DESAFIOS FÍSICOS
Empresas de transporte de valores acionam STF sobre cota de contratação de PcD e aprendizes

Ministro Gilmar Mendes é o relator
Foto: Carlos Moura/STF

A Federação Nacional das Empresas de Transporte de Valores (Fenaval) apresentou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 7668) no Supremo Tribunal Federal (STF) para pedir que os postos de vigilante armado de transporte de valores sejam excluídos do cálculo de vagas destinadas a pessoas com deficiência (PcD) e jovens aprendizes, em razão da natureza da atividade e dos altos riscos a que essas pessoas estariam submetidas.

A ação foi distribuída ao ministro Gilmar Mendes, que decidiu levar o julgamento diretamente ao Plenário e requisitou informações às autoridades envolvidas.

Segundo a Fenaval, a função exige capacitação específica, além de idade mínima de 21 anos. Argumenta que a própria Polícia Federal (PF), organizadora dos cursos de formação de vigilante, tem se manifestado há mais de 20 anos sobre a impossibilidade de PcD concluírem com êxito o curso de formação para trabalhar em carros fortes, diante dos desafios físicos de parte das disciplinas, que requerem, entre outras habilidades, agilidade física, coordenação motora, flexibilidade e força de ambos os lados do corpo.

A Federação afirma que os sindicatos profissionais e patronais do setor já têm excluído da base de cálculo dos cotistas o número de vigilantes armados. A prática, porém, vem sendo questionada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).

Por isso, pede que o STF suspenda parcialmente a eficácia do artigo 93 da Lei 8.213/1991 (que obriga empresas com 100 ou mais empregados a destinar de 2% a 5% dos seus cargos a beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência) e do artigo 429 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que trata da contratação de aprendizes, em relação às empresas do setor. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

ADI 7668

ADVOCACIA PREDATÓRIA
MP tem legitimidade para questionar honorários abusivos em ações previdenciárias

Foto: Divulgação INSS

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o Ministério Público (MP) tem legitimidade para propor ação civil pública (ACP) com o objetivo de discutir honorários advocatícios supostamente abusivos cobrados de pessoas hipossuficientes para o ajuizamento de ações de Direito Previdenciário.

Para o colegiado, o profissional que cobra valores excessivos pela prestação do serviço de advocacia, além de prejudicar a subsistência do cliente, vai contra a lógica do Direito Previdenciário – situação que ultrapassa a esfera dos interesses particulares.

Na origem do caso julgado pela Terceira Turma, o Ministério Público de Rondônia (MPRO) propôs ACP contra dois advogados, na tentativa de inibir um esquema de captação de clientes, beneficiários da Previdência Social, e de cobrança de honorários supostamente excessivos.

O juízo de primeiro grau julgou a ação parcialmente procedente e tornou sem efeito a cobrança de honorários que ultrapassasse 30% do valor do benefício previdenciário. A sentença também anulou cláusulas contratuais que previam o recebimento integral dos honorários nas hipóteses de rescisão ou distrato. E mais: determinou que os alvarás expedidos em nome dos advogados fossem de apenas 30% do valor depositado em juízo. O Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) manteve a sentença.

Em recurso especial (REsp) dirigido ao STJ, os advogados alegaram a ilegitimidade do MPRO para propor esse tipo de ação, por envolver interesses individuais e particulares, e sustentaram que não haveria vício nos contratos.

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Imprensa/TSE

Usuários da Previdência Social estão em situação de vulnerabilidade

Para a relatora do caso na Terceira Turma do STJ, ministra Nancy Andrighi, o contrato de prestação de serviços advocatícios está inserido no âmbito do Direito Privado, mas, quando pessoas em situação de hipossuficiência e vulnerabilidade são induzidas de forma recorrente a aceitar a cobrança abusiva de honorários, o problema ultrapassa os limites da esfera meramente individual.

Segundo a ministra, o caso ganha maior importância por envolver demandas previdenciárias, pois ‘‘geralmente são pessoas em situação de hipervulnerabilidade social, econômica e sanitária que estão buscando o poder público para garantir meios de sobrevivência’’.

Nancy Andrighi observou que, embora os beneficiários do sistema previdenciário não sejam apenas os idosos, o artigo 74 do Estatuto da Pessoa Idosa dá ao Ministério Público competência para instaurar inquérito civil e ação civil pública para proteção desse público, que compõe a maioria dos segurados.

