EXIGÊNCIA SEM LEI
Desembargador manda cartório registrar imóvel fruto de usucapião sem recolher ITBI

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Des. Carlos Cini Marchionatti, do TJRS
Foto: Imprensa/TRE-RS

A usucapião não é fato gerador do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), já que inexiste, em sentido próprio, uma ‘‘transmissão’’ do bem. O que existe é a aquisição em razão do exercício prolongado da posse, sem qualquer vinculação com o proprietário anterior, como transmitente do direito real de propriedade.

A conclusão é do desembargador Carlos Cini Marchionatti, integrante da 20ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao reformar decisão interlocutória que condicionou o reconhecimento da usucapião ao recolhimento de ITBI na 1ª Zona de Registro de Imóveis de Caxias do Sul, na Serra gaúcha.

No primeiro grau, a 4ª Vara Cível da Comarca de Caxias do Sul entendeu que o pedido de usucapião estava lastreado em ‘‘justo título’’. Assim, haveria fato gerador e, por via de consequência, obrigação dos autores da ação de usucapião em arcar com o recolhimento do imposto de transmissão.

‘‘Com efeito, a confecção da escritura pública de compra e venda para posterior registro no RI [Registro de Imóveis] demanda, entre outras diligências, o pagamento do imposto de transmissão. Em razão disso, o deferimento da usucapião não libera os autores de arcar com o imposto que, de fato, é devido. À parte autora, para providenciar a quitação do ITBI, juntando aos autos a respectiva guia’’, determinou, no despacho, a juíza Cláudia Bampi.

Agravo de instrumento

Inconformados com a decisão da juíza, os autores da ação de usucapião interpuseram agravo de instrumento no TJRS, recurso que foi provido em decisão monocrática da lavra do desembargador Carlos Cini Marchionatti. Ou seja, no efeito prático, ele determinou o registro da sentença que declarou a usucapião sem necessidade de quitação do ITBI.

Conforme Marchionatti, a Súmula 237 do Supremo Tribunal Federal (STF) pôs fim à polêmica quanto ao momento da aquisição pela usucapião, se por ocasião da sentença predominantemente declaratória ou pelo registro no cartório de imóveis.

‘‘Decisiva e definitivamente (…), adquire-se pela usucapião no momento, no dia, em que se completam os seus requisitos, quando o casal adquiriu o direito real da propriedade imobiliária objeto de usucapião, o que independe da incidência de qualquer imposto, já que não está caracterizado o fato gerador’’, escreveu na decisão monocrática.

O julgador ainda lembrou que o artigo 35 do Código Tributário Nacional (CTN) estabelece a transmissão da propriedade ou dos direitos reais sobre o imóvel como fato gerador do aludido tributo, sem menção à usucapião.

Com relação aos atos registrais, o desembargador citou trecho da página 226 de ‘‘Dúvida Registral Imobiliária e Direitos Fundamentais’’, obra de sua autoria: ‘‘o oficial procede como determina a lei, pois deve cumprir as determinações da lei fielmente, seja para efetuar o registro ou a averbação, seja para fazer exigências. Feitas exigências pelo oficial, o apresentante pode aceitá-las para satisfazê-las ou, não se conformando, requerer a suscitação da dúvida pelo oficial, que só poderá conter exigências legais ao registro ou à averbação não observados no título. Incumbido o oficial de fazer exigências com fundamento na lei, não as pode fazer sem lei’’.

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5003564-22.2014.8.21.0010 (Caxias do Sul-RS)

 

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BATE-PAPO NAS EMPRESAS
Deputado que pediu voto em Bolsonaro vai pagar R$ 80 mil por assédio moral eleitoral

Foto: Reprodução

A 7ª Vara do Trabalho de Goiânia condenou o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) pela prática de assédio moral eleitoral. Ele terá de pagar R$ 80 mil, a título de dano moral coletivo, por pedir votos para o candidato a presidente Jair Messias Bolsonaro (PL) durante as eleições presidenciais de 2022. O valor será revertidos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

Além da condenação, o juízo trabalhista proibiu o deputado de liderar ou promover reuniões dentro de empresas e organizações com o objetivo de ‘‘aliciar, persuadir, convencer, induzir ou instigar o voto de trabalhadores para qualquer candidato’’, sob pena de multa de R$ 10 mil por trabalhador assediado.

