DIREITO DE PREFERÊNCIA
Sócio pode adquirir quotas penhoradas antes da apresentação do balanço especial

Ministra Nancy Andrighi, Foto: Agência CNJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o sócio pode exercer o direito de preferência na aquisição de quotas sociais penhoradas antes da realização do balanço especial, sendo incabível a rejeição imediata do seu requerimento.

Com essa posição, o colegiado determinou ao juízo de primeiro grau que intime uma sociedade empresária e os demais sócios para se manifestarem quanto à intenção de compra.

No caso, houve a penhora das ações ordinárias nominativas de uma sociedade, a qual foi intimada a apresentar balanço especial, conforme previsão do artigo 861, inciso I, do Código de Processo Civil (CPC). Antes que o procedimento fosse realizado, entretanto, um dos sócios requereu a transferência das quotas para si, mas o pedido foi rejeitado judicialmente.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) considerou a iniciativa prematura e condicionou a transferência à prévia realização do balanço especial. No recurso especial (REsp) aviado ao STJ, o sócio sustentou que poderia depositar o valor correspondente às ações penhoradas e postular a sua transferência imediata, independentemente do balanço a ser feito pela sociedade.

Manifestação de interesse pode ocorrer antes de intimação da sociedade

A relatora do REsp, ministra Nancy Andrighi, explicou que o ordenamento jurídico brasileiro admite a penhora de quotas e ações de sociedades empresárias desde a edição da Lei 11.382/2006. Quando isso ocorre – prosseguiu –, a Justiça define um prazo não superior a três meses para que a pessoa jurídica seja intimada, apresente balanço especial e ofereça as quotas ou ações aos demais sócios, observando o direito de preferência legal ou contratual.

No entanto, a relatora lembrou que existe a possibilidade de algum sócio se interessar pela aquisição das quotas penhoradas antes da intimação da sociedade. Nessa hipótese, ela destacou que ‘‘o juiz deverá intimar as partes do processo – exequente e executado – a respeito da proposta apresentada e deverá dar ciência à sociedade, para evitar burla a eventual direito de preferência convencionado no contrato social’’, detalhou.

CPC dispõe sobre cabimento do balanço especial e da avaliação judicial

Segundo a ministra, o artigo 861, inciso I, do CPC, exige a apresentação do balanço especial pela sociedade para a definição do valor correspondente às quotas ou ações objeto de penhora. ‘‘Todavia, se credor e devedor anuírem com o montante indicado pelo sócio e não houver oposição, será viável o exercício imediato do direito de preferência pelo sócio interessado’’, observou a ministra.

Em caso de impugnação do valor oferecido pelo sócio, a relatora alertou que será necessário aguardar o transcurso do prazo definido pelo juiz para apresentação do balanço especial. Ainda assim, apontou a ministra, o juiz poderá dispensar o procedimento por requerimento de qualquer dos interessados e determinar a realização de avaliação judicial (artigo 870 do CPC), se entender que essa medida é mais adequada.

‘‘Não havendo impugnação quanto ao valor ofertado, será viável o exercício imediato do direito de preferência pelo recorrente, com a consequente transferência das quotas à sua titularidade, observada a previsão do artigo 880, parágrafo 2º, do CPC’’, concluiu Nancy Andrighi. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Clique aqui para ler o acórdão

REsp 2101226

EQUIPARAÇÃO
Tele não prova perfeição técnica e terá de pagar diferenças salariais a empregado que fazia a mesma função do paradigma

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O que de fato importa para decidir acerca de um pedido de equiparação salarial são as atividades efetivamente executadas pelos empregados, e não a denominação do cargo, como sinaliza o item III da Súmula 6 do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

O entendimento, já pacificado, levou a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina) a manter sentença que, no aspecto, julgou procedente o pedido de equiparação salarial feito por um ex-funcionário da V.Tal Rede Neutra de Telecomunicações S. A., que presta  serviços para a operadora OI S. A. (em recuperação judicial). Ambas foram condenadas solidariamente.

‘‘A ré não se desincumbiu do ônus de provar a maior perfeição técnica do paradigma, conforme alegado, sendo que eventual experiência adquirida anteriormente ao exercício da função não é fato impeditivo à equiparação salarial. Ante o exposto, nego provimento ao recurso’’, definiu, no acórdão, o relator do recurso ordinário, desembargador Nivaldo Stankiewicz.

Mesmas tarefas, diferentes denominações

Na ação reclamatória ajuizada na 3ª Vara do Trabalho de Florianópolis, o reclamante alegou que, nos 10 anos de contrato de trabalho, desempenhou as mesmas tarefas que o empregado-paradigma – ‘‘suporte técnico de operação e manutenção de centrais telefônicas’’ –, mas recebia salário menor.

