique o resgate das cotas, a transferência de titularidade para os herdeiros autorizaria a tributação na fonte, pois resultaria em alteração escritural.

Ministro Gurgel Faria foi o relator
Foto: Imprensa/STJ

Tributo só incide na transferência por valor de mercado e se houver ganho

O relator do recurso no STJ, ministro Gurgel de Faria, observou que o artigo 23 da Lei 9.532/1997 estipula duas opções para avaliar bens e direitos transferidos nas hipóteses de herança, legado ou doação em adiantamento da legítima: pelo valor de mercado ou pelo valor constante na última declaração de IR do falecido ou doador.

Contudo, Gurgel de Faria apontou que não há fato gerador do imposto se as cotas estão sendo transferidas aos herdeiros diretamente, em razão da morte do titular, e avaliadas conforme a última declaração, e não por valor de mercado.

O ministro também destacou que não pode ser aplicado ao caso o disposto no artigo 65 da Lei 8.981/1995, que trata da incidência do IRRF sobre o rendimento produzido por aplicação financeira de renda fixa, e que prevê, em seu parágrafo 2º, que a alienação compreende qualquer forma de transmissão da propriedade, bem como a liquidação, o resgate, a cessão ou a repactuação do título ou da aplicação.

‘‘Além de se referir a fundo de renda fixa, e não de investimento, a alienação, como ato de vontade, não abrange a transferência causa mortis. Assim, não há norma legal stricto sensu a determinar a incidência de IRRF sobre a mera transferência de cotas de fundos de investimento – de qualquer modalidade – decorrente de sucessão causa mortis, quando os herdeiros optam pela observância do valor constante na última declaração de bens do de cujus. Somente incide o tributo se a transferência for realizada por valor de mercado e houver diferença positiva relativamente ao valor de aquisição’’, esclareceu no voto.

Receita Federal não pode exigir tributo sem previsão legal

O relator comentou que não cabe à Receita Federal determinar a tributação pelo IRRF em situação diversa da prevista em lei, quando não há ganho de capital. Segundo ele, não se pode presumir antecipação de liquidação ou resgate pela transferência legítima de cotas aos herdeiros quando, na verdade, ocorre mera atualização cadastral das cotas perante a administradora.

Gurgel de Faria ressaltou que, em conformidade com o princípio da legalidade em matéria tributária (artigo 150, inciso I, da Constituição), a autoridade administrativa somente pode exigir o tributo quando há precisa adequação entre o fato e a hipótese legal de incidência, ou seja, quando ocorre sua descrição típica. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 1968695

PARASITISMO DE REPUTAÇÃO
Brechó vai indenizar rede de franquias de roupas infantis por imitar a sua vestimenta comercial

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Franquia Cresci e Perdi/ Capa Revista Exame

Imitar a vestimenta comercial (trade dress) de uma empresa de renome no mercado, para captar clientes no mesmo nicho mercadológico, é concorrência parasitária, por afrontar a Lei da Propriedade Industrial – LPI (Lei 9.279/96). Logo, o causador do dano fica obrigado, legalmente, a indenizar o ‘‘parasitado’’.

A decisão é da 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) ao prestigiar sentença que condenou a Baby Brechó Comércio de Artigos do Vestuário, de Guarulhos (SP), a pagar danos morais e materiais (perdas e danos) pelo uso de cores, design de fachada, layout interno e mobiliário semelhantes ao da rede de franquias Cresci e Perdi, sediada em São José do Rio Pardo (SP) e espalhada pelo país. Ambas comercializam roupas infantis, acessórios e brinquedos novos e usados.

A reparação por danos materiais, termos do artigo 210 da LPI, será apurada em sede de liquidação de sentença. Já o dano moral, por uso indevido de marca alheia para auferir lucro, ocasionando confusão e abalo na concorrência no mercado, foi arbitrado em R$ 20 mil – valor integralmente mantido pelo colegiado.

Tal como decidiu o juízo da 8ª Vara Cível de Guarulhos (SP), a Baby Brechó deve abster-se, definitivamente, de usar o trade dress (conjunto-imagem) da marca de propriedade da Cresci e Perdi, devendo descaracterizar o seu estabelecimento, abandonando a identidade visual. Também deve abster-se de veicular propaganda e estratégia de marketing idênticas ou semelhantes às realizados pela autora nas redes sociais.