Ação civil pública

A sentença, publicada na segunda-feira de Natal, é consequência de ação civil pública (ACP) do Ministério Público do Trabalho em Goiás (MPT-GO) que processou Gayer após receber denúncias de que ele visitou empresas em Goiânia para assediar trabalhadores a votar em Bolsonaro.

A primeira denúncia foi registrada no dia 13 de outubro de 2022, logo após o primeiro turno das eleições presidenciais. Na ocasião, foi apresentado vídeo do réu em pelo menos três estabelecimentos comerciais, aliciando os trabalhadores para votar em Bolsonaro.

Reiteração de conduta ilegal

Cinco dias depois, as empresas firmaram Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho (MPT), se comprometendo a não repetir a prática nem permitir o assédio moral eleitoral nos estabelecimentos.

O deputado, no entanto, não compareceu à audiência e alegou que estava em Brasília, solicitando a marcação de uma nova data. Em nova tentativa de agendamento, a assessoria do deputado informou que, novamente, ele não poderia comparecer por ‘‘não haver espaço na sua agenda nessa semana’’. Apesar disso, no dia seguinte à audiência (19/12), o deputado esteve em mais um estabelecimento comercial e repetiu a mesma conduta ilegal alvo da investigação.

Para a procuradora do trabalho Janilda Guimarães de Lima, que subscreveu a peça da ACP, ‘‘o referido deputado eleito prefere formular desculpas inverídicas porque sabidamente reconhece a ilegalidade de sua conduta, mas não pretende modificá-la’’.

‘‘Debate’’ sobre conjuntura política

A defesa de Gustavo Gayer alegou que ele esteve presente nos estabelecimentos não para assediar os trabalhadores a votar em determinado candidato, mas para debater a atual conjuntura política do país, em especial nos dias que antecederam a realização do segundo turno das eleições presidenciais.

Segundo o juiz do trabalho Celismar Coêlho de Figueiredo, o argumento não se sustenta. ‘‘Debate pressupõe, por lógica, a presença de mais de um ‘palestrante’ que, usualmente, defendem posições políticas antagônicas. Não há debate de único propagador.’’

Redes sociais registraram o assédio

O magistrado destacou as postagens de redes sociais do parlamentar, retratando diversos ambientes empresariais com a presença dos empregados, e que comprovam a prática de assédio eleitoral em ‘‘comportamento acintoso frente à legislação que proíbe a conduta denunciada’’.

Para o juiz da 7ª Vara do Trabalho de Goiânia, ficou evidente o constrangimento dos trabalhadores em tais situações. Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Imprensa do MPT-GO.

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ACPCiv 001121-12.2022.5.18.0007 (Goiânia)

VENDA FICTÍCIA
Yara Brasil não prova entrega de adubo, e TJRS enterra cobrança contra transportadora

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Tratando-se de duplicata mercantil não subscrita pelo sacado, incumbe ao emitente do título a comprovação do negócio jurídico e da prestação dos serviços, mediante a exibição de documento que demonstre início de prova – cheque, carta, e-mail, telegrama etc.

Por falta dessa comprovação, a 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) manteve sentença que extinguiu ação monitória ajuizada por uma multinacional do setor de fertilizantes contra uma transportadora de Ibiraiaras (RS). Ou seja, a empresa não conseguiu provar, por nenhum meio admissível, o recebimento da mercadoria pela parte presumivelmente devedora, inviabilizando a cobrança judicial do crédito.

