PARASITISMO DE REPUTAÇÃO
Brechó vai indenizar rede de franquias de roupas infantis por imitar a sua vestimenta comercial

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Franquia Cresci e Perdi/ Capa Revista Exame

Imitar a vestimenta comercial (trade dress) de uma empresa de renome no mercado, para captar clientes no mesmo nicho mercadológico, é concorrência parasitária, por afrontar a Lei da Propriedade Industrial – LPI (Lei 9.279/96). Logo, o causador do dano fica obrigado, legalmente, a indenizar o ‘‘parasitado’’.

A decisão é da 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) ao prestigiar sentença que condenou a Baby Brechó Comércio de Artigos do Vestuário, de Guarulhos (SP), a pagar danos morais e materiais (perdas e danos) pelo uso de cores, design de fachada, layout interno e mobiliário semelhantes ao da rede de franquias Cresci e Perdi, sediada em São José do Rio Pardo (SP) e espalhada pelo país. Ambas comercializam roupas infantis, acessórios e brinquedos novos e usados.

A reparação por danos materiais, termos do artigo 210 da LPI, será apurada em sede de liquidação de sentença. Já o dano moral, por uso indevido de marca alheia para auferir lucro, ocasionando confusão e abalo na concorrência no mercado, foi arbitrado em R$ 20 mil – valor integralmente mantido pelo colegiado.

Tal como decidiu o juízo da 8ª Vara Cível de Guarulhos (SP), a Baby Brechó deve abster-se, definitivamente, de usar o trade dress (conjunto-imagem) da marca de propriedade da Cresci e Perdi, devendo descaracterizar o seu estabelecimento, abandonando a identidade visual. Também deve abster-se de veicular propaganda e estratégia de marketing idênticas ou semelhantes às realizados pela autora nas redes sociais.

O juiz Luiz Gustavo de Oliveira Martins Pereira destacou, com base na prova pericial, que um dos sócios da ré se aproveitou das informações passadas pela autora – quando mostrou interesse na franquia – para montar o modelo do seu negócio. Fragmento do laudo, no ponto: ‘‘embora o sócio da empresa Ré não tenha assinado o Contrato de Franquia com a Autora, o simples fato de ter participado de processo para obtenção de licença para montagem de uma loja da rede foi o suficiente para que ele obtivesse informações e/ou conhecimentos facilitados para implantar sua própria loja, conhecimentos esses que foram ‘aproveitados’ no novo negócio, conforme pudemos expor no laudo que ora finalizamos’’.

Desembargador Sérgio Shimura foi o relator
Foto: Imprensa/PUC-Campinas

Desvio de clientela

Para o julgador de origem, as provas documental e pericial comprovam que a autora faz jus à proteção legal da propriedade industrial, por deter o registro da marca reclamada.

‘‘Assim, considerando que a parte requerida está fazendo uso das cores, projeto dos móveis, disposição dos móveis, cópia das estratégias de marketing e do conteúdo dos folders, idênticos ao da marca Cresci e Perdi, de propriedade da autora, de rigor o reconhecimento de que houve violação aos direitos de propriedade industrial’’, fulminou, julgando totalmente procedente a ação.

Em agregação aos fundamentos da sentença, o relator da apelação no TJSP, desembargador Sérgio Shimura, lembrou que a concorrência desleal se caracteriza pelo desvio de clientela, por meio do uso indevido de mecanismos que induzem o consumidor à confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço – ou entre os produtos e serviços postos no comércio. É o que ocorre, por exemplo, com a reprodução ou imitação de uma característica do título de estabelecimento, nome comercial ou marca de um produto ou serviço.

‘‘Tal prática pode afetar ou reduzir o valor de uma marca ou denominação empresarial na respectiva classe de atuação, vez que pode ser associada a empresas que prestem serviços ou comercializem produtos de qualidade duvidosa ou inferior àquelas que já ostentem bons indicativos’’, cravou no acórdão.