O juiz Luiz Gustavo de Oliveira Martins Pereira destacou, com base na prova pericial, que um dos sócios da ré se aproveitou das informações passadas pela autora – quando mostrou interesse na franquia – para montar o modelo do seu negócio. Fragmento do laudo, no ponto: ‘‘embora o sócio da empresa Ré não tenha assinado o Contrato de Franquia com a Autora, o simples fato de ter participado de processo para obtenção de licença para montagem de uma loja da rede foi o suficiente para que ele obtivesse informações e/ou conhecimentos facilitados para implantar sua própria loja, conhecimentos esses que foram ‘aproveitados’ no novo negócio, conforme pudemos expor no laudo que ora finalizamos’’.

Desembargador Sérgio Shimura foi o relator
Foto: Imprensa/PUC-Campinas

Desvio de clientela

Para o julgador de origem, as provas documental e pericial comprovam que a autora faz jus à proteção legal da propriedade industrial, por deter o registro da marca reclamada.

‘‘Assim, considerando que a parte requerida está fazendo uso das cores, projeto dos móveis, disposição dos móveis, cópia das estratégias de marketing e do conteúdo dos folders, idênticos ao da marca Cresci e Perdi, de propriedade da autora, de rigor o reconhecimento de que houve violação aos direitos de propriedade industrial’’, fulminou, julgando totalmente procedente a ação.

Em agregação aos fundamentos da sentença, o relator da apelação no TJSP, desembargador Sérgio Shimura, lembrou que a concorrência desleal se caracteriza pelo desvio de clientela, por meio do uso indevido de mecanismos que induzem o consumidor à confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço – ou entre os produtos e serviços postos no comércio. É o que ocorre, por exemplo, com a reprodução ou imitação de uma característica do título de estabelecimento, nome comercial ou marca de um produto ou serviço.

‘‘Tal prática pode afetar ou reduzir o valor de uma marca ou denominação empresarial na respectiva classe de atuação, vez que pode ser associada a empresas que prestem serviços ou comercializem produtos de qualidade duvidosa ou inferior àquelas que já ostentem bons indicativos’’, cravou no acórdão.

Negócio inovador para incentivar o consumo consciente

A administradora da Cresci e Perdi conta, na peça inicial da ação cominatória/indenizatória, que criou, em 18 de maio de 2017, um conceito sustentável no segmento de roupas infantis, acessórios e brinquedos novos e usados, oferecendo produtos muito mais baratos que os das lojas convencionais. Para resguardar os seus direitos, obteve, junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), o registro da marca, na forma mista, a fim de distinguir seus produtos e serviços.

Esclarece que, por se tratar de uma franquia, as lojas franqueadas possuem características marcantes e identificadoras, desenvolvidas por equipe de profissionais especializados. Este conjunto forma um padrão visual todo próprio e especial – layout, decoração, disposição dos móveis, disposição dos produtos e espaços. Ou seja, estas características reunidas identificam as franquias Cresci e Perdi aos olhos dos consumidores. Hoje, a franqueadora conta com centenas de unidades espalhadas pelo território nacional, visando incentivar o consumo consciente.

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1039346-50.2020.8.26.0224 (Guarulhos-SP)

 

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ORDEM PRÁTICA
Ação de produção antecipada de prova pode ser ajuizada no local em que se encontra o objeto a ser periciado

Sede Icavi/Divulgação

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a ação de produção antecipada de prova pericial pode ser processada na comarca onde se encontra o objeto que vai ser periciado, e não necessariamente no local de domicílio da parte ré – que, no caso julgado, coincidia com o foro eleito em contrato.

Na origem do caso, a Icavi Indústria de Caldeira Vale do Itajaí S. A., sediada em Pouso Redondo (SC), moveu ação de produção antecipada de prova pericial num equipamento fornecido pela Net Steel S. A. Indústria Metalúrgica, sediada em Lontras (SC), que atualmente se encontra na Videolar Innova S. A., sua cliente, no Polo Petroquímico de Trinfo (RS).

A autora pretende fazer um levantamento da estrutura do equipamento. Ou seja, a perícia vai verificar se os cálculos estruturais, soluções de engenharia, materiais e técnicas de construção/montagem, empregadas pela parte ré, atendem os requisitos de resistência estrutural exigida do equipamento, de acordo com as normas técnicas aplicáveis. Tal perícia vai apontar todos os problemas/defeitos constatados.