Ofensa ao sistema previdenciário atinge toda a sociedade

Conforme acrescentou a ministra, a advocacia que visa prejudicar o propósito da Previdência Social é uma ofensa ao próprio sistema previdenciário – bem jurídico de interesse de toda a sociedade –, o que atrai a competência do MP.

‘‘A modalidade de advocacia predatória que obsta o propósito da Previdência Social de mantença de seus segurados, ao atuar com desídia para aumentar a sua remuneração e ao cobrar honorários que prejudicam a subsistência dos beneficiários, desvirtua a lógica do direito previdenciário’’, concluiu a relatora. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2079440

PROMESSA DE CONTRATAÇÃO
Coca-Cola é condenada a pagar dano moral por abortar admissão de motorista no RS

Comete ato ilícito o empregador que dá trâmite a todos os procedimentos legais para a admissão de um empregado, com sinais inequívocos de que pretendia contratá-lo, e depois volta atrás em sua decisão sem motivo razoável, frustrando legítima expectativa.

Por vislumbrar esta conduta patronal, a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) manteve condenação em danos morais, pela perda de uma chance, da SPAL Indústria Brasileira de Bebidas S/A (produtos Coca-Cola), prejudicando um trabalhador que se encontrava em boa situação funcional no antigo emprego. O colegiado manteve o quantum reparatório arbitrado pela Vara do Trabalho de São Gabriel: o valor de um ano de salário que seria recebido pelo trabalhador, cerca de R$ 30 mil.

Segundo o processo, o reclamante – que deveria ter sido contratado como motorista-entregador – recebeu uma proposta de emprego da Coca-Cola e a confirmação de que seria admitido. Por isso, ele pediu demissão da São Gabriel Saneamento S.A., onde trabalhou por mais de cinco anos.

Em contestação aos pedidos embutidos na reclamatória, a empresa alegou que não contratou o autor porque o irmão dele também trabalhava no local, na função de auxiliar de motorista. Entretanto, apurou-se, no decorrer do processo, que o código de ética da empresa não proíbe a contratação de familiares, apenas ‘‘recomenda’’ que não haja relações hierárquicas entre estes.

Informações sobre parentesco

Mensagens de WhatsApp trocadas com o setor de recursos humanos da fábrica, em Santa Maria (RS), comprovaram que o motorista informou sobre o parentesco no primeiro formulário remetido à empresa. Mesmo assim, na sequência, foram enviados os demais documentos exigidos, realizado o exame toxicológico e aberta a conta-salário no banco. Ficou definido até o dia de ‘‘integração’’, primeiro dia de trabalho.

Testemunhas ainda afirmaram que o trabalhador era um ótimo profissional e estimado por todos na empregadora anterior. A saída aconteceu apenas pela proposta da ré.

Para a juíza Fabiana Gallon, da VT de São Gabriel, foi comprovada a perda de chance e o ato ilícito da indústria, uma vez que não havia a proibição no código de ética para a contratação de parentes. ‘‘Tenho por provado que o reclamante se submeteu a processo seletivo junto à reclamada, a qual deu claras indicações de que ele seria contratado, o que o levou a pôr término ao vínculo de emprego que possuía na época’’, disse a magistrada na sentença.

Desembargador João Paulo Lucena
Foto: Secom/TRT-4

A parte reclamada recorreu ao Tribunal para afastar a condenação ou reduzir o valor da indenização, mas não obteve êxito. O relator do acórdão, desembargador João Paulo Lucena, destacou o correto e adequado exame e valoração das provas.

‘‘Veja-se que em nenhum momento durante todo o trâmite de solicitação de documentos é informado ao candidato que haveria tal impedimento de contratação. Não se trata de impedimento legal, senão que apenas norma interna da empresa (que, conforme bem fundamentado na origem, sequer aponta para total impeditivo, senão que apenas consta o verbo ‘evitar’ no código interno), que foi revelada ao reclamante somente ao final do processo, quando já encaminhado para contratação’’, ponderou Lucena.

