PROTEÇÃO VEICULAR
Oferta ilegal de seguro por associação de transportadores, sem prejuízo aos associados, não causa dano moral coletivo

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

A atuação ilegal no mercado de seguros não é suficiente para caracterizar a ocorrência de dano moral coletivo, especialmente se, no processo, não ficou comprovado prejuízo concreto à coletividade que celebrou os contratos.

A decisão é da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), após negar provimento à apelação da Superintendência de Seguros Privados (Susep), inconformada com a parte da sentença que deixou de condenar a Associação dos Transportadores Catarinenses de Cargas (Astracarg) em danos morais coletivos, após o reconhecimento da ilegalidade dos contratos de seguro oferecidos aos associados.

Ação civil pública

Na origem, a 2ª Vara Federal de Florianópolis julgou parcialmente procedente a ação civil pública (ACP) manejada pela Susep contra a Astracarg, determinando: a proibição de venda de seguros em todo o território nacional; a suspensão da cobrança de valores de seus associados, a título de mensalidades vencidas e/ou vincendas, rateio e outras despesas relativas à atuação irregular no mercado de seguros; e a publicidade da decisão judicial que a condenou.

O prolator da sentença, juiz federal Alcides Vettorazzi, entretanto, negou o pedido de indenização por danos morais coletivos.

Associados não tiveram prejuízos

Primeiro, porque não vislumbrou prejuízo aos associados, uma vez que estes tiveram à sua disposição cobertura pelos riscos a que estavam expostos, à semelhança do que ocorre no contrato de seguro capitalista. Além disso, provavelmente, ilustrou, os associados pagaram a título de prêmio valor menor do que o de mercado – o que configuraria um ganho, e não perda.

Em segundo lugar, o julgador ponderou que a atividade da Astracarg neste segmento de seguros é proporcionalmente irrelevante, dado o pequeno número de associados. Neste sentido, lembrou o voto da desembargadora Marga Inge Barth Tessler, já aposentada, exarado no julgamento da AC 5014540-29.2018.4.04.7003.

No ponto: ‘‘Com efeito, em relação aos associados, verifica-se que não houve qualquer prejuízo imediato, tendo em vista que os associados passaram a contar com proteção similar à de seguro, inexistindo nos autos prova de que a proteção ofertada, quando requerida, tivesse sido indevidamente negada’’.

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ACP 5002329-16.2018.4.04.7211 (Florianópolis)

 

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ATOS COOPERATIVOS
Fisco municipal não pode cobrar ISS sobre taxas administrativas da Unimed Federação, diz TJRS

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Sede da Unimed Federação RS, em Porto Alegre

A compreensão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é de que a cooperativa, quando serve de mera intermediária entre seus associados e terceiros, que usam os serviços médicos, está isenta de tributos, porque exerce atos cooperativos (artigo 79 da Lei 5.764/71) e, por isso, goza de não-incidência de Imposto Sobre Serviços (ISS).

Ancorada nesse fundamento, a 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grade do Sul (TJRS) confirmou sentença que acolheu embargos à execução fiscal opostos pela Unimed – Federação das Cooperativas Médicas do RS Ltda. em face do Município de Porto Alegre, que não reconhecia como atos cooperativos as taxas cobradas de alguns serviços prestados aos associados entre abril de 2009 e março de 2013. O valor cobrado pelo fisco municipal, que virou pó: R$ 6 milhões.

Serviços de intercâmbio

O fisco sustentou que uma das funções da Federação era coordenar os serviços de intercâmbio e apurar o montante que cada Unimed teria para receber e pagar em razão do atendimento fora da cobertura geográfica do beneficiário. Em tais casos, alegou que a embargante auferia duas diferentes modalidades de receitas: taxa de administração equivalente ao percentual estabelecido no convênio cobrado da Unimed de vinculação do usuário; e ingresso mais valia, referente à diferença do coeficiente de honorários entre as Unimeds envolvidas – espécie de índice próprio para determinar o valor monetário cobrado por procedimento médico –, podendo ser diferenciado por região.

Argumentou que, sobre tais receitas, deveria incidir o ISS, por se tratar de serviços de administração em geral, previstos no item 17.12 da Lista Anexa à LC 116/2003.

