EXECUÇÕES
Recuperação judicial não impede redirecionamento a sócio após desconsideração da personalidade jurídica

​O deferimento de pedido de recuperação judicial de empresa que tem a sua personalidade jurídica desconsiderada não impede o andamento da execução redirecionada aos sócios, decidiu, por unanimidade, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

De acordo com o colegiado, eventual constrição dos bens dos sócios não afeta o patrimônio da empresa em recuperação, tampouco atinge a sua capacidade de reestruturação.

No mesmo julgamento, a turma entendeu que a desconsideração da personalidade jurídica com base na teoria menor, prevista pelo artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), também se aplica às sociedades anônimas.

Diferentemente da teoria maior, trazida pelo artigo 50 do Código Civil (CC), a teoria menor admite a desconsideração apenas com a demonstração do estado de insolvência da empresa e de que a personalidade jurídica constitui obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados, sem a necessidade de comprovação de desvio de finalidade ou da confusão patrimonial entre os sócios e a sociedade empresária.

No caso dos autos, a desconsideração da personalidade jurídica da empresa em recuperação ocorreu no âmbito de uma ação de consumo. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), segundo o qual a recuperação judicial não alcançaria as demandas envolvendo os devedores solidários, a exemplo dos sócios e dos administradores.

Ao STJ, os recorrentes alegaram ser acionistas – e não sócios – das empresas que tiveram a personalidade jurídica desconsiderada e que o veto ao parágrafo 1° do artigo 28 do CDC excluiria sua responsabilização pela teoria menor, uma vez que não seria possível a desconsideração das sociedades anônimas. Eles também defenderam a suspensão do cumprimento da execução em virtude do deferimento do pedido de recuperação judicial.

Tipo societário para fins de aplicação da teoria menor é irrelevante

Ministro Villas Boas Cuêva foi o relator
Foto: Imprensa/STJ

O relator do caso no colegiado, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, citou precedentes do STJ (entre eles o REsp 1.658.648 e o REsp 1.900.843) para destacar que a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, embora não exija a prova de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, não possibilita a responsabilização pessoal de quem não integra o quadro societário da empresa, ainda que atue nela como gestor, e de quem, mesmo que tenha a condição de sócio, não desempenha atos de gestão na sociedade.

Por outro lado, segundo o relator, a desconsideração da personalidade jurídica fundamentada na teoria menor pode ser admitida para sociedades anônimas, desde que seus efeitos se restrinjam às pessoas que detenham efetivo controle sobre a gestão da companhia. Nesse sentido, o ministro apontou precedente estabelecido pela Quarta Turma no AREsp 1.811.324, no qual o colegiado definiu que o tipo societário da empresa não é fator determinante para a aplicabilidade da teoria menor.

Em relação ao pedido de suspensão das execuções, Villas Bôas Cueva comentou que, conforme decidido pela Segunda Seção no REsp 1.333.349, o deferimento da recuperação judicial, a despeito de suspender as ações e as execuções contra e sociedade em recuperação, não impede o prosseguimento das execuções nem gera a suspensão ou a extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários.

‘‘Justamente por não afetar o patrimônio do devedor principal, ou seja, da empresa em recuperação, é que o legislador ressalvou os direitos e os privilégios dos credores contra coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (artigo 49, parágrafo 1º, da LREF), admitindo o prosseguimento de eventuais execuções contra eles instauradas’’, completou.

No caso concreto analisado, o ministro Cueva ressaltou que, segundo as instâncias ordinárias, os recorrentes são acionistas e controladores da sociedade, e, por consequência, possuem o poder de controle sobre a gestão da sociedade anônima que teve a personalidade desconsiderada.

‘‘No caso, portanto, não há óbice a que os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica recaiam sobre o patrimônio dos recorrentes’’, concluiu no voto. Com informações da Assessoria de Imprensa.

Leia o acórdão no REsp 2.034.442

RESOLUÇÃO VÁLIDA
STJ confirma decisão que autoriza corte de energia com aviso prévio de 15 dias

Reprodução internet

Os atos normativos editados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não correspondem à lei federal. Logo, não desafiam análise de recurso especial (REsp).