Negócio inovador para incentivar o consumo consciente

A administradora da Cresci e Perdi conta, na peça inicial da ação cominatória/indenizatória, que criou, em 18 de maio de 2017, um conceito sustentável no segmento de roupas infantis, acessórios e brinquedos novos e usados, oferecendo produtos muito mais baratos que os das lojas convencionais. Para resguardar os seus direitos, obteve, junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), o registro da marca, na forma mista, a fim de distinguir seus produtos e serviços.

Esclarece que, por se tratar de uma franquia, as lojas franqueadas possuem características marcantes e identificadoras, desenvolvidas por equipe de profissionais especializados. Este conjunto forma um padrão visual todo próprio e especial – layout, decoração, disposição dos móveis, disposição dos produtos e espaços. Ou seja, estas características reunidas identificam as franquias Cresci e Perdi aos olhos dos consumidores. Hoje, a franqueadora conta com centenas de unidades espalhadas pelo território nacional, visando incentivar o consumo consciente.

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1039346-50.2020.8.26.0224 (Guarulhos-SP)

 

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ORDEM PRÁTICA
Ação de produção antecipada de prova pode ser ajuizada no local em que se encontra o objeto a ser periciado

Sede Icavi/Divulgação

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a ação de produção antecipada de prova pericial pode ser processada na comarca onde se encontra o objeto que vai ser periciado, e não necessariamente no local de domicílio da parte ré – que, no caso julgado, coincidia com o foro eleito em contrato.

Na origem do caso, a Icavi Indústria de Caldeira Vale do Itajaí S. A., sediada em Pouso Redondo (SC), moveu ação de produção antecipada de prova pericial num equipamento fornecido pela Net Steel S. A. Indústria Metalúrgica, sediada em Lontras (SC), que atualmente se encontra na Videolar Innova S. A., sua cliente, no Polo Petroquímico de Trinfo (RS).

A autora pretende fazer um levantamento da estrutura do equipamento. Ou seja, a perícia vai verificar se os cálculos estruturais, soluções de engenharia, materiais e técnicas de construção/montagem, empregadas pela parte ré, atendem os requisitos de resistência estrutural exigida do equipamento, de acordo com as normas técnicas aplicáveis. Tal perícia vai apontar todos os problemas/defeitos constatados.

A ação foi ajuizada na comarca onde se encontra o equipamento, enquanto o foro eleito no contrato de fornecimento, entre autora e ré, é o de domicílio desta última.

Após o tribunal de segunda instância não acolher a tese proposta pela ré, em sede de exceção de incompetência, esta recorreu ao STJ, sustentando que a cláusula contratual de eleição de foro deveria prevalecer.

STJ flexibilizou a regra de competência antes da mudança do CPC

A relatora do recurso especial (REsp), ministra Nancy Andrighi, observou que a possibilidade de pedir a produção antecipada de prova ao juízo do local onde deva ser produzida, prevista no artigo 381, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), não tinha equivalente no CPC/1973, o qual estabelecia como regra geral que a competência para a ação cautelar era do juízo competente para a ação principal (artigo 800 do CPC/1973).

Apesar disso – acrescentou a ministra –, antes mesmo da vigência do CPC/2015, o STJ já vinha admitindo a flexibilização dessa competência em relação aos procedimentos cautelares, sobretudo quando se tratasse de produção antecipada de provas, por uma questão de praticidade.

‘‘A facilitação da realização da perícia prevalece sobre a regra geral do ajuizamento no foro do réu por envolver uma questão de ordem prática, tendo em vista a necessidade de exame no local onde está situado o objeto a ser periciado’’, completou.

A relatora destacou ainda que o artigo 381, parágrafo 3º, do CPC/2015, prevê expressamente que o foro no qual tramitar a ação cautelar de produção de prova não ficará prevento para a futura ação principal.

Assim, segundo a ministra, afasta-se qualquer ideia de prejuízo à parte ré, pois, caso seja ajuizada a ação principal, o foro eleito no contrato – que coincide com o local de sua sede – poderá prevalecer. Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2136190

CONDIÇÃO DE TRANSFERIDO
Trabalhador de navio recrutado e contratado no Brasil conta com a proteção da CLT

Foto: Divulgação

A contratação para trabalho em navio, se realizada em solo brasileiro, atrai a legislação local. A decisão é da 11ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de 2ª Região (TRT-2, São Paulo) ao manter sentença que reconheceu a legislação brasileira como competente para julgar um litígio entre uma trabalhadora admitida no Brasil para prestar serviços a bordo de navios de cruzeiro com bandeira italiana e seus empregadores.

