AÇÃO REGRESSIVA
Empresa não tem de ressarcir o INSS com base em norma inexistente à época do acidente de trabalho

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O empregador não pode ser responsabilizado pelo descumprimento de medidas de prevenção inexistentes à época do acidente de trabalho que culminou com o afastamento do empregado. Afinal, é impossível exigir-lhe a adoção de medidas que só seriam previstas numa evolução normativa posterior.

Com a prevalência desse fundamento, a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), por maioria, julgou improcedente uma ação regressiva acidentária manejada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra a FRS S/A Agro Avícola Industrial (sucessora da Doux Frangosul S/A), reformando a sentença proferida pela 2ª Vara Federal de Passo Fundo (RS).

O desembargador Cândido Alfredo Silva Leal Junior, voto divergente vencedor nesse julgamento, observou que o laudo pericial, embora aponte falhas na aplicação de medidas ergonômicas preventivas por parte da empresa, indica, como fundamento para a configuração de tais falhas, as disposições contidas na Norma Regulamentadora 36 (NR 36) do Ministério do Trabalho.

‘‘A referida norma (NR-36), entretanto, entrou em vigor apenas em 2013, através da publicação da Portaria 555, de 18 de abril de 2013, enquanto o benefício que se pretende o ressarcimento […] foi concedido no período de 30/01/2011 a 30/01/2012; ou seja, em período anterior à vigência da norma’’, fulminou no voto, acolhendo a apelação da empresa.

Síndrome do manguito rotador

Desembargador Cândido Alfredo Leal Júnior
Foto: Sylvio Sirangelo/ACS/TRF-4

Uma auxiliar de produção da sala de cortes de frango, contratada em setembro de 2008, acabou afastada de suas funções por doença incapacitante conhecida como ‘‘síndrome do manguito rotador no ombro direito’’, decorrente das condições de trabalho. É que o exercício da atividade exigia esforços repetitivos em função do trabalho de desossa, de recorte de peças de carne de frango (sassami) e do embalamento do produto.

Com o contrato de trabalho suspenso, ela passou a receber o benefício previdenciário de auxílio-doença, no período entre 30 de janeiro de 2011 a 30 de janeiro de 2012.

Segundo o INSS, a 4ª Vara do Trabalho de Passo Fundo (processo 0000435-66.2012.5.04.0664) reconheceu a culpa da empresa pela doença incapacitante, tanto que a condenou ao pagamento de indenização, por ter dado causa ao surgimento da incapacidade.

Na peça inicial, a autarquia federal discorreu sobre a culpa da empresa e o descumprimento das normas de proteção à saúde e à segurança no meio ambiente laboral, o que lhe daria direito à reparação pelo pagamento do benefício previdenciário.

Vitória do INSS no primeiro grau

Em análise de mérito, o juízo da 2ª Vara Federal de Passo Fundo julgou a ação regressiva acidentária parcialmente procedente, condenando a empresa a ressarcir ao INSS os valores pagos em razão da concessão do auxílio-doença.

Tomando como base o laudo da perícia médica, o juiz federal Fabiano Henrique de Oliveira entendeu que ficou comprovada a culpa do empregador, caracterizada pelo nexo de causalidade entre a doença alegada e o trabalhado executado.

Ação regressiva acidentária

A ação regressiva acidentária é aquela movida pelo INSS contra o empregador, para ressarcir os cofres públicos dos custos com indenização dos trabalhadores afastados de suas funções em razão de comprovadas negligências ou acidentes ocorridos no ambiente de trabalho, por culpa deste.

No âmbito previdenciário, a regra aplicável é a do artigo 120 da Lei 8.213/91, redigida nestes termos: ‘‘Nos casos de negligência quanto às normas-padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis’’.

Noutras palavras, o INSS busca recompor os cofres públicos dos valores que possuem natureza jurídica de recursos públicos.

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5011671-23.2014.4.04.7104 (Passo Fundo-RS)

 

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PERDA DE TEMPO
TJSC aplica teoria do desvio produtivo para ressarcir cliente que sofreu com fornecedor

O tempo útil do consumidor tem sido objeto de reflexão para os operadores do Direito. A preocupação com a verdadeira via-crúcis que um cliente lesado precisa percorrer em busca de seus direitos culminou no desenvolvimento da teoria do desvio produtivo – análise da perda de tempo decorrente de atos e omissões reiterados dos fornecedores de produtos e serviços. Com o objetivo único de otimizar o lucro, empresas descumprem os deveres da boa-fé e da ética e deixam de observar os princípios e regras que regem as relações contratuais.