O entendimento é da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao manter acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) que considerou lícita a interrupção do fornecimento de energia elétrica após comunicação formal realizada com antecedência mínima de 15 dias, na forma da Resolução 456/2000 Aneel (atualmente revogada).

Assim, o STJ deixou de analisar o mérito de recurso interposto pelo Ministério Público Federal (MPF) e por uma concessionária de energia,

Na origem, o MPF ajuizou ação civil pública (ACP) contra concessionárias de energia elétrica do Rio Grande do Sul para que o fornecimento de energia aos usuários residentes no Estado não fosse interrompido por falta de pagamento com base na Resolução 456/2000 da Aneel.

De acordo com o autor da ação, o serviço de energia elétrica tem caráter essencial e sua supressão representaria uma restrição arbitrária ao direito do cidadão. O MPF também considerou exíguo o prazo de 15 dias para aviso aos usuários sobre a suspensão do serviço.

Em julgamento de embargos infringentes, o TRF-4 reformou sentença e reconheceu a validade da resolução da Aneel em relação ao prazo de comunicação prévia sobre a interrupção do fornecimento de energia. Para o tribunal, entendimento contrário poderia causar desequilíbrio econômico-financeiro nos contratos e ameaçar a própria a prestação do serviço, uma vez que as limitações ao corte de fornecimento de energia se relacionariam diretamente com o aumento da inadimplência.

Resolução é ato normativo que não corresponde a lei federal

Em seu voto, o relator do caso no STJ, ministro Francisco Falcão, ressaltou a inadequação do emprego do recurso especial como instrumento de análise de portarias, resoluções, regimentos ou outras normas que não se enquadrem no conceito de lei federal.

“Especificamente quanto à Resolução 456/2000 da Aneel, esta corte já decidiu que a resolução não corresponde a lei federal, não se amoldando o recurso especial ao ditame da alínea ‘‘a’’ do inciso III do art. 105 da CF/1988’’, concluiu Falcão. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

REsp 1250127

DIREITO DO CONSUMIDOR
Itaú vai pagar dano moral por encerrar conta sem avisar o correntista

A 2ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) manteve decisão que condenou, por unanimidade, o Itaú Unibanco S/A a indenizar correntista que teve conta encerrada sem prévia comunicação.

A decisão determinou o reestabelecimento provisório da conta do autor da ação indenizatória, para que ele possa sacar os valores. Além disso, o correntista será indenizado no valor R$ 2 mil, por danos morais.

O autor relata que é cliente do banco e que teve sua conta encerrada de forma unilateral. Ele alega que o réu reteve a quantia que ele tinha em sua conta corrente e condicionou o saque do valor à eventual ordem judicial.

Nesse sentido, como estava impossibilitado de movimentar o dinheiro, relata que acionou a Justiça para requerer a restituição do valor, bem como indenização por danos morais.

Serviço defeituoso

O réu argumenta que não houve falha na prestação dos serviços, já que o banco possui direito de rescindir contratos, conforme a sua conveniência e necessidade. Sustenta que agiu no exercício regular de direito, uma vez que fez a devida notificação prévia no endereço informado.

Por fim, o banco ainda defende que, de acordo com o Banco Central (Bacen), a comunicação prévia só é obrigatória em caso de constatação de irregularidades graves na conta do correntista e que não houve incidência de danos morais, pois os valores foram creditados na conta de origem do autor.

Desembargador Fernando Tavernard

Ao julgar o caso, a Turma esclarece que, de acordo com o Bacen, a comunicação prévia da intenção de rescindir o contrato deve conter a situação que motivou a rescisão e estipular prazo para eventual regularização da pendência. Dessa forma, para o colegiado, a comunicação realizada por e-mail, enviado após o encerramento da conta, não cumpre os requisitos do Bacen.

Sem meios para saque

Finalmente, a Justiça do DF pontua que o banco não comprovou que prestou informação clara e adequada ao consumidor sobre os motivos do encerramento da conta, tampouco disponibilizou meios para o saque dos valores depositados.