‘‘No caso, não demonstrada a existência de efetiva relação jurídica subjacente, porquanto não comprovada a entrega das mercadorias, mostra-se indevida a emissão da duplicata, impondo-se a manutenção da decisão que acolheu os embargos monitórios e julgou improcedente a ação monitória’’, resumiu, no acórdão, a desembargadora-relatora Liége Puricelli Pires.

Ação monitória

Yara Brasil Fertilizantes S. A. narrou, na ação monitória, que vendeu diversos produtos à Cian Carlos Bocchi Transporte e Comércio de Produtos Agrícolas Eireli, tendo emitido duplicatas mercantis sem aceite, acompanhadas das respectivas notas fiscais (NFs). Como as duplicatas não foram pagas em sua integralidade, disse que a transportadora ré acumulou dívida de R$ 138,3 mil. Assim, requereu a expedição de mandado de pagamento no prazo de 15 dias, com o acréscimo de juros legais e correção monetária.

A ação monitória é um instrumento processual, previsto entre os artigos 700 a 702 do Código de Processo Civil (CPC), que tem como objetivo o reconhecimento de prova escrita, sem eficácia de título executivo, em título executivo. Ou seja, pode ser proposta por aquele que afirma, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, ter o direito de exigir determinada quantia do devedor.

Embargos monitórios

Notificada pela 3ª Vara Judicial da Comarca de Lagoa Vermelha (RS), a transportadora ré apresentou embargos monitórios. Em síntese, alegou que inexiste prova do negócio jurídico envolvendo as notas fiscais e as duplicatas que instruem a petição inicial. Garantiu que, se houver demonstração de que tais produtos foram entregues, não há problemas em reconhecer o crédito. Afinal, foram muitos os negócios realizados entre ambas as partes.

Para a transportadora, nada veio aos autos que demonstre, efetivamente, a existência dessas negociações, tanto que tais faturas não constam no seu sistema de controle de contas a pagar. Por isso, requereu a intimação da autora para comprovar a entrega das mercadorias objeto da presente cobrança. E, caso não comprovada, pediu a procedência dos embargos monitórios, para extinção da ação.

Sentença de improcedência

O juiz Gérson Lira acolheu os embargos monitórios e, por consequência, julgou improcedente a ação monitória, por entender que a parte autora não fez prova constitutiva de seu direito. O inciso I do artigo 373 do CPC diz: ‘‘O ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito’’.

O julgador apurou que as duplicatas acostadas pela autora não possuem assinatura ou data do aceite preenchidas. Dessa forma, não há prova de recebimento dos produtos e de quem os fez. Assim, era de suma importância a comprovação de recebimento das mercadorias descritas nos documentos – o que não correu.

‘‘No ponto, não é possível exigir do embargante [transportadora] prova negativa da contratação, uma vez que se trata de prova diabólica, impossível de ser realizada. Outrossim, sequer há contrato anterior a fim de comprovar a relação jurídica existente ou eventuais e-mails e conversas de negociações dos produtos. No ponto, também cabe destacar que os espaços para preenchimento de assinatura destinados a confirmar o recebimento da mercadoria encontram-se em branco’’, fundamentou na sentença.

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5004381-95.2021.8.21.0057 (Lagoa Vermelha-RS)

 

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PALETA ATLÂNTIDA
Maior churrasco à beira-mar do mundo não prejudica praia gaúcha, decide TRF-4

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: Divulgação

Os promotores de uma grande churrascada na praia, sem a possibilidade técnica de causar danos à flora e à fauna, nem de poluir severamente o local ou prejudicar os demais frequentadores, estão dispensados de apresentar um Plano de Recuperação de Área Degradadas (PRAD), como prevê a legislação ambiental.

Este, em síntese, foi o entendimento da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ao negar apelação do Ministério Público Federal (MPF), inconformado com a sentença que manteve a realização do evento gastronômico ‘‘Paleta Atlântida’’, o maior churrasco de praia do mundo, que ocorre anualmente num balneário do litoral norte do Rio Grande do Sul.