O acórdão destacou que, mesmo em contratos internacionais de trabalho, a contratação no Brasil atrai a jurisdição nacional, nos termos da Lei 7.064/1982 e do artigo 651, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

De acordo com os autos da ação reclamatória, a profissional foi selecionada por agência brasileira. Todo o processo seletivo e as tratativas de contratação ocorreram via internet, quando a trabalhadora ainda se encontrava em solo brasileiro.

Em defesa, as empresas rés alegaram que a Justiça brasileira seria incompetente para julgar o caso. A legislação aplicável seria a italiana, e o foro competente o de Gênova, na Itália. Argumentaram, ainda, que a prestação de serviços ocorreu, em sua maioria, em águas internacionais.

TRT-SP afastou a aplicação da Lei do Pavilhão

No entanto, a desembargadora-relatora Wilma Gomes da Silva Hernandes entendeu que o vínculo jurídico e as tratativas iniciais ocorreram em território brasileiro, o que assegura o direito à legislação trabalhista mais favorável.

A magistrada esclareceu que, a partir da reforma da Lei 7.064/1982, realizada em 2009, o empregado contratado por empresa sediada no Brasil para prestar serviços no exterior passou a ser considerado transferido, ‘‘situação na qual se enquadra a autora’’.

A julgadora também afastou, expressamente, a aplicação da Lei do Pavilhão, tratado segundo o qual a legislação aplicável para esses conflitos é a do país da bandeira da embarcação.

Segundo a relatora, esta lei não se impõe de forma absoluta, sobretudo na hipótese dos autos, em que a contratação da reclamante se efetivou em território brasileiro. ‘‘Não há como afastar o critério da territorialidade apenas em virtude do registro das embarcações em outros países’’, concluiu. Redação Painel de Riscos com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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ATOrd 1001317-46.2023.5.02.048 (São Vicente-SP)

PEJOTIZAÇÃO
Correspondente financeira reconhecida como empregada será indenizada por não ter usufruído a licença-maternidade

Uma prestadora de serviços da Miranda Gestão de Tecnologia (Múltipla Soluções Financeiras), que teve impedido o direito à licença-maternidade, será indenizada em R$ 15 mil, a título de danos morais, após reconhecimento de vínculo empregatício com o empregador. A sentença foi proferida pela 10ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte.

A reclamante teve que retornar ao trabalho uma semana após o nascimento do seu filho, sem gozar da licença-maternidade, devido à ausência de registro na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS).

Por isso, ela propôs ação trabalhista, pedindo a indenização e o reconhecimento do vínculo de emprego com a empresa para a qual prestava serviço na função de correspondente financeira.

Na defesa, a empregadora negou que a trabalhadora tivesse direito à licença-maternidade, ‘‘uma vez que prestava serviços como autônoma’’. Mas, ao decidir o caso, o juiz do trabalho Marco Antônio Ribeiro Muniz Rodrigues deu razão à correspondente financeira, acolhendo os seus pedidos.

A ex-empregada informou que foi contratada no dia 3 de junho de 2019. Sustentou que fez cadastro como microempreendedor individual (MEI) apenas para atender à demanda da empresa. Mas, segundo ela, exercia o ofício com pessoalidade e todos os elementos caracterizadores da relação de emprego.

Apontou ainda que estava refém dos desígnios da empregadora, sendo chamada atenção em alguns momentos e recebendo ordens. Afirmou que sempre foi remunerada, trabalhando rigorosamente das segundas às sextas-feiras. Acrescentou que foi dispensada sem justa causa em 7 de outubro de 2022 e não recebeu as verbas rescisórias.

Já o empregador confirmou a prestação de serviços pela profissional, mas negou a existência do vínculo empregatício. Apontou que ela era livre para executar as tarefas e que não havia subordinação. Além disso, informou que a trabalhadora realizava as atividades na própria residência e que não trabalhava com habitualidade.

