CLÁUSULAS ABUSIVAS
TRF-4 proíbe a Caixa Econômica Federal de alterar limites de crédito de conta-corrente sem autorização do cliente

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre (RS), julgou procedente um recurso de apelação do Ministério Público Federal (MPF) e determinou que a Caixa Econômica Federal (CEF) deixe de alterar os limites de crédito disponibilizados em conta-corrente sem a prévia e expressa autorização do cliente.

O MPF aponta que a prática contraria não só a Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor – CDC), mas também normas reguladoras do Banco Central do Brasil (Bacen), em especial as Resoluções 3.694/2009, 1.559/1988 e 3.191/2010. A decisão vale para todo o Brasil.

A controvérsia entre o MPF e a CEF se estabeleceu em função de duas cláusulas contratuais para abertura de conta bancária. As cláusulas permitiam à instituição financeira efetuar o aumento do limite do crédito vinculado às contas da Caixa (crédito rotativo ou cheque especial), sem autorização expressa dos seus titulares, bem como a diminuição do limite do crédito vinculado a essas contas, sem comunicação prévia.

Pelo acórdão do TRF-4, a CEF ficou obrigada a anular as cláusulas contratuais consideradas abusivas. Também deve comunicar os correntistas, de modo expresso e registrado, com prazo não inferior a 30 dias, sempre que objetivar reduzir o limite de crédito rotativo ofertado.

Para o procurador regional da República Waldir Alves, a natureza jurídica do cheque especial é de contrato de empréstimo e suas alterações devem ser formalizadas por meio de aditivos contratuais ou novos contratos. ‘‘Não por extratos bancários, como previa os Contratos de Cheque-Azul da CEF, à revelia do consumidor’’, apontou em seu parecer.

Entenda o caso

A Procuradoria da República do Rio Grande do Sul (PRRS) – ou seja, o MPF no Estado – apurou que, ao assinarem um contrato de abertura de conta-corrente na Caixa Econômica Federal, os clientes eram obrigados a aceitar o limite de crédito do cheque especial, sobre o qual incidiriam juros e tarifas, e ainda a aceitar um aditivo sobre a alteração desse limite (Cheque-Azul), que permitia à CEF elevá-lo a seu critério. Isso, “independente de aviso prévio ou de qualquer aditivo contratual, sendo o novo limite informado, no extrato da conta e, em não havendo manifestação contrária do cliente, esse valor passa a integrar o contrato’’.

Já para redução do valor do limite, o parágrafo terceiro da cláusula contratual estabelecia apenas a manifestação expressa do ente financeiro, com uma comunicação prévia de 10 dias, ficando o cliente obrigado a depositar na conta-corrente quantia suficiente para a cobertura do valor utilizado e de eventuais excessos, no prazo de 24 horas.

Des. Roger Raupp Rios foi o relator
Foto: Sylvio Sirangelo/ACS/TRF-4

Diante disso, em 2013, o MPF-RS ajuizou uma ação civil pública (ACP) em que pedia o fim de tal conduta pelo banco, subscrita pelo procurador da república Estevan Gavioli da Silva. A ação foi julgada parcialmente procedente pela 3ª Vara Federal de Porto Alegre, levando o MPF e a Caixa a recorrerem ao TRF-4.

Danos morais coletivos

Ao prover o recurso de apelação do MPF, a 3ª Turma do TRF-4, sob a relatoria do desembargador Federal Roger Raupp Rios, ampliou os itens nulos do contrato bancário, além de ordenar que a CEF comunique aos correntistas, com antecedência de 30 dias, sempre que pretenda reduzir o crédito ofertado. Também determinou que o banco informe a cada correntista, por e-mail ou correspondência, sobre as cláusulas consideradas nulas e ainda condenou a Caixa ao pagamento de R$ 300 mil a título de reparação por danos morais coletivos.