Assim, ‘‘a ausência de informação ao consumidor e dos motivos relevantes que deram causa ao encerramento da conta, além da comprovação de que o consumidor utilizava a conta encerrada para recepção de seu salário e os demais abalos derivados da abrupta ruptura do vínculo negocial, subsidiam a reparação por dano extrapatrimonial’’, concluiu o relator da apelação, desembargador Fernando Tavernard Lima. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJDFT.

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DOENÇA ESTIGMATIZANTE
Dispensa de motorista com transtorno afetivo bipolar é considerada discriminatória pelo TST 

Reprodução Martinspsiquiatria.Com.Br

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) tomou como discriminatória a dispensa de um motorista carreteiro da Rumo Malha Sul S.A. diagnosticado com transtorno afetivo bipolar. Também reconheceu o direito dele à reparação pelo prejuízo extrapatrimonial.

O valor da indenização não foi definido pelo colegiado do TST, que determinou o retorno dos autos à 1ª Vara do Trabalho de Curitiba para que prossiga no julgamento e arbitre quanto o trabalhador deve receber a este título.

Afastamentos

Contratado em 2012 e dispensado em 2013, o motorista carreteiro afirmou, no processo, que estava inapto para o trabalho na data da dispensa. Alegou que a empresa tinha conhecimento dos sucessivos afastamentos previdenciários e afirmou que a dispensa ocorreu enquanto ele aguardava a decisão judicial sobre o restabelecimento do último benefício previdenciário.

Em seguida, narrou, o auxílio-doença foi restabelecido de forma retroativa a 1º de abril de 2013; ou seja, data anterior à rescisão contratual. Além da nulidade da dispensa, ele pediu indenização por danos morais, argumentando que a dispensa foi discriminatória, decorrente de sofrer de transtorno afetivo bipolar.

Dispensa nula

Ao julgar o caso, o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9, Paraná) declarou a nulidade da dispensa, mas rejeitou o pedido de indenização. Conforme o TRT, o restabelecimento do benefício previdenciário implica reconhecimento de que, no momento da dispensa, em 9 de setembro de 2013, o contrato de trabalho encontrava-se suspenso, ‘‘não sendo possível efetuar a sua rescisão enquanto perdurar o período de licença’’.

Quanto à indenização, entendeu serem inaplicáveis a Lei 9.029/1995 e a Súmula 443 do TST, que presume discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito, sendo o ato inválido e com o empregado tendo direito à reintegração no emprego. Para o TRT, a enfermidade que acomete o trabalhador (transtorno afetivo bipolar) não se enquadraria como ‘‘doença grave que suscite estigma ou preconceito’’ e, assim, não poderia ser presumida a dispensa discriminatória. No caso, segundo o Tribunal Regional, não houve ilegalidade por parte da empregadora, e caberia ao trabalhador demonstrar que a rescisão contratual foi motivada pela doença psiquiátrica.

Doença, estigma e preconceito

Ministro Agra Belmonte foi o relator
Foto: Secom/TST

Com entendimento diverso do TRT, o relator do recurso de revista do motorista ao TST, ministro Agra Belmonte, destacou que não se sustenta a tese defendida no acórdão regional de que os transtornos psiquiátricos não provocam estigma e preconceito, pois essa percepção ‘‘encontra-se absolutamente desconectada da ciência e da realidade social’’.

Na avaliação do ministro-relator, é difícil escapar da presunção de que o rompimento unilateral do vínculo empregatício ‘‘teve por motivação a intenção da empregadora de não contar em seus quadros com trabalhador suscetível a essa enfermidade’’.

Segundo Agra Belmonte, mesmo sendo direito do empregador rescindir unilateralmente o contrato de trabalho, ‘‘tal prerrogativa não deve se sobrepor a todo o acervo constitucional e legal construído, democraticamente, com o intuito de salvaguardar os conceitos de igualdade, de solidariedade, de função social do trabalho, de dignidade da pessoa humana’’, assinalou. Isso, principalmente, diante do contexto histórico atual, em que ‘‘a adoção de políticas afirmativas de inclusão de grupos minoritários, inclusive dos portadores de necessidades especiais e de doenças graves e/ou estigmatizantes, floresce na população brasileira’’.