Para o magistrado, se não fosse o ato ilícito, o trabalhador poderia ter alcançado uma posição jurídica mais vantajosa. ‘‘Se razoável, séria e real, mas não fluida ou hipotética, a perda da chance é tida por lesão às justas expectativas do indivíduo, então frustradas’’, afirmou o relator no acórdão que manteve a sentença.

Participaram do julgamento o desembargador André Reverbel Fernandes e o juiz convocado Roberto Antônio Carvalho Zonta.

Ainda cabe recurso da decisão. Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia/Secom/TRT-4.

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ATOrd 0020142-25.2023.5.04.0861 (São Gabriel-RS)

INADIMPLÊNCIA CONTRATUAL
Credor pode usar e-mail para cumprir exigência de notificação do devedor fiduciante

Se o credor fiduciário apresentar prova de recebimento do e-mail encaminhado ao endereço eletrônico fornecido no contrato de alienação fiduciária, estará cumprida a exigência legal de notificação extrajudicial para o ajuizamento da ação de busca e apreensão do bem financiado, pois tais requisitos são os mesmos da carta registrada com aviso de recebimento (AR). O entendimento é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Segundo o ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso especial (REsp) em julgamento, ‘‘não é razoável exigir, a cada inovação tecnológica que facilite a comunicação e as notificações para fins empresariais, a necessidade de uma regulamentação normativa no Brasil para sua utilização como prova judicial, sob pena de subutilização da tecnologia desenvolvida’’.

No caso em discussão, o Banco Hyundai Capital Brasil S. A. ajuizou ação de busca e apreensão de automóvel contra o devedor, pois este deixou de pagar as parcelas do financiamento, o que acarretou o vencimento antecipado das obrigações.

Após o juízo de primeiro grau julgar o processo extinto, sem resolução do mérito, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) negou provimento à apelação, por entender que a notificação feita por e-mail não está em consonância com o disposto no parágrafo 2º do artigo 2º do Decreto-Lei 911/1969, não sendo válida para a constituição do devedor em mora. A corte local afirmou ainda que não era possível ter certeza quanto ao recebimento da mensagem.

Ministro Antonio Ferreira foi o relator
Foto: Sérgio Amaral/Imprensa STJ

Notificação extrajudicial assegura ciência dos desdobramentos da inadimplência

O ministro Antonio Carlos Ferreira observou que, embora a mora decorra da não quitação da parcela na data do vencimento, o legislador determinou ao credor uma obrigação prévia ao ajuizamento da ação de busca e apreensão do bem móvel alienado fiduciariamente: a notificação extrajudicial do devedor (artigos 2º, parágrafo 2º, e 3º do Decreto-Lei 911/1969).

Para o ministro, essa notificação é muito importante porque assegura ao devedor a plena ciência dos desdobramentos de sua inadimplência contratual, permitindo-lhe agir de forma proativa para regularizar sua situação financeira. ‘‘A notificação possibilita ao devedor defender seus próprios interesses, promovendo transparência e facilitando soluções amigáveis entre as partes envolvidas’’, destacou no voto.

O magistrado lembrou que, conforme definido pela Segunda Seção em julgamento de recurso repetitivo (REsp 1.951.662), na ação de busca e apreensão de bem financiado com alienação fiduciária, é suficiente para comprovar a mora o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no contrato, independentemente de quem a tenha recebido.

‘‘A par desses dois requisitos – notificação enviada para o endereço do contrato e comprovação de sua entrega efetiva –, é viável explorar outros possíveis meios de notificação extrajudicial que possam legitimamente demonstrar, perante o Poder Judiciário, o cumprimento da obrigação legal para o ajuizamento da ação de busca e apreensão do bem’’, declarou.

Houve uma ampliação das possibilidades de notificação extrajudicial

O relator ainda ressaltou que, com a Lei 13.043/2014, ficou estabelecido que a comprovação da mora ‘‘poderá’’ ser feita por carta registrada com aviso de recebimento, o que significa que houve uma ampliação das possibilidades de notificação do devedor. Segundo o relator, o surgimento de novos meios de comunicação não pode ser ignorado pelo Direito, devendo a lei acompanhar a evolução da sociedade e da tecnologia.