O relator da apelação, desembargador federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, disse que o fato de o evento ter tomado grandes proporções não implica a adoção de severa medida proibição. Primeiro, porque os órgãos de fiscalização expediram o licenciamento ambiental e realizaram vistorias in loco no dia do evento. Segundo, porque, ao término das festividades, o idealizador do evento determinou, prontamente, a imediata limpeza e recuperação do espaço público.

‘‘Observo igualmente que os técnicos do Departamento de Meio Ambiente do Município (Biólogos) informam que não haveria necessidade de PRAD, pois o único possível impacto ambiental, se existente, seria o trânsito de alguns veículos a serviço dos festejos. Assim, parece-me que este impacto é mitigado pelo também pisoteamento das pessoas diuturnamente e demais atividades recreativas na beira da praia, não resultando em dano ambiental irreversível, perfeitamente factível a recuperação in natura e in integrum’’, fulminou no acórdão o desembargador-relator.

Ação civil pública

O Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul (MPF-RS) propôs ação civil pública (ACP) em face do Município de Xangri-lá, do empresário Felipe Melnick e da União Federal, com o intuito de impedir a realização do evento denominado ‘‘Paleta Atlântida’’, agendado para o dia 25 de janeiro de 2020, na praia do balneário de Atlântida, pertencente a Xangri-Lá. As churrasqueiras seriam montadas numa área de 8 mil metros quadrados na orla marítima, entre o oceano e as dunas frontais.

O evento, anunciado pelos organizadores como o ‘‘maior churrasco à beira mar do mundo’’, segundo o MPF gaúcho, não seria compatível com o uso da praia, em função do risco de danos à área de marinha – de proteção permanente – nem com a natureza de bem público de uso comum do povo. Principalmente, durante o período de veraneio, alta temporada, que, por assumir grandes proporções, com cobrança de ingressos, atrai milhares de veranistas.

Nesse passo, o parquet pediu a condenação dos responsáveis pelo evento à obrigação de não fazer, consistente em não realizar eventos privativos na praia, com a cobrança de ingressos e reserva de espaço público. Assim como a indenizar e a reparar, em perdas e danos, eventuais prejuízos causados à população e ao meio ambiente, pela desconformidade com o ordenamento jurídico vigente.

Sentença de improcedência

O juízo da 1ª Vara Federal de Capão da Canoa (RS) concedeu a tutela liminar para impedir a realização do evento, mas a decisão foi cassada em sede agravo de instrumento, interposto com sucesso pelas rés no TRF-4. A Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), colocados no polo passivo, manifestaram desinteresse em ingressar na ACP –, resultando excluídos dos autos.

Ao decidir o mérito da ação, o juízo da Vara julgou improcedente a pretensão punitiva estatal, por não vislumbrar tal ‘‘incompatibilidade’’, já que o evento foi realizado em área previamente demarcada. E sem a comprovação de que os demais veranistas foram prejudicados no seu direito de usar a praia.

Para o juiz federal Vinícius Vieira Indarte, não houve impedimento de locomoção dos usuários da praia. Ao contrário, muitos veranistas interagiram harmoniosamente com o evento, inclusive levando suas próprias churrasqueiras.

‘‘Além disso, é fato público e notório que diversos eventos são realizados em tais regiões da praia, como corridas (Travessia Torres Tramandaí – TTT), campeonatos de surf, de futebol, de vôlei de praia, de beach tennis, de modo que a realização do evento em foco se insere dentro da cultura de reunião de pessoas para usufruírem a praia durante o veraneio, bem como para valorizar a cultura regional ‘gaúcha’, em sua culinária, já que seu principal objetivo é reunir as pessoas para assarem e comerem o tradicional churrasco, que é, legalmente (Lei n. 11.929/2003), um prato típico do Rio Grande do Sul, reconhecido internacionalmente’’, cravou na sentença.