Condutas discriminatórias

O ministro citou também precedentes do TST de casos análogos que, embora não versem especificamente da situação examinada, tratam do caráter estigmatizante das doenças psiquiátricas. Mais ainda, salientou a jurisprudência atual de que as condutas discriminatórias descritas no artigo 1º da Lei 9.029/1995 constituem ‘‘elenco meramente exemplificativo’’, notadamente pelo fato de a Lei 13.146/2015 inserir a expressão ‘‘entre outros’’ na redação original daquele dispositivo.

A Sétima Turma do TST, considerando que a averiguação da situação atual do trabalhador e a verificação de que a viabilidade de sua reintegração aos quadros da empresa escapa ao papel da instância extraordinária, determinou o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem.

O relator assinalou também que, embora tenha sido reconhecida a existência do dano moral, a ausência de detalhamento fático no acórdão regional acerca da extensão da ofensa aos direitos da personalidade ‘‘recomenda que o magistrado de primeiro grau proceda ao arbitramento do quantum devido ao trabalhador’’.

A decisão foi unânime, mas foram apresentados recursos, ainda não julgados. Com informações da jornalista Lourdes Tavares, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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ARR-184-88.2014.5.09.0001 

DIREITO DOS DEFICIENTES
Servidor celetista com filho autista consegue redução de 50% da jornada de trabalho em São Paulo

A ausência de lei específica não pode impedir a redução da jornada de trabalhador que precisa atender filho autista. Neste caso, o Direito Administrativo cede lugar à interpretação sistemática do ordenamento, que se inicia na Constituição, passa pela Convenção Internacional de Proteção das Pessoas com Deficiência e desemboca no artigo 98, parágrafos 2º e 3º, da Lei 8.212/91 – de aplicação subsidiária.

Na esteira deste entendimento, a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) determinou que a Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA) reduza em 50% a jornada de um servidor celetista, sem prejuízo da remuneração nem necessidade de compensação, para que possa acompanhar o filho diagnosticado com transtorno do espectro autista (TEA) em consultas e tratamentos médicos.

A medida vale enquanto comprovada a necessidade, exigindo-se apenas prova de vida anual da criança.

A decisão do segundo grau da Justiça do Trabalho modifica sentença da 1ª Vara do Trabalho de Franco da Rocha (SP), que indeferiu o pedido com base no princípio da legalidade, previsto no Direito Administrativo, concluindo que não havia base legal para autorizar a diminuição das horas de trabalho.

A negativa em primeiro grau também se deu sob a alegação de que não se trata de pai solo, que a escala 2×2 do homem permitia tais cuidados com o filho e que os acompanhamentos feitos não provocaram sanções administrativas ao profissional.

Segundo a juíza-relatora do acórdão no TRT-SP, Eliane Aparecida da Silva Pedroso, o caso envolve ainda o diagnóstico de epilepsias fármaco-resistentes e é complexo o suficiente para que a análise considere também as convenções internacionais ratificadas pelo Brasil (como a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência), a Constituição da República e as leis ordinárias, hierarquicamente. Cita, por fim, jurisprudência recente envolvendo o tema.

A magistrada alerta que a lei não exige que o pai ou a mãe seja solo para ter direito à jornada reduzida, tampouco obriga que a jornada diária seja de oito horas nem condiciona o deferimento da redução à probabilidade ou não de punições administrativas.

‘‘A lei não faz nenhuma restrição para os pais de filhos com deficiência e, onde a lei não distingue, não cabe ao intérprete fazê-lo, muito menos para adotar entendimento que acabe por prejudicar aquele a quem o preceito visa a proteger’’, afirma a julgadora.

Caso a Fundação Casa descumpra o determinado pela Justiça do Trabalho, pagará multa diária de R$ 1 mil, a ser revertida em favor de entidades de amparo à criança com transtorno do espectro autista. Redação Painel de Riscos com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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ATOrd 1001030-08.2022.5.02.0291(Franco da Rocha-SP)