Tendo isso em conta, Antonio Carlos Ferreira registrou que é possível, por interpretação analógica do artigo 2º, parágrafo 2º, do Decreto-Lei 911/1969, considerar suficiente a notificação extrajudicial por e-mail enviado ao endereço eletrônico que consta no contrato. ‘‘Se a parte apresentar evidências sólidas e verificáveis que atestem a entrega da mensagem, assim como a autenticidade de seu conteúdo, o juiz pode considerar tais elementos válidos para efeitos legais’’, concluiu.

No caso julgado, como o TJRS não considerou provado o recebimento da mensagem e isso não foi contestado pelo banco, a Quarta Turma negou provimento ao recurso especial (REsp). Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2087485

PRINCÍPIO DA MORALIDADE
Fisco deve compensar valores recolhidos do Simples com os de lançamentos de ofício, diz TRF-4

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

A Lei Complementar 123, de 2006, determina que os recolhimentos efetuados pela empresa no regime do Simples Nacional devem ser aproveitados como pagamento de tributos. Assim, o contribuinte deve recolher aos cofres do fisco apenas a diferença.

A conclusão é da 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ao prestigiar sentença que declarou o direito da Multiparts Indústria e Comércio de Autopeças Ltda. de compensar os valores recolhidos pela sistemática do Simples Nacional com os créditos instrumentalizados por três processos administrativos fiscais (PAFs), lançados, de ofício e retroativamente, pela Receita Federal.

Juiz federal Marcel de Azevedo,  o voto vencedor
Foto: Divulgação/Ajufergs

O juiz federal convocado Marcel Citro de Azevedo, voto divergente vencedor no julgamento que negou a apelação da União (Fazenda Nacional), disse que negar o direito de compensação equivale a deixar os valores recolhidos num ‘‘limbo fiscal’’ de créditos a classificar. Este ‘‘limbo’’, no futuro, não irá representar acesso a nenhum ‘‘paraíso’’ em que tais valores serão amortizados da dívida consolidada. Antes, ocorrerá, apenas, a perda do direito de repetir, em franca antinomia com a boa-fé que deve pautar a relação fisco-contribuinte.

‘‘A moralidade correlaciona-se não só com os valores que permeiam nossos princípios e regras, mas também com os parâmetros que nos impulsionam, enquanto sociedade, a distinguir o certo do errado, o correto do irregular. A atividade do fisco – desde o primeiro oferecimento de uma sistemática simplificada ao conjunto de contribuintes (Simples Nacional, por exemplo) até o cálculo do valor devido e a exclusão de parcelas não consolidadas – deve se pautar pelo agir moral’’, destacou no acórdão.

Mandado de segurança

No mandado de segurança (MS) impetrado contra a autoridade fazendária da União em Porto Alegre, a parte autora diz que foi optante do Simples Nacional de 2007 até 2016, quando acabou excluída retroativamente – de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2012 –, vindo a sofrer procedimento de fiscalização em relação a esse período.

Alega que a autoridade coatora lançou, de ofício, os tributos na sua totalidade, desconsiderando tudo o que foi recolhido no âmbito do Simples, como se não houvesse nenhum recolhimento. Informa que não consegue parcelar os débitos com o abatimento dos valores que recolheu em 2012, no Simples Nacional, e que o sistema Pedido Eletrônico de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação (PER/DCOMP), da Receita Federal, não admite o referido abatimento.

Em síntese, a autora confirma que quer parcelar os débitos que foram apurados, mas pretende compensá-los com os créditos decorrentes dos recolhimentos efetuados no Simples.

Direito de reaproveitar os recolhimentos do Simples Nacional

No primeiro grau, a 14ª Vara Federal de Porto Alegre concedeu a segurança, repisando a fundamentação posta na decisão que deferiu a liminar. Ou seja, na análise de mérito, reafirmou o direito da autora de aproveitar os recolhimentos efetuados no Simples Nacional.

‘‘A Lei Complementar nº 123/06 prevê que os créditos apurados no Simples Nacional não poderão ser utilizados para extinção de outros débitos para com as Fazendas Públicas, salvo por ocasião da compensação de ofício oriunda de deferimento em processo de restituição ou após a exclusão da empresa do Simples Nacional (art. 21, § 10º). Há, portanto, relevância nos fundamentos do pedido a justificar o deferimento da liminar para que os débitos sejam suspensos’’, registrou a sentença proferida pelo juiz federal Fábio Soares Pereira.

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MS 5062459-77.2019.4.04.7100 (Porto Alegre)

 

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