Sentença de procedência

No primeiro grau, o 2º Juízo da 8ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central da Comarca de Porto Alegre enfrentou, ponto por ponto, os quesitos do fisco elencados na contestação, julgando procedentes os pedidos veiculados na ação. Em síntese, desconstituiu o auto de infração e lançamento e declarou extinta a execução fiscal.

Nas razões de decidir, a juíza Ana Beatriz Rosito de Almeida destacou que o ato cooperativo, por não implicar operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou mercadoria, está fora da incidência tributária.

‘‘Neste contexto, tem-se que os serviços prestados aos associados, como descritos nos autos de lançamento, caracterizam atos típicos cooperados, não sujeitos à incidência do ISS’’, definiu.

 Dupla tributação sobre o mesmo fato gerador

Na 22ª Câmara Cível do TJRS, o relator da apelação e reexame necessário, desembargador Miguel Angelo da Silva, seguiu a mesma linha de raciocínio da magistrada. Ou seja, não viu irregularidade na dedução sobre a taxa de administração nem sobre a mais valia, quando do recolhimento do ISS, das rubricas referentes a serviços prestados por médicos, clínicas, laboratórios e hospitais credenciados.

Para o relator, o ato tributável, para fins de ISS, é aquele praticado com intuito negocial, entre a cooperativa e os terceiros adquirentes dos planos de saúde ofertados. Já os atos decorrentes do vínculo da cooperativa com seus associados não estão sujeitos à tributação pela embargante.

‘‘Em verdade, quem deve ISS sobre o valor do repasse são apenas as pessoas e entidades prestadoras dos serviços. Assim sendo, o acolhimento da tese defendida pelo fisco implicaria em bis is idem ou dupla tributação, uma vez que os respectivos associados da cooperativa de serviços médicos já são tributados isoladamente sobre o mesmo fato gerador’’, fulminou no acórdão.

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001/1.17.0049032-0 (Porto Alegre)

 

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ABUSO DE PODER
Companhia Carris vai pagar dano moral por levar programador de TI a ócio forçado

Funcionário impedido de exercer as suas funções, jogado no ostracismo dentro da empresa, sofre abalo moral, pela violação dos direitos de personalidade – nome, imagem, honra e intimidade. Assim, deve ser indenizado em danos morais, como sinalizam os incisos V e X do artigo 5º da Constituição; e os artigos 186 e 927 do Código Civil.

Por permitir essa situação laboral, a Companhia Carris Porto-Alegrense, estatal municipal de transporte coletivo recentemente privatizada, terá de pagar indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil a um programador de TI (tecnologia da informação) que ficou mais de dois anos sem receber tarefas/incumbências, completamente isolado, por ordem expressa do diretor administrativo-financeiro da empresa.

A condenação foi imposta pela juíza Márcia Padula Mucenic, da 6ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, e confirmada pelos integrantes da 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul).

Além do isolamento profissional, os desembargadores do TRT gaúcho consideraram que o empregado foi vítima de condutas desrespeitosas e ofensivas por parte do superior hierárquico, caracterizando o assédio moral. O gestor, que assumiu em 2021, resolveu perseguir o reclamante depois que este começou a reivindicar melhorias e suprimentos, tornando público os pedidos e os indeferimentos.

Proibido de trabalhar

O reclamante foi admitido em abril de 2001 no cargo de programador de computador, após aprovação em concurso público. Em 2022, ele deixou de desempenhar a função gratificada de coordenador e retornou ao cargo original de programador. A partir daí, seu superior hierárquico o deixou em inatividade, proibindo que fossem designadas tarefas a ele. O empregado também foi colocado em uma sala isolada dos demais colegas, sem receber informações sobre o trabalho.

A juíza de primeiro grau concluiu, com base na prova testemunhal, que houve assédio moral contra o programador. A coordenadora do setor médico da empresa, ouvida como testemunha, relatou que o empregado procurou atendimento médico algumas vezes, com pressão alta, em virtude do comportamento do chefe. Ela destacou que, além do autor da ação, outros trabalhadores se dirigiam ao setor médico por problemas de saúde causados pela conduta do diretor.