Esclareceu que a sua função era de ‘‘Técnico Telecom I’’, enquanto a do paradigma, de ‘‘Especialista Telecom II’’. Assim, no bojo de outros pedidos vertidos na peça inicial, exigiu o pagamento das diferenças salariais por equiparação.

A reclamada, em sua defesa, disse inexistir identidade de funções, mesma produtividade, tampouco mesma perfeição técnica apta a conferir ao autor a pretensa equiparação salarial. Negou, ainda, que o reclamante ocupava a mesma função do paradigma. Por consequência, não se poderia falar em direito à diferença salarial.

Paradigma confirmou as alegações

O juiz do trabalho Alessandro da Silva observou, citando a doutrina de Arnaldo Süssekind, que o mais importante são as atividades executadas pelos ‘‘equiparandos’’, independentemente da denominação do cargo.

No caso dos autos, o julgador destacou que o ‘‘trabalhador-paradigma’’ – única testemunha ouvida no processo – deixou claro que ambos executavam as mesmas tarefas, sem distinção. E que a diferença de salário decorria do fato de que já trabalhavam para a Alcatel quando foram admitidos pela Oi, sendo que, à época (2013), foi mantido o desnível salarial – mas as tarefas eram idênticas.

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

ATOrd 0000332-25.2023.5.12.0026 (Florianópolis)

 

COLABORE COM ESTE PROJETO EDITORIAL.

DOE PELA CHAVE-PIX: jomar@painelderiscos.com.br

MANDADO DE SEGURANÇA
Trabalhadora com filho autista pode sacar FGTS para tratamento médico, decide TRF-4

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacificou entendimento de que o rol de casos previsto no inciso XXII do artigo 20 da Lei 8.036/90 – que autoriza a liberação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para dependentes com doença rara – não é taxativo. Antes, o dispositivo deve interpretado em consonância com os princípios do ordenamento constitucional e com os fins sociais a que a lei se dirige.

Norteada por este entendimento, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) derrubou sentença da 6ª Vara Federal de Porto Alegre que extinguiu mandado de segurança (MS) impetrado pela mãe de uma criança autista, que teve indeferido o pedido para saque do FGTS numa agência da Caixa Econômica Federal (CEF) de Canoas (RS).

O relator que acolheu a apelação da mãe, juiz federal convocado Sérgio Renato Tejada Garcia, explicou que a situação da impetrante estaria, em princípio, contemplada no dispositivo, caso a doença rara constasse da lista disponibilizada pelo Ministério da Saúde – o que não ocorre.

No entanto, destacou, a jurisprudência reconhece que as situações apresentadas não integram rol taxativo de casos em que o levantamento do FGTS é possível. Ou seja, a norma legal comporta ‘‘interpretação extensiva’’, pela impossibilidade concreta de o legislador prever todas as doenças consideradas graves, contagiosas e incuráveis, a fim de abarcar todas as situações em que o trabalhador necessita de proteção.

Segundo Garcia, o parágrafo 2º do artigo 1º da Lei 12.764/12 (que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, reconhece o autista como ‘‘pessoa com deficiência’’ para todos os efeitos legais’’. E, como sinaliza o artigo 3º, inciso III, com direito à atenção integral às suas necessidades de saúde.

‘‘Por tais razões, comprovada a condição de portador de doença grave do dependente da apelante, bem como a necessidade de utilização dos recursos depositados em sua conta vinculada ao FGTS para o custeio de tratamento médico, é de se reformar a sentença para afastar a extinção do feito [processo] e, no mérito, julgar procedente o pedido’’, decretou o juiz-relator no acórdão.

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

MS 5008161-60.2023.4.04.7112 (Porto Alegre)

 

COLABORE COM ESTE PROJETO EDITORIAL.

DOE PELA CHAVE-PIX: jomar@painelderiscos.com.br

FRAUDE CONTRATUAL
Fisioterapeuta contratada como sócia obtém reconhecimento de vínculo empregatício

Foto ilustrativa: Breno Esaki/Agência Saúde DF

O vínculo de emprego estará caracterizado quando diante do labor prestado por uma pessoa natural, de forma pessoal, não eventual, onerosa e subordinada, conforme dispõe os artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Com essa configuração, a 29ª Vara do Trabalho de São Paulo reconheceu o vínculo de emprego entre a Afint Assistência Fisioterápica Integral Ltda. e uma fisioterapeuta que era enquadrada como sócia. Entretanto, ficou claro que a profissional atuava como empregada em regime de 60 horas de descanso para cada 12 horas de trabalho.