No julgamento do recurso, o TRF-4 manteve a abrangência nacional dos efeitos da decisão, de modo que todas as agências da CEF no País estão obrigadas a publicar o teor do acórdão no site da instituição financeira e a afixação de seu conteúdo no interior de suas agências.

O TRF-4 também manteve a determinação de expedição de ofício aos Procons de todas as unidades federativas do território nacional, para que deem publicidade à decisão em seus endereços eletrônicos, além de conservar a multa fixada em R$ 50 mil por mês para cada hipótese de descumprimento das determinações impostas. Com informações da Assessoria de Comunicação Social (Ascom) da Procuradoria Regional da República da 4ª Região (PRR-4) em Porto Alegre.

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ACP 5066942-87.2018.4.04.7100 (Porto Alegre)

RECURSOS REPETITIVOS
STJ definirá se ISS compõe base de cálculo do IRPJ e da CSLL apurados pelo lucro presumido

Ministro Gurgel de Faria é o relator
Foto: Gustavo Lima/STJ

​A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu afetar os Recursos Especiais 2.089.298 e 2.089.356, de relatoria do ministro Gurgel de Faria, para julgamento sob o rito dos repetitivos.

A questão submetida a julgamento, cadastrada como Tema 1.240 na base de dados do STJ, é definir ‘‘se o Imposto sobre Serviços (ISS) compõe a base de cálculo do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) quando apurados pela sistemática do lucro presumido’‘.

O colegiado ainda determinou a suspensão dos recursos especiais (REsps) e dos agravos em recurso especial que versem sobre a questão controvertida em segunda instância e no STJ.

Similaridade com repetitivo sobre inclusão do ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL

O relator destacou parecer da ministra Assusete Magalhães (aposentada), quando presidia a Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do STJ, a respeito da similaridade com o Tema 1.008, no qual a Primeira Seção estabeleceu que o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) compõe a base de cálculo do IRPJ e da CSLL quando apurados na sistemática do lucro presumido.

Segundo Gurgel de Faria, as turmas de Direito Público passaram a aplicar a mesma tese aos casos relativos ao ISS, embora aquele repetitivo tratasse apenas do ICMS. Assusete Magalhães ponderou que a aplicação dos efeitos processuais inerentes ao rito dos recursos repetitivos somente poderá ser adotada pelas cortes de origem após a deliberação da Primeira Seção sobre o caso específico do ISS.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica 

O Código de Processo Civil (CPC) regula, no artigo 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão de afetação no REsp 2.089.298

REsp 2089298

REsp 2089356

COBRANÇA ILEGAL
Variação cambial nas compras a prazo de insumos agrícolas e a contabilidade criativa

Por Eduardo Lima Porto

Eduardo Lima Porto, da LucrodoAgro

‘‘Chovendo no molhado’’, insisto num assunto que incomoda a muitas empresas de insumos agrícolas, o qual vem sendo negligenciado por produtores, revendas e cooperativas, seja por total desconhecimento ou por preguiça mental, seja por puro ‘‘temor reverencial’’ em relação ao porte de algumas multinacionais.

Se aproximam os vencimentos de muitas transações e, coincidentemente, por questões conjunturais, se verifica atualmente uma forte volatilidade cambial.

O caixa dos produtores se viu bastante fustigado nesta safra pelos preços baixos e quebras de produção, principalmente no Mato Grosso. E poderá ser ainda mais castigado pela cobrança reconhecidamente ILEGAL da variação cambial nas operações a prazo.

Artigo publicado no LinkedIn em agosto/2023, assim como vários outros que venho postando nos últimos anos, fornece subsídios técnicos mais do que suficientes para embasar uma negativa frontal a esta imposição, servindo também de base para que advogados possam buscar a devolução dos valores pagos indevidamente. Aqui a íntegra.

Aliás, muito me surpreende a aceitação passiva de tais imposições e espanta a omissão inexplicável dos ADVOGADOS AGRARISTAS em relação a esta questão que afeta gravemente o fluxo de caixa do setor.