Nesse sentido, a 3ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) reformou sentença e julgou procedente ação de repetição de indébito e indenização por danos morais ajuizada por cliente prejudicada pela operadora de telefonia e internet Claro S/A.

A prestadora de serviços lhe ofereceu um plano pós-pago para linha móvel, no valor mensal de R$ 55, e informou que bastava realizar a portabilidade online do chip para que fossem cobrados em fatura única os serviços de TV, internet, telefonia fixa e móvel.

Logo na primeira conta, no entanto, a cliente recebeu uma fatura avulsa no valor de R$ 133, sob a rubrica ‘‘plano + dependente’’, diversamente do que lhe foi prometido.

Após inúmeras ligações e idas à loja física da operadora em Blumenau (SC), nada foi resolvido, pois a empresa alegava que o plano de R$ 55 nunca existiu e que a cliente deveria abrir reclamação no setor do plano de TV para acoplar os valores numa única conta. Este setor, por sua vez, respondeu que era a própria empresa de telefonia quem deveria fornecer uma conta única de todos os serviços.

Para não ser coagida a pagar o excessivo valor mensal, a autora cancelou o plano, sob pena de prejudicar sua subsistência. Entretanto, a Claro cobrou multa pela quebra de fidelidade, emitiu normalmente as faturas dos serviços cancelados, com valores aleatórios e nenhum critério de cobrança, seja pela TV, seja pela internet, sempre acima do estipulado em contrato.

No juízo de origem, a sentença garantiu à cliente a rescisão do contrato e a restituição dos valores cobrados pela empresa, mas não a indenização por danos morais. Assim, a defesa da consumidora recorreu da decisão inicial neste aspecto.

Para o desembargador-relator do recurso de apelação no TJSC, a situação fática exposta pela cliente permite o reconhecimento do dever compensatório por desvio de tempo produtivo da consumidora.

‘‘A Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor (ou tempo útil perdido), neste contexto, traz ao panorama a tutela do direito individual do tempo livre do consumidor, que, quando violado, é capaz de atrair o dever reparatório’’, frisa o relator.

O montante da indenização por danos morais foi arbitrado em R$ 3 mil. O voto do relator foi seguido de maneira unânime pelos demais integrantes da 3ª Câmara de Direito Civil. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJSC.

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5009802-69.2020.8.24.0008 (Blumenau-SC)

DANO MORAL
Livelo é condenada por não creditar pontos a consumidor após promoção

A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, diz o artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Por afronta a este dispositivo, a 26ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve sentença da 4ª Vara Cível de Sorocaba que condenou a Livelo S/A a computar os pontos acumulados por um cliente após compra promocional no site da Casas Bahia e a indenizá-lo por danos morais após recusa no crédito do benefício.

O valor da reparação moral foi reduzido de R$ 7 mil para R$ 5 mil. O colegiado também determinou o pagamento, a título de danos materiais, de R$ 374.

Oferta atraente

Segundo os autos, o consumidor foi atraído por oferta da ré que garantia seis pontos para cada real gasto em loja virtual. Ele adquiriu um refrigerador com o objetivo de acumular pontos a serem utilizados no aluguel de um veículo.

Entretanto, a ré não creditou o benefício, alegando que a promoção só era válida para compras ‘‘vendidas e entregues’’ pela própria loja, e não para vendas via marketplace; ou seja, quando fornecedores terceiros utilizam a plataforma da loja para negociar seus produtos.

Em razão disso, o consumidor precisou utilizar recursos próprios para a locação do automóvel.
O relator do recurso de apelação no TJSP, desembargador Morais Pucci, salientou que a oferta não foi clara em relação ao conceito de compra via marketplace. Afinal, de acordo com os artigos 36 e 37 do CDC, a propaganda deve ser clara e precisa.