O julgador esclareceu que os valores descritos na peça inicial não podem ser vistos como cobrança de ingressos, mas como contribuições dos usuários das churrasqueiras, em razão dos custos envolvidos (de montagem e desmontagem). Ou seja, o MPF não provou auferimento de lucro pelo empreendedor e idealizador do evento. Desse modo, incabível falar em ‘‘privatização’’ da coisa pública.

‘‘Nessas circunstâncias, ainda que o evento seja grande, […] é visível e digno de confiança que o ente público intenciona evoluir no licenciamento ambiental para minorar os impactos, assim como verifica-se que não ocorreram danos ambientais nem o auferimento de lucro pelo uso da coisa pública, tendo os réus comprovado que o ‘Paleta Atlântida’ proporcionou maior interação das pessoas com o ambiente de praia, dentro de um contexto cultural da culinária riograndense, razão pela qual entende-se ser desproporcional o pedido de proibição do evento’’, concluiu a sentença.

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5000187-47.2020.4.04.7121 (Capão da Canoa-RS)

 

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DIREITOS AUTORAIS
Cobrança por música executada em evento público não está atrelada à obtenção de lucro

A cobrança de direitos autorais em virtude da execução de obras musicais protegidas em eventos públicos não está condicionada ao objetivo ou à obtenção de lucro, decidiu, por unanimidade, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) ajuizou ação de cobrança contra o munícipio de Cerquilho (SP), cuja prefeitura estaria realizando eventos públicos com a reprodução de músicas sem a autorização dos autores e sem o recolhimento dos direitos autorais.

O juízo de primeiro grau condenou o município a pagar 15% do custo total dos eventos pela reprodução mecânica de músicas e 10% pela execução de música ao vivo. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão.

No recurso ao STJ, o município alegou que o pagamento de direitos autorais somente é devido quando houver qualquer tipo de lucro ou proveito econômico, o que não ocorreu na hipótese dos autos, em que foram realizadas festas comemorativas, sem finalidade lucrativa, em lugares públicos abertos à população em geral.

Norma de 1973 exigia objetivo de lucro direto ou indireto

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Imprensa/TSE

A relatora do recurso especial (REsp) no STJ, ministra Nancy Andrighi, observou que o sistema criado para tutelar os direitos autorais no Brasil, baseado no chamado sistema francês, visa ‘‘incentivar a produção intelectual, transformando a proteção do autor em instrumento para a promoção de uma sociedade culturalmente diversificada e rica’’.

A ministra lembrou que, de início, tal matéria era regulada pela Lei 5.988/1973, a qual previa, em seu artigo 73, que as composições musicais ou obras de caráter assemelhado não poderiam, sem autorização do autor, ser transmitidas por rádio, serviço de alto-falantes, televisão ou outro meio, nem executadas em espetáculos públicos ou audições públicas que tivessem objetivo de lucro direto ou indireto.

Sob essa legislação – disse Nancy Andrighi –, o STJ firmou jurisprudência no sentido de que, em se tratando de festejo de cunho social e cultural, sem a cobrança de ingressos e sem a contratação de artistas, não havendo proveito econômico, seria indevida a cobrança de direitos autorais.

‘‘A gratuidade das apresentações públicas de obras musicais protegidas, portanto, era elemento relevante para determinar o que estaria sujeito ao pagamento de direitos autorais’’, declarou.

Lei 9.610/1998 alterou a disciplina relativa à cobrança de direitos autorais

Entretanto, a ministra-relatora ressaltou que, posteriormente, o sistema passou a ser regulado pela Lei 9.610/1998, que atualizou e consolidou a legislação sobre o tema, alterando significativamente a disciplina relativa aos direitos autorais. Segundo a ministra, o artigo 68 da nova lei, correspondente ao artigo 73 da lei revogada, suprimiu a expressão ‘‘que visem lucro direto ou indireto’’.

‘‘Daí por que, atualmente, à luz da Lei 9.610/1998, a finalidade lucrativa direta ou indireta não é mais pressuposto para a cobrança de direitos autorais nessa hipótese’’, concluiu ao negar provimento ao recurso do município. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.098.063