Inconsistências contábeis que podem trazer graves problemas de ordem fiscal para quem paga a variação cambial, pois não poderá registrar a saída de caixa como ‘‘despesa cambial’’ e terá um lucro tributável maior do que o real, de forma totalmente desnecessária.

A Syngenta, maior empresa de defensivos agrícolas do mundo, apesar de cobrar agressivamente a variação cambial dos seus clientes, reconheceu na emissão de um Certificado de Recebíveis Agrícolas (CRA) de R$ 600 milhões que este procedimento é considerado ‘‘NULO DE PLENO DIREITO’’ pela legislação brasileira. E ainda alertou que poderia haver o risco de questionamentos judiciais por parte dos sacados, afetando, eventualmente, o patrimônio líquido do fundo e o rendimento dos investidores.

Nas operações domésticas – que não envolvem uma importação direta –, não existe a emissão de notas fiscais em dólar. A indexação ao dólar na compra dos insumos é permitida até o momento em que ocorre a transferência da posse da mercadoria do fornecedor para o comprador. No caso das operações a prazo, depois da conversão do dólar para o real na DATA DA TRANSAÇÃO, se calculam os juros até o vencimento, os quais são de livre estipulação por parte das empresas.

Quem alega que os produtores precisam fazer o hedge cambial nas compras de insumos e outros malabarismos envolvendo o BARTER [pagamento pelo insumo através da entrega do grão na pós-colheita], desconhece inteiramente do que está falando ou simplesmente age de MÁ-FÉ, defendendo um procedimento abusivo que foi se cristalizando como prática ao longo dos anos.

Eduardo Lima Porto é diretor da LucrodoAgro Consultoria Agroeconômica Ltda com sede em Sinop-MT

PESSOA COM DEFICIÊNCIA
Sindicatos não podem fazer acordo para flexibilizar base de cálculo de cotas legais

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho (TST) restabeleceu decisão liminar que havia proibido sindicatos dos setores de asseio e conservação e de segurança privada de Santa Catarina de fazer instrumentos coletivos que flexibilizam a base de cálculo das cotas legais de aprendizagem e de pessoas com deficiências.

No exame do caso em recurso em mandado de segurança, o colegiado avaliou que a mitigação das cotas está entre as matérias que não podem ser negociadas coletivamente, de acordo com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Ação civil pública

Em ação civil pública, o Ministério Público do Trabalho (MPT) relatou que convenções coletivas firmadas pelos sindicatos patronal e de empregados previam que tanto a cota de aprendizes quanto a de pessoas com deficiência seriam calculadas apenas sobre o número de trabalhadores lotados em atividades administrativas internas.

Tutela de urgência

A pedido do MPT, o juízo da 7ª Vara do Trabalho de Florianópolis (SC) concedeu tutela provisória de urgência para proibir as entidades sindicais de celebrar instrumentos coletivos alterando a base de cálculo das cotas, com a aplicação de multa diária no caso de descumprimento. Esse tipo de medida judicial que visa à garantia imediata de um direito em situações de urgência.

Segundo a juíza Danielle Bertachini, esses temas não são passíveis de negociação sobre o legislado e há risco de dano, porque a redução da base de cálculo dificulta a inserção de aprendizes e pessoas com deficiência no mercado de trabalho.

Mandado de segurança

Para afastar a proibição, o Sindicato das Empresas de Asseio, Conservação e Serviços Terceirizados (Seac/SC) e o Sindicato das Empresas de Segurança Privada de Santa Catarina (Sindesp/SC) impetraram mandado de segurança. Um dos argumentos foi que a grande maioria dos serviços prestados pelas empresas não exigia curso de formação profissional nem oferecia condições dignas a pessoas com deficiência ou oportunidade de progressão social a aprendizes, pois a maioria das contratações eram para funções de auxiliar de serviços gerais, serventes e vigilantes.