‘‘A propaganda veiculada pela ré induz o consumidor a acreditar que, clicando no link oferecido em sua página da Livelo, e adquirindo produtos ali oferecidos, haveria crédito de 6 pontos a cada real gasto. É verdade que a propaganda informa, também, que a compra por meio do Marketplace pontua 1 ponto a cada real gasto (e não 6 pontos); no entanto, a informação não é clara sobre o conceito de compra por meio de marketplace. Diante dos fatos, a ré deve cumprir a oferta veiculada, creditando os 6 pontos por real gasto ao autor’’, escreveu no acórdão.
Também participaram do julgamento os desembargadores Carlos Dias Motta e Maria de Lourdes Lopez Gil.

A decisão foi unânime. Redação Painel de Riscos com informações da Comunicação Social do TJSP.

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1010644-56.2022.8.26.0602 (Sorocaba-SP)

RISCO DO PATRÃO
Vendedor tem direito à comissão sobre produtos devolvidos, decide TRT-SC

Após a efetivação da venda, caracterizada esta pela entrega do bem, é vedado às empresas o desconto ou estorno das comissões do empregado incidentes sobre mercadorias devolvidas pelo cliente, tanto em face do cancelamento da venda quanto da troca do produto adquirido.

O entendimento é da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina) em ação na qual o empregador foi condenado a restituir as comissões descontadas de um trabalhador pelas devoluções ou cancelamentos de compras.

O caso aconteceu em Balneário Camboriú (SC) envolvendo a fabricante de bebidas Heineken. O autor procurou a Justiça do Trabalho alegando que seu salário consistia em uma parte fixa e outra variável, dependente do cumprimento de metas estabelecidas pela empresa.

O autor reclamou que os critérios para atingir as metas eram pouco claros e que elas aumentavam ao longo do mês. Além disso, afirmou ter sofrido prejuízos mensais devido a descontos indevidos em suas comissões.

Já a empresa negou as alegações do vendedor, afirmando que comissões eram pagas conforme estabelecido pela legislação trabalhista. Alegou, também, que os descontos em comissões ocorriam apenas em casos de negligência por parte do vendedor, como falhas em verificar o estoque disponível.

Juíza Karem Mirian Didoné
Foto: Fabio Borges/TRT-SC

A responsável pelo caso na 1ª Vara do Trabalho de Balneário Camboriú, juíza Karem Mirian Didoné, julgou procedente o pedido do trabalhador para restituição de valores descontados.

‘‘A prova oral produzida corrobora a alegação do autor de que havia estorno de comissões em caso de cancelamento da compra e devolução de produtos, situação que viola o direito do empregado, que despende esforços com a venda e deixa de receber a devida contraprestação’’, ressaltou a magistrada na sentença.

Karem Didoné concluiu a decisão afirmando que, mesmo se prevista em contrato entre empregador e empregado, a prática continua sendo ilegal.

Risco exclusivo do empregador

Insatisfeita com o desfecho no primeiro grau, a empresa recorreu, insistindo que o trabalhador perdia comissões apenas em certas circunstâncias, como quando a mercadoria não era entregue.

No entanto, o relator do caso na 1ª Turma do TRT-SC, desembargador Roberto Luiz Guglielmetto, não aceitou o argumento da defesa. Segundo o acórdão, com base no depoimento das testemunhas, a comissão era retida dos vendedores em todas as situações de devolução de produtos, contrariando a alegação da empresa.

Ao fundamentar a decisão, o magistrado citou o artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), segundo o qual o risco do empreendimento econômico é exclusivo do empregador. Guglielmetto também mencionou a Súmula de Jurisprudência nº 88 do Regional catarinense, segundo a qual a venda se concretiza com  entrega da mercadoria.

Des. Roberto Guglielmetto Foto: Secom/TRT-12

‘‘Dado que o risco do empreendimento pertence ao empregador, após ultimada a transação, com a entrega do produto, não pode ser atribuído ao obreiro o ônus pelo mero cancelamento da venda e devolução do produto, por iniciativa do cliente, incluindo a troca do produto adquirido’’, frisou o relator.

Ele complementou que a única ressalva à regra acontece quando comprovada a insolvência do comprador, conforme disposto no artigo 7º da Lei nº 3.207/57, mas que essa não seria a hipótese em questão.