Outra testemunha ouvida explicou que os chamados da informática não eram direcionados para o autor, mas sim para um terceirizado. Assim, o empregado passava a jornada em frente ao computador, mas sem trabalhar.

Segundo a magistrada, ficou clara a imposição do empregado ao ostracismo. ‘‘Cristalino é o dano moral que daí surge, fazendo a parte jus à indenização decorrente, tendo em vista o abalo sofrido por empregado, que é simplesmente deixado de lado’’, concluiu a julgadora.

As partes recorreram ao TRT-RS. O relator do caso na 7ª Turma, desembargador Wilson Carvalho Dias, manteve a sentença. No entendimento do magistrado, ficou comprovado o abuso do poder diretivo pelo diretor da empresa, que isolou o subordinado, configurando assédio moral.

Também participaram do julgamento o desembargador Emílio Papaléo Zin e o juiz convocado Marcelo Papaléo de Souza. Não foi interposto recurso do acórdão. Redação Painel de Riscos com informações de Bárbara Frank (Secom/TRT-4).

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ATOrd 0020391-53.2022.5.04.0006 (Porto Alegre)

PRAZO DE UM ANO
Plano de recuperação judicial pode prever deságio sobre os créditos trabalhistas

Ministro Villas Bôas Cueva foi o relator
Foto: Reprodução/CJF

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou válida a cláusula do plano de recuperação judicial de uma empresa do ramo de alimentos que previu a incidência de deságio sobre os créditos trabalhistas pagos em até um ano.

O juízo de primeiro grau entendeu ser possível a aplicação do deságio aos créditos trabalhistas, já que houve a aprovação do plano pela assembleia geral de credores. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), porém, reformou a decisão após uma ex-empregada sustentar, em recurso, que o deságio violava princípios do Direito Trabalhista e que os créditos, de natureza alimentar, não poderiam sofrer dilapidação unilateral.

No recurso especial (REsp) dirigido ao STJ, a empresa em recuperação pediu o reconhecimento da legalidade da cláusula que trata do deságio.

Vedação de deságio para pagamentos prorrogados

O relator do REsp, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, esclareceu que a redação original do artigo 54 da Lei 11.101/2005 apresentava requisitos apenas de limitação temporal para o pagamento de créditos trabalhistas, não sendo vedada a incidência de deságio.

O ministro destacou que, após a inclusão do parágrafo 2º naquele artigo pela Lei 14.112/2020, houve a extensão de prazo para o pagamento dos créditos trabalhistas sem a possibilidade da aplicação do deságio. Conforme explicou, se o pagamento for feito no prazo de um ano, o legislador não vedou a estipulação de deságios.

‘‘No caso de o pagamento ser prorrogado até o prazo de três anos, o crédito deve ser satisfeito em sua integralidade’’, complementou.

Lei estabeleceu soberania da assembleia de credores

O ministro ressaltou que o plano de recuperação foi aprovado dentro dos moldes do artigo 45 da Lei 11.101/2005, e a empresa, além de atender aos requisitos impostos pelo artigo 54, fará o pagamento do crédito trabalhista no prazo de um ano, não havendo vedação legal para o deságio.

O relator enfatizou que a referida lei estabeleceu a soberania da assembleia de credores, ressalvadas algumas limitações, e condições especiais de pagamento como forma de recuperação. Segundo apontou, com a aprovação do plano pelos credores trabalhistas, a cláusula deve ser tida como válida.

‘‘Não havendo vedação para o pagamento do crédito trabalhista com deságio, não há como afastar as cláusulas do plano modificativo aprovado pela assembleia de credores’’, concluiu o ministro. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2110428

SÍNDROME DE BURNOUT
Banco deve indenizar gerente em R$ 40 mil por cobrança abusiva de metas

Ilustração Sindibancários

Demonstrada a realização de cobranças de forma abusiva, com ameaças veladas de dispensa e resultando em ambiente de trabalho promovedor de doenças, houve evidente exacerbação do poder diretivo e ofensa a direitos personalíssimos do trabalhador, configurando-se, assim, o assédio moral organizacional, hábil a justificar a condenação ao pagamento de indenização por danos morais.