Competência

Ministro Dezena da Silva foi o relator
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

Ao analisar o mandado, o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina) considerou que, embora o MPT tenha legitimidade para ajuizar a ação, o pedido de anulação da cláusula é da competência originária do Tribunal, e não da Vara do Trabalho. Assim, cassou a decisão que deferiu a tutela de urgência antecipada.

Caráter inibitório

O relator do recurso do MPT no TST, ministro Dezena da Silva, salientou que a pretensão veiculada na ação civil pública não é de anulação de cláusula coletiva, mas de caráter inibitório; isto é, de impor aos entes sindicais a obrigação de não mitigar a base de cálculo das cotas legais por meio da negociação coletiva. E, para isso, a Vara do Trabalho é competente.

Restrições não autorizadas

Por outro lado, Dezena da Silva frisou que as leis que regulamentam a aprendizagem (artigos 428 e seguintes da CLT) e as cotas de pessoas com deficiência (artigo 93 da Lei 8.213/1991) não autorizam restrições quanto à base de cálculo nem quanto à natureza das atividades desempenhadas pelo empregador.

Discriminação

A seu ver, a redução tem um cunho discriminatório, porque o objetivo das cotas é justamente o de proteger seus destinatários contra a discriminação sofrida por determinados segmentos sociais no momento de sua inserção no mercado de trabalho.

Por unanimidade, a SDI-2 restabeleceu integralmente a tutela de urgência deferida pela juíza Danielle Bertachini na ação civil pública. Com informações da jornalista Lourdes Tavares, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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ROT-549-88.2019.5.12.0000

ATIVO ECONÔMICO
Uso de água mineral retirada do subsolo para processos industriais depende de autorização federal

Ministro Paulo Sérgio Domingues
Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que é indispensável a autorização federal para utilização de água mineral obtida diretamente do solo como insumo em processo industrial, ainda que esta não seja destinada ao consumo humano.

O entendimento foi fixado pelo colegiado ao reformar acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) que, confirmando sentença de improcedência de ação popular, considerou suficiente a autorização do poder público estadual para o uso de água termomineral por uma indústria de café.

Segundo o TRF-4, não há obrigatoriedade de prévia autorização do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) – substituído pela Agência Nacional de Mineração (ANM) – para uso da água retirada do solo em processos industriais, pois a permissão seria necessária apenas nas hipóteses de extração para consumo humano ou para fins balneários.

Relator do recurso especial (REsp) do Ministério Público Federal, o ministro Paulo Sérgio Domingues lembrou que o artigo 20, inciso IX, da Constituição Federal prevê que são bens da União os recursos minerais, inclusive aqueles depositados no subsolo.

O ministro também explicou que, conforme definido no artigo 1º do Decreto-Lei 7.841/1945, águas minerais são aquelas oriundas de fontes naturais ou fontes artificialmente captadas que possuam composição química distinta das águas comuns, com características que lhes confiram ação medicamentosa.

Caracterização da água como mineral não advém de sua destinação

Para Paulo Sérgio Domingues, diferentemente do entendimento do TRF-4, o que caracteriza a água como mineral – e, por consequência, define a necessidade de autorização e fiscalização federais para sua exploração – é a composição química, e não a finalidade para a qual será destinada (industrial ou consumo humano, por exemplo).

O relator reforçou que a legislação brasileira protege o possível interesse da União por um ativo econômico natural do poder público, de forma que o recurso não poderia ser explorado sem a autorização federal.

‘‘A fiscalização e a análise da água pelo DNPM, hoje realizadas pela ANM, não têm como objetivo somente a verificação de suas propriedades para fins de saúde da população que pode vir a consumi-la. É uma atividade que visa o resguardo dos interesses da União no bem natural, respeitando imperativos de predominância do interesse público sobre o particular e de desenvolvimento no interesse nacional’’, concluiu o ministro ao julgar procedente a ação popular. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 1490603