A empresa ainda está tentando levar o caso para reapreciação no Tribunal Superior do Trabalho (TST). Na primeira tentativa, o presidente do TRT-SC, desembargador Amarildo Carlos de Lima, negou seguimento ao recurso de revista (RR). Desta decisão, a empresa entrou com agravo, pendente de julgamento. Redação Painel de Riscos com informações de Carlos Nogueira, da Secretaria de Comunicação Social (Secom)/TRT-12.

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ATOrd 0000083-32.2023.5.12.0040 (Camboriú-SC)

MAU PROCEDIMENTO
Dirigente sindical é dispensado por justa causa após dizer em mensagem que empresa era “um lixo”

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) rejeitou o exame do recurso de um motorista da DVM Transportes Ltda., de Umuarama (PR), demitido por justa causa depois de falar mal da empresa ao chefe por WhatsApp e, depois, mostrar as mensagens aos colegas, entre outras atitudes. A Justiça do Trabalho reconheceu que ele cometeu faltas graves que afastaram sua garantia de emprego por ser dirigente sindical.

Estabilidade

O artigo 543, parágrafo 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), garante a dirigentes sindicais a garantia de emprego a partir do momento do registro de sua candidatura ao cargo até um ano após o final do seu mandato. A dispensa só é admitida em caso de falta grave devidamente apurada; ou seja, se for por justa causa.

Faltas graves

O motorista tinha garantia de emprego até 18 de novembro de 2023. Após realizar auditoria interna e suspender o contrato do motorista em 19 de março de 2019, a transportadora pleiteou o reconhecimento judicial de três faltas graves para embasar a justa causa. No pedido, relatou que o empregado já sofrera, desde 2017, diversas advertências por não cumprir normas internas, avariar cargas, fazer horas extras sem autorização e causar prejuízos a terceiros.

‘‘Lixo de empresa’’

A principal falta grave apontada para a justa causa, porém, foram mensagens de WhatsApp em que, com termos ofensivos, o motorista afrontava o chefe com frases como ‘‘mande embora se vc tiver capacidade para isso’’ e dizia que tinha vergonha de dizer que trabalhava em um ‘‘lixo de empresa’’. Para a DVM, isso configuraria ato lesivo à honra e à boa fama do empregador.

Como desdobramento da falta grave, o motorista, no pátio da empresa, teria mostrado as mensagens aos demais colegas e novamente falado mal da empregadora, dizendo que ela não poderia demiti-lo em razão da estabilidade sindical. O ato foi classificado como mau procedimento.

Além disso, ele teria se recusado a abrir conta para receber o salário, atitude considerada insubordinação.

Prints

O juízo de primeiro grau confirmou a justa causa. Com base nas provas apresentadas pela empresa, inclusive prints das telas de celular com as mensagens trocadas com o chefe, e nos depoimentos de testemunhas, a conclusão foi de que os incidentes diziam respeito apenas à esfera individual do trabalhador. Não foi comprovada atuação sindical ou em defesa dos demais trabalhadores nem perseguição pelo mandato sindical.

Histórico

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9, Paraná) manteve a sentença, observando que o empregado já tinha histórico de advertências por descumprir obrigações e, quando passou a exercer mandato sindical, praticou as três faltas graves apontadas pela DVM.

Desproporcional

O motorista tentou rediscutir o caso no TST, reconhecendo que sua conduta foi reprovável, mas ‘‘não foi praticada de má-fé nem acarretou prejuízos à empresa’’. Sustentou também que não foi observada a gradação pedagógica das penas e que a dispensa foi desproporcional e inadequada.

Gradação das penalidades

A relatora do recurso no TST, desembargadora convocada Margareth Rodrigues Costa, observou que o TRT analisou os fatos e as provas da causa e verificou a reiteração de condutas inadequadas no ambiente de trabalho. Também constatou a gradação das penalidades pelo empregador, que tentou corrigir a conduta do trabalhador aplicando as punições de advertência e suspensão. Na avaliação da magistrada, invalidar essa conclusão demandaria reexame de fatos e provas, não cabível na esfera do TST.

A relatora ressaltou que os TRTs são soberanos na avaliação do conjunto fático-probatório e que ao TST, como corte revisora, cabe somente a apreciação das questões de direito. Com informações da jornalista Lourdes Tavares, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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AIRR-436-05.2019.5.09.0749