A conclusão, ipsis literis, é da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina) ao determinar que o Banco Bradesco pague, a título de danos morais, R$ 40 mil a um ex-gerente de banco diagnosticado com Síndrome de Burnout, desenvolvida após cobrança abusiva de metas, deverá ser indenizado em R$ 40 mil.

O caso aconteceu no município de Cocal do Sul, região sul de Santa Catarina. O autor da ação reclamatória trabalhou como gerente da parte reclamada por quase 30 anos. Durante o período, houve dias em que o expediente chegou a durar até 14 horas, conforme relatado no processo.

O bancário também afirmou que a instituição financeira exigia que ele e sua equipe atingissem resultados que variavam de 150% a 200% das metas estabelecidas. Relatou, ainda, que era cobrado de forma rigorosa e constrangedora, frequentemente na frente de colegas, além de receber ameaças veladas de demissão.

Impactos na saúde

Ao longo dos anos, a pressão começou a impactar a saúde do gerente. Ele foi diagnosticado com ansiedade generalizada, transtorno misto de ansiedade e depressão e, mais tarde, Síndrome de Burnout – uma condição caracterizada pelo esgotamento físico e emocional, comumente relacionada ao ambiente de trabalho.

Mesmo em tratamento, continuou exercendo as atividades profissionais. No entanto, anos depois, ele foi surpreendido com a demissão sem justa causa. A dispensa ocorreu mesmo com o histórico de problemas de saúde, que, segundo ele, estavam diretamente relacionados às condições de trabalho impostas pelo empregador.

O banco, por sua vez, sustentou que a dispensa ocorreu dentro do seu direito potestativo, ou seja, no exercício legítimo do poder de decisão, sem qualquer relação com a condição de saúde do gerente. Argumentou também que o trabalhador não estava afastado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) no momento da demissão e, por esse motivo, não faria jus à estabilidade no emprego prevista para casos de doença ocupacional.

Na análise do juízo de primeiro grau, a 1ª Vara do Trabalho de Criciúma (SC) não acolheu os pedidos do autor. A decisão se baseou principalmente nas conclusões do perito chamado ao processo, cujo laudo afirmou que a condição do funcionário era ‘‘temporária e parcial’’.

Limites à cobrança de metas

Inconformado com a sentença, o reclamante recorreu para o tribunal. Ele novamente requereu que sua condição fosse reconhecida como decorrente da pressão recebida no banco e, portanto, equiparada a um acidente de trabalho.

A relatora do processo na 2ª Turma do TRT-SC, juíza convocada Maria Beatriz Vieira da Silva Gubert, acolheu os argumentos do reclamante. No acórdão, ela destacou que existem limites para a cobrança de metas.

‘‘A cobrança de metas é regular e está inserida no poder potestativo do empregador, mas deve ser feita de forma a respeitar a dignidade do trabalhador e a urbanidade no ambiente de trabalho, sem importar em abuso de direito’’, destacou Maria Beatriz Gubert. A magistrada acrescentou que a conduta da ré caracterizou assédio moral organizacional.

Reforma da sentença

Para fundamentar a decisão, a relatora confrontou as conclusões do laudo pericial com outras provas apresentadas, como depoimentos de testemunhas e atestados emitidos por psiquiatras apontando um quadro de sofrimento mental relacionado ao trabalho.

Com base nesses elementos, a 2ª Turma reformou a decisão de primeiro grau, reconhecendo que o banco contribuiu para o adoecimento do ex-gerente, condenando a instituição ao pagamento de R$ 40 mil a título de indenização por danos morais.

A decisão também reconheceu que, diante do quadro clínico apresentado, o bancário teria direito à estabilidade provisória (artigo 118 da Lei 8.213/91), que assegura ao trabalhador afastado por doença relacionada ao trabalho uma estabilidade no emprego por até 12 meses após o retorno do tratamento. Portanto, além da indenização por danos morais, o pagamento dos salários do período de estabilidade também foi concedido.

A empresa recorreu da decisão. Redação Painel de Riscos com informações de Carlos Nogueira, da Secretaria de Comunicação Social (Secom)/TRT-12.

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ATOrd 0000169-17.2023.5.12.0003 (Criciúma-SC)