‘‘Reconhecida a prestação de serviços, era ônus da empregadora comprovar a ausência dos elementos caracterizadores da relação de emprego, o que não se verificou’’, ressaltou o juiz.

Nesse contexto, o julgador reconheceu as datas de entrada e saída do emprego, determinando  o pagamento do aviso-prévio, além dos salários e outras verbas devidas.

Ao reconhecer o vínculo de emprego, o julgador entendeu que a correspondente financeira tem direito à licença-maternidade. Contudo, segundo o julgador, os extratos apresentados com a defesa comprovam que a reclamante recebeu salários de agosto a novembro de 2021.

‘‘Assim, restou comprovado que ela, por culpa da empresa, foi cerceada do seu direito ao bem-estar e dos cuidados com o bebê’’, concluiu o juiz, determinando o pagamento de indenização no valor de R$ 15 mil.

Na decisão, ele considerou o alcance da lesão, o grau de responsabilidade da reclamada e o caráter pedagógico da medida.

Da sentença, cabe recurso ordinário ao Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais). Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-3.

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ATOrd 0010805-07.2022.5.03.0010 (Belo Horizonte)

TESE DEFINIDA
Devedor deve provar que imóvel rural é explorado pela família e não pode ser penhorado

Divulgação Ministério da Cidadania

​A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema 1.234), estabeleceu a tese de que é ônus do devedor provar que a sua pequena propriedade rural é explorada pela família, como forma de assegurar a impenhorabilidade do bem.

Com a fixação da tese – que confirma entendimento já pacificado na Segunda Seção –, poderão voltar a tramitar os recursos especiais e agravos em recurso especial que estavam suspensos à espera da definição do precedente qualificado.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do tema repetitivo, comentou que a proteção da pequena propriedade rural contra a penhora para pagamento de dívidas tem fundamento na Constituição Federal (artigo 5º, inciso XXVI) e em outras leis, como o Código de Processo Civil (CPC), segundo o qual o reconhecimento da impenhorabilidade desse tipo de imóvel depende de dois elementos: a qualificação da propriedade como rural e a sua exploração pela família (artigo 833, inciso VIII, do CPC).

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Imprensa/TSE

Em relação ao tamanho da propriedade, a ministra citou precedentes do STJ (a exemplo do REsp 1.408.152) no sentido de que é incumbência do devedor comprovar que ela não tem mais do que quatro módulos fiscais (área máxima atualmente compreendida pela jurisprudência como pequeno imóvel rural).

Já no tocante à exploração do imóvel pela família, a relatora lembrou que havia divergência entre as turmas de Direito Privado sobre a quem competiria demonstrar essa situação – se à parte exequente (credor) ou ao executado (devedor). Essa divergência, contudo, foi superada em 2023, quando a Segunda Seção pacificou o entendimento de que cabe ao executado comprovar não apenas o enquadramento do imóvel como pequena propriedade rural, mas também que o bem é voltado para a subsistência familiar (REsp 1.913.234).

Proprietário tem mais condições de produzir prova sobre uso do imóvel

Segundo Nancy Andrighi, é mais fácil ao devedor demonstrar que a propriedade rural é objeto de exploração familiar, tendo em vista que ele é o proprietário do imóvel e, por isso, pode acessá-lo livremente.

Além disso, para a relatora, caso houvesse uma presunção relativa de que o pequeno imóvel rural é explorado pela família – transferindo-se ao credor, portanto, o encargo de afastar essa presunção –, ocorreria uma indevida equiparação entre a impenhorabilidade da pequena propriedade rural e a impenhorabilidade do bem de família, institutos juridicamente distintos.

‘‘O artigo 833, VIII, do CPC/2015 é expresso ao condicionar o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural à sua exploração familiar. Isentar o devedor de comprovar a efetiva satisfação desse requisito legal e transferir a prova negativa ao credor importaria em desconsiderar o propósito que orientou a criação dessa norma, o qual consiste em assegurar os meios para a efetiva manutenção da subsistência do executado e de sua família’’, concluiu a ministra. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2080023