A ação foi ajuizada na comarca onde se encontra o equipamento, enquanto o foro eleito no contrato de fornecimento, entre autora e ré, é o de domicílio desta última.

Após o tribunal de segunda instância não acolher a tese proposta pela ré, em sede de exceção de incompetência, esta recorreu ao STJ, sustentando que a cláusula contratual de eleição de foro deveria prevalecer.

STJ flexibilizou a regra de competência antes da mudança do CPC

A relatora do recurso especial (REsp), ministra Nancy Andrighi, observou que a possibilidade de pedir a produção antecipada de prova ao juízo do local onde deva ser produzida, prevista no artigo 381, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), não tinha equivalente no CPC/1973, o qual estabelecia como regra geral que a competência para a ação cautelar era do juízo competente para a ação principal (artigo 800 do CPC/1973).

Apesar disso – acrescentou a ministra –, antes mesmo da vigência do CPC/2015, o STJ já vinha admitindo a flexibilização dessa competência em relação aos procedimentos cautelares, sobretudo quando se tratasse de produção antecipada de provas, por uma questão de praticidade.

‘‘A facilitação da realização da perícia prevalece sobre a regra geral do ajuizamento no foro do réu por envolver uma questão de ordem prática, tendo em vista a necessidade de exame no local onde está situado o objeto a ser periciado’’, completou.

A relatora destacou ainda que o artigo 381, parágrafo 3º, do CPC/2015, prevê expressamente que o foro no qual tramitar a ação cautelar de produção de prova não ficará prevento para a futura ação principal.

Assim, segundo a ministra, afasta-se qualquer ideia de prejuízo à parte ré, pois, caso seja ajuizada a ação principal, o foro eleito no contrato – que coincide com o local de sua sede – poderá prevalecer. Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2136190

CONDIÇÃO DE TRANSFERIDO
Trabalhador de navio recrutado e contratado no Brasil conta com a proteção da CLT

Foto: Divulgação

A contratação para trabalho em navio, se realizada em solo brasileiro, atrai a legislação local. A decisão é da 11ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de 2ª Região (TRT-2, São Paulo) ao manter sentença que reconheceu a legislação brasileira como competente para julgar um litígio entre uma trabalhadora admitida no Brasil para prestar serviços a bordo de navios de cruzeiro com bandeira italiana e seus empregadores.

O acórdão destacou que, mesmo em contratos internacionais de trabalho, a contratação no Brasil atrai a jurisdição nacional, nos termos da Lei 7.064/1982 e do artigo 651, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

De acordo com os autos da ação reclamatória, a profissional foi selecionada por agência brasileira. Todo o processo seletivo e as tratativas de contratação ocorreram via internet, quando a trabalhadora ainda se encontrava em solo brasileiro.

Em defesa, as empresas rés alegaram que a Justiça brasileira seria incompetente para julgar o caso. A legislação aplicável seria a italiana, e o foro competente o de Gênova, na Itália. Argumentaram, ainda, que a prestação de serviços ocorreu, em sua maioria, em águas internacionais.

TRT-SP afastou a aplicação da Lei do Pavilhão

No entanto, a desembargadora-relatora Wilma Gomes da Silva Hernandes entendeu que o vínculo jurídico e as tratativas iniciais ocorreram em território brasileiro, o que assegura o direito à legislação trabalhista mais favorável.

A magistrada esclareceu que, a partir da reforma da Lei 7.064/1982, realizada em 2009, o empregado contratado por empresa sediada no Brasil para prestar serviços no exterior passou a ser considerado transferido, ‘‘situação na qual se enquadra a autora’’.

A julgadora também afastou, expressamente, a aplicação da Lei do Pavilhão, tratado segundo o qual a legislação aplicável para esses conflitos é a do país da bandeira da embarcação.

Segundo a relatora, esta lei não se impõe de forma absoluta, sobretudo na hipótese dos autos, em que a contratação da reclamante se efetivou em território brasileiro. ‘‘Não há como afastar o critério da territorialidade apenas em virtude do registro das embarcações em outros países’’, concluiu. Redação Painel de Riscos com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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ATOrd 1001317-46.2023.5.02.048 (São Vicente-SP)