Por meio de prova testemunhal, obtida de outras fisioterapeutas que trabalhavam no mesmo modelo, o juiz Ramon Magalhães Silva, prolator da sentença, constatou todos os requisitos para a formação de vínculo. O único elemento que poderia afastá-lo seria o fato de as testemunhas terem dito que poderiam se fazer substituir.

No entanto, as testemunhas não relataram a frequência com que isso ocorria. ‘‘A substituição da prestação dos serviços eventual e consentida não afasta a pessoalidade’’, salientou o magistrado na sentença.

Outros fatores denotam a irregularidade na contratação: a sócia-proprietária tinha cota social 76,5 vezes superior à da reclamante e a remuneração era paga unicamente como contrapartida do trabalho realizado em plantões, sem que houvesse distribuição de lucros ou assunção de prejuízos.

Por fim, a empresa era formada por cerca de 60 fisioterapeutas, todos sócios, sem que a companhia tivesse um único empregado. Com isso, o magistrado concluiu que houve fraude na contratação da reclamante no fenômeno da ‘‘socialização’’.

A autora obteve ainda reconhecimento de adicional de insalubridade em grau médio, uma vez que laudo pericial comprovou a atuação em ambiente hospitalar com risco biológico, sendo os equipamentos de proteção individual (EPIs) usados insuficientes para neutralizá-los.

Com a condenação, a ré terá que pagar todas as verbas trabalhistas que seriam devidas a uma empregada regularmente contratada, incluindo 13º salário integral, férias + 1/3, FGTS, além de anotação do vínculo na carteira de trabalho. Além disso, terá que arcar com adicional de insalubridade de 20% com reflexos e apresentar o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) das atividades, constando o risco ambiental reconhecido na decisão.

Da sentença, ainda cabe recurso ordinário ao Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo).  Com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

Clique aqui para ler a sentença

ATOrd 1000852-35.2023.5.02.0029 (São Paulo)

DISCRIMINAÇÃO PRESUMIDA
Técnico de enfermagem dispensado após tentar suicídio será reintegrado e indenizado em R$ 20 mil

Foto ilustrativa Coren-ES

Dispensar trabalhador com transtornos psiquiátricos, com histórico de tentativa de suicídio, é conduta discriminatória que fere direitos de personalidade elencados no inciso X do artigo 5º da Constituição – privacidade, intimidade, honra e imagem –, ensejando reparação moral. Isso além de violar a Súmula 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Por estes fundamentos, a Sétima Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais decidiu que um técnico de enfermagem deve ser reintegrado ao trabalho em função compatível ao seu quadro clínico e ainda receber indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil após ter sido dispensado de forma discriminatória.

A decisão do colegiado, por maioria, reforma sentença proferida pela 7ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que havia julgado improcedentes os pedidos embutidos na ação reclamatória ajuizada contra a Gestho – Gestão Hospitalar S/A.

Transtornos psiquiátricos

Segundo o processo, o empregado foi diagnosticado com transtornos psiquiátricos e ficou afastado por quatro dias após ‘‘tentativa de autoextermínio’’ por ingestão de medicamentos. Quatro dias após o retorno ao trabalho, ele foi dispensado sem justa causa. O prontuário médico anexado ao processo revelou que a tentativa de suicídio foi precedida de outra, dentro do último mês.

A instituição hospitalar, situada em Belo Horizonte, alegou motivos econômicos para a rescisão contratual. Entretanto, ao examinar o recurso interposto pelo trabalhador, o juiz convocado Marcelo Oliveira da Silva, como relator, destacou que o hospital deveria ter apresentado prova de sua versão, o que não fez.

Para o magistrado, a rescisão contratual, dias após a ‘‘tentativa de autoextermínio’’ e dos diagnósticos psiquiátricos do trabalhador, caracteriza ato discriminatório.

Súmula 443 do TST

O entendimento se amparou na Súmula 443 do TST, segundo a qual ‘‘presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito’’, concedendo ao trabalhador o direito à reintegração ao emprego. O relator registrou que os transtornos psiquiátricos que acometem o autor apresentam-se de forma que usualmente causam estigma ou preconceito ao portador.

‘‘Impossível olvidar que o empregado, diagnosticado com doença psíquica, passa a ser percebido como um problema para o empregador, pois poderia não mais produzir como antes, e eventualmente ocorreriam afastamentos por tal motivo’’, concluiu o juiz relator. Houve recurso de revista, e o processo foi remetido ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-3.

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

ATSum 0010281-52.2023.5.03.0017 (Belo Horizonte)